Corpo carbonizado, marido preso e crime premeditado: o que se sabe sobre morte de cantora gospel na Bahia

Sara Mariano foi encontrada com corpo carbonizado em área de matagal na Região Metropolitana de Salvador, após ficar três dias desaparecida.

A cantora gospel Sara Freitas Sousa Mariano, de 35 anos, foi encontrada morta na última sexta-feira (27), às margens da BA-093, na região de Dias D’Ávila, cidade da Região Metropolitana de Salvador. Ela ficou desaparecida por três dias e teve o corpo reconhecido pelo marido, Ederlan Mariano, segundo informações da Polícia Civil, que investiga o caso.

Ederlan foi preso no sábado (28), após confessar o crime. O g1 tentou contato com a defesa do suspeito, mas não obteve retorno. Veja o que se sabe e o que falta esclarecer sobre o caso:

Quem era Sara Mariano?

Sara Mariano tinha 35 anos e era casada com Ederlan Mariano, com quem tinha uma filha de 11 anos. O casal, que morava no bairro de Valéria, na capital baiana, e comandava a “TV Shalom”, canal na internet que tem 256 mil inscritos e produz conteúdos voltados para o público evangélico.

A cantora gospel tinha mais de 50 mil seguidores em um dos perfis nas redes sociais e compartilhava ministrações de cultos, vídeos de louvores e fotos pessoais.

Em publicações, Sara Mariano mostrava momentos em que cantava para fiéis e pregava em palcos e praças. O trabalho artístico dela era empresariado pelo marido.

Quem são os suspeitos?

O marido de Sara Mariano foi preso na madrugada de sábado (28), após confessar ter cometido o crime, de acordo com a Polícia Civil. Conforme consta na decisão da Justiça, a prisão é temporária, com prazo de 30 dias. Também foi decretado um mandado de busca domiciliar na casa do suspeito.

No pedido de prisão temporária, o delegado Euvaldo Costa, responsável pelo caso, informou ao juiz Antônio Marcelo Oliveira Libonati, que Ederlan Mariano “deixou clara a intenção de destruir as possíveis provas que estavam armazenadas no celular da vítima e prejudicar as investigações dos fatos, bem como impedir a aplicação da lei pena”.

Investigações da Polícia Civil apontam a participação de mais de uma pessoa na morte da cantora gospel, contudo, o delegado Marcos Tebaldi, coordenador do Departamento de Polícia Metropolitana (Depom), disse que os nomes desses outros envolvidos não podem ser divulgados para não atrapalhar as investigações.

O corpo foi encontrado em uma área de mata às margens da BA-093, em Dias D’Ávila, na Região Metropolitana de Salvador. Ederlan Mariano, marido de Sara, foi até o local e reconheceu o corpo como sendo o dela. Ele disse ter encontrado um anel e uma sandália da esposa no cadáver, que estava parcialmente queimado.

Apesar disso, a Polícia Civil informou que o Departamento de Polícia Técnica (DPT) ainda vai confirmar a identidade do corpo junto à mãe, Dolores Freitas, que chega em Salvador nesta segunda (30). No domingo (29), Soraia Correia, irmã de Sara, chegou a Salvador para reconhecer e liberar o corpo da vítima, que segue no Instituto Médico Legal (IML) da capital baiana.

Apesar da viagem, Soraia não conseguiu reconhecer e liberar o corpo de Sara. Segundo o advogado, houve um “conflito nas informações documentais”. Por isso, a mãe delas, Dolores Freitas, sairá do Maranhão, onde mora, para fazer o procedimento com toda a documentação necessária na Bahia.

O crime foi planejado?

O delegado Euvaldo Costa informou que Ederlan Santos Mariano planejou o feminicídio há pelo menos um mês. Apesar de ter dado poucas informações sobre o caso, para não atrapalhar as investigações, o delegado explicou que há indícios de que a premeditação iniciou no dia 24 de setembro, quando o casal teria passado por um suposto desentendimento.

A versão da premeditação também é sustentada pelo advogado da família de Sara, Marcus Rodrigues.

Como Sara foi morta?
O delegado Euvaldo Costa informou que ainda não foi possível descobrir se Sara Mariano foi morta queimada ou teve o corpo incendiado após ser assassinada.

Segundo o delegado, o modus operandi dos autores do crime só será descoberto após a Polícia Civil ter acesso ao laudo de necrópsia.

No domingo, o advogado Marcus Rodrigues também comentou essa situação.

“O corpo foi carbonizado e é necessário o exame da necropsia, para saber se essa carbonização foi antes, durante ou após a morte, e até para saber se houve outros crimes, como asfixia, lesão corporal, se houve disparo de arma de fogo ou golpe de arma branca. Nesse exame a gente vai saber a total realidade do fato criminoso, e pode demorar. Por isso, creio que não vai ser liberado amanhã”, explicou.

O que dizem a família e o advogado da vítima?
Logo após o desaparecimento, Ederlan Mariano informou que não sabia o nome e o evento para onde a evangélica foi antes de sumir. Antes de ser encontrado o corpo, a irmã dela, Soraia Correia, afirmou que não acreditava na versão apresentada pelo marido da cantora gospel.

A mãe de Sara, Dolores Correia, afirmou que, na véspera do desaparecimento, Sara disse que precisava conversar um assunto sério, mas não teve oportunidade de revelar o que era.

O advogado Marcus Rodrigues, que representa a família da vítima, afirmou que Ederlan Mariano teria forçado relações sexuais contra a vontade de Sara, e disse que ela era agredida de diversas formas pelo marido.

“O casal vivia um relacionamento tóxico. Ederlan a agredia, não somente verbalmente, como fisicamente também. Ele bebia muito, chegava em casa a agredindo e forçava a Sara a ter relações sexuais”, comentou o advogado.
O jurista também mencionou um áudio que Sara gravou para a irmã, Soraya Correia, em que a vítima dá a entender que o marido é uma pessoa nervosa, de temperamento instável e que queria comprar uma arma. [Ouça abaixo]

Cantora gospel encontrada morta na Bahia diz em áudio que marido queria comprar arma

O que falta esclarecer?
A Polícia Civil ainda precisa esclarecer se há mais suspeitos envolvidos no crime, além de Ederlan Mariano, marido da cantora gospel, que confessou o crime. Além disso, não há informações se Sara foi morta queimada ou teve o corpo incendiado após ser assassinada.

Também não há detalhes sobre quando Sara foi morta, se foi no dia do desaparecimento ou quando o corpo dela foi encontrado parcialmente carbonizado.

 

Ministério Público abre investigação contra prefeito de Martinópolis após denúncia de vereadores

Homem supostamente ligado ao chefe da administração municipal teria oferecido dinheiro para parlamentares votarem a favor de um projeto de lei, de autoria do Poder Executivo, que autorizava a Prefeitura a fazer um empréstimo milionário.

O Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP) abriu uma investigação contra o prefeito de Martinópolis (SP), Marco Antonio Jacomeli de Freita (Republicanos), após denúncias de que ele estaria envolvido em um suposto ato de corrupção ativa.

A acusação foi protocolada na Promotoria de Justiça da cidade pelos vereadores Alexandre Peres Cangussu (União), Alzair da Silva Lopes (União), Gabriel Valões Santos (Cidadania) e Leandro da Silva Valentim (PV).

No documento, os vereadores Alzair Lopes e Leandro Valentim alegam ter sofrido uma tentativa de aliciamento por um homem, supostamente de Brasília (DF), que teria oferecido R$ 50 mil para cada um caso votassem a favor de um projeto de lei, de autoria do Poder Executivo, que autorizava a Prefeitura a fazer um empréstimo de R$ 18.800.000. O dinheiro seria utilizado, segundo o projeto de Marco Freita, para obras de recapeamento na cidade.

Promotoria
À TV Fronteira, o promotor de Justiça Daniel Tadeu dos Santos Mano disse que os fatos e as provas apresentadas serão analisados.

Explicou, ainda, que isso pode levar à instauração de um inquérito civil ou procedimento investigativo para apurar a prática de ato de improbidade administrativa por parte de um agente público e outra pessoa envolvida.

O promotor também afirmou que poderá ser requisitada a instauração de um inquérito policial para apuração de possíveis delitos decorrentes dos mesmos fatos.

‘Esquema’
De acordo com a representação dos vereadores, existem provas de que o suposto aliciador teria se encontrado com o prefeito dias e até minutos antes da última sessão ordinária na Câmara Municipal, realizada em 16 de outubro de 2023, quando foi apreciado o projeto de lei para o empréstimo milionário.

Os denunciantes afirmam que existem áudios, fotos e vídeos do encontro, que foram também anexados no documento entregue ao Ministério Público Estadual.

Segundo o parlamentar, o possível aliciador também teria prometido aos vereadores a vantagem de escolher ruas e bairros que receberiam a pavimentação, “caso topassem entrar no esquema”.

Rejeição unânime
O projeto de lei pedindo autorização do Poder Legislativo para o empréstimo de quase R$ 19 milhões entrou em votação na 32ª sessão ordinária. Durante a reunião, a situação do possível aliciamento foi trazida a plenário por vereadores.

A proposta ainda previa uma operação de crédito, através da Agência de Fomento do Estado de São Paulo, o Desenvolve-SP, para as obras de pavimentação e recapeamento na cidade.

Por unanimidade, a proposta foi rejeitada pela Casa de Leis.

“No decorrer da votação, surgiram algumas denúncias. Foi rejeitado [projeto de lei] por 10 votos contrários, não teve nenhum favorável. A Câmara deu suporte, com seu corpo técnico, aos vereadores nessa representação ao Ministério Público e vai continuar dando esse suporte”, ressaltou à TV Fronteira o presidente da Câmara de Vereadores, José Elizeo Lourenço da Silva.

Outro lado
O prefeito de Martinópolis não quis gravar entrevista, mas, em nota, o setor de comunicação da Prefeitura disse não ter recebido denúncia formal sobre o assunto e que vai cooperar com as autoridades que investigam o caso.

“Acreditamos na importância de uma apuração justa, imparcial e sem cunho político dos fatos para esclarecer a verdade e manter a confiança da população em nossa administração”.

A TV Fronteira procurou o prefeito Marco Freita na Prefeitura de Martinópolis, na tarde desta quarta-feira (18), porém, foi informada de que ele estava em uma viagem.

O que se sabe sobre a prisão de dentista acusado de estupro no DF

Gustavo Najjar, que trabalha com harmonização facial, foi preso em 12 de setembro após denúncia de paciente; DNA dele foi encontrado no corpo da vítima. Defesa afirma que ‘não houve os ilícitos cogitados prematuramente pela autoridade policial’.

O dentista Gustavo Najjar, de 38 anos, especializado em harmonização facial, foi preso no dia 12 de setembro por estupro. A vítima, uma mulher de 33 anos, procurou a Polícia Civil do Distrito Federal e denunciou ter sido violentada dentro do consultório dele, em um shopping do Plano Piloto, em Brasília, no dia 17 de agosto.

Najjar foi formalmente indiciado pelo crime de estupro e teve a prisão temporária decretada por 30 dias. Ele está na Divisão de Controle e Custódia de Presos da Polícia Civil e, segundo a corporação, pode ser transferido para a Penitenciária da Papuda caso a prisão seja convertida em preventiva.

A defesa de Najjar afirma que “não houve os ilícitos cogitados prematuramente pela autoridade policial” (veja nota completa mais abaixo).

De acordo com a polícia, o DNA encontrado no corpo da mulher que acusa o dentista de estupro é de Najjar. O dentista também é suspeito de importunar sexualmente outras sete mulheres.

Veja abaixo o que se sabe até agora sobre a prisão do dentista:

Como ocorreu o estupro, segundo a vítima de 33 anos
DNA de material biológico colhido no corpo da vítima é do dentista, diz polícia
Qual o ‘modus operandi’, conforme a polícia, e quem são as outras vítimas
O que diz a defesa do dentista Gustavo Najjar

Como ocorreu o estupro, segundo a vítima de 33 anos

A mulher de 33 anos que fez a primeira denúncia contra Gustavo Najjar disse à polícia que conheceu o dentista por meio de uma rede social. Segundo ela, durante as conversas, ele disse que poderia “resolver insatisfações que ela tinha com a aparência”, já que é especialista em harmonização facial.

Conforme a investigação, no dia 17 de agosto Najjar marcou uma consulta, às 18h, no consultório. “Ele me passou muita confiança. Ele passa confiança […] Pra mim era uma avaliação, que deveria ser normal”, diz a mulher (veja vídeo acima).

A vítima lembra que contou ao dentista que fez outros procedimentos estéticos e que Gustavo Najjar perguntou sobre “sensibilidade”. Então, ele pediu para ver as cicatrizes.

“Ele falou ‘preciso ver onde abriu ponto, onde sangrou, a sua sensibilidade’ […] Ele foi fazendo perguntas que pra mim tinham coerência”, conta a mulher.
O dentista perguntou sobre uma cicatriz de um procedimento que a vítima havia feito na região das pernas. Foi quando ele pediu que a mulher virasse de costas e disse que precisava “ver a sensibilidade”. A mulher conta que, então, Najjar deu dois tapas em suas nádegas.

“Nessa hora em que já ia virando, ele veio por trás como se ele me abraçasse. Ele veio por trás e me fechou.[…] Eu lembro que eu subi, acho que eu subi em torno de umas três vezes a minha calça. Ele descia. E eu não conseguia, não sabia o que fazer. Aí ele me virou rápido na mesa dele e houve a penetração”, diz.

A mulher afirma que, após o estupro, o dentista seguiu a consulta normalmente e ainda zombou dela.

“Na hora em que eu saí eu vi que ele tinha arrebentado a minha calça. Ele foi na frente, tinha um espelho, eu vi. Eu perguntei se tinha uma blusa, alguma coisa pra tapar. Ele falou ‘Fui eu?’ E riu” , diz a vítima.

DNA de material colhido no corpo da vítima é do dentista, diz polícia
Depois do crime, a vítima procurou a polícia. Ela fez exames no Instituto Médico Legal (IML) e foram colhidas amostras de material biológico do seu corpo.

O laudo do Instituto de Médico Legal foi concluído na última semana e confirmou que a mulher sofreu lesão corporal compatível com abuso sexual. O exame também atestou a presença de espermatozoides no material biológico colhido da vítima e um outro procedimento detectou a presença de espermatozoides nas roupas dela.

Os resultados ficaram prontos na última sexta-feira (22). Conforme a Polícia Civil do DF, o DNA desse material é do dentista que teve amostras coletadas no dia da prisão.

“O laudo de confronto de material genético realizado pelo IPDNA/PCDF e que foi concluído na data de ontem atestou que o material biológico coletado na vítima de estupro possuía DNA idêntico ao do investigado”, disse a Polícia Civil no sábado (23).
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‘Modus operandi’ e outras vítimas
O dentista, de acordo com a polícia, não realizava mais consultas odontológicas, apenas procedimentos estéticos como harmonização facial. Conforme a investigação, Gustavo Najjar tinha um “modus operandi” que se repetiu na maioria dos casos:

O primeiro contato era realizado nas redes sociais.
Depois, o dentista oferecia uma avaliação e dizia que iria “encaixar” um horário na clínica. A consulta era marcada depois do último paciente, quando os funcionários iam embora.
Na avaliação para harmonização facial, ele pedia para a mulher se despir para mostrar o processo de cicatrização ou flacidez do corpo.
Neste momento, ocorria o abuso sexual.
Além da mulher de 33 anos que fez a primeira denúncia, outras sete pessoas procuraram a polícia, conforme o delegado João Ataliba:

Uma jovem de 21 anos e contou que o abuso sexual ocorreu na segunda-feira (11), um dia antes do dentista ser preso.
No depoimento, ela disse que após conversar Najjar pela internet foi ao consultório para fazer uma avaliação para um procedimento estético. Segundo ela, durante a avaliação, Gustavo Najjar pediu para examinar seu corpo e tentou tocar suas partes íntimas, mas ela o impediu.

Ao sentar na cadeira para fazer o procedimento, o dentista pegou a mão da jovem e a colocou no órgão genital dele. Depois, ele agiu normalmente, sem demonstrar culpa, disse a vítima.

Uma mulher, de 31 anos, contou ter sido abusada em dezembro de 2022, durante um curso ministrado pelo dentista em Fortaleza, no Ceará.
Conforme a denúncia, Najjar pediu que ela ficasse dentro da sala de aula durante o intervalo do curso, para que ele pudesse avaliar uma cirurgia que ela havia feito nos seios. Ele informou, segundo a mulher, que a avaliação seria “estritamente profissional”.

No entanto, o dentista pegou em um seio da vítima e passou a acariciá-lo. Ela disse que tentou deixar a sala, mas foi impedida pelo homem, que a segurou e tentou beijá-la. Ele só liberou a vítima quando ela disse que estava calma.

Uma mulher de 44 anos também procurou a Polícia Civil do Distrito Federal e disse ter sido abusada em 2020, no consultório de Najjar, durante um procedimento estético.
Ela afirmou aos policiais que foi medicada para fazer um procedimento e que ficou “lenta”. Conforme o depoimento, o dentista perguntou se ela tinha colocado silicone e se tinha ficado com alguma flacidez.

A vítima disse que estava confusa com a medicação ingerida e que não se recordava de como as coisas foram acontecendo. Mas lembrava de estar em pé, em frente a um espelho, com o dentista a abraçando por trás, com as mãos em seus seios.

Outras quatro vítimas entraram em contato com a delegacia de forma anônima
Elas não formalizaram a denúncia. Segundo o delegado, as vítimas disseram ter medo de “repercussão social, da família e profissional”.

O que diz a defesa do dentista Gustavo Najjar
O dentista Gustavo Najjar, preso em 12 de setembro, foi interrogado no dia 14 de setembro e ficou em silêncio, segundo o delegado da 5ª DP, João Ataliba. Ele foi formalmente indiciado pelo crime de estupro e teve a prisão temporária decretada por 30 dias.

Najjar está na Divisão de Controle e Custódia de Presos da Polícia Civil, em Brasília e, de acordo com o delegado, pode ser transferido para a Penitenciária da Papuda caso a prisão seja convertida em preventiva.

No sábado (23), a defesa de Gustavo Najjar afirmou, em nota, que repudia, com veemência, o que chama de vazamento parcial de trechos da investigação, que corre em segredo de justiça e que não houve o crime cogitado prematuramente pela autoridade policial.

A defesa disse ainda que a divulgação dessas informações configura ilícito grave e que vai tomar medidas legais contra os agentes públicos que, segundo a defesa, estão criando um sensacionalismo irracional para antecipar um julgamento sobre os fatos em apuração.

Leia a íntegra da nota

“A defesa de Gustavo Naijar repudia, com veemência, o vazamento parcial de trechos da investigação que corre em segredo de justiça. Não houve os ilícitos cogitados prematuramente pela autoridade policial.

A defesa não vai comentar os detalhes do processo em respeito ao sigilo dos autos.

O que podemos adiantar mais uma vez é que não houve crime e que já existem provas robustas sobre isto, o que torna o vazamento parcial de informações gravíssimo.

A divulgação de informações escolhidas pelos agentes públicos encarregados do inquérito, além de configurar ilícitos graves, busca criar sensacionalismo irracional para antecipar um julgamento sobre os fatos em apuração.

Todas as medidas legais estão sendo tomadas para responsabilizar os agentes públicos que, mesmo advertidos, insistem em transgredir a lei, e que assumem, de forma deliberada, o risco dos resultados de sua conduta irresponsável.

Por fim, a defesa vai postular no Juízo competente que seja então autorizado, dada a divulgação parcial e despropositada de informações direcionadas, e para se garantir a paridade de tratamento, a divulgação das provas existentes em favor do seu cliente – o que não se pode revelar agora sem expressa autorização judicial em razão do sigilo dos autos e da exposição da intimidade de outras pessoas envolvidas na investigação.”

Exame de DNA confirma presença de material biológico do dentista preso por estupro de paciente, no DF

Gustavo Najjar, que trabalha com harmonização facial, foi preso em 12 de setembro, após denúncia de paciente. Depois, outras sete mulheres procuraram polícia para prestar queixa contra dentista, que atendia em shopping no centro de Brasília. Defesa de Najjar afirma que ‘não houve os ilícitos cogitados prematuramente pela autoridade policial’.

A Polícia Civil do Distrito Federal confirmou, neste sábado (23), que o DNA encontrado no corpo da mulher que acusa o dentista Gustavo Najjar de estupro é do investigado. O dentista, especialista em harmonização facial, foi preso no dia 12 de setembro e também é suspeito de abusar sexualmente de outras sete mulheres.

“O laudo de confronto de material genético realizado pelo IPDNA/PCDF e que foi concluído na data de ontem atestou que o material biológico coletado na vítima de estupro possuía DNA idêntico ao do investigado”, diz a Polícia Civil.
A defesa de Najjar afirma que “não houve os ilícitos cogitados prematuramente pela autoridade policial’ (leia íntegra da nota mais abaixo).

O dentista, que completou 38 anos, cumpre mandado de prisão temporária na Divisão de Controle e Custódia de Presos da Polícia Civil. Ele foi formalmente indiciado pelo crime de estupro e, caso condenado, estará sujeito a uma pena de 6 a 10 anos de prisão, aponta a polícia.

Um laudo do Instituto de Médico Legal (IML) também confirmou que a vítima que denunciou Gustavo Najjar sofreu lesão corporal compatível com abuso sexual. Além disso, o exame atestou a presença de espermatozoides no material biológico colhido da vítima.

Outro procedimento detectou a presença de sêmen nas roupas da mulher. Essas evidências foram confrontadas com o material genético do dentista e os exames deram positivo.

As denúncias contra o dentista
A mulher de 33 anos que fez a primeira denúncia contra Najjar disse ter sido molestada durante uma consulta de avaliação para realizar o procedimento de harmonização no rosto. Segundo ela, o dentista pediu que ela mostrasse todas as outras cirurgias estéticas que já havia feito.

Ainda de acordo com a mulher, após olhar todo o corpo dela, Najjar deu um tapa em suas nádegas. Depois, a agarrou e a estuprou.

Segundo a 5ª DP, o IML constatou que havia presença de vestígios de violência sexual e que o zíper da calça da mulher tinha sido arrebentado.

A segunda vítima, de 31 anos, contou ter sido abusada em dezembro de 2022, durante um curso ministrado pelo dentista em Fortaleza, no Ceará.

De acordo com a Polícia Civil do DF, Gustavo Najjar pediu para a vítima ficar dentro da sala de aula durante o intervalo do curso, para que ele pudesse avaliar uma cirurgia que ela havia feito nos seios. Ele informou, segundo a investigação, que a avaliação seria “estritamente profissional”.

No entanto, o dentista pegou o seio da vítima e passou a acariciá-lo. A mulher disse que tentou deixar a sala, mas foi impedida pelo dentista, que a segurou e tentou beijá-la. Ele só liberou a mulher quando ela disse que estava calma.

A terceira vítima que procurou a polícia tem 44 anos e disse ter sido abusada em 2020, no consultório de Najjar, durante um procedimento estético. Ela afirmou aos policiais que foi medicada para fazer um procedimento e ficou “lenta”.

De acordo com ela, o dentista também perguntou se ela tinha colocado silicone e se tinha ficado com alguma flacidez. A vítima disse que estava confusa com a medicação ingerida e não se recorda de como as coisas foram acontecendo, mas se recorda de estar em pé, em frente a um espelho, com o autor a abraçando por trás com as mãos em seus seios.

Outras quatro vítimas entraram em contato com a delegacia de forma anônima e não quiseram se identificar. Segundo o delegado, sofreram abuso e não querem denunciar pois têm medo de “repercussão social, da família e profissional”.

“Mesmo assim procurem a delegacia, registrem ocorrência policial, façam a denúncia contra ele para estar reforçando e fortalecendo outras mulheres”, diz o delegado.

‘Modus operandi’
O dentista, de acordo com a polícia, não realizava mais consultas odontológicas, apenas procedimentos estéticos como harmonização facial. O delegado destaca que Gustavo Najjar tinha um modus operandi que se repetiu na maioria dos casos. Veja abaixo:

O primeiro contato é realizado nas redes sociais.
Depois, o dentista oferece uma avaliação e diz que vai encaixar em um horário na clínica. A consulta é marcada depois do último paciente e quando os funcionários já foram embora.
Na avaliação para harmonização facial, ele pede para a mulher se despir para mostrar processo de cicatrização ou flacidez do corpo.
Neste momento, ocorre o abuso sexual.
Em nota, o Conselho Regional de Odontologia do Distrito Federal (CRO-DF) afirmou que repudia “qualquer manifestação de violência, sobretudo quando se trata de alegações de abuso sexual”.

O conselho informou ainda que não foi notificado oficialmente sobre o caso e que, assim que receber a notificação, “realizará a apuração minuciosa, rigorosa e imparcial dos fatos, assegurando aos envolvidos todas as garantias constitucionais e legais”.

Nota da defesa de Gustavo Najjar

“A defesa de Gustavo Naijar repudia, com veemência, o vazamento parcial de trechos da investigação que corre em segredo de justiça. Não houve os ilícitos cogitados prematuramente pela autoridade policial.

A defesa não vai comentar os detalhes do processo em respeito ao sigilo dos autos.

O que podemos adiantar mais uma vez é que não houve crime e que já existem provas robustas sobre isto, o que torna o vazamento parcial de informações gravíssimo.

A divulgação de informações escolhidas pelos agentes públicos encarregados do inquérito, além de configurar ilícitos graves, busca criar sensacionalismo irracional para antecipar um julgamento sobre os fatos em apuração.

Todas as medidas legais estão sendo tomadas para responsabilizar os agentes públicos que, mesmo advertidos, insistem em transgredir a lei, e que assumem, de forma deliberada, o risco dos resultados de sua conduta irresponsável.

Por fim, a defesa vai postular no Juízo competente que seja então autorizado, dada a divulgação parcial e despropositada de informações direcionadas, e para se garantir a paridade de tratamento, a divulgação das provas existentes em favor do seu cliente – o que não se pode revelar agora sem expressa autorização judicial em razão do sigilo dos autos e da exposição da intimidade de outras pessoas envolvidas na investigação.”

 

Juiz do caso Americanas é investigado por corrupção

O Monitor do Mercado teve acesso a documentos que mostram acusações graves envolvendo o juiz e até mesmo administradores judiciais nomeados por ele para a Americanas

O juiz responsável pela recuperação judicial da Americanas — após a empresa encontrar um rombo de pelo menos R$ 20 bilhões em suas contas — é acusado de participar de um esquema de corrupção, que, segundo o Ministério Público, tem características típicas dos casos de lavagem de dinheiro.

O magistrado Paulo Assed Estefan, titular da 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, aprovou, na última quinta-feira (19), a recuperação judicial da Americanas (AMER3), com dívida declarada de R$ 43 bilhões. A decisão foi tomada poucas horas depois de a empresa fazer o pedido à Justiça.

O instituto da recuperação serve para travar cobranças, facilitar as negociações e permitir à empresa colocar-se de volta nos trilhos.

Monitor do Mercado teve acesso a documentos que mostram acusações graves envolvendo o juiz, em processo que corre no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

As denúncias contra Paulo Estefan apontam que ele privilegiaria amigos e parentes na hora de nomear administradores para empresas em recuperação judicial.

O administrador judicial é responsável por fiscalizar os atos da empresa em recuperação e por fazer com que o plano de recuperação judicial seja cumprido, da forma que foi acordado com os credores. Ele é nomeado pela Justiça e recebe (normalmente bem) para isso.

Acontece que um dos administradores judiciais nomeados para atuar em casos julgados por Estefan é casado com uma sócia do filho do próprio juiz em pelo menos três empresas (uma distribuidora de bebidas, um restaurante e uma companhia de delivery).

As investigações apontam uma “inexplicável e promíscua relação empresarial ligando membros da família do magistrado e a própria esposa de um administrador judicial em atuação perante a Vara Empresarial [da qual Estefan é titular]”.

Para o Ministério Público, as investigações têm circunstâncias típicas de crimes de lavagem de capitais e outros delitos.

Nenhuma das três empresas nas quais a esposa do administrador judicial e o filho do juiz possui empregados cadastrados, indicando que são “empresas de papel”, comumente usadas para “justificar” um aumento de patrimônio que seus sócios não podem declarar legalmente, diz documento do Ministério Público, acessado pelo Monitor do Mercado.

A acusação detalha transações financeiras do administrador judicial em questão e de sua esposa que seriam incompatíveis com seus ganhos. São cifras milionárias. “Não faltam elementos que indiciem a prática dos ilícitos apurados”, afirma o MP.

Caso aberto

As investigações levaram à abertura de dois procedimentos contra o juiz. Um deles foi arquivado. O outro chegou a ser arquivado por um “erro de sistema”, mas voltou a andar em outubro, por determinação do Corregedor Nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, e segue em curso.

O ex-corregedor-geral de Justiça do TJ-RJ, Bernardo Garcez, responsável pelas investigações que deram início aos processos, diz ter encontrado vários “indícios de irregularidades nos relacionamentos entre magistrados, administradores judiciais, escritórios de advocacia e, especialmente, participação de esposas e filhos de juízes em empreendimentos mercantis associados a esposas e advogados que operavam nas varas onde os juízes eram titulares”.

Além disso, explica Garcez, existem investigação criminais contra Estefan e outros juízes investigados pelo mesmo motivo, que ainda tramitam no Órgão Especial do TJ-RJ.

Ao Monitor do Mercado, um advogado que atuou no caso arquivado, representando outro juiz acusado, aponta que foi declarada a nulidade de todas as investigações iniciadas contra os juízes, porque o CNJ teria constatado “inúmeras ilegalidades cometidas pelo então Corregedor-Geral do TJ-RJ, em especial (i) a ampliação indevida do escopo de um mero processo administrativo que possuía como objeto a melhoria na gestão de uma Vara Empresarial, e (ii) a atuação parcial e maliciosa, numa especulativa perseguição contra os magistrados e seus familiares”.

Em resposta a pedido de informações e entrevista, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro afirma que não pode comentar o caso que ainda corre, pois ele está em segredo de Justiça. 

A corte fez questão de reafirmar que o outro caso foi arquivado por problemas em sua origem e de ressaltar o currículo de Paulo Assed.

“O juiz Paulo Assed Estefan faz parte, como integrante eleito, aprovado por unanimidade, do FONAREF- Fórum Nacional de Recuperações Empresariais e Falências do próprio Conselho Nacional de Justiça, que tem por objetivo fiscalizar e elaborar estudos, além de propor medidas para o aperfeiçoamento da gestão de processos de recuperação judicial”, afirma nota do tribunal ao Monitor do Mercado.  

O desembargador Bernardo Garcez, corregedor à época das primeiras investigações,  já negou publicamente as acusações de que a investigação tenha sido problemática e aponta a existência das outros processos em curso como prova de que o caso é real.

Administradores judiciais da Americanas

No caso das Americanas, o juiz Paulo Estefan nomeou como administradores judiciais, para atuarem já durante o período da cautelar, a empresa Preserva-Ação, na pessoa de seu sócio administrador Bruno Rezende, e o Escritório de Advocacia Zveiter.

A nomeação do mesmo Bruno Rezende já fez a Justiça suspender, temporariamente, outro caso julgado por ele — e de grande interesse de investidores—: a recuperação judicial da João Fortes Engenharia (JFEN3).

Há pouco mais de dois anos, a recuperação da construtora, foi suspensa pela segunda instância da Justiça do RJ, porque os honorários a serem pagos para o administrador, seriam “excessivos”. Rezende receberia R$ 9,7 milhões. O Ministério Público sugeria que o valor justo seria bem menor: R$ 1,9 milhão.

O caso voltou a andar e a empresa continuou na função de administradora.

O outro escritório nomeado como administrador judicial da Americanas tem como um de seus sócios Sérgio Zveiter, ex-deputado, acusado de receber caixa 2 da chamada máfia dos transportes do Rio de Janeiro, na delação de Lélis Teixeira, ex-presidente da Fetranspor (Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro). Na mesma delação, ele diz pagar propina para nove desembargadores do TJ-RJ.

Entenda o caso Americanas

Quem tinha R$ 1 mil reais em ações da Americanas (AMER3) no início do dia 12 de janeiro foi dormir com menos de R$ 96 na conta, no fim do dia. Os papéis perderam 76% do seu valor em poucas horas de negociação.

A Bolsa bem que tentou segurar, suspendendo as negociações das ações por boa parte do dia, para acalmar os ânimos, mas a queda brutal no preço vai entrar para a história do mercado de capitais brasileiro, num mau sentido.

Tudo começou na noite de quarta-feira (11), quando a empresa emitiu um comunicado ao mercado, afirmando que fora detectado um rombo estimado em R$ 20 bilhões em suas contas.

E R$ 20 bilhões não desapareceram da noite para o dia. A empresa afirmou serem inconsistência em lançamentos ao longo de anos. Se não bastasse a cifra bilionária, a informação levou investidores a se questionarem se não há outros “esqueletos no armário”, ou seja, erros até então não encontrados.

No mesmo documento, a Americanas anunciou a renúncia de Sergio Rial ao cargo de CEO e de André Covre à posição de CFO e Diretor de Relações com Investidores. Os executivos estavam há 9 dias no cargo.

Corrida pelo dinheiro

Dias antes de aceitar o pedido de recuperação judicial da Americanas, na sexta-feira (13), Estefan já havia determinado que fosse suspensa toda e qualquer possibilidade de bloqueio, sequestro ou penhora de bens da empresa, assim como adiou a obrigação da companhia de pagar suas dívidas até que um provável pedido de recuperação judicial fosse feito à Justiça. O único banco credor que conseguiu uma decisão para “pular” esse bloqueio antes do início da recuperação foi o BTG Pactual.

O banco, que tem cerca de R$ 1,2 bilhão a receber da empresa, afirmou que ao ir à Justiça pedir tal blindagem, a rede agiu como um menino que, “após matar o pai e a mãe, pede clemência aos jurados por ser órfão”.

Todo o imbróglio, dentro e fora do Judiciário, não tem agradado em nada os investidores. As ações AMER3, que custavam R$ 11,80 no último dia 11, hoje já são negociadas abaixo de R$ 0,90.

Quem paga a conta?

A insegurança dos investidores reflete também na auditoria responsável por aprovar as contas da empresa. Como mostrou reportagem do Monitor do Mercado, os balanços foram aprovados “sem ressalvas” pela PricewaterhouseCoopers, ou PwC.

Entre as maiores do mundo, ela também “deixou passar” em suas auditorias as fraudes e desvios da Petrobras, descobertos na operação ‘lava jato’; e a situação insustentável da Evergrande, que colapsou o mercado imobiliário chinês.

Ela é uma das chamadas “Big Four”, ou seja, as quatro maiores auditorias do mundo, que são responsáveis por analisar as contas de quase todas as empresas que têm ação em Bolsa. E especialistas afirmam que elas podem ser responsabilizada por prejuízos causados a investidores, se ignoraram problemas nas contas.

Ao Monitor do Mercado, o presidente da Abradin (Associação Brasileira dos Investidores), Aurélio Valporto, disse já estudar medidas cabíveis junto à CVM e ao Ministério Público para apurar a responsabilidade dos auditores, e controladores (atuais e anteriores) no prejuízo que investidores terão.
 
“A primeira coisa que me chamou a atenção foi a absoluta incompetência dos auditores. Este fato lesa enormemente o patrimônio dos investidores e mina a credibilidade do mercado de capitais nacional”, afirma Valporto.

Também ouvidos pelo Monitor do Mercado, advogados especialistas na área de mercado de capitais apontam que a Americanas deve ter um longo e difícil caminho de disputas com seus investidores.
 Pedro Almeida, especialista em Contencioso Empresarial e Arbitragem no GVM Advogados, afirma que a responsabilização dos diretores e conselheiros é bem provável neste caso, mas dificilmente será suficiente para cobrir os prejuízos sofridos pelos investidores.
 
Como a legislação brasileira, ao contrário da estadunidense, não prevê a responsabilidade da própria companhia por danos causados pela sua administração, uma alternativa é pleitear a responsabilização dos auditores independentes, por se tratar de uma questão contábil. “No exterior, existem alguns precedentes que permitem cogitar essa possibilidade”, diz Almeida. 

Empresa pede reparação por abusos em operação da PF

Chegou à Justiça Federal do Distrito Federal mais um desdobramento de uma investigação “célebre” da Polícia Federal. A holandesa Agrenco BV, holding e sócia controladora da hoje em recuperação judicial Agrenco do Brasil, entrou com pedido de reparação contra a União, pelos efeitos devastadores da investigação que foi apelidada de “operação influenza” pela PF. A companhia pede R$ 734 milhões por danos materiais e morais decorrentes das apurações.

A operação foi conduzida em conjunto pela PF e pela Receita Federal. Investigou crimes financeiros como lavagem de dinheiro, fraude em licitações e práticas cambiais ilegais, deflagrada no dia 20 de junho de 2008. Segundo o relatório da PF, divulgado no mesmo dia, a Agrenco do Brasil fazia parte de organização criminosa que “internalizava divisas de forma ilegal” por meio de operações cambiais com doleiros e empresas-laranja com sede em paraísos fiscais, ocultação de bens e documentos falsos. Ainda segundo a PF, os integrantes da tal organização corromperam funcionários públicos para conseguir dar cabo de seus crimes.

Em dezembro de 2010, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região trancou a ação penal que decorreu da influenza por ilegalidades nas investigações. O caso tramitou em segredo de Justiça. Consta da ementa da decisão que a denúncia foi feita à Justiça Estadual de Santa Catarina que, de pronto, autorizou a interceptação telefônica dos acusados (entre eles, Antonio Iafelice, dono da Agrenco do Brasil).

O grampo durou de 9 de agosto a 19 de novembro de 2007. Depois disso, foi reconhecida a incompetência da Justiça Estadual no caso e os autos foram remetidos à Justiça Federal em Santa Catarina. Lá, o juízo autorizou a continuidade das escutas. Com base nessas escutas, foram determinadas diversas medidas cautelares de busca e apreensão, prisões e oitiva dos denunciados.

A anulação veio, então, da Vara Federal Criminal de Florianópolis, por causa de uma questão processual. À época, a juíza do caso afirmou que o devido processo legal foi violado porque não houve protocolo e distribuição dos pedidos de interceptação às varas criminais da Comarca. “Não se trata de vício formal, mas de verdadeira afronta à garantia constitucional do juiz natural, corolário da parcialidade do juiz e fundamental para o Estado Democrático de Direito”, afirmou. O TRF-4 confirmou o entendimento.

Informe trimestral
No pedido de indenização feito pela Agrenco BV à Justiça Federal do DF, a companhia, que tem sede em Amsterdã, faz suas alegações na qualidade de acionista prejudicada. A empresa holandesa afirma que, dois dias depois da diligência da PF, apresentava dívida de R$ 860 milhões em decorrência da queda abrupta no valor das suas ações negociadas na bolsa de valores.

À época da deflagração da operação influenza, a Agrenco BV detinha 47% das ações da Agrenco Brasil, empresa de capital aberto. Segundo a petição da companhia holandesa, quando a Polícia Federal foi à sede da controlada brasileira, apreendeu todos os documentos e registros da companhia. E isso, de acordo com as alegações da inicial, foi feito dez dias antes do fechamento do segundo trimestre de 2008.

Como todos os documentos de repente ficaram em poder da PF, não foi possível declarar à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão regulador do mercado de capitais brasileiro, seu Informe Trimestral (ITR).

A partir daí, a Agrenco Brasil se viu em situação difícil de se recuperar. Como não pôde fazer seu ITR e era alvo de uma operação midiática da Polícia Federal, a CVM suspendeu a negociação de suas ações. A petição da Agrenco BV colaciona uma série de laudos técnicos de auditorias atestando a liquidez da companhia até o dia 20 de junho de 2008, data da deflagração da operação influenza.

Sem poder negociar, a Agrenco Brasil se viu em um inevitável processo de recuperação judicial. Uma das execuções, pelo Deutsche Bank, foi no valor de R$ 88,8 milhões. “Os credores passaram, então, pressionados pelo escândalo provocado ilegalmente pela Polícia Federal, a atuar como algozes de última hora”, diz a empresa.

A companhia afirma ainda que para pagar as dívidas que foram cobradas na Justiça pelos credores, teve de se desfazer de imóveis que ainda nem haviam sido ocupados. O caso mais significativo foi o da fábrica que foi construída em Marialva (PR). A unidade foi arrendada, às pressas, por R$ 37 milhões pela empresa BS Bios. Dois meses depois, apenas 50% dessa fábrica foram alienados pela Petrobras pelo va R$ 55 milhões.

No Supremo
A operação influenza está longe de ser a única anulada pelo Judiciário por métodos ilegais de coleta de prova. A diferença é que o Ministério Público Federal nunca a levou ao Superior Tribunal de Justiça. Mas ao time da influenza se juntam outras operações célebres da Polícia Federal, como satiagraha, castelo de areia e kaspar II, por exemplo.

O que é inusitado no caso da influenza é o fato de um acionista ir à Justiça pleitear indenização pelas perdas sofridas em decorrência da operação. Mas é praticamente consensual entre os ministros dos tribunais de Brasília como a jurisprudência deve se consolidar.

A grande maioria dos ministros ouvidos pelo Anuário da Justiça Brasil 2012, feito entre outubro e dezembro de 2011, defendeu que a União deve, sim, indenizar vítimas de abusos em investigações policiais.

Os ministros do Supremo Tribunal Federal foram menos assertivos que os do Superior Tribunal de Justiça, mas concordam com a tese agora defendida pela Agrenco BV. O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, ponderou que “a investigação, por si só, não viola as regras básicas do Estado de Direito, desde que se saiba que ela tem um motivo plausível”.

Luiz Fux entende que o Estado deve indenizar por exageros e ilegalidades em investigações, “mas desde que isso não represente uma camisa de força nos poderes investigatórios da polícia”. “Se efetivamente a parte conseguir comprova que houve abuso do direito, não no afã de investigar, mas no de expor a pessoa através de um procedimento irregular, com o objetivo de apenas chamar a atenção e denegri-la de maneira irreversível, aí, dependendo do caso concreto, pode ser que surja o germe de uma responsabilidade civil.”

O ministro Dias Toffoli entende que cabe reparação apenas se há dolo ou má-fé comprovada dos agentes do Estado na condução da investigação. “A União pode ser responsabilizada e, depois, entrar com ação de regresso contra os agentes que agiram mal. Contudo, nos casos em que não há dolo, mas má-formação ou até incompetência do agente, a União pode ser responsabilizada pelo caráter negligente de seu agente e não terá direito de regresso”, avalia.

No mesmo sentido pensa o ministro Ricardo Lewandowski. Para ele, “se houver uma grave violação à imagem do investigado ou a outros direitos subjetivos, como o direito à intimidade, à privacidade, cabe, em tese, a responsabilização da União ou do estado, a depende do foro da investigação”.

O ministro Teori Zavascki, hoje no Supremo Tribunal Federal, quando foi entrevistado pela reportagem do Anuário, era ministro do STJ. Para ele, “é o mesmo problema de saber se o Estado tem de ser condenado por erro do Judiciário ou do Ministério Público, por erro da máquina administrativa. A investigação é um ato legítimo do Estado e, sendo assim, não é indenizável.”