Brasileiro Ligado à Máfia Japonesa Capturado por Crimes de Extorsão e Assassinato

Indivíduo com histórico associado à máfia japonesa é detido pela Polícia Militar de São Paulo

Um brasileiro, Alexandre Hideaki Miura, conhecido por seu envolvimento com a Yakuza, a máfia japonesa, foi capturado no último domingo (10) pela Polícia Militar (PM) de São Paulo. Sua prisão ocorreu após ter sido condenado pelas autoridades brasileiras pelo sequestro e assassinato de um empresário no Japão, em 2001. A Yakuza é notória por suas atividades ilícitas, como jogos de azar, tráfico de drogas, exploração sexual, agiotagem e extorsão.

Em 2022, Alexandre Hideaki Miura recebeu uma sentença de 30 anos de prisão em regime fechado por seu papel em um crime de sequestro com extorsão e morte, juntamente com outros três brasileiros e cinco japoneses associados à Yakuza. O crime em questão ocorreu em Nagoya, Japão, onde eles se passaram por trabalhadores da construção civil para perpetrar o sequestro, agressão, disparos de arma de fogo e posteriormente o assassinato de Harumi Inagaki.

A vítima foi brutalmente agredida com objetos como tacos de beisebol, tacos de golfe e chaves de roda, além de ter sido alvejada duas vezes. Sua esposa, Takako Katada, também foi atingida por tiros, mas sobreviveu aos ferimentos.

Após o ataque, os criminosos ocultaram o corpo de Harumi em um barril preenchido com cimento, que foi então jogado em um rio na cidade. O crime só veio à tona quando alguns dos envolvidos confessaram à polícia japonesa.

Harumi Inagaki, além de empresário de casas noturnas, estava supostamente ligado à Yakuza, o que levanta a possibilidade de que seu assassinato tenha sido motivado por vingança devido a conflitos com a organização criminosa. O grupo também buscava extorquir dinheiro dele e de sua família.

Os criminosos brasileiros foram recrutados pela máfia japonesa para auxiliar no plano. Dois deles foram identificados pelas autoridades japonesas: Alexandre e Marcelo Yokoyama. Após o crime, extorquiram dinheiro da família da vítima e retornaram ao Brasil.

Devido às leis brasileiras que impedem a extradição de seus cidadãos, o processo foi traduzido para o português e continuou com as autoridades brasileiras, incluindo a Polícia Federal (PF), o Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça Federal em São Paulo.

Ambos os brasileiros foram inicialmente presos em 2017 pela polícia paulista. Marcelo foi detido em Santa Bárbara d´Oeste, no interior do estado, enquanto Alexandre foi capturado em Poá, região metropolitana de São Paulo. Embora tenham sido concedidas liberdades provisórias, Marcelo foi posteriormente novamente detido por decisão judicial, enquanto Alexandre permaneceu em liberdade até sua condenação, cinco anos depois.

Com a recente prisão de Alexandre, a polícia paulista o encaminhou para a Superintendência Regional da Polícia Federal. Ele, que era conhecido como Bu-Yan ou Jumbo no Japão, enfrentará as consequências de seus crimes perante a justiça brasileira.

A Yakuza é uma organização criminosa com raízes históricas no Japão, envolvida em uma ampla gama de atividades ilícitas, incluindo prostituição, jogos de azar e extorsão. Seus membros são conhecidos por seguir regras estritas, sendo punidos severamente por falhas e traições, muitas vezes resultando em mutilações ou até mesmo assassinatos.

Advogado de Atibaia é preso em investigação sobre sonegação de impostos por meio de criação de empresas fantasmas

Buscas em Atibaia aconteceram na casa e no escritório de um advogado de 55 anos. Outros mandados foram cumpridos em Pouso Alegre, Poços de Caldas, Borda da Mata, São Paulo, São Bernardo do Campo, Curitiba e Balneário Camboriú.

Um advogado de Atibaia (SP) foi preso nesta terça-feira (4) de uma operação do Ministério Público de Minas Gerais que apura fraude tributária por meio de criação de empresas fantasmas. Batizada de ‘Operação Sinergia’, a ação cumpriu mandados em outras sete cidades (veja mais abaixo).

Em Atibaia, foi cumprido um mandado de busca e apreensão na casa e no escritório do advogado tributarista Marcos Roberto Monteiro, de 55 anos. Nos dois pontos foram apreendidos diversos documentos e objetos, que serão avaliados e usados na investigação.

O advogado foi preso preventivamente e levado para a cadeia pública de Piracaia. O g1 tenta contato com a defesa de Marcos.

Mandados de prisão preventiva e busca e apreensão também foram cumpridos em São Paulo, São Bernardo do Campo, Pouso Alegre, Poços de Calda, Borda da Mata, Balneário Camboriú e Curitiba.

A operação
A 6ª fase da Operação Sinergia apura fraudes tributárias praticadas por uma organização criminosa especializada na criação de empresas fantasmas com o objetivo de sonegação fiscal, especialmente no setor de metais recicláveis.

Foi determinada, ainda, judicialmente, a indisponibilidade de bens móveis e imóveis em mais de R$ 48 milhões. Além do crime de sonegação fiscal, os investigados podem responder pelos crimes de organização criminosa, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.

De acordo com o MP, os membros da organização criminosa agenciavam pessoas que exerciam atividades clandestinas em galpões de recicláveis. Eles pagavam comissões para que as empresas fantasmas tivessem um local de atividade comercial.

Os indícios levantados pelo MP ainda apontam que o grupo fornecia apoio material para a concretização das fraudes, realizando serviços contábeis, fiscais e bancários, criando ‘camadas’ que dificultavam a fiscalização dos órgãos no local.

As empresas fantasmas, situadas em Minas Gerais, simulavam a aquisição e venda de mercadorias com objetivo de sonegar o pagamento de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) que era devido ao Estado de Minas Gerais.

Além de Minas, o grupo também tinha atuação nos estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Com as fraudes, o MP estima que houve lesão aos cofres públicos em aproximadamente R$ 96 milhões.

O conto de Omaha: ex-CFO do IRB é acusado de fraude por Justiça americana

 

Pena pode chegar a 80 anos de prisão em quatro acusações contra Fernando Passos

Uma das maiores lorotas da história recente do mercado financeiro brasileiro acaba de virar processo civil e criminal nos Estados Unidos. A SEC e o Departamento de Justiça americano acusam o executivo Fernando Passos, o ex-CFO do IRB, de ser o responsável pela falsa informação de que a Berkshire de Warren Buffett estava comprando ações da resseguradora em 2020.

“Vou espalhar essa história de que a Berk comprou 28 milhões de ações, a partir daí isso se torna verdade”, diz uma mensagem que o executivo teria enviado ao RI, de acordo com a denúncia. Mais tarde, Passos também teria falsificado documentos da contabilidade para sustentar a informação, criando uma falsa lista de acionistas que colocava a companhia de Buffett como quarta maior investidora do IRB.

Era uma tentativa de reação da empresa a um relatório negativo publicado pela gestora Squadra em 2020. Na ocasião, a gestora carioca reavaliou a posição na companhia e, entre as justificativas, questionou as práticas contábeis da resseguradora. A carta e a posição short da Squadra provocaram reação imediata no mercado e, no mesmo dia, as ações da companhia despencaram mais de 17%.

Em 22 de fevereiro daquele ano, Passos enviou uma mensagem para um de seus funcionários dizendo que a Berkshire Hathaway tinha aumentado sua participação no IRB, sendo que a companhia não constava no quadro de acionistas. 

“Essa informação é confidencial, mas se nós pudéssemos mandar a um jornalista da área econômica, que seja da nossa confiança, para que publique a informação sem citar o IRB como fonte, seria excelente!”, escreveu o então diretor. “O ideal seria sair na quarta-feira”, concluiu. Não por coincidência, seria o dia da chegada de Passos aos EUA para encontrar com investidores, onde seguia para o Reino Unido.

No roadshow, Passos deu a informação falsa sobre a Berkshire a ao menos um analista e dois investidores, de acordo com a SEC.

Em março, ao tomar conhecimento da história, a Berkshire Hathaway divulgou um comunicado à imprensa negando a informação. “Há notícias recentes na imprensa brasileira de que a Berkshire Hathaway Inc. é acionista do IRB Brasil Re. Essas matérias estão incorretas.

A Berkshire Hathaway Inc. não é atualmente acionista do IRB, nunca foi acionista do IRB e não tem intenção de se tornar acionista do IRB”, dizia a nota.

Um funcionário da equipe de RI do IRB enviou um print do comunicado a Passos, por mensagem. “Estamos ferrados!”, respondeu o então CFO. As ações do IRB na bolsa brasileira derreteram mais de 31% no dia seguinte.

“Acho que houve um engano por parte da mídia sobre o que eu realmente disse. Eu afirmei que vocês eram uma de nossas resseguradoras, tomando uma posição na retrocessão do IRB. Desculpem pelo inconveniente!”, argumentou Passos à época. A retrocessão é um processo comum de divisão de riscos entre resseguradoras. O Pipeline não conseguiu contato com a defesa de Passos.

“Como alegado na denúncia, Passos engajou um esquema descarado para fraudar investidores e fez um grande esforço para perpetuar seu esquema, incluindo adulterar uma lista de acionistas”, disse Jason Burt, diretor do escritório de Denver da SEC. “Continuaremos a perseguir maus atores, localizados ou não nos Estados Unidos, cuja conduta fraudulenta afete investidores americanos”.

No final do ano passado, a CVM abriu um processo administrativo sobre o assunto no Brasil, citando manipulação de preços no caso de Passos e falha no dever de diligência do ex-CEO José Carlos Cardoso.

Desde 2020, o IRB trocou toda sua administração e vem tentado colocar em prática um plano de reestruturação – que tem o investidor Luiz Barsi entre seus entusiastas.

Fonte: https://pipelinevalor.globo.com/mercado/noticia/o-conto-de-omaha-ex-cfo-do-irb-e-acusado-de-fraude-por-justica-americana.ghtml

 

 

 

 

 

Justiça Federal do RS condena réus de operação da PF

A Justiça Federal de Porto Alegre condenou quatro réus da operação mãos dadas, da Polícia Federal, pelos crimes de formação de quadrilha, falsidade ideológica e denunciação caluniosa. Entre os condenados, está o casal Wolf Gruenberg e Betty Guendler, acusados de fazer parte de um esquema de “prática de estelionato contra a União, para obter precatórios que lhes foram concedidos”. O caso corre sob sigilo de Justiça e ainda não transitou em julgado.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A ação movida contra o casal por estelionato foi trancada pelo Superior Tribunal de Justiça, pois não há sequer lei penal sobre o chamado “estelionato judicial” do qual são acusados e, ainda que houvesse a tipificação de tal crime, a acusação não conseguiu comprovar as supostas manobras e inverdades usadas no processo, segundo acórdão do dia 1º de outubro de 2009.

Os réus foram condenados, por maioria de votos, a penas que variam entre dois e nove anos de prisão, além de multas que vão de 63 a 7,6 mil salários mínimos. Foi fixada, ainda, fiança de R$ 30 milhões a um dos acusados, que reside no Uruguai. Não foram divulgados os nomes dos condenados.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A fiança de R$ 30 milhões foi revogada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

A defesa de Gruenberg declarou que ainda não foi notificada da condenação. Afirmou que é uma “total surpresa dos advogados terem tomado conhecimento pelo site da Justiça Federal e por órgãos de imprensa”.

A sentença veio um dia depois da publicação de uma reportagem da revista Época narrando os vários casos judiciais de Gruenberg. Intitulada O homem que processou o Brasil, a reportagem em três capítulos conta a história do empresário e de seus embates com a Justiça brasileira. O primeiro deles data de 1978, quando Gruenberg entrou na Justiça para reclamar de uma venda pela qual não recebeu o dinheiro. A compradora, à época do negócio, era uma empresa controlada pelo Banco do Brasil, e poucos meses depois do início do caso, a família Gruenberg foi à falência.

O homem que processou o Brasil

A insólita história de Wolf Gruenberg, o empresário que dedicou sua vida a cobrar uma dívida, foi preso sob acusação de manipular a Justiça – e hoje acusa a polícia de tortura e quer fazer seu caso chegar às Nações Unidas

Capítulo 1

UM CASAL NA PRISÃO

Sentado na cafeteria de um shopping center no bairro paulistano de Higienópolis, Wolf Gruenberg narra sua história. O terno e as rugas de seus 63 anos lhe conferem um ar de respeitabilidade. Ele entremeia seu relato com um sem-número de documentos que vai sacando de uma pasta de couro preta. Todo tipo de artefato jurídico sai lá de dentro: há certidões, sentenças, recursos, registros, agravos de instrumento, exceções de suspeição e um emaranhado de fios que vão se cruzando nos pontos e nós de um enredo que, por seu relato, daria um thriller ao estilo dos best-sellers de autores como John Grisham ou Scott Turow.

Wolf nasceu em 1948, pouco depois da Segunda Guerra Mundial, no campo de refugiados de Wolfrathausen, onde seus pais se conheceram. Quando a guerra acabou, era inviável para judeus como eles permanecer na Alemanha. O casal Gruenberg e o filho de 3 anos, nascido apátrida, cruzaram então o Atlântico para se estabelecer na Bolívia, depois no Brasil. Wolf viveu em Corumbá, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Porto Alegre. Aos 18 anos, recebeu a cidadania brasileira. Formou-se em Direito e, adulto, tornou-se um empresário dedicado a recuperar companhias em processo falimentar. Às vésperas dos 60 anos, foi acometido de um incomum e virulento câncer sublingual, que quase lhe tirou a voz e a vida. Quando foi diagnosticado, o tumor crescia a cada 26 horas. Havia duas saídas: uma cirurgia radical ou uma combinação agressiva de sessões de quimioterapia e radioterapia. A opção escolhida foi a segunda. A doença regredia de acordo com os planos médicos, até que a vida de Wolf sofreu uma súbita reviravolta.

Às 6 horas da manhã do dia 11 de julho de 2008, cerca de 30 policiais federais armados de submetralhadoras arrombaram o portão de sua casa em Porto Alegre. Prenderam Wolf e sua mulher, Betty. Até então, Wolf apenas suspeitava ser o foco de investigações policiais. Desconhecia detalhes das pilhas de processos resultantes de uma investigação de mais de um ano em sua vida, suas contas, seus negócios, suas relações pessoais. Ele era monitorado pela Polícia Federal (PF) por meio de escutas telefônicas, telemáticas e ambientais. Passara de empresário renomado, com bom trânsito na alta sociedade, a principal alvo da operação da Polícia Federal batizada de mãos dadas. Nas páginas dos jornais que noticiaram a operação, Wolf Gruenberg foi qualificado como chefe de uma quadrilha que arquitetou um esquema bilionário de fraudes contra a União.

Wolf afirma ter sido privado, ao longo dos 150 dias que passou na prisão, da fase final de seu tratamento contra o câncer. Ainda assim, diz ele, suas agruras no cárcere foram pequenas em comparação com o suplício da mulher. Quando foi presa, Betty Gruenberg acabara de sair de uma cirurgia para redução nos seios. Nem sequer tinha retirado os pontos da delicada operação. Ela foi então instalada pelas autoridades numa cela da Penitenciária Feminina Madre Pelletier, em Porto Alegre. Lá, contraiu uma infecção que deixou seus seios purulentos e quase se transformou em septicemia. Transferida para o melhor hospital de Porto Alegre, o Moinhos de Vento, Betty quase perdeu as mamas. Na UTI do hospital, foi mantida algemada pelos pés à maca em que convalescia. “O Estado quase a matou. Eles foram extremamente cruéis com ela”, afirma Wolf. Ele retira então da pasta de couro fotografias que mostram as lesões da mulher e os boletins médicos que relatavam a gravidade de seu quadro. Quando saiu do hospital, Betty foi colocada na carceragem da Polícia Federal, onde, de acordo com os relatos de Wolf, dividiu uma cela com homens.

As arbitrariedades de que Wolf se julga vítima não cessaram aí. Conversas dele com seus advogados foram grampeadas – prática repudiada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Câmeras de vídeo foram instaladas em quartos de hotéis em que o casal Gruenberg se hospedou. Em 2009, a casa de Wolf em Punta del Este, no Uruguai, foi vasculhada pela polícia uruguaia, de posse de um mandado de busca e apreensão oriundo do Judiciário brasileiro. Documentos, computadores, chaves dos carros e objetos da família foram apreendidos. Wolf deu por falta até de uma caneta da marca Mont Blanc que seu filho mais novo ganhara por ocasião de seu bar mitzvah, cerimônia judaica que marca a entrada do homem na vida adulta, aos 13 anos. Os objetos nunca mais foram vistos pela família Gruenberg. Tampouco a Polícia Federal brasileira os recebeu. Espera por eles há quase três anos para prosseguir com as investigações. A polícia uruguaia não soube explicar onde foram parar os pertences dos Gruenbergs.

Depois de ser libertado, graças a um habeas corpus, Wolf começou uma cruzada a que tem se dedicado nos últimos quatro anos. Nela, tem investido tempo e dinheiro. Contratou assessores de imprensa e alguns dos mais badalados advogados do Brasil, como Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, Luiz Roberto Barroso, Carlos Eduardo Caputo Bastos e o ex-deputado federal e delegado da Polícia Federal Marcelo Itagiba. Wolf também buscou o apoio de ONGs internacionais, como a Justiça Global. A pedido dele, a Justiça Global remeteu um relatório sobre as condições de sua prisão e de sua mulher para a análise da Relatoria Especial da Organização das Nações Unidas contra tortura. “Temos muitas demandas de violações de direitos humanos em cadeias brasileiras. Em geral, as vítimas são pobres. No caso de Wolf, não tivemos tempo de averiguar tudo, mas ele trouxe fotos e documentação para comprovar o que nos disse”, afirma Sandra Carvalho, da Justiça Global.

Em mais de oito horas de conversa, em dois encontros com ÉPOCA, Wolf procurou relatar seu caso incomum. “Sou um perseguido, e meus inimigos usam o Estado brasileiro para me atingir”, diz. Essa é a explicação, de acordo com sua versão, para a extensa lista de crimes que lhe imputam e que enumera com sua voz mansa, enquanto alisa a barba espessa e grisalha: formação de quadrilha, estelionato judicial, falsidade ideológica, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, denunciação caluniosa. “Nem na época da ditadura uma coisa dessas aconteceria.” Ri, nervosamente.

Capítulo 2

GRUENBERG X UNIÃO

A contenda entre Wolf e as autoridades é uma história longa e complicada, que se estende por quase todos os desvãos do labiríntico sistema Judiciário brasileiro. Seu início data de 1977. Naquela ocasião, a família Gruenberg tocava a AC Indústria e Comércio, Importação e Exportação S.A., uma indústria têxtil em São Paulo. Um dos negócios da AC era vender mercadorias a uma empresa no Paraguai. A operação de exportação era intermediada pela Companhia Brasileira de Entrepostos Comerciais, ou Cobec, uma empresa de capital misto, da qual a União era acionista. A operação comercial, segundo Wolf, teve um desfecho desastroso. A Cobec comprou, mas não pagou. A família Gruenberg vendeu, mas não levou. Restou a Wolf apenas uma coleção de duplicatas não pagas no valor, na moeda de então, de Cr$ 15 milhões. Isso é o equivalente, em valores atualizados, a aproximadamente R$ 2,7 milhões, de acordo com a evolução do Índice de Preços ao Consumidor de São Paulo (IPC-SP), da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).

Depois de mais de um ano de tentativas para receber o crédito, Wolf recorreu à Justiça pela primeira vez em 1978. Moveu dois processos contra a Cobec. Um para receber o montante que a empresa paraguaia pagaria por suas mercadorias. E outro para obter reparação pelo que a família deixara de ganhar em lucros futuros por causa do calote. Poucos meses depois de sofrê-lo, a empresa da família Gruenberg foi à falência. Wolf ganhou o primeiro processo no final da década de 1980. Na ocasião, a Cobec, então controlada pelo Banco do Brasil, já fora rebatizada de Infaz. A Justiça fixou o valor a ser recebido por Wolf em US$ 1,06 milhão. Esse montante, segundo as contas da Infaz, incluía o valor corrigido das mercadorias e as perdas futuras da AC. E somava também uma multa estipulada pela Justiça, que considerou a Infaz culpada de ter tentado postergar a sentença usando argumentos desleais ou, no jargão jurídico, de ter praticado litigância de má-fé. A família Gruenberg discordou. De acordo com Wolf, o que lhes foi pago estava aquém do justo. “Além disso, a Infaz não dispunha de recursos para liquidar a dívida e nos pagou apenas 10% do que a Justiça determinou”, diz ele.

A trama se embaralhou ainda mais quando Wolf insistiu no segundo processo contra a Cobec, para receber indenização por perdas e danos. Nesse ponto da narrativa, sua contida indignação começa a aumentar. Mas sua voz rouca jamais sobe de tom. Sem precisar consultar nenhuma anotação, cita nomes e datas com precisão. Quando questionado sobre algum trecho da história, retoma a explicação sem cair em contradição. Chega a repetir frases inteiras, palavra por palavra, em conversas distintas, quase como se tivesse decorado um texto. Na Justiça, a Infaz acusou Wolf de cobrar o pagamento de um prejuízo pelo qual ele já fora ressarcido no primeiro processo. A disputa se deu no âmbito cível da Justiça de São Paulo. Em 30 de outubro de 1991, 14 anos depois do calote, Wolf obteve outra decisão favorável nesse segundo processo. O juiz Aclibes Burgarelli decidiu que uma perícia contábil deveria ser realizada para fixar o valor da indenização a ser paga pela Infaz a Wolf. O perito contratado pela Infaz calculou-o em US$ 10 milhões. O perito de Wolf estimou-o em US$ 58 milhões. O perito nomeado pelo juiz Aclibes Burgarelli estipulou o valor de US$ 41 milhões.

Bastaria superar o imbróglio contábil para que esse capítulo da vida de Wolf se encerrasse. A essa altura, já fazia 17 anos que ele levara o calote. No entanto, antes que o juiz desse a sentença final sobre o valor da indenização, em 10 de junho de 1994, houve mais uma reviravolta na já rocambolesca história. A Infaz foi absorvida pela União. Daí em diante, quem se sentaria no banco dos réus da ação movida por Wolf era o próprio Estado brasileiro – e não mais uma empresa de capital misto. A briga começava a ganhar contornos ainda mais kafkianos. A discussão, que até então seguia na Justiça de São Paulo, teve de ser reaberta em âmbito federal, a instância jurídica adequada para processos que envolvem o Estado brasileiro. Por conveniência de Wolf, que morava em Porto Alegre, o processo foi transferido para a Primeira Vara Cível Federal na capital gaúcha.

Apenas em 1999, 22 anos depois do calote, a União assumiu efetivamente seu papel de parte no processo. A Advocacia-Geral da União (AGU) acusou Wolf de tentar cobrar uma dívida que a Infaz já pagara, ato chamado, no jargão jurídico, de dúplice cobrança. A AGU também pediu a entrada do Ministério Público Federal no caso, a anulação do processo e novas perícias contábeis. A tramitação foi morosa, a despeito da disposição do juiz federal Alexandre Lippel em julgar com celeridade. “O processo já tramitava havia muitos anos, e o doutor Wolf sempre vinha me pedir rapidez”, diz Lippel. “Queria que ele saísse do meu pé.” Só em 2004, 27 anos depois do calote e 13 anos depois da primeira decisão favorável à indenização, Lippel pronunciou sua decisão. Fixou a indenização devida a Wolf em R$ 754 milhões, ou mais de R$ 1 bilhão em valores corrigidos pela inflação.

Em dezembro de 2011, o juiz Lippel demonstrou perplexidade ao ser questionado sobre sua decisão de sete anos atrás. Seus olhos azuis ficaram perdidos. Lippel disse que se baseou nos três laudos contábeis que constavam do processo que corria na Justiça de São Paulo. Sua decisão levou em conta correções monetárias a partir da variação do dólar e de uma expectativa de lucro calculada em quase 20% ao ano para a empresa de Wolf. “É um valor enorme, me surpreendeu, mas, pelo tempo que a ação corria, imaginei que fosse isso mesmo”, disse Lippel. “Dei até um prazo dilatado para a União se manifestar.” Ao longo das investigações da Operação Mãos Dadas, da PF, Lippel foi chamado a depor na ação criminal contra Wolf. Em seu depoimento, afirmou que nunca foi pressionado a decidir em favor do empresário e que olhou o processo “com capricho”. “Estava convencido dos critérios que usei para julgar”, disse a ÉPOCA. “Mas fica sempre a dúvida, eu não sei (se fui enganado). A gente atua na boa-fé, confiando na lealdade das pessoas. Dizem que eu teria sido manipulado. Até hoje, fica essa desconfiança.”

A União apelou contra a decisão de Lippel e argumentou que devia apenas R$ 47,6 milhões. Mesmo com uma decisão que lhe atribuía um crédito de quase R$ 800 milhões, Wolf também apelou para reclamar um valor maior. O processo subiu para o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, com sede em Porto Alegre. Foi nesse mesmo período que o Ministério Público Federal e a Polícia Federal iniciaram uma investigação contra Wolf por suspeita de “estelionato judicial”, uma tentativa de ludibriar a Justiça para lesar a União. De acordo com a investigação, longe de ser vítima do Estado brasileiro, Wolf era o responsável por uma criminosa alquimia que transformou uma dívida de alguns milhares de cruzeiros – de que ele era credor no final da década de 1970 – numa conta de mais de R$ 1 bilhão a ser paga pela União. Segundo a PF e o MPF, Wolf manipulou fatos, provas e juízes para conseguir essa façanha.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A ação movida contra o casal por estelionato foi trancada pelo Superior Tribunal de Justiça, pois não há sequer lei penal sobre o chamado “estelionato judicial” do qual são acusados e, ainda que houvesse a tipificação de tal crime, a acusação não conseguiu comprovar as supostas manobras e inverdades usadas no processo, segundo acórdão do dia 1º de outubro de 2009.

Capítulo 3

A INVESTIGAÇÃO POLICIAL

O resumo das atividades criminosas de que Wolf foi acusado consta dos volumes de processos que tramitam em caráter sigiloso na Justiça. Eles foram elaborados, sobretudo, ao longo de mais de um ano de trabalho exclusivo de um único delegado e dois agentes da Polícia Federal, no Rio Grande do Sul. “Como pode uma empresa que tinha patrimônio negativo, em 1977, de Cr$ 6.976.510,35 e faliu ser capaz de gerar uma indenização de R$ 1 bilhão?”, diz o delegado Luciano Flores de Lima, que comandou as investigações da PF. Atualizado pelo IPC da Fipe, os Cr$ 6 milhões de patrimônio negativo da empresa AC, da família Gruenberg, equivaleriam hoje a R$ 1,3 milhão.

Em 2006, quando a indenização a Wolf em R$ 754 milhões foi confirmada, em segunda instância, pelo desembargador Edgar Lippmann, do TRF da 4a Região, a PF reforçou sua investigação contra ele. Na época, surgiram denúncias de que Lippmann vendera uma sentença favorável à reabertura de uma casa de bingos. Por causa dessas denúncias, Lippmann , desde 2008, é investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ele responde a um processo administrativo disciplinar, que deverá ser julgado até março. Pelas mesmas acusações, Lippmann enfrenta um processo criminal no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Os investigadores da PF sugerem que Lippmann pode ter sido permeável às pressões de Wolf. O empresário nega. “Lippmann não nos ajudou em nada”, diz ele. No vaivém de recursos e liminares relativos aos processos, dois juízes deram decisões contrárias aos interesses de Wolf. Os dois foram denunciados por ele como parciais. Para a PF e o MPF, foi uma tentativa de Wolf para desacreditá-los e retirá-los do caso. Pelas ações contra os juízes, Wolf responde a processo por denunciação caluniosa. “Dizem que enganei juízes, mas não dizem a quem enganei”, afirma Wolf. “Ou sou um gênio, mais inteligente que Albert Einstein, ou os mais de 40 juízes que atuaram no caso são todos uns incapacitados.”

Atualização (16 de março de 2016): Não houve qualquer imputação de corrupção ou tentativa de corrupção por parte de Wolf em relação a Lippmann. Em relação aos magistrados que estão no contexto das acusações de denunciação caluniosa, as representações foram feitas por advogado nomeado pela Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas do Advogado da OAB-RS, órgão de classe que deferiu assistência em favor de Wolf por entender violadas suas prerrogativas profissionais.

Trinta e um anos depois do calote, em abril de 2008, a então ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), reviu todas as decisões anteriores que mandaram a União pagar indenização a Wolf. Acatando um pedido da AGU, ela suspendeu o pagamento. Na ocasião, Wolf já recebera quase R$ 11 milhões dos R$ 754 milhões que a União lhe devia. Boa parte do dinheiro fora enviada ao Uruguai, onde Wolf tem casa em Punta del Este. De acordo com a PF e o MPF, a transferência do dinheiro era um ardil para evitar que ele fosse confiscado para o pagamento de dívidas trabalhistas das empresas da família Gruenberg. Wolf foi então acusado de evasão de divisas. Ele chama essa acusação de “balela”. Diz que transferiu seu dinheiro por meio do Banco Central e, por isso mesmo, as autoridades brasileiras sabiam onde ele estava. E que, como tinha negócios no Uruguai, resolveu manter seus recursos por perto.

Atualização (16 de março de 2016): A transferência foi feita através de instituição financeira oficial, com a chancela do Banco Central. O mesmo juiz que prendeu Wolf pela suposição da prática do ilícito de evasão de divisas, veio a absolvê-lo sumariamente após a resposta à acusação, em decisão confirmada pelo TRF da 4ª Região.

A investigação da PF contra Wolf colheu mais elementos do que chamava de “conduta criminosa” do empresário. Monitorado por telefone, e-mail e escutas ambientais, Wolf foi flagrado, segundo os investigadores, tentando constranger autoridades e influenciar o curso de seus processos. Num telefonema a sua mulher, Betty, Wolf, de acordo com as investigações, dissera estar disposto a gastar “de R$ 10 a R$ 15 milhões” em subornos a servidores federais, entre eles o então chefe da AGU, José Dias Toffoli, hoje ministro do STF. Em outro diálogo, com dois advogados de Brasília, disse, de acordo com as gravações: “Contratem juristas de renome, para atuar detrás das cortinas, no STF e no STJ”. As escutas serviram de justificativa para a ação da Operação Mãos Dadas que prendeu Wolf, sua mulher e alguns de seus funcionários, em 11 de julho de 2008. “Isso é mentira. Tenho um amigo em comum com o Toffoli, mas não teria cabimento abordá-lo para falar do meu caso”, diz Wolf.

Responsável por decretar as prisões, o juiz federal criminal de Porto Alegre João Paulo Baltazar nega qualquer tipo de excesso ou maus-tratos em relação aos réus. “Houve várias perícias na senhora Betty. Ela foi internada no hospital particular que escolheu. Na minha interpretação, não houve violação de nenhum direito”, afirma Baltazar. Segundo ele, Betty não teve contatos com nenhum homem em sua cela, porque estava numa solitária. Reconhece que, no local, não havia vaso sanitário, mas afirma que essa é uma determinação legal para evitar que os detentos tenham qualquer instrumento capaz de facilitar um suicídio. E diz que as algemas foram necessárias no período no hospital, porque Betty ameaçava fugir. Recentemente, Wolf tentou afastá-lo do caso por meio de um instrumento jurídico conhecido como exceção de suspeição. A ação de Wolf contra Baltazar, juiz especializado em lavagem criminal e ex-auxiliar do CNJ, foi rejeitada pelo TRF da 4ª Região. Baltazar só concordou em receber a reportagem de ÉPOCA para falar em tese, e não sobre o caso específico de Wolf.

Atualização (22 de março de 2016): A exceção de suspeição movida contra o juiz José Paulo Baltazar Junior foi rejeitada pelo argumento de que a vinculação ideológica do juiz não é motivo indicado na lei para suspeição.

A prisão pela PF e as denúncias feitas pelo MPF transtornaram completamente a vida da família Gruenberg. Mais de três anos depois da Operação Mãos Dadas, Wolf continua empenhado em receber a indenização da União pela qual briga há 33 anos. O pagamento da dívida continua suspenso. A essa batalha judicial, acrescentou outra: move dois processos contra a União por tortura e tenta derrubar as últimas acusações que subsistem contra ele na Justiça: falsidade ideológica, formação de quadrilha e denunciação caluniosa. Os crimes de evasão de divisas, estelionato judicial e lavagem de dinheiro foram considerados inexistentes ou improcedentes. Os processos relativos a eles foram trancados na primeira e na segunda instâncias e no STJ. Os remanescentes devem ser julgados dentro de seis meses pelo juiz Baltazar, cujas decisões têm sido desfavoráveis a Wolf. Curiosamente, é o próprio Baltazar quem resume a insólita história de Wolf, um homem que passou mais da metade de sua vida envolvido em disputas nos tribunais brasileiros: “A Justiça brasileira é disfuncional e sem fim”.

Atualização (22 de março de 2016): Os delitos de evasão de divisas, estelionato judicial e lavagem de dinheiro foram considerados inexistentes ou improcedentes. As acusações em relação aos demais delitos — falsidade ideológica de documento particular, formação de quadrilha e denunciação caluniosa — ainda aguardam a análise de embargos infringentes no TRF-4.

Servidor do TRT-RJ tem empresa em Miami

Pivô de uma crise no Judiciário por conta de 16 movimentações bancárias atípicas registradas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras, no valor de R$ 282 milhões, em 2002, o analista judiciário do TRT-RJ Rogério Figueiredo Vieira é dono de uma empresa de exportação em Miami. Lá, ele também tem uma casa comprada por US$ 98 mil.

O servidor responde a cinco processos judiciais — um no Amazonas, outro no Paraná e três no Rio de Janeiro, por crimes contra o sistema financeiro e descaminho (importação de produtos estrangeiros sem pagamento de tributos).

Na época das primeiras ilegalidades detectadas pelo Banco Central, em 2000, ele já era servidor da Justiça do Trabalho. Seu ingresso, por concurso, ocorreu no TRT do Espírito Santo, mas em 1991 foi transferido para o TRT da 1ª Região, Rio de Janeiro. Com isto passou “a integrar definitivamente os quadros desta instituição em 1993, pelo instituto de redistribuição”, segundo nota divulgada pelo TRT.

Sua efetivação no Rio se deu na gestão do juiz José Maria de Mello Porto na presidência do tribunal, a quem ele assessorou. Em 1996, chegou a ser punido pelo tribunal por 45 dias. A nota do TRT não diz a causa da punição e explica que em 31 de janeiro de 1998 foi cedido à Câmara dos Deputados, permanecendo ali até 25 de dezembro de 2003. Após este período, gozou de férias e licenças para tratamento de saúde até 1º de março de 2004. Depois, afastou-se em “para trato de interesses particulares, sem vencimentos” (1º de março de 2004 a 1º de março de 2007).

Na Câmara dos Deputados, Rogério Vieira primeiro ficou no gabinete do então deputado Jorge Wilson, mas já em 2003 prestou serviços ao deputado Carlos Rodrigues, o Bispo Rodrigues, na época da Igreja Universal do Reino de Deus.

Sua primeira empresa, a Eleon Comércio e Assessoria Internacional Ltda. foi aberta em 1998, como demonstra o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPF) da Receita Federal. Ela, que tem o nome fantasia Yahweh-Nissi, desde 2005 é dada como inapta pela prática de irregularidade no comércio exterior.

Em 2000, o Banco Central detectou mais de US$ 2 milhões no exterior em nome da Yahweh-Nissi, sem origem esclarecida. O caso foi investigado pelo inquérito policial 015/2004, da Polícia Federal do Amazonas e terminou com uma denúncia da Procuradoria da República daquele estado, que gerou o processo 2006.32.00.002286-8, ainda em tramitação na 4ª Vara Federal do Amazonas. A demora é causada pelas cartas precatórias que são expedidas para ouvir depoimentos no Rio.

Vieira, na época, tentou trancar esta Ação Penal através do HC 102.696-AM (2008/0063469-6) no Superior Tribunal de Justiça. No acórdão do julgamento, o ministro relator, Napoleão Nunes Maia Filho, destacou trecho da denúncia: “a empresa Yahweh-Nissi Importação e Exportação Ltda. (…) realizou no período compreendido entre 1/09/2000 e 11/12/2000, exportações de mercadorias no valor total de US$ 2.362.747,19. Instada pela autoridade administrativa a resolver pendências detectadas, não logrou comprovar a efetiva exportação de mercadorias, ou mesmo a existência de cobertura cambial ou retorno dos bens ao território nacional”.

De acordo com a denúncia, “tal fato configura a manutenção no exterior de depósitos de valores não declarados à autoridade competente, configurando a prática do ilícito previsto no artigo 22, parágrafo único, da Lei 7.492/96. Os documentos de folhas 06/54, oriundos do Banco Central do Brasil são hábeis a comprovar a materialidade do delito que deu ensejo à presente. Quanto à autoria delitiva, de acordo com os documentos de folhas 70/77 (contrato social e alterações da referida empresa), constata-se que, à época dos fatos, os sócios da empresa Yahweh-Nissi Importação e Exportação Ltda. eram Rogério Figueiredo Vieira e Hélio Toledo”.

Para se defender da acusação de falta de comprovação das mercadorias exportadas ou importadas, Rogério Vieira limitou-se a dizer que “as mercadorias estavam em trânsito pelo Brasil, tendo sido recepcionadas por sua empresa e posteriormente remetidas ao exterior, sem cobertura cambial e sem declaração à autoridade competente”.

Com isto, a procuradora da República Anna Claudia Lazzarini, na época em Manaus, concluiu: “Depreende-se que as operações de exportação em análise destinaram-se a encobrir a evasão de divisas do país, tendo o denunciado, portanto, praticado os crimes tipificados no parágrafo único do artigo 22 da Lei 7.492/86 e inciso IV do artigo 1º da Lei 9.613/98”. O STJ não atendeu ao pedido de trancamento.

Com o mesmo nome Eleon ele abriu uma firma em Miami, Estados Unidos, a Eleon Enterprises Corporation, com endereço 840 NW 68 Street. No documento de registro junto à Secretaria de Estado dos EUA Vieira fornece seu endereço do bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro. Mas ele também comprou uma residência em Miami, em agosto de 2002, ao preço de US$ 98 mil, em um condomínio na 919 NE 199 ST # 103, que aparece em destaque no mapa que ConJur localizou.

Foi no período em que, segundo o TRT, estava de licença sem vencimentos, que Vieira foi preso por policiais civis do estado do Paraná, na mesma operação em que prenderam dois ex-secretários do governador Jaime Lerner, Ingo Hübert e José Cid Campêlo Filho. O caso também foi discutido no Superior Tribunal de Justiça por conta da briga dos dois ex-secretários pelo direito a foro especial, privilégio derrubado depois pelo STF.

No HC, que teve como relator o então ministro Paulo Medina — depois afastado pelo CNJ por suposta venda de sentença — ficou explícito que a acusação contra os 15 réus é por associação para o cometimento de delitos patrimoniais, bem como para a prática de crimes contra a ordem tributária e contra a administração pública, além de falsificação de documentos.

A acusação era de que eles tinham cometido desvio de dinheiro público da Copel (Companhia Estadual de Energia) no total de R$ 16,8 milhões. Vieira era um dos quatro empresários acusados de envolvimento com o esquema que tiveram a prisão decretada. O caso continua em tramitação na 8ª Vara Criminal de Curitiba (processo 1837-3).

Ele também ingressou com um pedido de Habeas Corpus para ser solto alegando constrangimento ilegal, pois os demais co-réus que não tinham processos anteriores já estavam em liberdade. Ele permaneceu preso pelo caso do Amazonas. Mas o pedido sequer foi apreciado por que o Tribunal de Justiça do Paraná não havia analisado o mérito de questão idêntica.

Apesar destes dois processos e da sua prisão, em 2008, ele prestou novo concurso para o cargo de analista judiciário, sendo empossado no ano passado na vaga aberta por um servidor aposentado. O que alguns juízes do trabalho questionam é como ele foi contratado nas novas funções com uma ficha penal em que constavam, pelo menos, dois processos por crimes contra o sistema financeiro.

A nota do TRT, porém, esclarece que “até a presente data não houve qualquer condenação criminal ou imposição de pena de perda de cargo público relativo ao servidor, fato que poderia impedir a relação estatutária do mesmo com o Tribunal”. Alega ainda que “os fatos ensejadores de ações penais que envolvem o servidor não dizem respeito a atividade exercida junto ao Tribunal”.

Em 2009, Vieira voltou a ser alvo das investigações da Polícia Federal e de auditores da Receita Federal em um trabalho conjunto que resultou na Operação Voo Livre. Foi considerado o principal responsável por um esquema de descaminho de produtos eletrônicos que ele, com a ajuda de policiais que trabalhavam no aeroporto, trazia para o Brasil sem pagamento de tributos promovendo uma sonegação que, segundo o superintendente adjunto da Receita no Rio, Marcus Vinicius Vidal Pontes, foi responsável por um prejuízo de R$ 148 milhões por ano.

Em um primeiro momento sua prisão foi pedida, mas o caso caiu numa discussão de competência que demorou a ser definida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Quando o inquérito prosseguiu já não se justificava mais as prisões.

Ao todo, na operação, 22 pessoas foram indiciadas. Entre os denunciados estão o agente de polícia Saul Bemerguy e os papiloscopista Vagner Jacomo dos Santos Elias e Gustavo de Castro e Costa Accioly, do Departamento de Polícia Federal; as auditoras fiscais Glória de Oliveira Ribeiro, Taísa Castello Gomes e Jandira de Carvalho Martins; os analistas tributários Ernani da Silva Guimarães Filho e Martha Oiticica de França de Souza; os agentes administrativos Telmo Abrantes, Elizabeth Mendonça dos Santos e Handerson Loureiro Camello; e os servidores Ernani da Silva Guimarães Filho e Vera Lúcia Young Lobo Marques Pinto, todos da Receita Federal no Rio.

Vieira, como a ConJur noticiou na quinta-feira com exclusividade, foi alvo de três denúncias feitas pelo procurador da República Marcelo Freire, duas por lavagem de dinheiro, em tramitação na 1ª Vara Federal Criminal do Rio e outra por descaminho, na 7ª Vara Federal Criminal. O procurador ainda pediu a abertura de 54 inquéritos para apurar outros crimes cometidos pelas mesmas pessoas e por outros suspeitos. Vieira voltará a ser investigado em três deles.

 

Justiça aceita denúncia do MPF contra Edemar Cid Ferreira

O juiz Fausto de Sanctis da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo aceitou denúncia oferecida Ministério Público Federal, em São Paulo, contra ex-controlador do Banco Santos, Edemar Cid Ferreira e outros 18 ex-dirigentes da instituição. Eles são acusados de lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e gestão fraudulenta.

Ferreira e o ex-superintendente do banco Mário Arcângelo Martinelli também estão sendo processados por manter contas ilegalmente no exterior. Com a decisão do juiz de receber a denúncia, os bens do banqueiro que foram apreendidos no começo deste ano continuam à disposição da Justiça. Os depoimentos dos réus estão marcados para acontecer entre os dias 22 e 26 de agosto.

O processo de intervenção no Banco Santos começou em maio de 2004. A decisão foi tomada tendo em vista que os ativos da instituição não cobrem 50% das dívidas com os credores do banco. Pela Lei 6.024, o Banco Central, nesses casos, tem de fazer a liquidação da instituição.

Outro motivo que levou à liquidação foi o insucesso das negociações entre os credores do banco para viabilizar uma solução que permitisse sua reabertura. De acordo com o BC, o Banco Santos tinha em fevereiro um passivo a descoberto de R$ 2,236 bilhões. No início do processo de intervenção, o BC estimava que esse passivo a descoberto fosse de aproximadamente R$ 703 milhões.

Os correntistas e investidores da instituição, entre eles várias prefeituras, fundos de pensão e empresas, têm poucas chances de reaver seus depósitos, já que o controlador do banco não tem ativos suficientes para cobrir o débito.

Desde dezembro, a consultoria Valora, contratada por Edemar Cid Ferreira, tentava costurar um acordo entre o controlador e os credores. Com a liquidação, o Ministério Público Federal em São Paulo deve propor uma ação de responsabilidade sobre a quebra do banco. Ferreira poderá ser responsabilizado criminalmente.

Desde a intervenção, descobriu-se uma série de irregularidades, Várias operações obscuras de concessão de empréstimos a empresas em dificuldades financeiras no Brasil foram feitas em troca de compra de papéis e investimentos nas empresas sediadas em paraísos fiscais. Descobriu-se também que os bens mais valiosos do banqueiro, como sua mansão no bairro do Morumbi, avaliada em R$ 50 milhões, estavam em nome de empresas situadas em paraísos fiscais.

Na maioria das empresas, a mulher do banqueiro, Márcia Cid Ferreira, aparece como a principal executiva. Pouco antes de o BC intervir em seu banco, Ferreira iniciou uma ambiciosa operação para transformá-lo num banco de varejo.

Leia a íntegra da denúncia

Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 6ª Vara Criminal da 1ª

Subseção Judiciária do Estado de São Paulo

O Ministério Público Federal, pelo Procurador da República signatário, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência oferecer

DENÚNCIA em face de:

1. Edemar Cid Ferreira, qualificado às fls. 2138 dos autos de inquérito policial, Fundador e presidente do Banco Santos S.A. Idealizador das fraudes perpetradas, cercou-se de profissionais especializados e a eles determinou as metas do conglomerado. Definiu os planos de expansão do Banco, e garantiu, com falsos dados contábeis e resultados positivos artificiais, bem como uma política de marketing agressiva e cara, uma boa imagem junto ao público e a algumas agências de avaliação de riscos. Determinou a criação do Bank of Europe e de dezenas de empresas nacionais e off shore utilizadas nas operações de reciprocidade e compensação de créditos, bem como, juntamente com Mário, Álvaro, Ricardo e Rodrigo, e com a participação de Clive e Ary, definia e controlava o fluxo financeiro clandestino de recursos para ou do Exterior através dessas empresas. Integrava o comitê de crédito.

2. Mário Arcângelo Martinelli, qualificado às fls. 2116 dos autos de inquérito policial, Superintendente do Banco, integrava um comitê executivo não oficial formado por Edemar, seu filho Rodrigo, seu sobrinho Ricardo e Álvaro, órgão este que tinha uma visão abrangente da instituição e definia as estratégias operacionais. Integrava o comitê de crédito. Diretor da Alsace Lorraine. Definia, em conjunto com Álvaro Zucheli, quem seriam os procuradores das off shores. Montou as empresas não financeiras e movimentava suas contas correntes. Definia, juntamente com os outros membros do comitê, os fluxos financeiros, a origem e o destino de valores.

3. Álvaro Zucheli Cabral, qualificado às fls. 2126 dos autos de inquérito policial, Diretor Administrativo. Integrava o comitê executivo do Banco. Definia, em conjunto com Mário Martinelli, quem seriam os procuradores das empresas off shore. Integrava o comitê de crédito. Definia qual empresa deveria ser utilizada para a realização de determinada operação de reciprocidade. Montou as empresas não financeiras e movimentava suas contas correntes. Assinou contratos de mútuo e outros documentos envolvendo operações de reciprocidade. Era o responsável pela gestão de todas as empresas não-financeiras não reconhecidas como integrantes do conglomerado. Definia, juntamente com os outros membros do comitê, os fluxos financeiros, a origem e o destino de valores.

Fonte: https://www.conjur.com.br/2005-jul-06/justica_aceita_denuncia_mpf_edemar_cid_ferreira