Sócio da UPBus investigado por ligação com PCC, advogado sai da cadeia 1 dia após ser preso em SP

Justiça de São Paulo concedeu benefício da prisão domiciliar a Ahmed Saleh porque Estatuto da Advocacia prevê que advogados não podem ficar em prisões antes de sentenças com trânsito em julgado. Ele foi preso em 6 de agosto e ganhou o benefício no dia 7 de agosto.

A Justiça de São Paulo concedeu o benefício da prisão domiciliar ao advogado Ahmed Saleh, sócio da empresa de ônibus UPBus, investigado por ligação com a organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).

Ahmed teve a prisão temporária decretada em julho, mas foi preso apenas na última terça-feira (6), em Mogi das Cruzes (SP), no âmbito da Operação Decurio, que cumpriu 20 mandados de prisão e bloqueou mais de R$ 8 bilhões de pessoas e empresas suspeitas de ligação com o crime organizado.

No entanto, na quarta-feira (7), um dia após a prisão do suspeito, a juíza da 2ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital converteu a prisão temporária em domiciliar.

Para manter o benefício, Ahmed deverá comparecer a todos os atos processuais para os quais for intimado, não poderá sair da cidade sem autorização judicial e terá de comunicar qualquer mudança de endereço.

O Ministério Público chegou a solicitar o uso de tornozeleira eletrônica, mas a Justiça negou o pedido.

A magistrada concedeu o benefício pelo fato de Ahmed ser advogado. O artigo 7º do Estatuto da Advocacia diz que é direito do advogado: “não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas […], e, na sua falta, em prisão domiciliar”.

Relatório de investigação apresentado pela Polícia Civil à Justiça aponta que Ahmed teve “conversas suspeitas” com Silvio Luis Pereira, o “Cebola”, sócio da UPBus que está foragido;
Cebola é apontado pela polícia como controlador da UPBus e como um dos chefes do PCC;
O documento também diz que Ahmed teria ameaçado policiais na cidade de Ubatuba, no litoral paulista;
Ahmed, segundo a polícia, teria se utilizado da profissão para tentar blindar as atividades ilícitas da organização criminosa e auxiliado na exploração do tráfico de drogas e na lavagem de dinheiro.

Avaliação externa na UPBus

A Prefeitura de São Paulo contratou uma organização privada para realizar avaliação externa independente nas empresas de ônibus Transwolff e a UPBus, que atuam respectivamente nas Zonas Sul e Leste da capital.

As duas são investigadas desde abril deste ano por suposta ligação com o PCC e estão sob intervenção do Executivo após determinação judicial (entenda mais abaixo).

A contratação foi publicada no Diário Oficial de 2 de agosto pela Secretaria Executiva de Transporte e Mobilidade Urbana (Setram). Quem realizará a análise será a Fundação Carlos Alberto Vanzolini pelo valor de R$ 1.540.000.

Em nota ao g1, a pasta informou que o objetivo é “prestar serviços de avaliação independente dos processos de operação e gestão nas concessionárias Transwolff e UPBUS, com o objetivo de dar apoio ao trabalho das equipes dos comitês de intervenção nas duas empresas”.

“As empresas citadas seguem sob intervenção da gestão municipal, por deliberação da Justiça e determinação da Prefeitura. As equipes de intervenção também já realizam as análises do cumprimento dos contratos de concessão pelas operadoras sob intervenção, priorizando a manutenção da prestação de serviço de transporte público à população”, ressaltou.

Por meio de nota, a Fundação Carlos Alberto Vanzolini (FCAV) informou que realmente “está sendo contratada para realizar uma avaliação externa independente para apoiar a SETRAN e não para realizar auditorias externas nas empresas, como foi divulgado”.

“A avaliação externa independente terá o objetivo fornecer subsídios à Administração Pública Municipal para fins de maior entendimento sobre a viabilidade econômico-financeira e operacional das empresas para fins de tomada de decisão”, disse a entidade.

A Fundação Vanzolini é uma organização sem fins lucrativos, criada há 57 anos e gerida pelos professores do departamento de Engenharia de Produção da Universidade de São Paulo (Poli-USP).

Em 9 de abril deste ano, uma operação realizada pelo Ministério Público, Polícia Militar, Receita Federal e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) prendeu dirigentes das duas empresas de ônibus, que operam na capital paulista, por suspeita de envolvimento com o PCC.

Ao todo, foram cumpridos 52 mandados de busca e apreensão na operação. As ações ocorreram na capital, Grande São Paulo e em cidades do interior paulista.

Segundo o MP, No imóvel de um de Luiz Carlos Efigênio Pacheco, dono da Transwolff, foram encontrados diversos fuzis, revólveres, além de dinheiro e joias. O advogado de Pacheco, Dr. Roberto Vasco Teixeira Leite, afirmou, por meio de nota, “que nunca foram encontrados fuzis e drogas na residência do Sr Luiz”.

Segundo a denúncia do Grupo de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), a Transwolff e a UPBus receberam mais de R$ 5,3 bilhões da prefeitura desde 2015, ano da assinatura dos primeiros contratos de concessão com a SPTrans, para operação de linhas de ônibus nas zonas Sul e Leste da cidade.

O Ministério Público protocolou denúncia contra 10 dirigentes e integrantes da Transwolff e 18 dirigentes e integrantes da Upbus. A Justiça aceitou e os tornou réus. Eles são acusados de crimes como organização criminosa e lavagem de dinheiro.

Lavagem de dinheiro e tráfico
Durante quase cinco anos de investigação, os promotores do grupo de combate ao crime organizado (Gaeco) reuniram indícios de que as empresas eram usadas pela facção criminosa para lavar dinheiro do tráfico de drogas e de outros crimes.

A suspeitas de que o crime organizado estava infiltrado no transporte público de São Paulo vêm desde os anos 1990, quando parte do sistema era operado por perueiros clandestinos, que faziam o trajeto entre os bairros mais afastados e os terminais de ônibus.

Em 2003, a prefeitura da capital transferiu a operação das linhas para a iniciativa privada. Parte do sistema ficou com as grandes empresas de ônibus, e os itinerários mais curtos passaram a ser feitos por cooperativas. A maior delas era a Cooperpam, com sede na Zona Sul.

Ao longo dos anos, segundo o MP, os dirigentes desta cooperativa montaram uma empresa e passaram a pressionar e até ameaçar os cooperados para que transferissem o controle da cooperativa para essa outra companhia, chamada de TW ou Transwolff.

Além disso, segundo os promotores, os diretores se apropriavam de parte da remuneração dos cooperados.

Dez anos depois, em 2013, quando o primeiro contrato de permissão da Prefeitura de SP chegou ao fim para todas as empresas, a Transwolff conseguiu assinar um contrato emergencial, que foi prorrogado durante anos, devido a um impasse no processo de concessão.

Só em 2019, depois que o TCM liberou a licitação, a prefeitura da capital assinou 32 contratos para a concessão das linhas de ônibus da cidade, por um prazo de 15 anos.

No caso da UPBus, o Ministério Público afirmou que os diretores integravam a cúpula da facção criminosa. Um dos donos da empresa era Anselmo Bicheli Santa Fausta, conhecido como “Cara Preta”.

Anselmo foi assassinado e degolado em dezembro de 2021. A cabeça dele foi deixada em uma praça do Tatuapé, também na Zona Leste.

Os promotores descobriram que outros chefes da facção criminosa fazem parte da direção da UPBus. Dois deles aparecem entre os sócios: Alexandre Salles Brito, chamado de Buiú, e Claudio Marcos de Almeida, o Jango. Eles já foram alvos de investigação por crimes graves como homicídios, tráfico de drogas, sequestros e roubo a bancos.

Parentes dos investigados também entraram para a sociedade. Segundo a investigação, eles têm profissões ou exercem atividades econômicas incompatíveis com o capital investido na UPBus.

 

Ex-secretária de Educação de Porto Alegre teria recebido R$ 300 mil em propina, diz investigação

Parcela do apartamento que Sônia da Rosa comprou teria sido paga por empresa e por advogado ligados a representante comercial que fez negócios com a pasta, conforme polícia.

Investigação da Polícia Civil apontou que parcela de R$ 300 mil do apartamento que a ex-secretária de Educação de Porto Alegre Sônia da Rosa comprou teria sido paga por uma empresa e por um advogado ligados a um representante comercial que fez negócios com a Secretaria Municipal de Educação (Smed). O custo total do imóvel, situado na Capital e adquirido em maio de 2022, foi de R$ 750 mil.

Conforme apuração da segunda fase da Operação Capa Dura, há indícios de que o valor de R$ 300 mil teria sido pago diretamente ao vendedor do apartamento e seria decorrente do pagamento de propina, para o direcionamento de compras.

O Grupo de Investigação da RBS (GDI)* teve acesso aos detalhes da compra do imóvel. A empresa que teria feito transferências é a MAC Construtora e Incorporadora, de Marco Antônio Freitas Rocha. E o advogado é Paulo de Tarso Dalla Costa.

Rocha e Paulo de Tarso têm ligação com o empresário e representante comercial Jailson Ferreira da Silva, que intermediou vendas para a Smed quando a pasta estava sob o comando de Sônia.

A relação de Jailson com Sônia já existia desde a época em que ela comandou a Educação em Canoas e fez compras oferecidas pelo representante comercial. Seis dias depois de assumir a Smed na Capital, Sônia recebeu Jailson para reunião em seu gabinete.

Das 11 aquisições feitas por adesão à ata de registro de preço em 2022 pela Smed da Capital, seis tiveram a participação de Jailson: elas somaram R$ 43,2 milhões pagos pela prefeitura por cerca de 500 mil livros e por 104 laboratórios de matemática e ciências.

Na apuração sobre a aquisição do apartamento, o vendedor e o corretor de imóveis prestaram depoimento à polícia. Conforme o contrato de promessa de compra e venda, os pagamentos foram previstos da seguinte forma: R$ 80 mil no ato da assinatura do contrato, R$ 450 mil em financiamento pela Caixa Econômica Federal e R$ 220 mil em espécie na data da assinatura do financiamento.

A parcela inicial, de R$ 80 mil, foi paga em 5 de maio, dividida para três destinatários, conforme previsto no contrato de compra e venda. O vendedor recebeu uma transferência de R$ 50 mil feita pela empresa MAC Construtora e Incorporadora. Na mesma data, o corretor de imóveis recebeu como comissão R$ 22,5 mil, também via Pix feito pela empresa MAC. A terceira parte foi paga à imobiliária: R$ 7,5 mil.

Ainda conforme descrito pelo vendedor em depoimento, ele recebeu os demais valores da seguinte forma:

R$ 80 mil via Pix da empresa MAC Construtora e Incorporadora, em 20 de junho de 2022;
R$ 60 mil via Pix da empresa MAC Construtora e Incorporadora, em 21 de junho de 2022;
Ficou faltando uma parcela de R$ 80 mil, que teria tido atraso. Em meados de julho de 2022, o vendedor recebeu, do corretor de imóveis, o repasse de um cheque de R$ 82 mil. O documento era de uma conta pertencente a Rocha, dono da MAC. Não foi descontado por por falta de fundos. O vendedor o devolveu ao corretor.

Em 15 de julho de 2022, R$ 87 mil (a parcela de R$ 80 mil mais R$ 7 mil de juros) foram transferidos para o vendedor pelo advogado Paulo de Tarso, conforme comprovante bancário que consta na investigação.

Segundo o inquérito, no mesmo dia, Jailson, por intermédio de uma de suas empresas, a JBG3 Tecnologia da Informação e Serviços, teria transferido R$ 88 mil para o advogado. Para os investigadores, essa transação evidenciaria a relação entre o pagamento feito por Paulo de Tarso ao vendedor do apartamento e a participação de Jailson na operação financeira para concretizar a compra do imóvel.

Conforme a investigação, a suposta propina de R$ 300 mil repassada à Sônia teria sido providenciada por Jailson e paga por intermédio da MAC e do advogado Paulo de Tarso.

Rocha, sócio da MAC Construtora e Incorporadorada, teve carros de luxo (uma Ferrari, um Bentley e um Hummer) apreendidos na segunda fase da Capa Dura. Ele também já foi alvo de outras investigações das polícias Civil e Federal por crimes como lavagem de dinheiro.

O advogado Paulo de Tarso acompanhou o depoimento de Jailson à polícia em janeiro, na condição de amigo, quando o empresário foi preso, na primeira etapa da Capa Dura.

Contrapontos
O que diz João Pedro Petek, advogado de Sônia da Rosa:
Nos manifestaremos apenas nos autos.

O que diz Nereu Giacomolli, que defende Jailson Ferreira da Silva:
Só vai se manifestar no processo.

O que diz José Henrique Salim Schmidt, advogado de Paulo de Tarso Dalla Costa:
Informa que já solicitou a oitiva de seu assistido, perante a autoridade policial, para a elucidação dos fatos. Reafirma que ele não tinha ciência que o depósito realizado tivesse ligação com eventual fato ilícito.

O que diz Adriano Bernardes, que defende Marco Antônio Freitas Rocha:
O investigado Marco Rocha não conhece e nunca teve qualquer relação pessoal ou profissional com a secretária da Educação Sônia da Rosa ou com o corretor de imóveis ou com o vendedor. Certamente nenhuma dessas pessoas conhece a pessoa física de Marco Rocha ou de suas pessoas jurídicas.

O cheque que faz a referência a notícia jornalística compensou diretamente na conta corrente de Marco Rocha. Os outros dois pagamentos referem-se a transferências devidamente registradas na contabilidade da empresa. Todas as operações são lícitas.

Afirma ainda que jamais participou ou teve proveito de qualquer procedimento licitatório com a Smed. Por fim, refere que demais esclarecimentos poderão ser dados após ser ouvido pela autoridade policial e que, apesar de se colocar à disposição da Polícia Civil, ainda não foi chamado.

 

Capitão da PM-BA suspeito de participar de esquema de tráfico de armas para facções é solto

O capitão Mauro Grunfeld foi preso preventivamente em maio. Ele e outras 19 pessoas foram alvos de mandados de prisão da Operação Fogo Amigo.

O capitão Mauro Grunfeld, suspeito de participar de um esquema de compra e venda de armas que abastecia facções criminosas na Bahia, foi solto na noite de quarta-feira (17), horas antes da publicação da reportagem “Conversas interceptadas mostram atuação de capitão da PM-BA em esquema de tráfico de armas para facções criminosas, dizem PF e MP” feita pelo g1 e jornal Bahia Meio Dia da TV Bahia.

A decisão foi tomada pela 1ª Vara Criminal da Comarca de Juazeiro, sob a presidência do juiz Eduardo Ferreira Padilha, que concedeu liberdade provisória ao capitão Mauro Grunfeld. O suspeito havia solicitado a revogação de sua prisão preventiva, alegando possuir bons antecedentes e endereço fixo, além da ausência dos requisitos para manutenção da medida cautelar.~

O Ministério Público manifestou-se contra a solicitação, sustentando que as circunstâncias que justificaram a prisão preventiva permaneciam inalteradas. No entanto, o juiz considerou que Grunfeld não ocupava papel de liderança na suposta organização criminosa investigada, sendo passível de responder ao processo em liberdade devido à ausência de antecedentes criminais.

Em sua decisão, o juiz Padilha ressaltou que a prisão preventiva deve ser uma medida excepcional, aplicável apenas quando houver evidências concretas de perigo à ordem pública ou à instrução processual. Citou ainda um precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que permitiu a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares diversas para réus sem papel de destaque em organizações criminosas.

Grunfeld foi liberado sob as seguintes condições:

não alterar seu endereço sem comunicação prévia ao juízo
comparecer a todos os atos processuais
não se ausentar da comarca de sua residência sem autorização e
evitar contato com pessoas relacionadas aos fatos investigados.
O não cumprimento dessas medidas resultará na decretação de nova prisão preventiva. A decisão determinou ainda a emissão do alvará de soltura e a expedição de carta precatória para fiscalização das medidas cautelares.

De acordo com informações da Corregedoria da Polícia Militar, o capitão Mauro Grunfeld responde a processo administrativo disciplinar (PAD), independentemente da apuração de responsabilidade na esfera criminal.

O que aconteceu

Ex-subcomandante da 41ª Companhia Independente (CIPM/Federação-Garcia) e condecorado pela corporação como “policial militar padrão do ano de 2023” pelo “fiel desempenho nos serviços prestados”, Grunfeld foi preso preventivamente em maio. Ele e outras 19 pessoas foram alvos de mandados de prisão da Operação Fogo Amigo, que desvendou o esquema criminoso da organização batizada como “Honda”.

A suposta participação do capitão Mauro Grunfeld no esquema de compra e venda de armas que abastecia facções criminosas na Bahia foi revelada por meio de conversas em aplicativos de mensagens. As informações foram interceptadas pela Polícia Federal, em investigação conjunta com o Ministério Público do Estado (MP-BA).

O capitão nega as acusações. A defesa dele diz que as armas eram compradas para uso pessoal. [Veja os detalhes ao final do texto]

De acordo com a apuração conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco), de Investigações Criminais Norte e das Promotorias Criminais da Comarca de Juazeiro, o capitão era um “contumaz negociador de armas e munições”. Grunfeld foi descrito como o principal remetente de dinheiro para Gleybson Calado do Nascimento, também policial militar da Bahia e apontado como um dos maiores operadores do esquema que movimentou quase R$ 10 milhões entre 2021 e 2023.

Um documento sigiloso, obtido pela TV Bahia, aponta que entre 18 de fevereiro de 2021 e 13 de fevereiro de 2022, o capitão transferiu R$ 87.330,00 para Nascimento. “Os diálogos entre os dois indivíduos não deixam nenhuma dúvida de que os altos valores transacionados, demonstrados abaixo, referem-se à comercialização de armas de fogo e munições. Denota-se, da conversa, que a negociação entre eles é algo permanente, habitual, comum, sem nenhuma formalidade”, indica um trecho do material.

Confira algumas transações:

Em 26 de setembro de 2023, por exemplo, Grunfeld teria negociado com Gleybson. “Manda o pix”, escreveu o capitão, se referindo à chave necessária para a transferência e questionando também o valor.

Em 29 de setembro do ano passado, outra conversa mostrou que Grunfeld também era vendedor. “Apareceu pedido de 5 cartelas de 7.65”, enviou o policial. Ele se referia ao tipo de cartucho para uma pistola.

Em 1º de outubro de 2023, uma nova conversa mostra Gleybson oferecendo um revólver a Grunfeld por R$ 4,5 mil.

A investigação também aponta que essas armas e munições tinham destino específico: “criminosos faccionados que atuam no Bairro do Calabar, em Salvador”. As negociações seriam intermediadas por traficantes de drogas.

Diante desses indícios, Grunfeld foi alvo de mandados de prisão preventiva e busca e apreensão — na Academia da Polícia Militar, na Boa Viagem, e na residência dele, no bairro da Graça, ambos endereços em Salvador. Porém, os agentes encontraram uma pistola sem o devido registro na casa e realizaram a prisão em flagrante.

O capitão alegou que a arma foi adquirida de um policial civil e que a propriedade seria de outra agente, mas disse não saber informar nome ou lotação da servidora. Ele argumentou também que fez a compra porque precisava de defesa pessoal e policiais militares estariam com “dificuldades burocráticas” para obter o artefato.

Esquema de compra e venda de armas

A operação que prendeu 19 pessoas, dentre elas 10 militares, foi deflagrada em 21 de maio. Policiais da Bahia e de Pernambuco, além de CACs (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador) e lojistas, são suspeitos de integrar a organização criminosa especializada em vender armas e munições ilegais para facções criminosas.

Os mandados foram cumpridos em Arapiraca, no estado de Alagoas; em Petrolina, no estado de Pernambuco; e em Juazeiro, Salvador, Santo Antônio de Jesus, Porto Seguro e Lauro de Freitas, na Bahia.

De acordo com a Polícia Federal, o modus operandi do grupo consistia em reter armamentos apreendidos em operações policiais. Ao invés de apresentar o material na delegacia, os suspeitos revendiam essas armas para organizações criminais.

Já a obtenção de armas novas era feita por meio de laranjas. Os investigados pagavam pessoas sem instrução, geralmente da zona rural das cidades e sem antecedentes criminais, para tirar o Certificado de Registo do Exército (CR) — necessário para obtenção do CAC.

Eles custeavam todo o processo para o laranja conseguir o documento. Garantido o registro, a pessoa comprava o artefato em lojas especializadas, também ligadas ao esquema, depois registrava um boletim de ocorrência por furto e dava a arma como extraviada para que não fosse conectada ao comprador final. Se por alguma razão, esse procedimento não fosse feito, o número de série era raspado ou refeito.

Salário de R$ 8 mil e ostentação nas redes sociais

Oficial da PM há 17 anos, o capitão informou que recebe salário fixo de R$ 8 mil. Como bens, declarou apenas ser proprietário de um apartamento, estimado em R$ 700 mil, e possuir R$ 20 mil no banco, em conta poupança.

Seu estilo de vida, no entanto, era luxuoso. Nas redes sociais, o capitão da PM exibia fotos em iates, passeios em restaurantes caros e viagens a destinos turísticos badalados, como a Ilha de San Andrés, na Colômbia.

Flagrante revogado

Ao analisar o caso, a 26ª Promotoria de Justiça Criminal da Capital, área do MP-BA não vinculada à investigação principal, pontuou que “não há qualquer elemento probatório ou mesmo fático que aponte para eventual participação do custodiado em organização criminosa ou que reitere na prática de crimes”.

O órgão ponderou que o procedimento criminal está sob sigilo, o que impede os promotores de acessarem o conteúdo, sendo o juízo da Vara Criminal de Juazeiro o “único órgão julgador que detém o real conhecimento das imputações porventura irrogadas em desfavor do custodiado”. A partir dessas ponderações, em 21 de maio, o MP-BA se pronunciou pela liberdade provisória com pagamento de fiança.

No dia seguinte, na audiência de custódia, a Justiça acatou os argumentos e concedeu o benefício da provisória ao capitão. Mas a juíza em questão não expediu alvará de soltura para que fosse cumprido o mandado de prisão preventiva em aberto. Assim, na mesma data, a preventiva foi cumprida.

Investigação por homicídio doloso

Mauro Grunfeld é alvo ainda de um inquérito por homicídio doloso durante o exercício da função como policial militar. O caso é de 10 de abril de 2013, quando ele era tenente e comandante de uma guarnição da Ceto (Companhia de Emprego Tático Operacional) em atuação no município de Santa Cruz Cabrália.

O registro da ocorrência diz que Grunfeld e outros quatro soldados faziam ronda noturna na Rua A, no bairro 5º Centenário — local descrito como sede de “intenso tráfico de drogas”. Ao se aproximar da área, a guarnição teria sido “recebida a tiros por cerca de quatro a cinco indivíduos, sendo forçada a usar da força necessária, revidando os tiros”.

Um deles seria um jovem de 18 anos, atingido com pelo menos quatro tiros. A corporação o encaminhou para uma unidade de saúde, mas o rapaz já chegou sem vida.

Em depoimentos, a família negou que o rapaz tivesse envolvimento com o crime. O irmão mais novo da vítima, que viu o jovem ser baleado, defendeu que ele teria corrido apenas por medo do tiroteio.

A Polícia Civil concluiu o inquérito sem pedir o indiciamento dos militares. A instituição remeteu o processo ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), tratando o caso como “homicídio privilegiado” — termo usado para situações em que o autor age sob forte emoção ou provocado pela vítima. Esses casos não preveem uma tipificação diferente do crime, mas implicam redução de pena.

Com a Justiça, o processo não avançou muito. Ainda em 2013, o MP-BA apontou “a precariedade e a pobreza dos (pouquíssimos) elementos de convicção colhidos e acostados aos autos do inquérito policial”. Os promotores pediram uma série de providências, como novo exame no local do fato, juntada de fotografias do cadáver e esclarecimentos sobre os disparos que atingiram a vítima.

Dez anos depois, o MP-BA reforçou a cobrança, mas não há registro de que a Delegacia de Santa Cruz Cabrália tenha retomado a investigação até o momento. O g1 e a TV Bahia fizeram questionamentos à Polícia Civil, que não retornou o contato.

O que diz a Secretaria de Segurança Pública

A Secretaria de Segurança Pública da Bahia informou que o cenário levou a pasta a fortalecer o trabalho das corregedorias.

Titular da SSP-BA, Marcelo Werner destacou a criação de um grupo que tem como objetivo o combate a crimes praticados por policiais, a Força Correcional Especial Integrada (Force). “Já foram mais de 10 operações somente da Force, diversos, sem prejuízo das operações realizadas pelas corregedorias próprias”, disse.

“Respeitando todo processo legal, uma vez que haja desvio de conduta, prática de crime por parte do policial, a gente tem sim que fazer investigação e levar eles à Justiça”, afirmou o secretário.

O que diz a defesa dos envolvidos
A defesa de Mauro Grunfeld negou que o capitão comprava armas e que tenha qualquer vínculo com facções criminosas. Exaltou o cliente como profissional exemplar e até apresentou um certificado de policial militar padrão emitido em 2023.

O advogado ainda afirmou que Grunfeld apenas adquiria munições para uso próprio, com o objetivo de aprimorar o treinamento.

“Armamento não, mas munições para uso próprio da atividade policial cotidiana e diária dele, sim. Ele reconhece isso”, disse à TV Bahia.
Questionado sobre conhecimento do cliente a respeito da procedência dessas munições, o advogado Domingo Arjones afirmou que Grunfeld tinha conhecimento de que “estava adquirindo uma munição própria para treinamento”.

Quanto ao inquérito sobre homicídio doloso, o advogado informou que não vai se posicionar pois não obteve acesso ao processo.

Também procurada, a defesa de Gleybson Calado do Nascimento, PM suspeito de ser um dos principais operadores do esquema, disse que impetrou um pedido de habeas corpus e aguarda o posicionamento do Ministério Público Estadual (MP-BA) antes de se posicionar.

Kat Torres, a ex-modelo e influencer brasileira condenada por tráfico humano e escravidão

Mulheres contam como foram traficadas e escravizadas pela ex-modelo e influenciadora, recém-condenada a 8 anos de prisão; BBC entrevista Kat dentro de presídio em Bangu.

Quando duas jovens brasileiras foram consideradas desaparecidas em setembro de 2022, suas famílias e o FBI (polícia federal dos EUA) iniciaram uma busca desesperada para encontrá-las.

Tudo o que sabiam era que elas estavam morando com a influenciadora brasileira Kat Torres nos EUA.

Em 28 de junho de 2024, Kat foi condenada a oito anos de prisão por submeter uma dessas mulheres a tráfico humano e condições análogas à escravidão.

Uma investigação sobre acusações de outras mulheres contra Kat está em curso no Brasil.

O tema é objeto do documentário “Do like ao cativeiro: ascensão e queda de uma guru do Instagram”, publicado no canal da BBC News Brasil no YouTube.

“Para mim ela era uma pessoa de confiança que entendia a minha dor, entendia o que eu estava passando”, diz Ana ao descrever o início de sua relação com Kat após conhecê-la pelo Instagram, em 2017.

Ana não era uma das mulheres desaparecidas que motivaram a busca do FBI – mas também foi vítima da coerção de Kat e foi fundamental no resgate dessas mulheres.

Ela diz que se sentiu atraída pela trajetória de Torres, da infância numa favela em Belém até as passarelas internacionais e as festas com celebridades de Hollywood.

“Ela dizia que já tinha superado vários relacionamentos abusivos e era justamente isso que eu tava buscando”, disse Ana a uma equipe da BBC Eye Investigations e da BBC News Brasil.

Ana estava numa situação vulnerável. Ela diz que teve uma infância violenta, mudou-se sozinha do sul do Brasil para os EUA e já enfrentou um relacionamento abusivo.

Kat Torres havia publicado recentemente o livro autobiográfico A Voz, no qual afirma poder fazer previsões e ter poderes espirituais, e já havia aparecido em programas de TV no Brasil.

“Ela estava em capas de revistas, ela foi vista com pessoas famosas como Leonardo DiCaprio, tudo o que eu vi parecia confiável”, diz ela.

Ana diz que ficou especialmente atraída pela abordagem de Torres sobre espiritualidade.

O que Ana não sabia é que a história inspiradora que Kat contava se baseava em meias verdades e mentiras.

O ator e escritor Luzer Twersky, que dividiu um apartamento com Kat em Nova York, nos contou que a brasileira mudou após frequentar círculos de ayahuasca com amigos em Hollywood.

Originária da Amazônia, a ayahuasca é uma bebida psicodélica considerada sagrada por algumas religiões e povos indígenas.

“Foi quando ela começou a perder o controle”, diz ele.

Twersky disse que também acreditava que Kat estava trabalhando como sugar baby, recebendo dinheiro por envolvimentos amorosos com homens ricos e poderosos – e que bancavam o apartamento que ele dividia com a amiga.

O site de Kat tinha um serviço de assinatura e prometia aos clientes “amor, dinheiro e autoestima com que você sempre sonhou”.

Vídeos dela ofereciam conselhos sobre relacionamentos, bem-estar, sucesso nos negócios e espiritualidade – incluindo hipnose, meditação e programas de exercícios.

Por US$ 150 adicionais (R$ 817), os clientes podiam agendar consultas em vídeo individuais com Kat, com as quais ela dizia ser capaz de resolver qualquer problema.

Amanda, outra ex-cliente, diz que Kat a fez se sentir especial.

“Todas as minhas dúvidas, meus questionamentos, minhas decisões: sempre levava primeiro para ela, para que pudéssemos tomar decisões juntas”, diz Amanda.

Mas os conselhos de Kat podiam levar a mudanças radicais.

Ana, Amanda e outras ex-seguidoras dizem que se viram cada vez mais isoladas psicologicamente de amigos e familiares e dispostas a fazer qualquer coisa que Kat sugerisse.

Quando Kat pediu a Ana em 2019 que se mudasse para a casa dela em Nova York para trabalhar como sua assistente, ela concordou.

Ela estava cursando uma faculdade de Nutrição em Boston, mas, em vez disso, decidiu fazer as aulas virtualmente e diz que aceitou uma oferta para cuidar dos pets de Kat, cozinhar, lavar e limpar por cerca de US$ 2.000 (R$ 10.900) por mês.

Ao chegar ao apartamento de Kat, porém, ela logo percebeu que as condições não correspondiam à perfeição exibida no Instagram.

“Foi chocante porque a casa estava muito bagunçada, muito suja, não cheirava bem”, diz ela.

Ana diz que Kat parecia incapaz de fazer até mesmo as coisas mais básicas, como tomar banho, sozinha, porque não suportava ficar sem a companhia de alguém.

Ela diz que tinha de estar constantemente à disposição de Kat e só podia dormir algumas horas por vez num sofá sujo com urina de gato.

Ela diz que, às vezes, se escondia na academia do prédio para dormir no colchonete de exercícios.

“Agora vejo que ela estava me usando como uma escrava”, diz Ana.

Ela diz ainda que nunca foi paga.

“Senti como se estivesse presa”, diz ela. “Provavelmente fui uma das primeiras vítimas de tráfico humano da Kat.”

Ana havia desistido de sua acomodação universitária em Boston, então não tinha para onde voltar e não tinha renda para pagar por uma moradia alternativa.

Ana conta que Kat, ao ser confrontada, ficou agressiva, o que fez Ana relembrar períodos em que viveu violência doméstica.

Depois de três meses, Ana encontrou uma maneira de escapar e foi morar com um novo namorado.

Mas esse não foi o fim da participação de Ana na vida de Kat.

Quando as famílias de outras duas jovens brasileiras relataram seu desaparecimento em setembro de 2022, Ana sabia que precisava agir.

Naquele momento, Kat estava casada com um homem chamado Zach, um jovem de 21 anos que ela conheceu na Califórnia, e eles moravam numa casa alugada de cinco quartos nos subúrbios de Austin, no Texas.

Repetindo o padrão usado com Ana, Kat tinha como alvo suas seguidoras mais dedicadas, tentando recrutá-las para trabalharem para ela.

Em troca, ela prometeu ajudá-las a realizar seus sonhos, se valendo de informações pessoais íntimas que haviam compartilhado com ela durante suas sessões de coaching.

Desirrê Freitas, uma brasileira que morava na Alemanha, e a brasileira Letícia Maia – as duas mulheres cujo desaparecimento motivou a operação liderada pelo FBI – mudaram-se para morar com Kat.

Outra brasileira, que chamamos de Sol, também foi recrutada.

Kat apresentou nas redes sociais o que chamou de seu “clã de bruxas”.

A BBC descobriu que pelo menos mais quatro mulheres foram quase convencidas a se mudar para a casa de Kat, mas desistiram.

Algumas das mulheres entrevistadas estavam receosas de aparecer num documentário da BBC, temendo receber agressões on-line e ainda traumatizadas por suas experiências.

Mas conseguimos verificar seus relatos usando documentos judiciais, mensagens de texto, extratos bancários e um livro de Desirrê sobre suas experiências, @Searching Desirrê, publicado pela DISRUPTalks (2023).

Desirrê conta que, no caso dela, Kat lhe comprou uma passagem de avião para que deixasse a Alemanha e fosse encontrá-la, citando pensamentos suicidas e pedindo ajuda.

Kat também é acusada de convencer Letícia, que tinha 14 anos quando iniciou sessões de coaching com ela, a se mudar para os EUA para um programa de au pair (babá que mora na residência da família atendida) e depois morar e trabalhar com ela.

Quanto a Sol, ela diz que concordou em ir morar com Kat depois de ficar sem teto e que foi contratada para fazer leituras de tarô e dar aulas de ioga.

Mas não demorou muito para que as mulheres descobrissem que a realidade era muito diferente do conto de fadas que lhes tinha sido prometido.

Em poucas semanas, Desirrê diz que Kat a pressionou a trabalhar em um clube de strip e disse que, se não obedecesse, teria que devolver todo o dinheiro gasto com ela em passagens aéreas, hospedagem, móveis para seu quarto e até mesmo rituais de “bruxaria” feitos por Kat.

Desirrê diz que, além de não ter esse dinheiro, também acreditava na época nos poderes espirituais que Kat dizia ter. Por isso, quando Kat ameaçou amaldiçoá-la por não seguir suas ordens, ela ficou apavorada.

A contragosto, Desirrê então concordou em trabalhar como stripper.

Um gerente do clube de strip-tease, James, disse à BBC que ela trabalhava muitas horas por dia, sete dias por semana.

Desirrê e Sol dizem que as mulheres na casa de Kat em Austin eram submetidas a regras rígidas.

Elas afirmam que foram proibidas de falar entre si, precisavam da permissão de Kat para sair de seus quartos – até mesmo para usar o banheiro – e foram obrigadas a entregar todo o dinheiro que recebiam.

“Era muito difícil sair da situação porque ela ficava com nosso dinheiro”, disse Sol à BBC.

“Foi assustador. Achei que algo poderia acontecer comigo porque ela tinha todas as minhas informações, meu passaporte, minha carteira de motorista.”

Mas Sol diz que percebeu que precisava fugir depois de ouvir um telefonema no qual Kat dizia a outra cliente que ela deveria trabalhar como prostituta no Brasil como “castigo”.

Sol conseguiu sair com a ajuda de um ex-namorado.

Enquanto isso, as armas que o marido de Kat mantinha em casa começaram a aparecer regularmente em posts no Instagram e se tornaram uma fonte de medo para as mulheres.

Nessa época, Desirrê conta que Kat tentou convencê-la a trocar o clube de strip-tease pelo trabalho como prostituta. Ela diz que recusou e, no dia seguinte, Kat a levou de surpresa para um campo de tiro.

Assustada, Desirrê diz que acabou cedendo à exigência de Kat.

“Muitas perguntas me assombravam: ‘Será que eu poderia parar quando quisesse?'”, escreve Desirrê em seu livro.

“E se a camisinha estourasse, eu pegaria alguma doença? Poderia [o cliente] ser um policial disfarçado e me prender? E se ele me matasse?”

Se as mulheres não cumprissem as metas de dinheiro estabelecidas por Kat, que subiram de US$ 1 mil dólares (R$ 5,45 mil) para US$ 3 mil (R$ 16,35 mil) por dia, não eram autorizadas a voltar para casa naquela noite, dizem.

“Acabei dormindo várias vezes na rua porque não consegui bater a meta”, diz Desirrê.

Extratos bancários obtidos pela BBC mostram que Desirrê transferiu mais de US$ 21.000 (R$ 114,5 mil) para a conta de Kat somente em junho e julho de 2022.

Ela diz que foi forçada a entregar uma quantia ainda maior em dinheiro.

A prostituição é ilegal no Texas, e Desirrê diz que Kat ameaçou denunciá-la à polícia quando ela cogitou parar.

Em setembro, amigos e familiares de Desirrê e Letícia no Brasil criaram campanhas nas redes sociais para encontrá-las depois de meses sem contato com as duas.

Nesta altura, elas estavam quase irreconhecíveis. Seus cabelos castanhos foram tingidos de loiro platinado para combinar com os de Kat.

Desirrê afirma que, nesse período, todos seus contatos telefônicos foram bloqueados e que ela obedeceu às ordens de Kat sem questionar.

À medida que a página do Instagram @SearchingDesirrê ganhava força, a história chegou ao noticiário no Brasil.

Os amigos de Desirrê temiam que ela tivesse sido assassinada, e a família de Letícia fez apelos desesperados para que as duas voltassem para casa.

Ana, que morou com Kat em 2019, disse que ficou alarmada assim que viu as notícias. Ela diz ter logo percebido que Kat “estava retendo outras meninas”.

Junto com outras ex-clientes, Ana começou a contatar o maior número possível de agências de segurança, incluindo o FBI, na tentativa de prender a influenciadora.

Cinco meses antes, ela e Sol haviam denunciado Torres à polícia dos EUA – mas dizem que não foram levadas a sério.

Num vídeo que gravou na época como prova e partilhado com a BBC, ouve-se Ana dizendo, em inglês: “Esta pessoa é muito perigosa e já ameaçou me matar”.

Em seguida, foram encontrados perfis das mulheres desaparecidas em sites de acompanhantes e prostituição. As suspeitas de exploração sexual, que circulavam nas redes sociais, pareciam se confirmar.

Em pânico com a atenção da mídia, Kat e as mulheres viajaram mais de 3 mil quilômetros do Texas até o Estado de Maine.

Em vídeos no Instagram, Desirrê e Letícia negaram estar ali contra sua vontade e exigiram que as pessoas parassem de procurá-las.

Mas uma gravação obtida pela BBC indica o que realmente estava acontecendo naquele momento.

A polícia nos EUA monitorava o grupo, e um policial conseguiu entrar em contato com Kat por videochamada para avaliar a situação das mulheres.

Pouco antes do início da conversa, Kat diz no vídeo:

“Ele vai começar a fazer perguntas. Gente, eles são truqueiros. Ele é um detetive, muito cuidado. Pelo amor de Deus, vou te chutar se alguém disser alguma coisa. Eu vou dar um grito.”

Em novembro de 2022, a polícia convenceu Kat e as outras duas mulheres a comparecerem pessoalmente a uma delegacia no Condado de Franklin, no Maine.

O policial que interrogou Kat, Desirrê e Letícia – o detetive David Davol – disse à BBC que ele e seus colegas ficaram preocupados após notarem uma série de sinais, como desconfiança das mulheres em relação aos policiais, seu isolamento e relutância em falar sem a permissão de Kat.

“Traficantes de pessoas nem sempre são como nos filmes, onde você tem uma gangue que sequestra pessoas. É muito mais comum que seja alguém em quem você confia.”

Em dezembro de 2022, as duas mulheres haviam retornado em segurança ao Brasil.

Segundo a ONU, o tráfico de pessoas é um dos crimes que mais crescem no mundo, gerando cerca de US$ 150 bilhões (R$ 817 bilhões) em lucros por ano no mundo.

Ele acredita que as redes sociais oferecem uma plataforma para que traficantes encontrem e seduzam vítimas.

Em abril deste ano, nossa equipe recebeu uma permissão judicial para entrevistar Kat na prisão – a primeira entrevista presencial que ela concede desde que foi presa.

Naquela época, Kat ainda aguardava o resultado de um julgamento relacionado ao caso de Desirrê.

Sorrindo, Kat se aproximou de nós com uma atitude calma e serena.

Ela se disse completamente inocente, negando que qualquer mulher tivesse vivido com ela ou que ela tivesse forçado alguém a se prostituir.

“Eu tive crises e mais crises de riso com tanta mentira que eu escutei. Todo mundo na sala podia ver que as testemunhas estavam mentindo”, afirmou..

“As pessoas me chamam de guru falsa, mas ao mesmo tempo elas falam: ela é muito perigosa. Cuidado com ela, porque ela pode mudar o que as pessoas pensam.”

Quando a confrontamos com as provas que tínhamos visto, ela ficou mais hostil, acusando-nos de também mentir.

“Você pode me ver como Katiuscia, você pode me ver como Kat, você pode me ver como Deus, você pode ver como o que você quiser ver. E você pode pegar o meu conselho ou não, é um problema, uma escolha toda sua”, afirmou.

Ao se levantar para voltar para sua cela, ela sugeriu que logo descobriríamos se ela tinha poderes ou não. Depois apontou para mim e disse: “Eu não gostei dela”.

Em 28 de junho, Kat foi condenada pelo juiz Marcelo Luzio Marques Araújo, da 10ª Vara Federal do Rio de Janeiro, a oito anos de prisão por submeter Desirrê a tráfico humano e condições análogas à escravidão.

O juiz concluiu que Kat atraiu a jovem para os EUA para fins de exploração sexual.

Mais de 20 mulheres relataram terem sido enganadas ou exploradas por Kat – muitas das quais compartilharam suas experiências com a BBC.

Algumas ainda estão em tratamento psiquiátrico para se recuperarem do que dizem ter experimentado em suas relações com Kat.

O advogado de Kat, Rodrigo Menezes, disse à BBC que recorreu da condenação e insiste que ela é inocente.

Uma investigação baseada em denúncias de outras mulheres contra Kat está em curso no Brasil.

Ana acredita que ainda mais vítimas poderão se apresentar, assim que lerem sobre os crimes de Kat. Esta foi a primeira vez que Ana falou publicamente.

Ela diz que seu objetivo é fazer com que pessoas reconheçam que as ações de Kat constituem um crime grave e não um “drama de Instagram”.

Nas páginas finais de seu livro, Desirrê também reflete sobre suas experiências.

“Ainda não estou totalmente recuperada, tive um ano desafiador. Fui explorada sexualmente, escravizada e presa. Espero que minha história sirva de alerta.”

Cantor de bares e churrascarias no Centro-Sul Fluminense consta como sócio de empresa com contratos de R$ 80 milhões de prefeituras do RJ

O RJ2 descobriu que a Blauberg, a empresa da qual, em tese, ele é dono faz parte de um grande grupo econômico, que inclui o IMP, empresa que teve assinaturas de morador de rua e de pessoa que já tinha morrido em Conselho de Administração.

Um homem que se apresenta como cantor e compositor nas redes sociais e faz posts sobre a vida dura de artista sem fama consta em registros como sócio da Blauberg, uma empresa com R$ 80 milhões em contratos com as prefeituras de Mesquita e Belford Roxo para a terceirização de pessoal.

Patrick Giovanni Santi Gonçalves de Barros se apresenta em bares e churrascarias no Centro-sul Fluminense. Ele aparece em vídeos nas redes sociais entoando músicas como “Seja mais você”, do Grupo Raça. Em janeiro, desabafou em um posto contra quem chora por descontos ao contratar músicos.

O RJ2 descobriu que a Blauberg, a empresa da qual, em tese, ele é dono faz parte de um grande grupo econômico.

Um conglomerado que soma quase um bilhão de reais em contratos com prefeituras, principalmente na Baixada Fluminense.

Entre as empresas estão a Icap, a Itanhangá e o Instituto de Medicina e Projeto – o IMP, responsável por administrar unidades de saúde.

O RJ2 já mostrou que o IMP ficou conhecido como “a empresa sem dono” – isso porque o presidente e o diretor negam integrar a empresa.

No papel sócio fundador da Blauberg, Patrick mora em uma casa simples no interior do estado, em Miguel Pereira.

O RJ2 tentou contato com ele, também pelo telefone, mas ele não recebeu a equipe.

Patrick informou à Receita Federal viver em uma residência que fica em um terreno com quatro casas, sem entrada independente, numa rua simples, cheia de imóveis com tijolos aparentes.

Já pra ser dono da Blauberg, teria feito um aporte de R$ 250 mil.

Um vizinho diz que Patrick se mudou recentemente pra morar com a mãe e desconhece a vida de empresário do cantor.

Um dia depois da viagem à Miguel Pereira, a equipe do RJ2 ligou para o músico. A ligação estava boa, até que foi mencionado o nome da Blauberg. Nesse ponto, a equipe não conseguiu mais contato.

Testemunho de advogado é elo entre as empresas
As empresas de grupo econômico do imp têm outra semelhança, além da dificuldade de achar o chefe: o advogado Rafael Bittencourt Licurci de Oliveira testemunhou a fundação de todas elas.

Há 2 meses, o RJ2 perguntou a ele quem é o verdadeiro dono por trás da empresa, mas não obteve resposta.

Na época, ele informou que teve uma participação pontual ao assinar uma alteração contratual.

Mas a assinatura de Rafael aparece em cinco documentos do IMP, junto a de pessoas que em tese integrariam o conselho de administração da empresa.

Uma especialista ouvida pelo RJ2 diz assinaturas de pessoas do conselho foram falsificadas.

Um dos membros do conselho de administração do IMP era uma pessoa em situação de rua. Outro já estava morto quando, supostamente, assinou um documento.

Rafael Bittencourt é investigado pela Polícia Federal, suspeito de lavagem de dinheiro.

Os investigadores dizem que a movimentação financeira dele é incompatível com o salário que recebe.

Ele é amigo de longa data do secretário estadual de saúde, Doutor Luizinho. Foi funcionário da pasta, advogado da campanha de Doutor Luizinho e contratado pelo político quando reeleito deputado federal.

O amigo do atual secretário ainda foi contratado pelo parlamentar em 2018, quando a empresa dele recebeu R$ 340 mil pelo aluguel de um carro ao deputado.

Advogado descobre outras ligações
Rafael foi dono da Ralic, uma empresa de fornecimento de remédios, que recebeu mais de R$ 2,6 milhões do estado e também é investigada pela PF.

Hoje, o nome dele não aparece na administração de nenhuma empresa, mas a assinatura consta na fundação das empresas do grupo econômico do Imp: Icap, da Itanhanga e Blauberg.

O que serviu de prova para um advogado que conseguiu comprovar na Justiça que todas as empresas eram uma só.

“Eu comecei a comparar as atividades feitas pro todas empresas, endereços, advogados em comum, funcionarios em comum os funcionarios dessas empresas circulavam entre as empresas. Tenho clientes aqui no escritorio que trabalhavam para a IMP com carteira anotada pela Blauberg e recebia pelo Icap. Tem pessoas que trabalham para a Icap, com carteira assinada com a Blauberg e eram pagos pelo Imp e assim sucessivamente”, diz o advogado Carlos Eduardo Bayeux.

“Descobri que um escritório de advocacia eles atuavam em 3 das 4 empresas. Um dos sócios do escritorio de advocacia operou em algum periodo as operações financeiras da Itanhanga”, acrescenta.

Trata-se de Raphael Cadete, que é um dos sócios do C. Medeiros Advogados. O escritório leva o nome de Luiz Carlos Huaik Gerhard de Medeiros, o Cacauzinho Medeiros. Ele é amigo de infância do secretário estadual de saúde, Doutor Luizinho.

As investigações
O Ministério Público apura a relação de dirigentes do IMP com agentes políticos. O Tribunal de Contas investiga o desperdício de dinheiro público nos contratos. As investigações contra a empresa que ficou conhecida como “sem dono” continuam.

“O maior enigma desse trabalho agora é descobrir esse monstro invisível. Quem é o sócio oculto? Com uma investigação forte da Polícia Federal e do Ministerio Público com certeza a gente vai conseguir chegar a esse sócio oculto”, afirmou.

O que dizem os citados
O RJ2 pediu um posicionamento ao Instituto de Medicina e Projeto, mas não obteve retorno. A produção não conseguiu contato com as empresas Icap, Itanhangá e Blauberg.

O secretário estadual de saúde, Doutor Luizinho, disse que desconhece as atividades profissionais de Rafael Bittencourt e que nada tem a ver com as atividades do IMP. Disse ainda que a empresa jamais teve contrato com a secretaria de saúde.

Rafael Bittencourt afirmou que desafia quem quer que seja a comprovar que falsificou qualquer tipo de documento. Disse ainda que nunca foi sócio, advogado ou procurador do IMP e que os valores da locação de veículos para Doutor Luizinho eram compatíveis com os praticados no mercado.

O RJ2 não teve retorno de Cacauzinho Medeiros.

Empresário vítima de esquema de criptomoedas ganha na Justiça direito de ser indenizado e receber dinheiro de volta

A 13ª Vara Cível de Fortaleza declarou a nulidade de negócio jurídico firmado entre um empresário cearense e Marcel Mafra Bicalho, suposto consultor financeiro e investidor, determinando a restituição de R$ 250.000,00, além da indenização de R$ 10.000,00 por danos morais. Além de Bicalho, foram condenadas de maneira solidária as empresas de compra e venda de criptomoedas, onde foram depositados os investimentos da parte autora.

“São notórios os fatos que envolveram a atuação do primeiro réu (Marcel Bicalho) como suposto consultor financeiro e investidor naquilo que viria a ser elucidado como uma grande fraude. Ao que tudo indica, nunca houve investimentos reais, mas apenas um esquema de pirâmide, criado para atrair as vítimas, convencendo-as a depositar valores na expectativa de lucros atraentes e irreais. Ou seja, a plataforma de investimentos e os fictícios contratos de prestação de serviços de assessoria financeira se materializaram como um ilícito desde a origem”, explica na sentença a magistrada Francisca Francy Maria da Costa Farias.

O empresário, autor da ação, fez o investimento de todas as suas economias, inclusive vendendo alguns objetos de trabalho e pessoais para fins de arrecadação de dinheiro e investimentos, com homem conhecido como Marcello Mattos (codinome adotado por Marcel Mafra Bicalho), suposto especialista em mercado financeiro. A promessa é que o retorno dos investimentos seria bimestral, sendo 100% no primeiro investimento e 60% nos seguintes.

No final de 2017, os réus lançaram um novo investimento, com prazo de seis meses, que renderia 512%. O réu, Marcello, ministrava cursos de investimentos, custando R$ 5.000,00 e depois aumentou para R$ 10.000,00, tendo o autor feito estes cursos.

Em 2019, no entanto, o Grupo Anti-Pirâmide (GAP) lançou um alerta sobre ilegalidades na operação dos réus, o que fez com que várias pessoas tentassem retirar seu dinheiro investido sem sucesso. Os réus não devolveram o dinheiro, alegando várias desculpas, como um suposto bloqueio do dinheiro.

EMPRESAS CONDENADAS

Após o alerta, foi descoberto o nome original do réu e que as contas usadas para depósito eram através das empresas Comprebitcoins Serviços Digitais, D de Souza Paula-Me, Taynan Fernando Aparecido dos Santos Bonin, Partners Intermediação e Serviços On-Line Ltda e M.G. Investimento em Tecnologia Ltda.

Ainda em 2019, o autor entrou com ação, pedindo entre outras coisas, a condenação de Marcel e todas as empresas participantes a devolução do valor de R$ 250.000,00 e a condenação em R$ 10.000,00 (dez mil reais), referente aos danos morais sofridos.

Em suas manifestações, as empresas se defenderam alegando ilegitimidade passiva, pois afirmam que não há relação alguma entre os réus e o autor, também argumentando que tinham Marcel Mafra como cliente e apenas intermediavam e prestavam serviços para ele. A tese foi rejeitada pelo juízo.

Na sentença, a juíza detalhou que todos os réus terão obrigação no ressarcimento. “A responsabilidade pelos danos causados aos consumidores em razão de defeito na prestação do serviço é de natureza objetiva e solidária, encontrando-se prevista no art. 18 do CDC. Nessa ordem de ideias, todos os réus são responsáveis pela obrigação de devolver à parte autora o valor comprovadamente repassado. A responsabilidade pelo ressarcimento dos valores é de todos os réus, em conjunto, pois partícipes da relação de consumo, integrando a cadeia de fornecedores”.

Para a magistrada, “nenhum dos beneficiados pelos depósitos comprova de modo adequado a contraprestação ou o destino dado ao dinheiro, o que só reforça a tese da conjunção de esforços para lesar o autor, aplicando-se ao caso o disposto no artigo 942 do Código Civil”.

A magistrada confirmou também a tutela de urgência anteriormente deferida, com algumas alterações, para determinar a realização imediata de novo bloqueio via SISBAJUD, na modalidade “teimosinha”, nas contas dos réus, além de nova pesquisa via RENAJUD. Além disso, determinou a anotação de intransferibilidade de imóveis via CNIB de propriedade de Marcel Mafra Bicalho que estejam registrados junto ao Cartório do 2º Registro de Imóveis de Montes Claros/MG, devendo ser Oficiado o referido Cartório ou qualquer outro cartório.

TJCE

Delegado é condenado por desvio de dinheiro para comprar churrasqueira

Por desvio de finalidade no uso de verbas públicas e consequente prejuízo ao erário, um delegado de polícia de Forquilhinha/SC e dois funcionários terceirizados daquela repartição foram condenados por atos de improbidade administrativa.

Eles teriam utilizado de modo indevido valores oriundos de convênio firmado entre o município de Forquilhinha, a Secretaria de Segurança Pública e Defesa do Cidadão do Estado e a Polícia Militar de Santa Catarina, denominado ”convênio de trânsito”. O dano ao erário alcançou mais de R$ 16 mil em valores da época. A decisão é da juíza Elaine Veloso Marraschi, titular da vara única da comarca de Forquilhinha.

Segundo a denúncia, a partir da análise de documentos de 2009 e 2012, constatou-se a existência de irregularidades no emprego das verbas com a aquisição de bens e serviços estranhos aos previstos no art. 320 do CTB, a exemplo de churrasqueira, forno elétrico, liquidificador, gêneros alimentícios, materiais de limpeza e outros produtos.

O art. 320 do CTB dispõe que “a receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito será aplicada, exclusivamente, em sinalização, em engenharia de tráfego, em engenharia de campo, em policiamento, em fiscalização, em renovação de frota circulante e em educação de trânsito”.

A grande quantidade de materiais de limpeza adquiridos, segundo depoimentos, nunca teria chegado à delegacia, pois tal quantidade de itens não caberia no almoxarifado do local, que tem o tamanho de apenas um armário. “Desta forma, além do desvio de finalidade, por terem sido comprados itens diversos do objetivo do convênio, também está comprovada a devida perda patrimonial do ente público, pois não é sabido o fim dos produtos adquiridos, os quais certamente não foram parar na Delegacia de Polícia”, anotou a magistrada.

O delegado de polícia à época e os dois funcionários terceirizados, responsáveis pelas compras da delegacia, foram condenados ao ressarcimento integral solidário do dano, no valor de R$ 16.162,25, acrescido de juros e correção monetária; à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos; ao pagamento individual de multa civil na monta do prejuízo causado ao erário; e proibidos de contratar com o poder público ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.

Veja a decisão.

Informações: TJ/SC.

Operação Persona: dois envolvidos em esquema bilionário de sonegação viram réus por lavagem de dinheiro

Empresário e auditor aposentado comandavam empresas de fachada utilizadas para fraudar importação de eletrônicos

A pedido do Ministério Público Federal em São Paulo, a Justiça Federal instaurou mais uma ação penal contra dois envolvidos em um esquema bilionário de sonegação de tributos descoberto pela Operação Persona em 2007. O empresário Cid Guardia Filho e o auditor fiscal aposentado Ernani Bertino Maciel responderão ao processo por lavagem de dinheiro. Ambos foram responsáveis pela ocultação de R$ 33,5 milhões em operações fraudulentas entre 2004 e 2008.

A quantia é apenas parte do montante que deixou de ser pago à Receita Federal na importação de produtos eletrônicos dos Estados Unidos. Nas pontas das transações estavam a fabricante norte-americana Cisco System Inc. e a real importadora no Brasil, a Mude Comércio e Serviços Ltda.. As operações de compra e venda entre as duas eram intermediadas por uma série de empresas de fachada sob o controle de laranjas e offshores ligadas a Cid e Ernani.

Essas firmas fantasmas simulavam entre si a aquisição e a revenda dos produtos para ocultar o verdadeiro destinatário e o valor efetivamente pago. O subfaturamento das vendas da Cisco permitia às empresas integrantes do esquema no Brasil sonegarem os impostos que incidiriam sobre o preço real das mercadorias. Segundo cálculos da Receita, o total de tributos não recolhidos devido às fraudes chega a R$ 1,5 bilhão.

Lavagem – Cid e Ernani praticaram uma série de fraudes para ocultar a origem do dinheiro recebido ilicitamente. A maior parte da quantia foi lavada com a simulação de contratos de prestação de serviços e operações de distribuição de lucros. Os réus ainda utilizaram os recursos para comprar dois imóveis em Ilhéus, na Bahia, registrados em nome de empresas de fachada das quais eram sócios.

Ambos já respondem a outra ação penal, oferecida pelo MPF logo após a deflagração da Operação Persona. Em 2011, a Justiça Federal os condenou a mais de cinco anos de prisão por descaminho e uso de documentos falsos. Ernani também é réu em uma ação de improbidade administrativa. Em 2013, ele foi condenado ao pagamento de multa equivalente a 36 vezes o valor da remuneração que recebia e teve sua aposentadoria cassada.

Homem escondeu lucros de crimes no valor de mais de US$ 1 milhão em contas de cassino

Um homem que viajou para alguns dos maiores casinos da Austrália e depositou grandes quantias de dinheiro confessou-se culpado de lidar com produtos do crime avaliados em mais de 1 milhão de dólares.

As pilhas de dinheiro, embrulhadas em elásticos ou escondidas em caixas, que ele carregava para os cassinos de Queensland e NSW foram sua ruína. A Polícia Federal Australiana iniciou uma investigação após ser alertada sobre seu comportamento.

Andre Gimenez Barbosa, 36, se confessou culpado na Suprema Corte de Brisbane na quarta-feira por uma acusação de tráfico de produtos do crime no valor de US$ 1 milhão ou mais.

Barbosa foi condenado a seis anos de prisão, mas terá direito à liberdade condicional após cumprir um ano.

A juíza Helen Bowskill disse que levou em consideração a falta de outros antecedentes criminais de Barbosa, seu bom caráter, sua cooperação com os detetives e suas boas perspectivas de reabilitação.

Barbosa foi preso em 11 de dezembro de 2018, após agentes federais executarem um mandado de busca e apreensão.

A investigação policial começou em agosto de 2018, quando a AFP foi alertada sobre grandes depósitos feitos no The Star Casino em Sydney e na Gold Coast, bem como no Treasury Casino em Brisbane.

O tribunal ouviu que Barbosa depositou mais de US$ 914 mil por meio de “contas de dinheiro adiantado” nos cassinos de 7 de agosto a 22 de novembro de 2018.

Ele também viajou para a Nova Zelândia 14 vezes, onde depositou US$ 90.000 no cassino SkyCity em Auckland, mas transferiu mais de US$ 720.000 de volta para suas contas australianas.

O tribunal foi informado de que Barbosa usou seu negócio, Max Study, descrito no Facebook como uma agência educacional que ajuda estudantes internacionais a encontrar cursos e solicitar vistos, como parte da infração.

O tribunal ouviu que ele conduzia seus negócios por meio de aplicativos de mensagens instantâneas, registrados em nome de outra pessoa e configurados para excluir mensagens um minuto após serem enviadas.

Andre Gimenez Barbosa era brasileiro, mas agora é cidadão australiano.

Andre Gimenez Barbosa era brasileiro, mas agora é cidadão australiano.

Durante interrogatórios policiais, Barbosa disse que não sabia a origem do dinheiro que movimentava, mas sabia que os responsáveis ​​​​o estavam usando porque não queriam que nada fosse registrado oficialmente.

Ele disse aos detetives que achava que o dinheiro provavelmente vinha “das coisas erradas” e que tinha “sempre suas suspeitas de que não pode ser um bom dinheiro”.

Ele disse à polícia para onde enviaria o dinheiro e como, e admitiu que deveria ter perguntado de onde veio o dinheiro.

Barbosa – originalmente de São Paulo, no Brasil, mas agora cidadão australiano – usou contas bancárias controladas por brasileiros e australianas.

“Envolvia o recebimento e a eliminação de dinheiro, depósitos bancários e transferências bancárias de vários clientes, tanto pessoalmente quanto para contas bancárias que você controlava na Austrália e no Brasil”, disse o juiz Bowskill na quinta-feira.

“Você então remeteu esse dinheiro para destinatários na Austrália e no Brasil usando o sistema de transferência Hawala, aceitando dinheiro na Austrália e creditando a conta indicada no Brasil com o valor equivalente e vice-versa.

“Inicialmente você ofereceu esse serviço aos estudantes para pagar taxas de cursos ou para enviar dinheiro de ou para o Brasil. Mas em diversas ocasiões você foi abordado por pessoas desconhecidas que queriam remeter quantias significativas de até US$ 100 mil para contas no Brasil.”

A acusação acarretava até 25 anos de prisão.

O tribunal ouviu que ele tinha dois filhos pequenos com uma mulher checa que conheceu na Austrália. Após a sua detenção, ela levou as crianças para a República Checa, para onde ele planeava mudar-se após a sua libertação.

Jovem, articulado e ‘herdeiro’ de chefe do PCC: Japa entra na mira da polícia

O duplo homicídio de Anselmo Becheli Santa Fausta e de Antonio Corona Neto, no fim de dezembro de 2021, na zona leste de São Paulo, trouxe à tona a nova dinâmica do crime organizado paulista. A partir dos dois assassinatos, a polícia de São Paulo confirmou apurações em andamento sobre a chefia em liberdade do PCC (Primeiro Comando da Capital) e descobriu novas informações que podem ser relevantes para investigações futuras e outras que estão em andamento.

A Polícia Civil e o MP (Ministério Público) sabiam da importância de Becheli, mas nunca tiveram seu paradeiro descoberto até a morte dele. Sem ser batizado pela facção paulista, ele era um megatraficante com foco na venda de cocaína para fora do país. Respeitado pelo crime organizado de São Paulo, ele mantinha negócios com o PCC. Neto, este sim integrante do PCC, era motorista de Becheli. Para tentar esclarecer a motivação das mortes, porém, é necessário entender como as peças de xadrez da facção estão se movimentando.

 

A primeira suspeita do DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa) era que Becheli e Neto tinham sido mortos a mando de um corretor de imóveis e de um empresário de criptomoedas porque Becheli havia entregado ao corretor 100 milhões de dólares para que o dinheiro fosse investido em bitcoins. No entanto, o traficante pediu o dinheiro de volta. A hipótese era que, sem o valor em mãos, o corretor e o empresário mandaram matá-lo. O corretor está preso preventivamente. O empresário, representado por um dos melhores — e mais caros — advogados do país, foi liberado.

Quem apertou o gatilho contra Becheli e Neto, em 27 de dezembro do ano passado, quando os dois criminosos saíam do apartamento onde o traficante vivia, no Jardim Anália Franco, na zona leste de São Paulo, foi assassinado dias depois. Como recado da organização criminosa, a cabeça do atirador foi deixada em uma praça, próximo de onde havia ocorrido o duplo homicídio. O PCC iniciou uma caçada aos atiradores. Mas, assim, abriu brechas para quem investiga a organização criminosa.

Ao ser preso pela polícia, em 8 de fevereiro deste ano, o corretor de imóveis negou que tenha mandado matar Becheli — e, consequentemente, Neto. Mas afirmou que foi submetido a um tribunal do crime, em janeiro, no Tatuapé. O corretor foi chamado por um criminoso identificado como Cigarreiro — que seria o atual chefe do PCC na favela da Caixa D’Água, na zona leste — para “conversar” em uma casa no Tatuapé. Ao chegar ao local marcado, o corretor afirmou à polícia que ficou sequestrado durante 9 horas. Nesse período, disse ter sido constantemente ameaçado de morte.

O que a facção paulista não acreditava era que o corretor tivesse identificado à polícia os criminosos que estavam no tribunal. Entre eles, segundo o corretor, estavam: Cláudio Marcos de Almeida, conhecido como Django, o agente de jogadores de futebol Danilo Lima de Oliveira, chamado de Tripa, e Rafael Maeda Pires, o Japa. Django foi assassinado em janeiro deste ano e teve o corpo deixado debaixo do viaduto Vila Matilde, na zona leste. Tripa está foragido. E Japa, segundo investigadores, acendeu alertas de suas atividades criminosas para a segurança pública paulista.

Japa era morador da região do Parque São Jorge, também na zona leste da capital, e ascendeu aos poucos dentro da facção criminosa paulista. Até 2018, ele era apontado como o braço direito de Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, morto no início daquele ano pelo PCC como queima de arquivo. Antes de ser assassinado, coube a Cabelo Duro o plano da facção paulista de matar Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, e Fabiano Alves de Souza, o Paca, que estariam desviando dinheiro do tráfico internacional a partir do porto de Santos (SP).

Em 2016, Japa conheceu Cabelo Duro quando arrendou uma casa noturna localizada na zona leste de São Paulo. Japa se tornou gerente do estabelecimento e se aproximou muito de Cabelo Duro. A proximidade foi tanta que as famílias dos dois passaram a viajar juntas com frequência, com destinos como Ilha Bela (SP), Angra dos Reis (RJ) e cidades do exterior.

Cabelo Duro era dono de uma produtora musical, que tinha contrato com artistas de funk e de pagode. Quem gerenciava o esquema da lavagem de dinheiro na casa noturna e em outros esquemas de São Paulo e Baixada Santista, segundo investigadores, era o Japa — à época, chamado de Rafa.

Além disso, Japa também era responsável por coordenar os pilotos contratados por Cabelo Duro para voos de lazer com os helicópteros, o que durou até a morte dele, em 2018. Paralelo a isso, um policial, que é o principal suspeito de ter atirado em Cabelo Duro, afirmou à Polícia Civil, em depoimento, que seu verdadeiro patrão era uma pessoa chamada Rafael. E com o apelido “Japa”.
O suspeito de ter matado Cabelo Duro afirmou que esse “Japa” era um traficante de drogas vinculado à Baixada Santista. À época do depoimento, a polícia documentou ter entendido que o policial entregou seu patrão após ter se sentido abandonado. Um outro policial militar testemunhou à polícia que costumava ver o PM suspeito de ter atirado em Cabelo Duro prestando serviços de motorista e de escolta a Japa.

Suspeita-se que Japa tenha sido submetido a um tribunal do crime em 2018, pelo fato de ser muito ligado a Cabelo Duro, mas conseguiu ser liberado. Com o tempo, ele ganhou respeito, notoriedade e subiu degraus dentro da facção paulista. Depois da morte de Cabelo Duro, chamou a atenção de investigadores a proximidade entre Japa e Becheli, o megatraficante assassinado em dezembro de 2021. A polícia suspeita que ele se manteve realizando o mesmo tipo de atividade, mudando apenas o patrão. De acordo com a Polícia Civil, ele realizava “serviços financeiros” a Becheli até o fim do ano passado.

Foragido e jovem, com apenas 29 anos, Japa também é piloto de automobilismo e já competiu em pequenos campeonatos. Hoje, é tido como herdeiro de Cabelo Duro. A polícia tenta entender, agora, o que ele herdará de Becheli e quais serão suas próximas movimentações no tabuleiro do crime organizado de São Paulo. A reportagem não conseguiu localizar a defesa de Rafael Maeda Pires.