Rede de barbearias era usada para lavar dinheiro do tráfico de drogas e de extorsões no RS, diz polícia

Conforme apurado pela Polícia Civil, moradores de loteamento de Viamão eram obrigados a pagar mensalidades para suposta regularização. Investigações apontaram que em dois anos e meio o esquema movimentou cerca de R$ 33 milhões. Oito pessoas foram presas.

A Polícia Civil desarticulou, nesta quinta-feira (25), um esquema de lavagem de dinheiro do tráfico de drogas e também de extorsões praticadas contra moradores de um loteamento de Viamão, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Oito pessoas foram presas.

”Além de explorar o tráfico de drogas naquela localidade, ainda cobravam mensalidade dos moradores. Os que não pagassem eram ameaçados, alguns foram agredidos, outros até foram expulsos do local”, relata o diretor da Divisão de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro, delegado Cassiano Cabral.

A mensalidade, de R$ 326, era destinada à Associação Comunitária Habitacional da Chácara da Figueira. A justificativa era de que o dinheiro seria usado para regularização da área, que tem 600 lotes. Os moradores eram iludidos com a promessa de proteção jurídica, no caso de uma reintegração de posse.

Três pessoas foram titulares da conta bancária em nome da associação. A partir da análise da movimentação financeira do grupo, a polícia descobriu que a suposta entidade era, na verdade, uma fachada para lavagem de dinheiro do tráfico. O dinheiro sustentava a compra de armas e drogas.

”O dinheiro desses contribuintes da comunidade de Viamão ia para uma conta principal. Essa conta acolhia dinheiro ,e o dinheiro dali era pulverizado em diversas outras contas, de pessoas físicas e jurídicas”, explica o titular da Delegacia de Repressão a Lavagem de Dinheiro, Filipe Bringhenti.

Com o rastreamento da movimentação entre essas contas, a polícia descobriu que parte do dinheiro ia para uma rede de barbearias, comandada por Erick Berkai Fernandes. Nas redes sociais, ele ostenta um patrimônio milionário, com motos e carros de luxo. O homem se apresenta como empreendedor de origem humilde, que em pouco tempo expandiu os negócios apenas com o corte de cabelo, abrindo oito filiais em Porto Alegre e mais duas no Rio de Janeiro.

Erick está entre os oito presos pela Polícia Civil nesta quinta. Também foram feitas buscas em uma corretora de investimentos, na zona norte de Porto Alegre. A suspeita é que um dos sócios tenha ligação com o homem.

A defesa de Erick afirma que ainda não teve acesso ao conteúdo do inquérito policial. O advogado acrescenta que ”a medida de prisão é desproporcional, uma vez que o crime que o crime de lavagem de dinheiro vem divorciado de violência ou grave ameaça, sendo cabível a substituição da prisão por medidas cautelares”.

R$ 33 milhões em dois anos e meio
As investigações apontaram que o esquema movimentou cerca de R$ 33 milhões em dois anos e meio. Foram identificadas contas em nome de 68 pessoas, entre físicas e jurídicas.

Com autorização da Justiça, a polícia conseguiu o bloqueio de R$ 1 milhão em cada uma dessas contas. A investida contra o patrimônio da quadrilha ainda inclui o bloqueio de imóveis avaliados em R$ 7 milhões. Treze veículos foram apreendidos.

Santander perde no Carf processo contra cobrança de R$ 9 bilhões

Moisés de Sousa Carvalho: caso é peculiar por tratar de cobrança de IRRF em ganho de capital com incorporação de ações envolvendo não residente

O Banco Santander perdeu uma disputa de R$ 9 bilhões com a Receita Federal no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). O processo, que envolve a compra do ABN Amro, é o de segundo maior valor no órgão. A instituição financeira pretende recorrer.
A decisão é da 2ª Turma da 4ª Câmara da 2ª Seção, que manteve, por voto de qualidade (desempate pelo presidente), autuação fiscal lavrada em 2013. O auto cobra Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre valores de ganho de capital decorrentes da operação de incorporação de ações em que o Santander obteve o controle acionário do Banco ABN Amro. A incorporação foi realizada em 2009.
A compra do ABN Amro envolveu um consórcio de bancos -o Royal Bank of Scotland (RBS), o Santander espanhol e o Fortis. Foi criado o grupo RFS Holding para adquirir as ações da instituição financeira globalmente. A fatia brasileira foi adquirida pelo Santander Brasil.

Com a operação, os ativos foram reavaliados e foi apurado ganho de capital que, para a fiscalização, deveria ser tributado por Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF). O Santander, por sua vez, alega que não houve acréscimo patrimonial.

O julgamento (processo nº 16327.720550/2013-29) estava suspenso desde outubro. Na ocasião, estava empatado. Mas teve que ser reiniciado por causa de uma mudança na composição da turma. Apesar de os conselheiros que já haviam votado terem repetido suas posições, com a leitura de votos e sustentações orais, a análise demorou mais de quatro horas.

Prevaleceu o voto divergente, do conselheiro Ronnie Soares Anderson, representante da Fazenda. Para ele, há ganho de capital na operação. A transferência de ações, segundo ele, caracteriza alienação e foi superior ao custo de aquisição.
A tese não é nova e esse é o entendimento que tem prevalecido no Carf, acrescentou o conselheiro. O voto foi acompanhado por todos os conselheiros representantes da Fazenda.

O relator do caso, conselheiro Jamed Abdul Nasser, representante dos contribuintes, ficou vencido. Em seu voto, afirmou que
o caso tem elementos peculiares. Um deles é o fato de o suposto beneficiário ser pessoa jurídica domiciliada no exterior, o que transfere a responsabilidade de recolhimento de IRRF à pagadora, no caso, o Santander.

Mas a sociedade adquirente, segundo ele, não tentou lucrar com a compra e venda de títulos de participação societária, apenas com a atividade das empresas, que passaram a atuar juntas. Para ele, não há aumento de renda com a incorporação de ações. Portanto, não haveria incidência de IRRF. Como a riqueza não teria se realizado, não haveria o fato gerador (ato ou fato que motiva a tributação).

Os representantes dos contribuintes seguiram o relator, que ficou vencido. Após o julgamento, o coordenador de atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no Carf, Moisés de Sousa Carvalho, destacou a mesma peculiaridade levantada pelo relator: tratar-se de cobrança de IRRF em ganho de capital com incorporação de ações envolvendo não residente.
São mais comuns os casos de residentes, de acordo com a procuradora Lívia de Queiroz, que fez a sustentação oral no caso. Ainda segundo ela, esse foi o segundo julgamento em que o Carf rejeitou a alegação de que o pagamento com ações impediria a cobrança do participante da operação que está no Brasil, como substituto tributário.

O banco deve recorrer de decisão. Em nota, informou que vai apresentar os recursos cabíveis na própria instância administrativa. “Mesmo após empate dos votos dos membros do Conselho, o resultado foi desfavorável ao banco devido ao chamado voto de qualidade”, diz a nota.

De acordo com advogados do banco, devem ser apresentados embargos de declaração. Posteriormente, pode ser proposto recurso à Câmara Superior -última instância do Carf.

Esse é um dos processos de valor mais alto no Carf. Acima desse caso, só há uma cobrança de R$ 22,92 bilhões contra o Itaú Unibanco. A autuação discute a fusão entre os bancos, em 2008. Nesse caso, a instituição financeira venceu a disputa, que poderá ser analisada pela Câmara Superior. O caso foi julgado pela 1ª Turma da 2ª Câmara da 1ª Seção (nº 16327.720680/2013-61).