Reportagem do Fantástico investiga o ‘golpe da falência’ dado por construtora de Goiás

O Ministério Público de Goiás quer prender novamente Dejair José Borges, dono da construtora Borges Landeiro, acusado de desviar patrimônio da empresa e aplicar um ‘golpe de falência’. Até o momento, 12 pessoas — entre sócios e família do empresário — fazem parte do processo.

 

O empresário e os outros 11 acusados foram presos em novembro durante uma operação do MP que investiga fraudes em recuperação judicial de empresas. Na ocasião, foram apreendidas propriedades rurais, uma aeronave e obras de arte, segundo o G1.

Nove dias depois, Borges e mais seis suspeitos foram soltos após a defesa do empresário conseguir um habeas corpus (nº 548.641-GO) no Superior Tribunal de Justiça (STJ) — cinco ainda ficaram detidos. O MP, no entanto, acredita que todos eles são culpados.

De acordo com o órgão, antes do pedido de recuperação judicial, em 2017, Borges e os sócios Vicente Conte Neto e Bruno Burilli Santos, mais um primo que supostamente foi usado como ‘laranja’, deram início a um golpe de falência.

Um funcionário da empresa entregou ao MP um áudio que denuncia a intenção de Dejair de não pagar as dívidas com credores — ele teria R$ 600 milhões em fazendas, portanto, dinheiro suficiente para injetar na empresa e resolver o problema.

Golpe de falência

Um trecho do processo conta Dejair e sua construtora diz o seguinte:

“O Grupo Borges Landeiro omitia informações e ocultava o seu patrimônio com a finalidade de fraudar e prejudicar os credores, além de se valer de pessoas físicas e jurídicas interpostas —laranjas—para desviar, movimentar e deter valores, inclusive de estoque, se utilizando também de terceiros para arrematar os próprios bens das empresas pertencentes ao grupo recuperando”.

A defesa de Dejair diz que “a acusação é totalmente improcedente”.

‘Kit falência’, o início do golpe

Em 2017, a construtora Borges Landeiro, uma das maiores de goiânia, alegou à Justiça que estava à beira da falência e que sua dívida era de R$ 250 milhões. Naquela ocasião, a empresa deixou de entregar apartamentos.

Segundo reportagem do Fantástico, essa foi a primeira parte do golpe. Ele foi executado por meio de uma estratégia para enganar tanto a Justiça quanto os clientes, um ‘kit falência’.

A tática descoberta pela promotoria consiste na abertura de empresas em nome de ‘laranjas’ para desviar o patrimônio. O domínio dessas novas empresas, contudo, fica nas mãos do dono da ‘empresa falida’.

Um primo de Dejair, por exemplo, era dono de um empresa laranja que recebeu R$ 60 milhões da construtora. O parente teria recebido R$ 5 mil para emprestar seus dados pessoais.

O dinheiro então vai sendo transferido até a empresa alegar não haver mais liquidez para pagar dívidas. Nisso, ela entra com pedido de recuperação judicial, um benefício previsto em lei.

A recuperação judicial serve para que uma empresa se reorganize financeiramente e não tenha que fechar as portas.

“No período de um ano, eles celebraram vários negócios jurídicos para desviar esse patrimônio”, disse à reportagem o promotor Juan Borges de Abreu.

Empresas ‘laranjas’

E foi com a abertura de várias empresas que veio a outra parte do golpe. As firmas entraram em contato com os credores, que, desesperados, aceitaram receber uma pequena parte da dívida.

Nisso, essas empresas se tornaram procuradoras dos clientes e assim puderam votar em na assembleia, o que definiu por votação o processo de recuperação judicial.

Com o poder de Dejair sobre tudo e todos, em março de 2019, foi aprovado o pagamento de 30% das dívidas num prazo de 26 anos e com início para pagamento em 2023.

“O consumidor, infelizmente, nessa assembleia de credores fez papel de bobo”, comentou o promotor.

‘Negócio da China’

Finalizado o golpe com o kit falência, a Borges Landeiro conseguiu reduzir as dívidas, recomprou os apartamentos a preços bem baixos e os colocou de novo à venda, mostrou a reportagem.

“Negócio da China”, disse Juan, após ressaltar que a empresa vendia o mesmo imóvel duas vezes, multiplicando o patrimônio em 200%.

A defesa de Borges, contudo, diz que “a acusação é totalmente improcedente”.

Cliente investiu dinheiro da vida toda

A reportagem também mostra que enquanto os clientes estão desesperados, Dejair desfruta de riqueza nas redes sociais — “barcos e jatinhos”.

Um dos clientes da construtora, o aposentado Antônio Francisco de Paula, pagou à Borges Landeiro R$ 200 mil, referente à compra de um apartamento em 2009. Até hoje ele não recebeu nem o imóvel nem o dinheiro que guardou por muitos anos, mostrou a reportagem.

O MP tenta não só reverter a soltura dos acusados, mas também anular o processo de recuperação judicial. Desta forma, a Justiça pode evitar que os clientes aguardem, literalmente, mais de um quarto de século para receber apenas um terço do que têm direito.

 

Operação Ápia: juiz federal decide enviar parte do processo para Justiça estadual em Palmas

Acusações de improbidade administrativa serão julgadas na comarca da capital. Ele entendeu que mesmo com recursos federais, as licitações das obras sob suspeita devem ser fiscalizadas em âmbito estadual.

O juiz federal Eduardo de Melo Gama, da 1ª Vara da Justiça Federal em Palmas, decidiu enviar para a Justiça Estadual do Tocantins parte do processo da Operação Ápia, da Polícia Federal. Esta é a maior investigação já realizada pela PF no Tocantins e resultou em mais de 500 indiciamentos. Os policiais apuram supostos desvios bilionários em obras rodoviárias no estado.

A parte que será julgada em âmbito estadual é a das acusações na área cível, como de improbidade administrativa, por exemplo. As acusações criminais, como a de formação de quadrilha, seguem com a Justiça Federal.

O motivo da mudança, segundo a decisão, seria que apesar dos recursos usados nas obras sob suspeita serem de origem federal, caberia aos órgãos estaduais a fiscalização das licitações, uma vez que eventuais prejuízos diriam respeito apenas ao Estado.

“qualquer irregularidade praticada nos procedimentos licitatórios não causará qualquer nulidade nos contratos de financiamento ou de empréstimo, ou seja, havendo desvios de recursos públicos nos procedimentos licitatórios, o único prejudicado financeiramente é o Estado, permanecendo incólume a obrigação de adimplir integralmente as parcelas do financiamento ou empréstimo”, explicou o juiz.

A decisão de Melo Gama foi tomada após um pedido das partes do processo que questionava de quem seria a competência no caso. Ele determino o encaminhamento dos trechos do processo para a comarca de Palmas.

A operação
A maior investigação realizada no Tocantins pela Polícia Federal teve seis fases com 90 investigados e cerca de 500 indiciamentos. Mais de 2 mil documentos foram apreendidos e analisados. Mais de 40 pessoas tiveram bens bloqueados num total de R$ 431 milhões, como casas, apartamentos, fazendas e carros, entre outros.

A Ápia teve como foco contratos de empréstimos do governo do Tocantins feitos entre 2012 e 2014, que somam R$ 1,2 bilhão para 12 obras de pavimentação no interior do estado. A Polícia Federal apurou que o desvio aconteceu no momento em que o Estado pagou indevidamente as empreiteiras por serviços não realizados.

O ex-governador Sandoval Cardoso, preso durante a primeira fase, foi solto dias depois após um Habeas Corpus do Tribunal Regional Federal e o pagamento de R$ 50 mil de fiança.

A segunda fase ocorreu em outubro de 2016 e envolveu os sócios da construtora Rio Tocantins. A terceira fase, foi em fevereiro de 2017, quando quatro pessoas foram presas. Entre elas, empresários suspeitos de serem laranjas de políticos.

A quarta fase foi em abril de 2018 e envolveu o deputado estadual Eduardo Siqueira Campos, que teve mandado de condução coercitiva decretado.

A quinta fase deu origem a outra operação chamada Convergência, que envolvem a família do ex-governador Marcelo Miranda e do ex-procurador-geral de justiça Clenan Renault.

O ex-chefe do MPE é suspeito de beneficiar empreiteiros e os filhos dele, que segundo a Polícia Federal teriam recebido propina por meio de um contrato fictício com um escritório de advocacia.

Em dezembro de 2017, a PF deu início a 6ª fase da Ápia para apurar os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro decorrentes de vários pagamentos de propinas realizados por empreiteiras. Entre os alvos estavam deputados federais Dulce Miranda e Carlos Gaguim.