Capitão da PM-BA suspeito de participar de esquema de tráfico de armas para facções é solto

O capitão Mauro Grunfeld foi preso preventivamente em maio. Ele e outras 19 pessoas foram alvos de mandados de prisão da Operação Fogo Amigo.

O capitão Mauro Grunfeld, suspeito de participar de um esquema de compra e venda de armas que abastecia facções criminosas na Bahia, foi solto na noite de quarta-feira (17), horas antes da publicação da reportagem “Conversas interceptadas mostram atuação de capitão da PM-BA em esquema de tráfico de armas para facções criminosas, dizem PF e MP” feita pelo g1 e jornal Bahia Meio Dia da TV Bahia.

A decisão foi tomada pela 1ª Vara Criminal da Comarca de Juazeiro, sob a presidência do juiz Eduardo Ferreira Padilha, que concedeu liberdade provisória ao capitão Mauro Grunfeld. O suspeito havia solicitado a revogação de sua prisão preventiva, alegando possuir bons antecedentes e endereço fixo, além da ausência dos requisitos para manutenção da medida cautelar.~

O Ministério Público manifestou-se contra a solicitação, sustentando que as circunstâncias que justificaram a prisão preventiva permaneciam inalteradas. No entanto, o juiz considerou que Grunfeld não ocupava papel de liderança na suposta organização criminosa investigada, sendo passível de responder ao processo em liberdade devido à ausência de antecedentes criminais.

Em sua decisão, o juiz Padilha ressaltou que a prisão preventiva deve ser uma medida excepcional, aplicável apenas quando houver evidências concretas de perigo à ordem pública ou à instrução processual. Citou ainda um precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que permitiu a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares diversas para réus sem papel de destaque em organizações criminosas.

Grunfeld foi liberado sob as seguintes condições:

não alterar seu endereço sem comunicação prévia ao juízo
comparecer a todos os atos processuais
não se ausentar da comarca de sua residência sem autorização e
evitar contato com pessoas relacionadas aos fatos investigados.
O não cumprimento dessas medidas resultará na decretação de nova prisão preventiva. A decisão determinou ainda a emissão do alvará de soltura e a expedição de carta precatória para fiscalização das medidas cautelares.

De acordo com informações da Corregedoria da Polícia Militar, o capitão Mauro Grunfeld responde a processo administrativo disciplinar (PAD), independentemente da apuração de responsabilidade na esfera criminal.

O que aconteceu

Ex-subcomandante da 41ª Companhia Independente (CIPM/Federação-Garcia) e condecorado pela corporação como “policial militar padrão do ano de 2023” pelo “fiel desempenho nos serviços prestados”, Grunfeld foi preso preventivamente em maio. Ele e outras 19 pessoas foram alvos de mandados de prisão da Operação Fogo Amigo, que desvendou o esquema criminoso da organização batizada como “Honda”.

A suposta participação do capitão Mauro Grunfeld no esquema de compra e venda de armas que abastecia facções criminosas na Bahia foi revelada por meio de conversas em aplicativos de mensagens. As informações foram interceptadas pela Polícia Federal, em investigação conjunta com o Ministério Público do Estado (MP-BA).

O capitão nega as acusações. A defesa dele diz que as armas eram compradas para uso pessoal. [Veja os detalhes ao final do texto]

De acordo com a apuração conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco), de Investigações Criminais Norte e das Promotorias Criminais da Comarca de Juazeiro, o capitão era um “contumaz negociador de armas e munições”. Grunfeld foi descrito como o principal remetente de dinheiro para Gleybson Calado do Nascimento, também policial militar da Bahia e apontado como um dos maiores operadores do esquema que movimentou quase R$ 10 milhões entre 2021 e 2023.

Um documento sigiloso, obtido pela TV Bahia, aponta que entre 18 de fevereiro de 2021 e 13 de fevereiro de 2022, o capitão transferiu R$ 87.330,00 para Nascimento. “Os diálogos entre os dois indivíduos não deixam nenhuma dúvida de que os altos valores transacionados, demonstrados abaixo, referem-se à comercialização de armas de fogo e munições. Denota-se, da conversa, que a negociação entre eles é algo permanente, habitual, comum, sem nenhuma formalidade”, indica um trecho do material.

Confira algumas transações:

Em 26 de setembro de 2023, por exemplo, Grunfeld teria negociado com Gleybson. “Manda o pix”, escreveu o capitão, se referindo à chave necessária para a transferência e questionando também o valor.

Em 29 de setembro do ano passado, outra conversa mostrou que Grunfeld também era vendedor. “Apareceu pedido de 5 cartelas de 7.65”, enviou o policial. Ele se referia ao tipo de cartucho para uma pistola.

Em 1º de outubro de 2023, uma nova conversa mostra Gleybson oferecendo um revólver a Grunfeld por R$ 4,5 mil.

A investigação também aponta que essas armas e munições tinham destino específico: “criminosos faccionados que atuam no Bairro do Calabar, em Salvador”. As negociações seriam intermediadas por traficantes de drogas.

Diante desses indícios, Grunfeld foi alvo de mandados de prisão preventiva e busca e apreensão — na Academia da Polícia Militar, na Boa Viagem, e na residência dele, no bairro da Graça, ambos endereços em Salvador. Porém, os agentes encontraram uma pistola sem o devido registro na casa e realizaram a prisão em flagrante.

O capitão alegou que a arma foi adquirida de um policial civil e que a propriedade seria de outra agente, mas disse não saber informar nome ou lotação da servidora. Ele argumentou também que fez a compra porque precisava de defesa pessoal e policiais militares estariam com “dificuldades burocráticas” para obter o artefato.

Esquema de compra e venda de armas

A operação que prendeu 19 pessoas, dentre elas 10 militares, foi deflagrada em 21 de maio. Policiais da Bahia e de Pernambuco, além de CACs (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador) e lojistas, são suspeitos de integrar a organização criminosa especializada em vender armas e munições ilegais para facções criminosas.

Os mandados foram cumpridos em Arapiraca, no estado de Alagoas; em Petrolina, no estado de Pernambuco; e em Juazeiro, Salvador, Santo Antônio de Jesus, Porto Seguro e Lauro de Freitas, na Bahia.

De acordo com a Polícia Federal, o modus operandi do grupo consistia em reter armamentos apreendidos em operações policiais. Ao invés de apresentar o material na delegacia, os suspeitos revendiam essas armas para organizações criminais.

Já a obtenção de armas novas era feita por meio de laranjas. Os investigados pagavam pessoas sem instrução, geralmente da zona rural das cidades e sem antecedentes criminais, para tirar o Certificado de Registo do Exército (CR) — necessário para obtenção do CAC.

Eles custeavam todo o processo para o laranja conseguir o documento. Garantido o registro, a pessoa comprava o artefato em lojas especializadas, também ligadas ao esquema, depois registrava um boletim de ocorrência por furto e dava a arma como extraviada para que não fosse conectada ao comprador final. Se por alguma razão, esse procedimento não fosse feito, o número de série era raspado ou refeito.

Salário de R$ 8 mil e ostentação nas redes sociais

Oficial da PM há 17 anos, o capitão informou que recebe salário fixo de R$ 8 mil. Como bens, declarou apenas ser proprietário de um apartamento, estimado em R$ 700 mil, e possuir R$ 20 mil no banco, em conta poupança.

Seu estilo de vida, no entanto, era luxuoso. Nas redes sociais, o capitão da PM exibia fotos em iates, passeios em restaurantes caros e viagens a destinos turísticos badalados, como a Ilha de San Andrés, na Colômbia.

Flagrante revogado

Ao analisar o caso, a 26ª Promotoria de Justiça Criminal da Capital, área do MP-BA não vinculada à investigação principal, pontuou que “não há qualquer elemento probatório ou mesmo fático que aponte para eventual participação do custodiado em organização criminosa ou que reitere na prática de crimes”.

O órgão ponderou que o procedimento criminal está sob sigilo, o que impede os promotores de acessarem o conteúdo, sendo o juízo da Vara Criminal de Juazeiro o “único órgão julgador que detém o real conhecimento das imputações porventura irrogadas em desfavor do custodiado”. A partir dessas ponderações, em 21 de maio, o MP-BA se pronunciou pela liberdade provisória com pagamento de fiança.

No dia seguinte, na audiência de custódia, a Justiça acatou os argumentos e concedeu o benefício da provisória ao capitão. Mas a juíza em questão não expediu alvará de soltura para que fosse cumprido o mandado de prisão preventiva em aberto. Assim, na mesma data, a preventiva foi cumprida.

Investigação por homicídio doloso

Mauro Grunfeld é alvo ainda de um inquérito por homicídio doloso durante o exercício da função como policial militar. O caso é de 10 de abril de 2013, quando ele era tenente e comandante de uma guarnição da Ceto (Companhia de Emprego Tático Operacional) em atuação no município de Santa Cruz Cabrália.

O registro da ocorrência diz que Grunfeld e outros quatro soldados faziam ronda noturna na Rua A, no bairro 5º Centenário — local descrito como sede de “intenso tráfico de drogas”. Ao se aproximar da área, a guarnição teria sido “recebida a tiros por cerca de quatro a cinco indivíduos, sendo forçada a usar da força necessária, revidando os tiros”.

Um deles seria um jovem de 18 anos, atingido com pelo menos quatro tiros. A corporação o encaminhou para uma unidade de saúde, mas o rapaz já chegou sem vida.

Em depoimentos, a família negou que o rapaz tivesse envolvimento com o crime. O irmão mais novo da vítima, que viu o jovem ser baleado, defendeu que ele teria corrido apenas por medo do tiroteio.

A Polícia Civil concluiu o inquérito sem pedir o indiciamento dos militares. A instituição remeteu o processo ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), tratando o caso como “homicídio privilegiado” — termo usado para situações em que o autor age sob forte emoção ou provocado pela vítima. Esses casos não preveem uma tipificação diferente do crime, mas implicam redução de pena.

Com a Justiça, o processo não avançou muito. Ainda em 2013, o MP-BA apontou “a precariedade e a pobreza dos (pouquíssimos) elementos de convicção colhidos e acostados aos autos do inquérito policial”. Os promotores pediram uma série de providências, como novo exame no local do fato, juntada de fotografias do cadáver e esclarecimentos sobre os disparos que atingiram a vítima.

Dez anos depois, o MP-BA reforçou a cobrança, mas não há registro de que a Delegacia de Santa Cruz Cabrália tenha retomado a investigação até o momento. O g1 e a TV Bahia fizeram questionamentos à Polícia Civil, que não retornou o contato.

O que diz a Secretaria de Segurança Pública

A Secretaria de Segurança Pública da Bahia informou que o cenário levou a pasta a fortalecer o trabalho das corregedorias.

Titular da SSP-BA, Marcelo Werner destacou a criação de um grupo que tem como objetivo o combate a crimes praticados por policiais, a Força Correcional Especial Integrada (Force). “Já foram mais de 10 operações somente da Force, diversos, sem prejuízo das operações realizadas pelas corregedorias próprias”, disse.

“Respeitando todo processo legal, uma vez que haja desvio de conduta, prática de crime por parte do policial, a gente tem sim que fazer investigação e levar eles à Justiça”, afirmou o secretário.

O que diz a defesa dos envolvidos
A defesa de Mauro Grunfeld negou que o capitão comprava armas e que tenha qualquer vínculo com facções criminosas. Exaltou o cliente como profissional exemplar e até apresentou um certificado de policial militar padrão emitido em 2023.

O advogado ainda afirmou que Grunfeld apenas adquiria munições para uso próprio, com o objetivo de aprimorar o treinamento.

“Armamento não, mas munições para uso próprio da atividade policial cotidiana e diária dele, sim. Ele reconhece isso”, disse à TV Bahia.
Questionado sobre conhecimento do cliente a respeito da procedência dessas munições, o advogado Domingo Arjones afirmou que Grunfeld tinha conhecimento de que “estava adquirindo uma munição própria para treinamento”.

Quanto ao inquérito sobre homicídio doloso, o advogado informou que não vai se posicionar pois não obteve acesso ao processo.

Também procurada, a defesa de Gleybson Calado do Nascimento, PM suspeito de ser um dos principais operadores do esquema, disse que impetrou um pedido de habeas corpus e aguarda o posicionamento do Ministério Público Estadual (MP-BA) antes de se posicionar.

Kat Torres, a ex-modelo e influencer brasileira condenada por tráfico humano e escravidão

Mulheres contam como foram traficadas e escravizadas pela ex-modelo e influenciadora, recém-condenada a 8 anos de prisão; BBC entrevista Kat dentro de presídio em Bangu.

Quando duas jovens brasileiras foram consideradas desaparecidas em setembro de 2022, suas famílias e o FBI (polícia federal dos EUA) iniciaram uma busca desesperada para encontrá-las.

Tudo o que sabiam era que elas estavam morando com a influenciadora brasileira Kat Torres nos EUA.

Em 28 de junho de 2024, Kat foi condenada a oito anos de prisão por submeter uma dessas mulheres a tráfico humano e condições análogas à escravidão.

Uma investigação sobre acusações de outras mulheres contra Kat está em curso no Brasil.

O tema é objeto do documentário “Do like ao cativeiro: ascensão e queda de uma guru do Instagram”, publicado no canal da BBC News Brasil no YouTube.

“Para mim ela era uma pessoa de confiança que entendia a minha dor, entendia o que eu estava passando”, diz Ana ao descrever o início de sua relação com Kat após conhecê-la pelo Instagram, em 2017.

Ana não era uma das mulheres desaparecidas que motivaram a busca do FBI – mas também foi vítima da coerção de Kat e foi fundamental no resgate dessas mulheres.

Ela diz que se sentiu atraída pela trajetória de Torres, da infância numa favela em Belém até as passarelas internacionais e as festas com celebridades de Hollywood.

“Ela dizia que já tinha superado vários relacionamentos abusivos e era justamente isso que eu tava buscando”, disse Ana a uma equipe da BBC Eye Investigations e da BBC News Brasil.

Ana estava numa situação vulnerável. Ela diz que teve uma infância violenta, mudou-se sozinha do sul do Brasil para os EUA e já enfrentou um relacionamento abusivo.

Kat Torres havia publicado recentemente o livro autobiográfico A Voz, no qual afirma poder fazer previsões e ter poderes espirituais, e já havia aparecido em programas de TV no Brasil.

“Ela estava em capas de revistas, ela foi vista com pessoas famosas como Leonardo DiCaprio, tudo o que eu vi parecia confiável”, diz ela.

Ana diz que ficou especialmente atraída pela abordagem de Torres sobre espiritualidade.

O que Ana não sabia é que a história inspiradora que Kat contava se baseava em meias verdades e mentiras.

O ator e escritor Luzer Twersky, que dividiu um apartamento com Kat em Nova York, nos contou que a brasileira mudou após frequentar círculos de ayahuasca com amigos em Hollywood.

Originária da Amazônia, a ayahuasca é uma bebida psicodélica considerada sagrada por algumas religiões e povos indígenas.

“Foi quando ela começou a perder o controle”, diz ele.

Twersky disse que também acreditava que Kat estava trabalhando como sugar baby, recebendo dinheiro por envolvimentos amorosos com homens ricos e poderosos – e que bancavam o apartamento que ele dividia com a amiga.

O site de Kat tinha um serviço de assinatura e prometia aos clientes “amor, dinheiro e autoestima com que você sempre sonhou”.

Vídeos dela ofereciam conselhos sobre relacionamentos, bem-estar, sucesso nos negócios e espiritualidade – incluindo hipnose, meditação e programas de exercícios.

Por US$ 150 adicionais (R$ 817), os clientes podiam agendar consultas em vídeo individuais com Kat, com as quais ela dizia ser capaz de resolver qualquer problema.

Amanda, outra ex-cliente, diz que Kat a fez se sentir especial.

“Todas as minhas dúvidas, meus questionamentos, minhas decisões: sempre levava primeiro para ela, para que pudéssemos tomar decisões juntas”, diz Amanda.

Mas os conselhos de Kat podiam levar a mudanças radicais.

Ana, Amanda e outras ex-seguidoras dizem que se viram cada vez mais isoladas psicologicamente de amigos e familiares e dispostas a fazer qualquer coisa que Kat sugerisse.

Quando Kat pediu a Ana em 2019 que se mudasse para a casa dela em Nova York para trabalhar como sua assistente, ela concordou.

Ela estava cursando uma faculdade de Nutrição em Boston, mas, em vez disso, decidiu fazer as aulas virtualmente e diz que aceitou uma oferta para cuidar dos pets de Kat, cozinhar, lavar e limpar por cerca de US$ 2.000 (R$ 10.900) por mês.

Ao chegar ao apartamento de Kat, porém, ela logo percebeu que as condições não correspondiam à perfeição exibida no Instagram.

“Foi chocante porque a casa estava muito bagunçada, muito suja, não cheirava bem”, diz ela.

Ana diz que Kat parecia incapaz de fazer até mesmo as coisas mais básicas, como tomar banho, sozinha, porque não suportava ficar sem a companhia de alguém.

Ela diz que tinha de estar constantemente à disposição de Kat e só podia dormir algumas horas por vez num sofá sujo com urina de gato.

Ela diz que, às vezes, se escondia na academia do prédio para dormir no colchonete de exercícios.

“Agora vejo que ela estava me usando como uma escrava”, diz Ana.

Ela diz ainda que nunca foi paga.

“Senti como se estivesse presa”, diz ela. “Provavelmente fui uma das primeiras vítimas de tráfico humano da Kat.”

Ana havia desistido de sua acomodação universitária em Boston, então não tinha para onde voltar e não tinha renda para pagar por uma moradia alternativa.

Ana conta que Kat, ao ser confrontada, ficou agressiva, o que fez Ana relembrar períodos em que viveu violência doméstica.

Depois de três meses, Ana encontrou uma maneira de escapar e foi morar com um novo namorado.

Mas esse não foi o fim da participação de Ana na vida de Kat.

Quando as famílias de outras duas jovens brasileiras relataram seu desaparecimento em setembro de 2022, Ana sabia que precisava agir.

Naquele momento, Kat estava casada com um homem chamado Zach, um jovem de 21 anos que ela conheceu na Califórnia, e eles moravam numa casa alugada de cinco quartos nos subúrbios de Austin, no Texas.

Repetindo o padrão usado com Ana, Kat tinha como alvo suas seguidoras mais dedicadas, tentando recrutá-las para trabalharem para ela.

Em troca, ela prometeu ajudá-las a realizar seus sonhos, se valendo de informações pessoais íntimas que haviam compartilhado com ela durante suas sessões de coaching.

Desirrê Freitas, uma brasileira que morava na Alemanha, e a brasileira Letícia Maia – as duas mulheres cujo desaparecimento motivou a operação liderada pelo FBI – mudaram-se para morar com Kat.

Outra brasileira, que chamamos de Sol, também foi recrutada.

Kat apresentou nas redes sociais o que chamou de seu “clã de bruxas”.

A BBC descobriu que pelo menos mais quatro mulheres foram quase convencidas a se mudar para a casa de Kat, mas desistiram.

Algumas das mulheres entrevistadas estavam receosas de aparecer num documentário da BBC, temendo receber agressões on-line e ainda traumatizadas por suas experiências.

Mas conseguimos verificar seus relatos usando documentos judiciais, mensagens de texto, extratos bancários e um livro de Desirrê sobre suas experiências, @Searching Desirrê, publicado pela DISRUPTalks (2023).

Desirrê conta que, no caso dela, Kat lhe comprou uma passagem de avião para que deixasse a Alemanha e fosse encontrá-la, citando pensamentos suicidas e pedindo ajuda.

Kat também é acusada de convencer Letícia, que tinha 14 anos quando iniciou sessões de coaching com ela, a se mudar para os EUA para um programa de au pair (babá que mora na residência da família atendida) e depois morar e trabalhar com ela.

Quanto a Sol, ela diz que concordou em ir morar com Kat depois de ficar sem teto e que foi contratada para fazer leituras de tarô e dar aulas de ioga.

Mas não demorou muito para que as mulheres descobrissem que a realidade era muito diferente do conto de fadas que lhes tinha sido prometido.

Em poucas semanas, Desirrê diz que Kat a pressionou a trabalhar em um clube de strip e disse que, se não obedecesse, teria que devolver todo o dinheiro gasto com ela em passagens aéreas, hospedagem, móveis para seu quarto e até mesmo rituais de “bruxaria” feitos por Kat.

Desirrê diz que, além de não ter esse dinheiro, também acreditava na época nos poderes espirituais que Kat dizia ter. Por isso, quando Kat ameaçou amaldiçoá-la por não seguir suas ordens, ela ficou apavorada.

A contragosto, Desirrê então concordou em trabalhar como stripper.

Um gerente do clube de strip-tease, James, disse à BBC que ela trabalhava muitas horas por dia, sete dias por semana.

Desirrê e Sol dizem que as mulheres na casa de Kat em Austin eram submetidas a regras rígidas.

Elas afirmam que foram proibidas de falar entre si, precisavam da permissão de Kat para sair de seus quartos – até mesmo para usar o banheiro – e foram obrigadas a entregar todo o dinheiro que recebiam.

“Era muito difícil sair da situação porque ela ficava com nosso dinheiro”, disse Sol à BBC.

“Foi assustador. Achei que algo poderia acontecer comigo porque ela tinha todas as minhas informações, meu passaporte, minha carteira de motorista.”

Mas Sol diz que percebeu que precisava fugir depois de ouvir um telefonema no qual Kat dizia a outra cliente que ela deveria trabalhar como prostituta no Brasil como “castigo”.

Sol conseguiu sair com a ajuda de um ex-namorado.

Enquanto isso, as armas que o marido de Kat mantinha em casa começaram a aparecer regularmente em posts no Instagram e se tornaram uma fonte de medo para as mulheres.

Nessa época, Desirrê conta que Kat tentou convencê-la a trocar o clube de strip-tease pelo trabalho como prostituta. Ela diz que recusou e, no dia seguinte, Kat a levou de surpresa para um campo de tiro.

Assustada, Desirrê diz que acabou cedendo à exigência de Kat.

“Muitas perguntas me assombravam: ‘Será que eu poderia parar quando quisesse?'”, escreve Desirrê em seu livro.

“E se a camisinha estourasse, eu pegaria alguma doença? Poderia [o cliente] ser um policial disfarçado e me prender? E se ele me matasse?”

Se as mulheres não cumprissem as metas de dinheiro estabelecidas por Kat, que subiram de US$ 1 mil dólares (R$ 5,45 mil) para US$ 3 mil (R$ 16,35 mil) por dia, não eram autorizadas a voltar para casa naquela noite, dizem.

“Acabei dormindo várias vezes na rua porque não consegui bater a meta”, diz Desirrê.

Extratos bancários obtidos pela BBC mostram que Desirrê transferiu mais de US$ 21.000 (R$ 114,5 mil) para a conta de Kat somente em junho e julho de 2022.

Ela diz que foi forçada a entregar uma quantia ainda maior em dinheiro.

A prostituição é ilegal no Texas, e Desirrê diz que Kat ameaçou denunciá-la à polícia quando ela cogitou parar.

Em setembro, amigos e familiares de Desirrê e Letícia no Brasil criaram campanhas nas redes sociais para encontrá-las depois de meses sem contato com as duas.

Nesta altura, elas estavam quase irreconhecíveis. Seus cabelos castanhos foram tingidos de loiro platinado para combinar com os de Kat.

Desirrê afirma que, nesse período, todos seus contatos telefônicos foram bloqueados e que ela obedeceu às ordens de Kat sem questionar.

À medida que a página do Instagram @SearchingDesirrê ganhava força, a história chegou ao noticiário no Brasil.

Os amigos de Desirrê temiam que ela tivesse sido assassinada, e a família de Letícia fez apelos desesperados para que as duas voltassem para casa.

Ana, que morou com Kat em 2019, disse que ficou alarmada assim que viu as notícias. Ela diz ter logo percebido que Kat “estava retendo outras meninas”.

Junto com outras ex-clientes, Ana começou a contatar o maior número possível de agências de segurança, incluindo o FBI, na tentativa de prender a influenciadora.

Cinco meses antes, ela e Sol haviam denunciado Torres à polícia dos EUA – mas dizem que não foram levadas a sério.

Num vídeo que gravou na época como prova e partilhado com a BBC, ouve-se Ana dizendo, em inglês: “Esta pessoa é muito perigosa e já ameaçou me matar”.

Em seguida, foram encontrados perfis das mulheres desaparecidas em sites de acompanhantes e prostituição. As suspeitas de exploração sexual, que circulavam nas redes sociais, pareciam se confirmar.

Em pânico com a atenção da mídia, Kat e as mulheres viajaram mais de 3 mil quilômetros do Texas até o Estado de Maine.

Em vídeos no Instagram, Desirrê e Letícia negaram estar ali contra sua vontade e exigiram que as pessoas parassem de procurá-las.

Mas uma gravação obtida pela BBC indica o que realmente estava acontecendo naquele momento.

A polícia nos EUA monitorava o grupo, e um policial conseguiu entrar em contato com Kat por videochamada para avaliar a situação das mulheres.

Pouco antes do início da conversa, Kat diz no vídeo:

“Ele vai começar a fazer perguntas. Gente, eles são truqueiros. Ele é um detetive, muito cuidado. Pelo amor de Deus, vou te chutar se alguém disser alguma coisa. Eu vou dar um grito.”

Em novembro de 2022, a polícia convenceu Kat e as outras duas mulheres a comparecerem pessoalmente a uma delegacia no Condado de Franklin, no Maine.

O policial que interrogou Kat, Desirrê e Letícia – o detetive David Davol – disse à BBC que ele e seus colegas ficaram preocupados após notarem uma série de sinais, como desconfiança das mulheres em relação aos policiais, seu isolamento e relutância em falar sem a permissão de Kat.

“Traficantes de pessoas nem sempre são como nos filmes, onde você tem uma gangue que sequestra pessoas. É muito mais comum que seja alguém em quem você confia.”

Em dezembro de 2022, as duas mulheres haviam retornado em segurança ao Brasil.

Segundo a ONU, o tráfico de pessoas é um dos crimes que mais crescem no mundo, gerando cerca de US$ 150 bilhões (R$ 817 bilhões) em lucros por ano no mundo.

Ele acredita que as redes sociais oferecem uma plataforma para que traficantes encontrem e seduzam vítimas.

Em abril deste ano, nossa equipe recebeu uma permissão judicial para entrevistar Kat na prisão – a primeira entrevista presencial que ela concede desde que foi presa.

Naquela época, Kat ainda aguardava o resultado de um julgamento relacionado ao caso de Desirrê.

Sorrindo, Kat se aproximou de nós com uma atitude calma e serena.

Ela se disse completamente inocente, negando que qualquer mulher tivesse vivido com ela ou que ela tivesse forçado alguém a se prostituir.

“Eu tive crises e mais crises de riso com tanta mentira que eu escutei. Todo mundo na sala podia ver que as testemunhas estavam mentindo”, afirmou..

“As pessoas me chamam de guru falsa, mas ao mesmo tempo elas falam: ela é muito perigosa. Cuidado com ela, porque ela pode mudar o que as pessoas pensam.”

Quando a confrontamos com as provas que tínhamos visto, ela ficou mais hostil, acusando-nos de também mentir.

“Você pode me ver como Katiuscia, você pode me ver como Kat, você pode me ver como Deus, você pode ver como o que você quiser ver. E você pode pegar o meu conselho ou não, é um problema, uma escolha toda sua”, afirmou.

Ao se levantar para voltar para sua cela, ela sugeriu que logo descobriríamos se ela tinha poderes ou não. Depois apontou para mim e disse: “Eu não gostei dela”.

Em 28 de junho, Kat foi condenada pelo juiz Marcelo Luzio Marques Araújo, da 10ª Vara Federal do Rio de Janeiro, a oito anos de prisão por submeter Desirrê a tráfico humano e condições análogas à escravidão.

O juiz concluiu que Kat atraiu a jovem para os EUA para fins de exploração sexual.

Mais de 20 mulheres relataram terem sido enganadas ou exploradas por Kat – muitas das quais compartilharam suas experiências com a BBC.

Algumas ainda estão em tratamento psiquiátrico para se recuperarem do que dizem ter experimentado em suas relações com Kat.

O advogado de Kat, Rodrigo Menezes, disse à BBC que recorreu da condenação e insiste que ela é inocente.

Uma investigação baseada em denúncias de outras mulheres contra Kat está em curso no Brasil.

Ana acredita que ainda mais vítimas poderão se apresentar, assim que lerem sobre os crimes de Kat. Esta foi a primeira vez que Ana falou publicamente.

Ela diz que seu objetivo é fazer com que pessoas reconheçam que as ações de Kat constituem um crime grave e não um “drama de Instagram”.

Nas páginas finais de seu livro, Desirrê também reflete sobre suas experiências.

“Ainda não estou totalmente recuperada, tive um ano desafiador. Fui explorada sexualmente, escravizada e presa. Espero que minha história sirva de alerta.”

Ex-procurador foi informado sobre operação um dia antes

O ex-procurador Marcello Miller recebeu com ao menos um dia de antecedência, e quando já atuava como advogado da J&F, a informação de que a força tarefa da Lava Jato deflagraria uma de suas mais importantes operações: a que levou à prisão de Andrea Neves, irmã do senador Aécio Neves (PSDB-MG), e do primo do tucano, o empresário Frederico Pacheco.

O vazamento foi registrado por ele mesmo, em mensagem a uma advogada que era sua parceira no caso.

O ex-procurador Marcelo Miller gesticula enquanto fala durante reunião da CPMI da JBS, no Senado, em novembro
O ex-procurador Marcelo Miller fala durante reunião da CPMI da JBS, no Senado, em novembro – Pedro Ladeira – 29.nov.2017 / Folhapress

Miller discutia com Esther Flesch um contrato que ampliaria os valores de honorários pagos pela JBS à dupla.

Às 8h15 de 17 de maio, o ex-procurador foi informado de que o escritório Trench Rossi Watanabe, no qual estava atuando, não aceitaria os termos propostos por ele numa minuta do trato.

Neste momento, ele diz a Esther que ela deveria readequar a proposta, e avisa: “Vamos correr, porque a informação insider é a de que a operação pode ser deflagrada amanhã” (sic).

 

Às 19h30 do mesmo dia, o jornal “O Globo” publicou em seu site a informação de que os donos da JBS haviam fechado um acordo de delação premiada. A matéria dizia que Joesley Batista havia gravado uma conversa com o presidente Michel Temer e que o empresário também havia apresentado grampos de um encontro em que Aécio pedia R$ 2 milhões a ele.

Às 6h do dia seguinte, 18, a Lava Jato deflagrou a operação Patmos, prendendo a irmã do tucano, seu primo e um assessor do senador Zezé Perrela (MDB-MG) sob a acusação de que teriam ajudado Aécio a obter o dinheiro.

A Patmos disparou 41 mandados de busca e apreensão em quatro Estados. A irmã do doleiro Lúcio Funaro também foi encarcerada. Já Aécio foi afastado do mandato pelo ministro Edson Fachin.

A conversa que registra o vazamento de informação da Lava Jato foi obtida em mensagens de WhatsApp trocadas por Miller e Flesch. Os dados foram coletados em um telefone funcional da advogada pelo Trench Rossi Watanabe. Fachin autorizou a quebra do sigilo telefônico.

Na mensagem à colega, Miller não diz quem lhe repassou a informação de que a operação seria deflagrada. Mas ao usar o termo “insider”, o ex-procurador dá a entender que obteve o relato junto aos investigadores.

Àquela altura, a participação de Miller nas tratativas da JBS com a Procuradoria ainda não havia sido explorada pelos políticos que foram alvo da delação do grupo.

Vínculo

O vínculo dele com o gabinete do ex-procurador-geral Rodrigo Janot foi escancarado dias depois pelo presidente Michel Temer, em um pronunciamento. Quando a crise escalou, Miller começou a discutir com Flesch sua própria estratégia de defesa.

No dia 20 de maio, ele escreveu: “Pellela acabou de confirmar: PGR solta nota agora. Curta. Negando minha participação em delação”.

Eduardo Pellela era chefe de gabinete de Janot. Miller informou sobre a nota às 10h57. O texto só foi tornado público às 13h45 daquele dia.

Enquanto atuou na Procuradoria, Miller era visto como um quadro muito próximo a Janot. Ele teve atuação decisiva em delações que envolveram gravações ocultas de autoridades, como o ex-senador Delcídio do Amaral e a cúpula do MDB, grampeada por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.

Miller foi contratado pela J&F, por meio do Trench Rossi  Watanabe, para cuidar do acordo de leniência do grupo —instrumento diverso da delação. No entanto, há evidências de que ele também orientou a colaboração dos irmãos Batista, inclusive enquanto ainda estava na PGR.

A atuação do ex-procurador na delação da JBS começou a ser formalmente investigada em setembro do ano passado. Nas mensagens que ele trocou com Flesch fica claro que delação e leniência eram tocadas em parceria. 

Outro lado

A assessoria do ex-procurador Marcelo Miller disse que a informação de que uma operação da Lava Jato seria deflagrada no dia seguinte à troca de mensagens “não adveio de nenhum órgão estatal”.

“O conteúdo da mensagem não adveio de nenhum órgão estatal, tendo origem na sua atuação como advogado, o que o obriga a preservar o sigilo profissional”, disse.

À Folha, a assessoria destacou que Miller já estava desligado dos quadros do MPF (Ministério Público Federal) “havia mais de 40 dias” quando enviou a mensagem.

Quanto à declaração de Miller de que Pelella soltaria nota negando a participação do ex-procurador na delação da JBS, a assessoria diz que o comunicado era uma “resposta enérgica” necessária “diante das inverdades que se veiculavam na imprensa”. Ela, contudo, não esclarece o contato feito entre Miller e Pelella.

O escritório Trench  Rossi  Watanabe disse, em nota, que sempre “colaborou com as autoridades”, destacou que os envolvidos não fazem mais parte de seu quadro de sócios e manifestou “total disposição” em auxiliar nas investigações.

Em nota, a assessoria de comunicação da Procuradoria Regional da República da 3ª Região afirmou que Eduardo Pelella “repudia as ilações, desprovidas de embasamento fático, envolvendo seu nome”.

Procurada, a PGR disse que não se manifestará sobre o tema. A advogada Esther Flesch também não quis falar. (Colaborou Isabel Fleck, SÃO PAULO)

 

Troca de Mensagens

Contexto: Advogados Marcello Miller e Esther Flesch conversam sobre uma proposta de honorários para os acordos de delação e leniência da JBS; Miller sugere que isso seja fechado logo pois uma operação da Lava Jato seria deflagrada no dia seguinte

17.mai.2017

Esther Flesch  08h12 > Nós havíamos falado de eu ligar para o Francisco [1], mas não liguei porque foi o dia em que ele acabou sendo alvo da condução coercitiva. Mas nesse meio tempo conversei com o Márcio  Polto  [2] para alinharmos não só a forma mas também o apoio dele para uma justa alocação desse honorário de êxito uma vez que seja recebido pelo escritório. Ele vai nos apoiar para colocar o êxito em documento formal. Além disso, conversamos sobre algumas condições: 1. não mencionar o escritório da Fernanda [3], embora entendamos que o cliente [4] quer pagar valores idênticos aos dois escritórios, não podemos vincular isso em documento nosso 2. usar o mesmo contrato para tratar do secondment seu no Brasil e da Camila nos EUA e 3. Colocar critérios de êxito não financeiros como conseguir um NPA [5] nos EUA, conseguir negociar que a investigação seja de natureza limitada etc. quanto ao item 3 talvez seja melhor fazer um documento diferente tratando do problema americano, certo?

Marcello Miller 08h14 > Certo!

Marcello Miller 08h15 > Então dividamos os valores que eu sugeri – se vc estiver de acordo com eles – pela metade na nossa proposta. E vamos correr, porque a informação insider é de que a operação [6] pode ser deflagrada amanhã

Esther Flesch  08h16 > Vou criar um grupo de WhatsApp para acelerarmos isso.

20.mai.2017

Marcello Miller 10h57 > Pelella [7] acabou de confirmar: PGR solta nota agora. Curta. Negando minha participação em delação.

Esther Flesch 10h57 > Ótimo. Obrigada.

Marcello Miller 10h57 > Nos exortou a nos manifestarmos ainda hoje também.

Esther Flesch 10h58 > Ok. Vou dizer aos sócios.

Marcello Miller 10h58 > Ok.

Marcello Miller 10h58 > Obrigado, Esther.

Marcello Miller 12h19 > Já tenho o esclarecimento.

Legenda

  1. .Francisco de Assis e Silva, diretor jurídico da JBS

  2. Márcio de Souza Polto, sócio da Trench Rossi Watanabe

  3. Fernanda Tórtima, advogada que assina a colaboração dos irmãos Batista

  4. JBS

  5. Non-Prosecution Agreement, acordo no qual os procuradores não fazem a acusação formal em troca de informações novas

  6. No dia seguinte, a PF prendeu a irmã do senador Aécio Neves (PSDB-MG), Andrea, o primo de Aécio Frederico Pacheco de Medeiros, que segundo as investigações recebeu o dinheiro que Joesley Batista direcionou ao senador, e mais duas pessoas

  7. Eduardo Pelella, então chefe de gabinete do procurador-geral da República à época, Rodrigo Janot

Saiba quem é quem no esquema que teria desviado R$ 101 milhões do Estado

Os presos são acusados de envolvimento em um esquema de desvio de dinheiro público do governo do Estado de Mato Grosso, por meio do sistema eletrônico disponibilizado pelo Banco do Brasil, BB-Pag

30 pessoas tiveram mandados de prisão temporária cumpridos na operação “BB Pag”, deflagrada pela Delegacia Especializada de Crimes Fazendários e Contra a Administração Pública (Defaz), da Polícia Judiciária Civil, na manhã de quinta-feira (15.10). A operação foi desencadeada com o objetivo de dar cumprimento de 78 ordens judiciais, sendo 34 mandados de prisão e 44 busca e apreensão, na capital e interior do Estado e nas cidades de Tubarão (SC) e Soledade (RS).

Segundo a delegada, Cleibe Aparecida de Paula, existe a possibilidade de que os foragidos se apresentem na delegacia acompanhado de advogados até a próxima semana.

Os presos são acusados de envolvimento em um esquema de desvio de dinheiro público do governo do Estado de Mato Grosso, por meio do sistema eletrônico disponibilizado pelo Banco do Brasil, BB-Pag. Quatro suspeitos de participação na fraude continuam foragidos.

Em Cuiabá, as buscas foram realizadas nas empresas: Assinter, Sintomat, LCA Fomento, Assut e Deville Empreendimentos Imobiliários. Na cidade de Primavera do Leste, dois mandados de buscas e apreensão foram cumpridos na casa e no escritório de contabilidade do investigado, Giovani Dadalt. Um mandado de prisão foi cumprido em uma empresa do suspeito em Tubarão, SC, e em Soledade, RS, a mãe e a tia do suspeito tiveram mandado de prisão cumpridos.

 

 

CONFIRA QUEM É QUEM NO ESQUEMA

O mandado de prisão expedido contra 34 pessoas, pela juíza  Selma Rosane Arruda, da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, expõe quem são e qual a participação de cada acusado de envolvimento no esquema que teria causado um rombo de R$ 101.123,118,61 na Conta única do Estado no ano de 2012.

Juércio Antônio Marque – foi presidente da Coopercon 2005-2011,  período em que se apurou a saída de R$ 14.947.851,52 dos valores recebidos indevidamente do Estado. É sócio proprietário das empresas INDATEC e Instituto Baguari (sócio de José Ribeiro Neto e Wockton Santos Pereira). A IMDATEC recebeu indevidamente do Estado de Mato Grosso em 2008 o montante de R$ 2.446.173,00, ao passo que o Instituto Baguari, entre os anos de 2009 e 2010, recebeu indevidamente do Estado de Mato Grosso o valor de R$ 740.675,00, além de ter recebido indiretamente em seu nome, oriundo da COOPERCON, o valor de R$ 18.833,92.

Plínio Alexandre de Amorim Marques – é sócio das empresas Central Assessoria de Treinamento LTDA e IND. COM. Espumas e Colchões Cuiabá LTDA. Recebeu da LD Fomento Mercantil os valores de R$ 50.000,00 e R$ 54.000,00 em nome de suas empresas.

Néia Araujo Marques –  também sócia das empresas Central Assessoria de Treinamento LTDA e IND. COM. Espumas e Colchões Cuiabá LTDA. Recebeu R$ 50.000,00 da LS Fomento Mercantil em nome da Central Assessoria de Treinamento LTDA. Recebeu da LD Fomento Mercantil em nome da IND. COM. Espumas e Colchões Cuiabá LTDA R$ 54.000,00, bem como recebeu em seu próprio nome o valor de R$ 40.000,00, oriundo da Coopercon.

Wockton Santos Pereira – sócio na empresa Instituto Baguari, , entre o anos de 2009 e 2010 recebeu indevidamente do Estado o valor de R$ 740.675,00.

José Ribeiro Neto – sócio na empresa Instituto Baguari a qual, entre o anos de 2009 e 2010 recebeu indevidamente do Estado o valor de R$ 740.675,00.

Claumir Tomazi – foi cooperado e membro do conselho fiscal da Coopercon nos períodos 09/2005 à 03/2006 e 03/2007 à 03/2010. Figura como sócio proprietário da empresa Agropecuária Trincheira. Claumi recebeu da Coopercon os valores de R$ 75.000,00. Recebeu da LD Fomento em nome da Agropecuária Trincheira R$ 235.439 entre os anos de 2009 e 2010. Recebeu por meio de transferência eletrônica R$ 96.400,00 da LD Fomento em nome da Agropecuária Trincheira. Recebeu do Siec R$ 30.000,00, no ano de 2009, em nome da Agopecuária Trincheira. Recebeu um depósito em dinheiro no valor de R$ 1.518.044,89 no dia 02/02/2004. Recebeu vários valores acima de R$ 10.000,00, sendo o total de R$ 215.523.86 oriundos de sua ex-esposa Rosa de Canto Melo, entre os anos de 2008 e 2010, e R$ 150.000,00 de sua própria pessoa. Transferiu de suas contas, somente no mês de agosto de 2004, a quantia de R$ 555.600,00. Recebeu em seu nome 10 cheques oriundo de Lucival Candido Amaral no Total de R$ 129.997,27.

Rosa de Castro Melo – ex-esposa de Claumir Tomazi. Recebeu da Coopercon R$ 20.000,00. Recebeu três cheques oriundos da LD Fomento Mercantil, no valor de R$ 88.306,00, dinheiro com o qual adquiriu um veículo Corolla XLIA/T MY 10, cor prata, com o cheque de nº 1419, conta 19711, agência 1966, no valor de R$ 63.500,00, cheque este oriundo da empresa de fomento de Lucival Candido Amaral.

Victor Castro Tomazi – filho de Claudir Tomazi. Recebeu um cheque oriundo da LD Fomento Mercantil no valor de R$ 1.800,00.

Elaine Cristina Batista Tomazi – atual esposa de Claumir. Recebeu dois cheques no total de R$ 9,400,00, oriundos de Lucival Candido Amaral.

Ari Lindemann Junior – sócio na empresa Agropecuária Trincheira. Recebeu 3 cheques oriundo das casa de fomento de Lucival Candido Amaral no valor de R$114.439,00. Recebeu da LD Fomento em nome da Agropecuária Trincheira R$ 25.439,00, entre os anos de 2009 e 2010. Recebeu, por meio de transferência eletrônica, R$ 96.400,00 da LD Fomento em nome da Agropecuária Trincheira. Recebeu do Siesc R$ 30.000,00 no ano de 2009 em nome da Agropecuária Trincheira.

Adauri Angelo da Silva – esposo de Terezinha Dias da Silva, autorizou o pagamento de despesas no valor de R$ 10.263,33 destinados de forma indevida para a de Ville Empreendimentos.

Alex Angelo Dias da Silva – filho de Adauri Angelo e Terezinha Das da Slva, proprietário da empresa A. A. Dias da Silva LTDA ME. Recebeu três cheques de Lucival Candido do Amaral no total de R$ 110.00,00. Recebeu, em nome da empresa A. A. Dias da Silva ME, o valor de R$ 125.000,00 oriundo da LCA Fomento Mercantil.

Terezinha Dias da Silva – recebeu R$ 278.661,00 oriundos da Assut. Recebeu, através da de Ville Empreendimentos, R$ 93.219,00 da LD Fomento Mercantil. Recebeu Através da De Ville Empreendimento R$ 181.000,00 da LCA Fomento Mercantil. Recebeu, através da De Ville empreendimentos, R$ 28.000,00 da Coopercon. Recebeu, através da De Ville Empreendimentos, R$ 40.263,00 pagos indevidamente pela SEDUC através da liquidação e empenho efetuados por Adauri Angelo da Silva.

Evanildes Dias Leite – recebeu R$ 278.661,00 oriundos da Assut. Recebeu, através da De Ville Empreendimentos, R$ 93.219,00 da LD Fomento Mercantil. Recebeu, através da De Ville Empreendimento, R$ 181.000,00 da LCA Fomento Mercantil. Recebeu, através da De Ville Empreendimento, R$ 28.000,00 da Coopercon. Recebeu, através da De Ville Empreendimentos R$ 40.263,33 para indevidamente pela SEDUC, por meio da liquidação e empenho efetuados por Adauri Angelo da Silva, esposo da sócia Terezinha da Silva. Recebeu o valor de R$ 5.620,00, oriundo da de Lucival Candido Amaral na forma de cheque.

Marco Paolo Picone – atuava com Claumir Tomazi realizando depósitos nas contas de sua empresa GPS, bem como indicou a Claumir a ASSUT para recebimento de valores indevidos do Estado. Recebeu, em seu nome, o valor de R$ 139,694,00, oriundo da LD Fomento Mercantil. Recebeu, em seu nome, 11 cheques oriundo de Lucival Candido Amaral no total de R$ 209.112,00. Recebeu R$ 90.000,00 em nome de sua empresa Gás Natural Veicular Com. E Servi. LTDA.

Gleice Pinto da Silva Picone – esposa de Marco Paolo e sócia da empresa GPS Comércio e Serviços LTDA. Recebeu, em seu nome, 06 cheques oriundo de Lucival Candido Amaral no total de R$ 159.731,51. Recebeu, em nome da GPS Comercio e Serviços LTDA, R$ 131.000,00 oriundos da LD Fomento Mercantil. Recebeu, em nome da GPS Comércio e Serviços LTDA. Diversos valores oriundo da Assut, totalizando R$ 1.139.213,11. Recebeu, em nome da GPS Comercio e Serviços, um cheque oriundo de Lucival Candido Amaral no valor de R$ 125.000,00.

Marco Paolo Picone Junior – filho de Marco Paole Picone, sócio da empresa GPS Comercio e Serviços LTDA. Recebeu, sem seu nome, dois cheques de Lucival Candido Amaral no valor de R$ 7.694,00. Recebeu, em seu nome, R$ 144.800,00 oriundo da Assut. Recebeu, em nome da empresa GPS Comércio e Serviços LTDA, R$ 131.000,00 oriundos da LD Fomento Mercantil. Recebeu, em nome da GPS Comércio e Serviços LTDA, diversos valores oriundos da Assut, totalizando R$ 1.139.213,11. Recebeu, em nome da GPS Comércio e Serviços, um cheque oriundo de Lucival Candido Amara, no valor de R$ 125.000,00.

Lucival Candido Amaral – proprietário das empresas LD Fomento Mercantil e LCA Fomento Mercantil, procurado por Marco Paolo Picone e manda de Claumir Tomazi para fazer parte de transações financeiras ilícitas, usando suas empresas de factoring como fachada. Recebeu, em seu nome, R$ 48.535,00 oriundo da Assut. Recebeu, em seu nome, R$ 15.066,00 oriundo da GPS. Recebeu , em nome da LD Fomento Mercantil, R$ 16.870.308,99 oriundo do Governo do Estado de Mato Grosso. Recebeu, em nome da LC Amaral Fomento, R$ 9.744.435,47 oriundo do Governo do estado de Mato Grosso. Recebeu, em nome da LAC Comercio e Serviços, R$ 53,420 oriundo da Assut.

Djalma José Alves Neto – filho de Lucival Candido Amaral e sócio da empresa LD Fomento Mercantil LTDA. Recebeu, através da LD Fomento Mercantil LTDA, valor de R$ 16.870.308,99. Recebeu valores significativos acima de R$ 10.000,00 em sua conta, totalizando o montante de R$ 297.575.00.

Marleide Oliveira Carvalho – o relatório de auditoria n. 048/2015 descortinou que, nos exercícios de 2004, 2005, 2008, 2009, a Assut recebeu indevidamente do Poder Executivo do Estado o montante de R$ 5.676.960,29. Relacionados ao Siesc se encontra a pessoa de Marleide de Oliveira Carvalho, presidente da Assut. Recebeu, em nome da Assut, R$ 5.676.960,29.

Alexandre Anderson Carneiro – foram detectados no relatório de auditoria da CGE, quatro pagamento pontuais à SIESC nos meses de junho a setembro de 2009, cujos valores totalizaram o montante de R4 386.370,68. Na época figurava como proprietário do SIESC a pessoa de Alexandre Anderson , que além de receber em nome da pessoa jurídica o valor citado também recebeu R$ 25.000,00, em seu nome, oriundo do SIESC.

João Pires Modesto – presidente da Assim entre 2005 e 2008, recebeu R$ 1.500,00 de Gabriel Nogueira Marqueto. Recebeu R$ 5.500,00 de Gabriel Nogueira Marqueto. Recebeu R$ 1.680,00 de Silvio da Silva Rondon. Recebeu de 2003 a 2010 o montante de R$ 83.808,84 oriundos de depósitos em dinheiro, em cheque on line, sem identificação de origem.

Gabriel Nogueira Marqueto – tesoureiro da ASSIM. Constatou-se lançamento de créditos em suas contas no total de R$ 5.205.821,45. Recebeu R$ 15.005,00 de Silvio da Silva Rondon. Recebeu entre os anos de 2003 e 2010 R$ 450.854,26 oriundos da ASSINS. Recebeu entre os anos 2003 a 2001 o montante de R$ 1.853.142,25 oriundo de depósito em dinheiro em cheque online, sem identificação da origem, destacando-se o depósito no valor de R$ 1.000.000,00.

Silvio da Silva Rondon – servidor do INDEA, constatou-se lançamentos de créditos em suas notas no total de R$ 4.085.765.32. Recebeu R$ 467.001,25 oriundos de Gonçalo Rodrigues de Almeida. Recebeu R$ 11.550,00 de Gabriel Nogueira Marqueto. Recebeu R$ 32.506,58 da ASSIM. Recebeu R$ 1.875,00 de João Pires Modesto Filho. Recebeu entre os anos de 2003 e 2011, o montante de R$ 769.833,56 oriundo de depósitos em dinheiro, online e depósito poupança sem identificação da origem, bem como recebeu o valor de R$ 111.125,35, referente a depósitos em cheques igualmente sem identificação de origem.

Waldir Aparecido Taques – presidente da ASSINTER entre 2004 a 2012. Recebeu da ASSINTER R$ 22.184,00.

Clarisse Aparecido Schmitt Basso – secretária da ASSINTER, recebeu R$ 8.795,00 oriundos da ASSINTER.

Rafaela Schimitt Basso – filha de Clarisse Basso, recebeu nos anos de 2010 a 2011, o valor total de R$ 187.610,01, em repasses mensais e recorrentes no valor médio de R$ 2.000,00.

Gonçalo Rodrigues de Almeida – contador da ASSIM, ASSINTER, SITOMAT e SINTAP. Recebeu R$ 6.639.566,00 da Associação dos Servidores do INTERMAT, conta corrente 16.241, agência 2960, Banco do Brasil. Recebeu R$ 1.020.181,00 do SINTAP, através da conta corrente 10.443-4, agência 2960, Banco do Brasil e conta corrente 377686, agencia 1461, banco 237. Movimentou o montante de R$ 4.891.817,75 recebido na conta corrente 377686, agência 1461, Banco Bradesco em nome da SINTAP.

Antônio Marques de Pinho – presidente do SITOMAT entre 2004 a 2012. Recebeu R$ 42.250,00 oriundo do SITOMAT. 

Marinete Ferreira Alves – esposa de Antônio Marque de Pinho, recebeu R$ 449.320,00 do SITOMAT.

Celso Alves Pinho – filho de Antônio Marque e Marinete, recebeu R$ 99,857,88 do SITOMAT.

Neida Terezinha Dadalt, Isabel de Fátima Dadalt e Giovani Dadalt Crespani – a empresa Boa Fomento Mercantil recebeu indevidamente do Governo do Estado de Mato Grosso, no exercício 2011, o valor de R$ 2.381.578,37. Em análise às entradas de recurso na entidade no período de 2009 a 2001, cujo montante foi de R$ 62.727.237,09, observou-se que, após o início dos pagamentos indevidos do Estado, houver considerável crescimento dos ingressos.  

Operação BB-Pag

A operação foi deflagrada com objetivo concluir as investigações iniciadas no ano de 2012, destinadas a apurar o vultoso desvio de dinheiro público do governo do Estado de Mato Grosso por meio do sistema eletrônico disponibilizado pelo Banco do Brasil denominado BBPAG, que teria causado um rombo de R$ 101.123.118,61 aos cofres públicos.

O desvio de dinheiro público do Estado teria ocorrido por meio do sistema eletrônico disponibilizado pelo Banco do Brasil denominado BBPAG, que teria causado um rombo de R$ 101.123.118,61 aos cofres públicos.

Quando a fraude veio à tona, a Delegacia Fazendária deflagrou a operação “Vespeiro”, que resultou na prisão de 43 pessoas envolvidas no esquema relativo somente ao envolvimento de pessoas físicas, que na ocasião foi mensurado em mais de R$ 16 milhões.

Com o apoio da Controladoria Geral do Estado, se apurou que os desvios iam muito além daquele valor e que teriam sido efetuados em benefício de 12 pessoas jurídicas, dentre cooperativas, associações, sindicatos e empresas privadas. Assim, nova investigação foi instaurada visando apurar os recebimentos por essas pessoas jurídicas de desvios de mais de R$ 85 milhões.

Participaram da operação policiais civis da Gerencia de Combate ao Crime Organizado (GCCO); Gerência de Operações Especiais (GOE); Delegacia Especializada do Meio Ambiente (Dema); Delegacia de Repressão a Entorpecente (DRE); Gerência Estadual de Polinter; Delegacia de Homicídio e Proteção a Pessoa (DHPP); Delegacia Especializada de Repressão a Roubos e Furtos de Veículos Automotores (DERRFVA); Delegacia do Consumidor (Decon); Delegacia de Várzea Grande; Delegacia de Primavera do Leste; além da colaboração das Policiais Civis das cidades de Tubarão (SC); e Soledade (RS).

O trabalho está inserido na operação da Segurança Pública “Karcharias”, deflagrada pela Polícia Civil de combate aos crimes de corrupção, contra a administração pública e tributários.