‘Macaco, escravo, preto adotado’: mãe denuncia escola particular em SP por omissão em casos de racismo contra filho adolescente

Família da vítima, que registrou boletim de ocorrência por injúria racial, diz que Colégio Ábaco, região de Perdizes, não agiu em outros casos. Direção da escola, no entanto, diz que ‘não havia recebido notificação de qualquer ocorrência nesse sentido’ em data anterior.

A mãe de um adolescente de 15 anos denunciou o colégio particular Ábaco, que fica na região de Perdizes, Zona Oeste de São Paulo, por se omitir diante de casos de racismo sofridos pelo filho, que cursa o 8º ano do ensino fundamental.

A mulher conta que, no último dia 9, o adolescente estava em sala de aula quando outro aluno apontou para a figura de um macaco e disse que era o garoto. Em outra ocasião, durante uma aula de história, o mesmo menino, de 13 anos, chamou a vítima de “escravo” e “preto adotado”.

 Fernanda Santos, mãe do adolescente, disse que participou de uma reunião com integrantes do colégio nesta segunda-feira (16). Em nota, a escola informou repudia discriminações de qualquer tipo e que, durante o encontro, “foram definidas e acordadas as ações educativas, que atualmente estão em andamento”. (leia íntegra abaixo)

“Tentaram culpar meu filho o tempo todo, dizendo que ele xingou a mãe do outro aluno, dizendo que ele precisa de acompanhamento psicológico. Não foi fácil de lidar”, afirmou a diretora de tecnologia.
Segundo a família da vítima, que registrou boletim de ocorrência por injúria racial, a escola não comunicou os responsáveis do adolescente agressor. “Ficamos sabendo porque [nosso filho], ao chegar em casa, falou que tinha sofrido racismo na escola.”

No BO, o delegado de polícia do 23º Distrito Policial de Perdizes afirmou que, com a análise das informações dadas pela mãe, “conclui-se que o caso tem feições” do crime descrito.

A mãe conta que não foi a primeira vez que o adolescente sofreu algum tipo de preconceito nas dependências do colégio, que, ao ser informado, foi omisso em todos os casos. A direção da escola, no entanto, diz que “não havia recebido notificação de qualquer ocorrência nesse sentido” em data anterior.

“Já havíamos comunicado a mãe do agressor que [nosso filho] vinha sofrendo bullying e preconceito, mas nenhuma atitude foi tomada, e o comportamento do menor continuou o mesmo”, apontou a mãe.
O que diz o Colégio Ábaco
“O Diretor do Colégio Ábaco – Unidade Sumaré, Sr. Marcus Vinícius Russo Loures, com sede na Avenida Dr. Arnaldo nº 1793, Bairro Sumaré – São Paulo – Capital, vem através do presente informar que essa Instituição de Ensino tem como um de seus princípios, a dignidade humana, que implica o respeito aos direitos humanos, repúdio à discriminação de qualquer tipo, acesso a condições de vida digna e respeito nas relações interpessoais.

Informamos que o Colégio tomou conhecimento de um incidente de racismo ocorrido entre dois alunos, de 13 e 15 anos, nas nossas dependências, no dia 09 de outubro na última aula. No dia 10 de outubro, a orientadora educacional atendeu os adolescentes e deu início aos procedimentos. É importante destacar que até então, o Colégio não havia recebido notificação de qualquer ocorrência nesse sentido.

Entramos em contato com as responsáveis pelo aluno, com o intuito de agendar uma reunião em caráter de urgência. Infelizmente, as responsáveis não puderam comparecer.

Em virtude do feriado prolongado do dia 12 de outubro, essa reunião se realizou no dia 16 de outubro, às 8 horas da manhã. Durante esse momento, foram definidas e acordadas as ações educativas, que atualmente estão em andamento.

O Colégio segue os preceitos definidos no seu Regimento Escolar, bem como ao Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal nº 8.069/90 e demais legislações. Trata-se de adolescentes em formação e cabe à escola informar a todos os pais, alunos e membros da comunidade escolar que levamos essa questão muito a sério, que estamos comprometidos em tomar todas as medidas necessárias para garantir um ambiente seguro, inclusivo e respeitoso para todos os nossos alunos.

Reiteramos que a educação e a sensibilização contra o racismo são prioridades fundamentais para nós, e continuaremos a trabalhar ativamente para combater qualquer forma de discriminação em nossa instituição”.

Após ser notificada pelo MEC, Unisa envia respostas antes do prazo final sem dizer quantos alunos foram identificados e punidos

Universidade tinha até o início de outubro para explicar denúncias de atos obscenos ocorridos jogos. Em documento, reitoria alega ter tomado conhecimento dos fatos, que ocorreram em abril, somente no dia 16 de setembro. Texto não informa critérios da investigação tampouco número de estudantes expulsos.

A Universidade Santo Amaro (Unisa) enviou ao Ministério da Educação um documento que não esclarece os critérios das investigações internas tampouco informa quanto e quais alunos foram identificados e punidos.

A instituição tinha até o início de outubro para enviar as explicações, mas o fez na terça-feira (19), logo após ser notificada pelo MEC.

No documento, ao qual o g1 teve acesso, a reitoria alega que só tomou conhecimento dos fatos no dia 16 de setembro, quando vídeos dos alunos pelados, simulando uma masturbação, viralizaram nas redes sociais. O caso ocorreu em abril, durante um campeonato de calouros no interior do estado.

“Tal evento esportivo foi organizado por Atléticas dos Cursos de Medicina, absolutamente divorciado do calendário acadêmico, sem qualquer participação da UNISA, que com ele não possui relação alguma, bem como não patrocina, aprova ou intermedia a participação de alunos. Logo, tratou-se de evento extramuros, sem relação com as atividades institucionais da UNISA.”

A universidade informa que puniu os envolvidos, mas não esclarece como o processo foi feito, quantos e quais estudantes foram expulsos.

“Não obstante, incontinenti, adotou as providências que lhe competiam, observados os termos e limites de seu Regimento Geral, identificando e punindo os envolvidos. Com efeito, no dia 18 de setembro, primeiro dia útil subsequente, por meio da Portaria da Reitoria 305/2023, procedeu ao desligamento sumário dos envolvidos naqueles atos.”

Por fim, diz ser contrária ao trote e alega adotar medidas contra tais práticas, mas também não informa quais.

À imprensa, instituição tem se recusado a comentar sobre a série de denúncias que surgiram após a repercussão do caso.

Ministro cobra explicações e pede retratação
Na terça (19), durante um evento em São Paulo, o ministro da Educação, Camilo Santana, cobrou explicações da universidade sobre a demora na apuração e punição dos envolvidos.

“Fico me perguntando por que não expulsou antes, porque o fato ocorreu em abril, porque só agora se tornou público, e acho que esses alunos primeiro precisam se retratar, pedir desculpas e precisam sofrer o que a lei determinar em relação a esse tipo de comportamento”, afirmou.

Cartilha de humilhações
Alunos da universidade afirmam que os atos obscenos cometidos por estudantes de medicina durante os jogo universitário de calouros fazem parte de condutas exigidas aos novatos por um grupo de alunos do último ano do curso, responsáveis por praticar o chamado trote.

Segundo relatos ouvidos pelo g1 e pela TV Globo, existe uma espécie de “cartilha de obrigações” que há mais de dez anos é reproduzida e mantida por alguns desses veteranos.

De acordo com os estudantes, logo que entram na faculdade, todos os calouros de medicina são pressionados a participar e se submeter às determinações. Mas quem deseja fazer parte da Atlética precisa passar pelo trote.

Os estudantes que não concordam ou desistem das atividades “são hostilizados e chamado de p** no c*”, relata um aluno.

“Falam que nós não vamos ter acesso a oportunidades dentro da faculdade, que não vamos conseguir arrumar emprego depois de formados, pois não vai ter ninguém para indicar, que não vamos conseguir participar dos esportes, pois todo mundo que pratica é o pessoal do trote, que não vamos conseguir construir um currículo bom no geral, que vamos ficar marcados como fracos dentro da universidade”, conta outra estudante de medicina.

No relato dos alunos, além de correr pelado pela quadra, eles devem aceitar humilhações que incluem frequentar a universidade usando cueca ou calcinha por cima da roupa e apelidos vexatórios.

“Se você questiona, leva bronca. No grupo, o seu nome de batismo é o apelido. E o nome na faculdade será o que eles vão te dar. E, muitas vezes, são nomes constrangedores, ficando com ele até o fim do curso”, explica uma caloura.
Ainda de acordo com os depoimentos, o trote é mantido até o final do primeiro semestre. Mas as punições acabam sendo aplicadas durante toda a graduação.

Procurada, a Unisa não quis comentar sobre tais acusações. O g1 tenta contato com representante da Atlética.

“Dura 6 meses. Quem participa do trote tem que ir em todas as festas que a Atlética, fazer tudo que eles pedem, como limpar materiais de treinos, arrumar materiais para ensaio de bateria, por exemplo, e carregar tudo isso para cima e para baixo. Fora os episódios de jogar bebida nos calouros por nada, fazer os meninos correrem pelados nas festas e serem super grossos com eles.”

O grupo de veteranos também estabelece como os calouros devem se vestir na faculdade ao longo dos primeiros seis meses.

“As mulheres devem ir de cabelo preso, camiseta larga, sem acessórios, calça sem rasgo, sem maquiagem e sapato fechado. Já os homens devem raspar a cabeça e ir com o mesmo estilo de roupa das meninas. Quando começam as aulas, começam as festas, inclusive toda semana. Os calouros devem seguir essa roupa, mas usar uma camiseta específica. As meninas com um top preto por cima da roupa, e os meninos com a cueca em cima da roupa.”

Agressão contra calouros
Um estudante disse à reportagem que um colega que não se submeteu às determinações acabou sendo agredido.

“Amassaram ele na porrada por ‘falta de respeito com os veteranos'”, explicou um estudante.
“Eles xingam quem não participa. Os alunos são humilhados. Conheço gente que saiu dessa jornada no meio, antes dos 6 meses. Eles são chamados com o nome que os veteranos deram por não participarem dos grupos. Tem gente que não aguenta”, relata outra aluna.
Como todo veterano já foi calouro, o problema reflete a espiral de humilhações e opressões dentro do sistema acadêmico. “Eles falam que passaram por isso, então os calouros tem que passar”.

Na avaliação dos estudantes, os alunos que foram expulsos acabaram penalizados por algo que ocorre dentro da universidade de forma sistêmica. “Eu acho que os meninos fizeram isso pela pressão da tradição, e acreditaram que ia dar em nada”.

Entretanto, a jovem espera que os responsáveis pela manutenção de tais praticas também sejam punidos. “Eu acredito que vão investigar os mandantes. São quem mandou os meninos realizarem esse ato obsceno durante o trote.”

“Eu acho que isso não define a faculdade. Foi um grupo de pessoas, foi uma atitude centrada num grupo pequeno, a universidade é muito maior que isso. A faculdade surgiu de um sonho de homens que queriam somente formar médicos, profissionais da saúde humanizados. Sou totalmente contra o trote e ações como essa. Acredito que essa situação vai fazer com que os alunos da medicina reflitam mais.”

Canal de denúncias
Os estudantes ouvidos pela reportagem afirmam que a Unisa criou um canal de denúncias, mas o processo é feito de forma interna, sem transparência.

A faculdade mantém nos campus cartazes contra o trote e um e-mail é enviado aos alunos reforçando a mensagem todo o início de semestre.

Reincidência e omissão
Diretórios de diversos cursos da Universidade Santo Amaro (Unisa) usaram as redes socias para manifestar repúdio ao caso.

Nas notas, eles cobram ações e relatam que a Universidade já foi omissa na punição em episódios similares anteriormente.

“Repudiamos os crimes cometidos e esperamos uma punição exemplar por conta da instituição que por muitas vezes se fez omissa aos crimes praticados por esses mesmos alunos em outras ocasiões”, afirmou o diretório acadêmico de direito.

“Exigimos que medidas sejam tomadas pela Unisa, e que não acabe apenas em cartazes espalhados pela universidade como aconteceu anteriormente, sobrando até para cursos que nunca estiveram envolvidos e os criminosos seguem intactos”, escreveram os diretórios dos cursos de farmácia e odontologia.
A Unisa afirmou que expulsou alunos do curso de medicina “identificados até o momento” que foram gravados seminus simulando masturbação durante um jogo de vôlei feminino. Ao todo, sete teriam sido banidos.

Histórico
O caso ganhou repercussão no domingo (17), após a publicação de um vídeo com a cena nas redes sociais. No entanto, o episódio aconteceu em abril, durante um campeonato universitário.

Por meio de nota, a Unisa disse que tomou conhecimento das “gravíssimas ocorrências” durante a manhã desta segunda-feira (18), ao receber as publicações que estavam circulando pelas redes sociais. A instituição era procurada pelo g1 para falar sobre o assunto desde o domingo (17).

“Assim que tomou conhecimento de tais fatos, mesmo tendo esses ocorrido fora de dependências da Unisa e sem responsabilidade da mesma sobre tais competições, a Instituição aplicou sua sanção mais severa prevista em regimento”, disse a universidade.

A Unisa também informou que levou o caso para as autoridades, que vai colaborar com as investigações e tomar providências cabíveis. E afirmou que caso outros alunos sejam identificados, “seja pela equipe da Unisa, ou polícia, receberão a mesma punição”.

Ainda de acordo com a Instituição, até o momento, nenhum representante da Unisa foi intimado.

Segundo apurado pelo g1, os alunos gravados seminus faziam parte do time de futsal da Unisa e estavam em uma arquibancada. Eles abaixaram as calças enquanto o time de vôlei feminino da instituição jogava contra o time de outra universidade, em São Carlos.

Nas imagens que circulam pelas redes sociais, os estudantes aparecem tocando nas próprias partes íntimas.

De acordo com a Polícia Civil, a Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de São Carlos está investigando a conduta dos estudantes. No entanto, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP) não detalhou por quais crimes os alunos são investigados.

Banco investigado na Lava Jato pagou jantar de luxo a ministros do STF

Cardápio contou com iguarias como tartare de atum, salmão defumado com caviar, tortelete de trufas e bruschettas de cogumelos Porcini e steak tartare

Daniel Vorcaro, jovem bilionário e dono do Banco Master, organizou e custeou, no restaurante Fasano New York, na região da 5ª Avenida, um jantar para os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e outros convidados da Brazil Conference, organizada pelo Lide, empresa de João Doria, em Nova Iorque.

Vorcaro, conhecido como um dos novos “lobos” da Avenida Faria Lima, foi alvo de investigações por suspeita de fraude em fundos de pensão de servidores públicos de prefeituras e, por isso, chegou a ser alvo de uma ordem de prisão em 2019. As informações são do portal Metrópoles. 

De acordo com o jornal, Daniel encomendou ao Fasano um banquete para 150 pessoas. O restaurante foi aberto especialmente para a ocasião. A instituição não aparece entre os patrocinadores e apoiadores da conferência do Lide.

Fartura 

O cardápio contou com cinco canapés, ao custo de US$ 65 dólares (cerca de R$ 350) por pessoa. Entre as opções servidas, os convidados podiam optar por tartare de atum, salmão defumado com caviar, tortelete de trufas e bruschettas de cogumelos Porcini e de steak tartare.

O jantar foi contemplado com uma sequência de quatro pratos, que não saem por menos de US$ 140 dólares (em torno de R$ 750) por pessoa. As bebidas foram servidas à vontade.

Lava Jato

O Banco Máxima foi investigado na Lava Jato. Hoje, além da mudança de nome, outros gestores comandam a empresa. O Master nasceu dos ativos do Máxima, mas são pessoas e gestão diferentes.

Em 2021, segundo o Ministério Público Federal (MPF), dois ex-gestores do Banco Máxima e outras três pessoas tornaram-se réus por crimes financeiros relacionados à instituição, entre 2014 e 2016. O então diretor-presidente do banco, Saul Dutra Sabba, e o diretor jurídico à época, Alberto Maurício Caló, respondem por gestão fraudulenta, prestação de informações falsas ao Banco Central e divulgação de dados inverídicos em demonstrativo financeiro. Com os delitos, os envolvidos pretendiam maquiar o balanço do Máxima para ocultar prejuízos e potencializar a captação de recursos no mercado.

A denúncia do MPF detalha também as supostas manipulações contábeis que Sabba e Caló realizaram para dissimular a insuficiência de capital do Máxima em declarações destinadas ao Banco Central, de janeiro de 2015 a março de 2016. A aplicação de metodologias diferentes daquelas estabelecidas pela autoridade monetária e a omissão de informações nos cálculos apresentados permitiram ao banco assumir legalmente novos riscos e evitaram restrições à remuneração de seus diretores e acionistas.

Alberto Maurício Caló

A assessoria de Alberto Maurício Caló esclarece que:

Alberto Maurício Caló, ex-Diretor Jurídico do então Banco Máxima, hoje Banco Master, não teve nenhuma participação nas operações relativas à denúncia do Ministério Público Federal. Em relação ao inquérito, Caló alega que o inquérito conduzido pela Polícia Federal concluiu pelo não indiciamento e, por fim, a defesa de Alberto Caló já pediu sua absolvição sumária e eventualmente pedirá o trancamento da ação.

Cabe ainda esclarecer que Alberto Caló está processando o Banco Central para afastar as acusações administrativas que lhe foram imputadas e já obteve medidas liminares a seu favor.

Nota do Banco Master

O Banco Master informa que a investigação mencionada (e o mandado de prisão) foi julgada ilegal pelo Tribunal Regional Federal da 1 Região. Não houve sequer denúncia por parte do Ministério Público Federal.
O Banco Máxima, atual banco Master, mudou de controladores em 2019. Nunca os atuais controladores foram denunciados e processados pelo Ministério Público Federal. A investigação foi considerada ilegal pois trata de episódios anteriores à aquisição do banco pelos atuais controladores.
Como faz em diversos seminários e fóruns de discussão empresarial, o Banco Master foi um dos vários patrocinadores da conferência organizada pelo LIDE em Nova York, que também cuidou da organização do jantar referido na reportagem.

O ministro Ricardo Lewandowski, em evento do Lide, em Nova Iorque | Foto: Reprodução/Redes Sociais
Banco investigado na Lava Jato pagou jantar de luxo a ministros do STF

Daniel Vorcaro, jovem bilionário e dono do Banco Master, organizou e custeou, no restaurante Fasano New York, na região da 5ª Avenida, um jantar para os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e outros convidados da Brazil Conference, organizada pelo Lide, empresa de João Doria, em Nova Iorque.

Vorcaro, conhecido como um dos novos “lobos” da Avenida Faria Lima, foi alvo de investigações por suspeita de fraude em fundos de pensão de servidores públicos de prefeituras e, por isso, chegou a ser alvo de uma ordem de prisão em 2019. As informações são do portal Metrópoles. 

De acordo com o jornal, Daniel encomendou ao Fasano um banquete para 150 pessoas. O restaurante foi aberto especialmente para a ocasião. A instituição não aparece entre os patrocinadores e apoiadores da conferência do Lide.

Fartura 

O cardápio contou com cinco canapés, ao custo de US$ 65 dólares (cerca de R$ 350) por pessoa. Entre as opções servidas, os convidados podiam optar por tartare de atum, salmão defumado com caviar, tortelete de trufas e bruschettas de cogumelos Porcini e de steak tartare.

O jantar foi contemplado com uma sequência de quatro pratos, que não saem por menos de US$ 140 dólares (em torno de R$ 750) por pessoa. As bebidas foram servidas à vontade.

Lava Jato

O Banco Máxima foi investigado na Lava Jato. Hoje, além da mudança de nome, outros gestores comandam a empresa. O Master nasceu dos ativos do Máxima, mas são pessoas e gestão diferentes.

Em 2021, segundo o Ministério Público Federal (MPF), dois ex-gestores do Banco Máxima e outras três pessoas tornaram-se réus por crimes financeiros relacionados à instituição, entre 2014 e 2016. O então diretor-presidente do banco, Saul Dutra Sabba, e o diretor jurídico à época, Alberto Maurício Caló, respondem por gestão fraudulenta, prestação de informações falsas ao Banco Central e divulgação de dados inverídicos em demonstrativo financeiro. Com os delitos, os envolvidos pretendiam maquiar o balanço do Máxima para ocultar prejuízos e potencializar a captação de recursos no mercado.

A denúncia do MPF detalha também as supostas manipulações contábeis que Sabba e Caló realizaram para dissimular a insuficiência de capital do Máxima em declarações destinadas ao Banco Central, de janeiro de 2015 a março de 2016. A aplicação de metodologias diferentes daquelas estabelecidas pela autoridade monetária e a omissão de informações nos cálculos apresentados permitiram ao banco assumir legalmente novos riscos e evitaram restrições à remuneração de seus diretores e acionistas.

Alberto Maurício Caló

A assessoria de Alberto Maurício Caló esclarece que:

Alberto Maurício Caló, ex-Diretor Jurídico do então Banco Máxima, hoje Banco Master, não teve nenhuma participação nas operações relativas à denúncia do Ministério Público Federal. Em relação ao inquérito, Caló alega que o inquérito conduzido pela Polícia Federal concluiu pelo não indiciamento e, por fim, a defesa de Alberto Caló já pediu sua absolvição sumária e eventualmente pedirá o trancamento da ação.

Cabe ainda esclarecer que Alberto Caló está processando o Banco Central para afastar as acusações administrativas que lhe foram imputadas e já obteve medidas liminares a seu favor.

Nota do Banco Master

O Banco Master informa que a investigação mencionada (e o mandado de prisão) foi julgada ilegal pelo Tribunal Regional Federal da 1 Região. Não houve sequer denúncia por parte do Ministério Público Federal.
O Banco Máxima, atual banco Master, mudou de controladores em 2019. Nunca os atuais controladores foram denunciados e processados pelo Ministério Público Federal. A investigação foi considerada ilegal pois trata de episódios anteriores à aquisição do banco pelos atuais controladores.
Como faz em diversos seminários e fóruns de discussão empresarial, o Banco Master foi um dos vários patrocinadores da conferência organizada pelo LIDE em Nova York, que também cuidou da organização do jantar referido na reportagem.

Moro confisca R$ 5,35 milhões de Argello e mais cinco alvos da Vitória de Pirro

A Justiça Federal decretou o bloqueio de R$ 5,35 milhões do ex-senador Gim Argello (ex-PTB/DF) e de outros cinco alvos da Operação Vitória de Pirro, 28ª fase da Operação Lava Jato, deflagrada nesta terça-feira, dia 12.

O valor corresponde à propina que Argello teria tomado em 2014 das empreiteiras UTC Engenharia e OAS para livrá-las da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Petrobras no Congresso.

As investigações apontam que R$ 5 milhões foram repassados para quatro partidos da Coligação União e Força e R$ 350 mil foram parar em conta da paróquia São Pedro, de Taguatinga, frequentada pelo político.

“Viável o decreto do bloqueio dos ativos financeiros dos investigados em relação aos quais há prova de recebimento de propina. Não importa se tais valores, nas contas bancárias, foram misturados com valores de procedência lícita. O sequestro e confisco podem atingir tais ativos até o montante dos ganhos ilícitos. Considerando os valores da propina paga, resolvo decretar o bloqueio das contas dos investigados até o montante de cinco milhões e trezentos e cinquenta mil reais”, assinalou o juiz federal Sérgio Moro.

A medida alcança ativos em contas e investimentos de Gim Argello e também de seu filho, Jorge Afonso Argello, do operador financeiro do ex-senador, Paulo César Roxo Ramos, e de três pessoas jurídicas – Argelo & Argelo Ltda., Garantia Imóveis Ltda. e Solo Investimentos e Participações Ltda.

Moro anotou que a medida cautelar apenas gera o bloqueio do saldo do dia constante nas contas ou nos investimentos, “não impedindo, portanto, continuidade das atividades das empresas ou entidades, considerando aquelas que eventualmente exerçam atividade econômica real”. O juiz federal destacou que, em relação às pessoas físicas, caso haja bloqueio de valores atinentes a salários, promoverá, mediante requerimento, a liberação.

No mesmo despacho, o juiz da Lava Jato já se adiantou e cravou que a competência para mais essa etapa da investigação é mesmo da Justiça Federal em Curitiba – base de toda a operação.

“A investigação, na assim denominada Operação Lava Jato, abrange crimes de corrupção e lavagem de dinheiro transnacional, com pagamento de propinas a agentes da Petrobras em contas no exterior e a utilização de expedientes de ocultação e dissimulação no exterior para acobertar o produto desse crime. Embora a Petrobras seja sociedade de economia mista, a corrupção e a lavagem, com depósitos no exterior, têm caráter transnacional, ou seja iniciaram-se no Brasil e consumaram-se no exterior, o que atrai a competência da Justiça Federal”, aponta o texto de Moro.

“O Brasil assumiu o compromisso de prevenir ou reprimir os crimes de corrupção e de lavagem transnacional, conforme Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção de 2003 e que foi promulgada no Brasil pelo Decreto 5.687/2006. Havendo previsão em tratado e sendo os crimes transnacionais, incide o artigo 109 V, da Constituição Federal, que estabelece o foro federal como competente”, complementa o despacho.

O magistrado observou que “no presente caso, a toda obviedade, o crime teria sido praticado por Gim Argello, então na condição de senador, utilizando os poderes inerentes a sua condição de integrante das comissões parlamentares de inquérito, o que por si só atrai a competência da Justiça Federal, considerando a natureza federal do cargo e das instituições, bem como a superveniente perda do foro privilegiado.

Sérgio Moro ressaltou que as informações que deram origem à Vitória de Pirro foram compartilhadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) com a Justiça Federal.

Ele se reporta aos dados contidos nas delações premiadas do empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC Engenharia, e Walmir Pinheiro Santana, diretor da empreiteira. Ambos revelaram os pagamentos de propinas para o ex-senador. “Oportuno ainda lembrar que foi o Supremo Tribunal Federal quem enviou a este Juízo cópia dos depoimentos de Ricardo Ribeiro Pessoa e de Walmir Pinheiro Santana, com o relato acerca da propina paga a Gim Argello, para a continuidade das investigações e do processo.”

Justiça Federal do RS condena réus de operação da PF

A Justiça Federal de Porto Alegre condenou quatro réus da operação mãos dadas, da Polícia Federal, pelos crimes de formação de quadrilha, falsidade ideológica e denunciação caluniosa. Entre os condenados, está o casal Wolf Gruenberg e Betty Guendler, acusados de fazer parte de um esquema de “prática de estelionato contra a União, para obter precatórios que lhes foram concedidos”. O caso corre sob sigilo de Justiça e ainda não transitou em julgado.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A ação movida contra o casal por estelionato foi trancada pelo Superior Tribunal de Justiça, pois não há sequer lei penal sobre o chamado “estelionato judicial” do qual são acusados e, ainda que houvesse a tipificação de tal crime, a acusação não conseguiu comprovar as supostas manobras e inverdades usadas no processo, segundo acórdão do dia 1º de outubro de 2009.

Os réus foram condenados, por maioria de votos, a penas que variam entre dois e nove anos de prisão, além de multas que vão de 63 a 7,6 mil salários mínimos. Foi fixada, ainda, fiança de R$ 30 milhões a um dos acusados, que reside no Uruguai. Não foram divulgados os nomes dos condenados.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A fiança de R$ 30 milhões foi revogada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

A defesa de Gruenberg declarou que ainda não foi notificada da condenação. Afirmou que é uma “total surpresa dos advogados terem tomado conhecimento pelo site da Justiça Federal e por órgãos de imprensa”.

A sentença veio um dia depois da publicação de uma reportagem da revista Época narrando os vários casos judiciais de Gruenberg. Intitulada O homem que processou o Brasil, a reportagem em três capítulos conta a história do empresário e de seus embates com a Justiça brasileira. O primeiro deles data de 1978, quando Gruenberg entrou na Justiça para reclamar de uma venda pela qual não recebeu o dinheiro. A compradora, à época do negócio, era uma empresa controlada pelo Banco do Brasil, e poucos meses depois do início do caso, a família Gruenberg foi à falência.

O homem que processou o Brasil

A insólita história de Wolf Gruenberg, o empresário que dedicou sua vida a cobrar uma dívida, foi preso sob acusação de manipular a Justiça – e hoje acusa a polícia de tortura e quer fazer seu caso chegar às Nações Unidas

Capítulo 1

UM CASAL NA PRISÃO

Sentado na cafeteria de um shopping center no bairro paulistano de Higienópolis, Wolf Gruenberg narra sua história. O terno e as rugas de seus 63 anos lhe conferem um ar de respeitabilidade. Ele entremeia seu relato com um sem-número de documentos que vai sacando de uma pasta de couro preta. Todo tipo de artefato jurídico sai lá de dentro: há certidões, sentenças, recursos, registros, agravos de instrumento, exceções de suspeição e um emaranhado de fios que vão se cruzando nos pontos e nós de um enredo que, por seu relato, daria um thriller ao estilo dos best-sellers de autores como John Grisham ou Scott Turow.

Wolf nasceu em 1948, pouco depois da Segunda Guerra Mundial, no campo de refugiados de Wolfrathausen, onde seus pais se conheceram. Quando a guerra acabou, era inviável para judeus como eles permanecer na Alemanha. O casal Gruenberg e o filho de 3 anos, nascido apátrida, cruzaram então o Atlântico para se estabelecer na Bolívia, depois no Brasil. Wolf viveu em Corumbá, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Porto Alegre. Aos 18 anos, recebeu a cidadania brasileira. Formou-se em Direito e, adulto, tornou-se um empresário dedicado a recuperar companhias em processo falimentar. Às vésperas dos 60 anos, foi acometido de um incomum e virulento câncer sublingual, que quase lhe tirou a voz e a vida. Quando foi diagnosticado, o tumor crescia a cada 26 horas. Havia duas saídas: uma cirurgia radical ou uma combinação agressiva de sessões de quimioterapia e radioterapia. A opção escolhida foi a segunda. A doença regredia de acordo com os planos médicos, até que a vida de Wolf sofreu uma súbita reviravolta.

Às 6 horas da manhã do dia 11 de julho de 2008, cerca de 30 policiais federais armados de submetralhadoras arrombaram o portão de sua casa em Porto Alegre. Prenderam Wolf e sua mulher, Betty. Até então, Wolf apenas suspeitava ser o foco de investigações policiais. Desconhecia detalhes das pilhas de processos resultantes de uma investigação de mais de um ano em sua vida, suas contas, seus negócios, suas relações pessoais. Ele era monitorado pela Polícia Federal (PF) por meio de escutas telefônicas, telemáticas e ambientais. Passara de empresário renomado, com bom trânsito na alta sociedade, a principal alvo da operação da Polícia Federal batizada de mãos dadas. Nas páginas dos jornais que noticiaram a operação, Wolf Gruenberg foi qualificado como chefe de uma quadrilha que arquitetou um esquema bilionário de fraudes contra a União.

Wolf afirma ter sido privado, ao longo dos 150 dias que passou na prisão, da fase final de seu tratamento contra o câncer. Ainda assim, diz ele, suas agruras no cárcere foram pequenas em comparação com o suplício da mulher. Quando foi presa, Betty Gruenberg acabara de sair de uma cirurgia para redução nos seios. Nem sequer tinha retirado os pontos da delicada operação. Ela foi então instalada pelas autoridades numa cela da Penitenciária Feminina Madre Pelletier, em Porto Alegre. Lá, contraiu uma infecção que deixou seus seios purulentos e quase se transformou em septicemia. Transferida para o melhor hospital de Porto Alegre, o Moinhos de Vento, Betty quase perdeu as mamas. Na UTI do hospital, foi mantida algemada pelos pés à maca em que convalescia. “O Estado quase a matou. Eles foram extremamente cruéis com ela”, afirma Wolf. Ele retira então da pasta de couro fotografias que mostram as lesões da mulher e os boletins médicos que relatavam a gravidade de seu quadro. Quando saiu do hospital, Betty foi colocada na carceragem da Polícia Federal, onde, de acordo com os relatos de Wolf, dividiu uma cela com homens.

As arbitrariedades de que Wolf se julga vítima não cessaram aí. Conversas dele com seus advogados foram grampeadas – prática repudiada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Câmeras de vídeo foram instaladas em quartos de hotéis em que o casal Gruenberg se hospedou. Em 2009, a casa de Wolf em Punta del Este, no Uruguai, foi vasculhada pela polícia uruguaia, de posse de um mandado de busca e apreensão oriundo do Judiciário brasileiro. Documentos, computadores, chaves dos carros e objetos da família foram apreendidos. Wolf deu por falta até de uma caneta da marca Mont Blanc que seu filho mais novo ganhara por ocasião de seu bar mitzvah, cerimônia judaica que marca a entrada do homem na vida adulta, aos 13 anos. Os objetos nunca mais foram vistos pela família Gruenberg. Tampouco a Polícia Federal brasileira os recebeu. Espera por eles há quase três anos para prosseguir com as investigações. A polícia uruguaia não soube explicar onde foram parar os pertences dos Gruenbergs.

Depois de ser libertado, graças a um habeas corpus, Wolf começou uma cruzada a que tem se dedicado nos últimos quatro anos. Nela, tem investido tempo e dinheiro. Contratou assessores de imprensa e alguns dos mais badalados advogados do Brasil, como Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, Luiz Roberto Barroso, Carlos Eduardo Caputo Bastos e o ex-deputado federal e delegado da Polícia Federal Marcelo Itagiba. Wolf também buscou o apoio de ONGs internacionais, como a Justiça Global. A pedido dele, a Justiça Global remeteu um relatório sobre as condições de sua prisão e de sua mulher para a análise da Relatoria Especial da Organização das Nações Unidas contra tortura. “Temos muitas demandas de violações de direitos humanos em cadeias brasileiras. Em geral, as vítimas são pobres. No caso de Wolf, não tivemos tempo de averiguar tudo, mas ele trouxe fotos e documentação para comprovar o que nos disse”, afirma Sandra Carvalho, da Justiça Global.

Em mais de oito horas de conversa, em dois encontros com ÉPOCA, Wolf procurou relatar seu caso incomum. “Sou um perseguido, e meus inimigos usam o Estado brasileiro para me atingir”, diz. Essa é a explicação, de acordo com sua versão, para a extensa lista de crimes que lhe imputam e que enumera com sua voz mansa, enquanto alisa a barba espessa e grisalha: formação de quadrilha, estelionato judicial, falsidade ideológica, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, denunciação caluniosa. “Nem na época da ditadura uma coisa dessas aconteceria.” Ri, nervosamente.

Capítulo 2

GRUENBERG X UNIÃO

A contenda entre Wolf e as autoridades é uma história longa e complicada, que se estende por quase todos os desvãos do labiríntico sistema Judiciário brasileiro. Seu início data de 1977. Naquela ocasião, a família Gruenberg tocava a AC Indústria e Comércio, Importação e Exportação S.A., uma indústria têxtil em São Paulo. Um dos negócios da AC era vender mercadorias a uma empresa no Paraguai. A operação de exportação era intermediada pela Companhia Brasileira de Entrepostos Comerciais, ou Cobec, uma empresa de capital misto, da qual a União era acionista. A operação comercial, segundo Wolf, teve um desfecho desastroso. A Cobec comprou, mas não pagou. A família Gruenberg vendeu, mas não levou. Restou a Wolf apenas uma coleção de duplicatas não pagas no valor, na moeda de então, de Cr$ 15 milhões. Isso é o equivalente, em valores atualizados, a aproximadamente R$ 2,7 milhões, de acordo com a evolução do Índice de Preços ao Consumidor de São Paulo (IPC-SP), da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).

Depois de mais de um ano de tentativas para receber o crédito, Wolf recorreu à Justiça pela primeira vez em 1978. Moveu dois processos contra a Cobec. Um para receber o montante que a empresa paraguaia pagaria por suas mercadorias. E outro para obter reparação pelo que a família deixara de ganhar em lucros futuros por causa do calote. Poucos meses depois de sofrê-lo, a empresa da família Gruenberg foi à falência. Wolf ganhou o primeiro processo no final da década de 1980. Na ocasião, a Cobec, então controlada pelo Banco do Brasil, já fora rebatizada de Infaz. A Justiça fixou o valor a ser recebido por Wolf em US$ 1,06 milhão. Esse montante, segundo as contas da Infaz, incluía o valor corrigido das mercadorias e as perdas futuras da AC. E somava também uma multa estipulada pela Justiça, que considerou a Infaz culpada de ter tentado postergar a sentença usando argumentos desleais ou, no jargão jurídico, de ter praticado litigância de má-fé. A família Gruenberg discordou. De acordo com Wolf, o que lhes foi pago estava aquém do justo. “Além disso, a Infaz não dispunha de recursos para liquidar a dívida e nos pagou apenas 10% do que a Justiça determinou”, diz ele.

A trama se embaralhou ainda mais quando Wolf insistiu no segundo processo contra a Cobec, para receber indenização por perdas e danos. Nesse ponto da narrativa, sua contida indignação começa a aumentar. Mas sua voz rouca jamais sobe de tom. Sem precisar consultar nenhuma anotação, cita nomes e datas com precisão. Quando questionado sobre algum trecho da história, retoma a explicação sem cair em contradição. Chega a repetir frases inteiras, palavra por palavra, em conversas distintas, quase como se tivesse decorado um texto. Na Justiça, a Infaz acusou Wolf de cobrar o pagamento de um prejuízo pelo qual ele já fora ressarcido no primeiro processo. A disputa se deu no âmbito cível da Justiça de São Paulo. Em 30 de outubro de 1991, 14 anos depois do calote, Wolf obteve outra decisão favorável nesse segundo processo. O juiz Aclibes Burgarelli decidiu que uma perícia contábil deveria ser realizada para fixar o valor da indenização a ser paga pela Infaz a Wolf. O perito contratado pela Infaz calculou-o em US$ 10 milhões. O perito de Wolf estimou-o em US$ 58 milhões. O perito nomeado pelo juiz Aclibes Burgarelli estipulou o valor de US$ 41 milhões.

Bastaria superar o imbróglio contábil para que esse capítulo da vida de Wolf se encerrasse. A essa altura, já fazia 17 anos que ele levara o calote. No entanto, antes que o juiz desse a sentença final sobre o valor da indenização, em 10 de junho de 1994, houve mais uma reviravolta na já rocambolesca história. A Infaz foi absorvida pela União. Daí em diante, quem se sentaria no banco dos réus da ação movida por Wolf era o próprio Estado brasileiro – e não mais uma empresa de capital misto. A briga começava a ganhar contornos ainda mais kafkianos. A discussão, que até então seguia na Justiça de São Paulo, teve de ser reaberta em âmbito federal, a instância jurídica adequada para processos que envolvem o Estado brasileiro. Por conveniência de Wolf, que morava em Porto Alegre, o processo foi transferido para a Primeira Vara Cível Federal na capital gaúcha.

Apenas em 1999, 22 anos depois do calote, a União assumiu efetivamente seu papel de parte no processo. A Advocacia-Geral da União (AGU) acusou Wolf de tentar cobrar uma dívida que a Infaz já pagara, ato chamado, no jargão jurídico, de dúplice cobrança. A AGU também pediu a entrada do Ministério Público Federal no caso, a anulação do processo e novas perícias contábeis. A tramitação foi morosa, a despeito da disposição do juiz federal Alexandre Lippel em julgar com celeridade. “O processo já tramitava havia muitos anos, e o doutor Wolf sempre vinha me pedir rapidez”, diz Lippel. “Queria que ele saísse do meu pé.” Só em 2004, 27 anos depois do calote e 13 anos depois da primeira decisão favorável à indenização, Lippel pronunciou sua decisão. Fixou a indenização devida a Wolf em R$ 754 milhões, ou mais de R$ 1 bilhão em valores corrigidos pela inflação.

Em dezembro de 2011, o juiz Lippel demonstrou perplexidade ao ser questionado sobre sua decisão de sete anos atrás. Seus olhos azuis ficaram perdidos. Lippel disse que se baseou nos três laudos contábeis que constavam do processo que corria na Justiça de São Paulo. Sua decisão levou em conta correções monetárias a partir da variação do dólar e de uma expectativa de lucro calculada em quase 20% ao ano para a empresa de Wolf. “É um valor enorme, me surpreendeu, mas, pelo tempo que a ação corria, imaginei que fosse isso mesmo”, disse Lippel. “Dei até um prazo dilatado para a União se manifestar.” Ao longo das investigações da Operação Mãos Dadas, da PF, Lippel foi chamado a depor na ação criminal contra Wolf. Em seu depoimento, afirmou que nunca foi pressionado a decidir em favor do empresário e que olhou o processo “com capricho”. “Estava convencido dos critérios que usei para julgar”, disse a ÉPOCA. “Mas fica sempre a dúvida, eu não sei (se fui enganado). A gente atua na boa-fé, confiando na lealdade das pessoas. Dizem que eu teria sido manipulado. Até hoje, fica essa desconfiança.”

A União apelou contra a decisão de Lippel e argumentou que devia apenas R$ 47,6 milhões. Mesmo com uma decisão que lhe atribuía um crédito de quase R$ 800 milhões, Wolf também apelou para reclamar um valor maior. O processo subiu para o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, com sede em Porto Alegre. Foi nesse mesmo período que o Ministério Público Federal e a Polícia Federal iniciaram uma investigação contra Wolf por suspeita de “estelionato judicial”, uma tentativa de ludibriar a Justiça para lesar a União. De acordo com a investigação, longe de ser vítima do Estado brasileiro, Wolf era o responsável por uma criminosa alquimia que transformou uma dívida de alguns milhares de cruzeiros – de que ele era credor no final da década de 1970 – numa conta de mais de R$ 1 bilhão a ser paga pela União. Segundo a PF e o MPF, Wolf manipulou fatos, provas e juízes para conseguir essa façanha.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A ação movida contra o casal por estelionato foi trancada pelo Superior Tribunal de Justiça, pois não há sequer lei penal sobre o chamado “estelionato judicial” do qual são acusados e, ainda que houvesse a tipificação de tal crime, a acusação não conseguiu comprovar as supostas manobras e inverdades usadas no processo, segundo acórdão do dia 1º de outubro de 2009.

Capítulo 3

A INVESTIGAÇÃO POLICIAL

O resumo das atividades criminosas de que Wolf foi acusado consta dos volumes de processos que tramitam em caráter sigiloso na Justiça. Eles foram elaborados, sobretudo, ao longo de mais de um ano de trabalho exclusivo de um único delegado e dois agentes da Polícia Federal, no Rio Grande do Sul. “Como pode uma empresa que tinha patrimônio negativo, em 1977, de Cr$ 6.976.510,35 e faliu ser capaz de gerar uma indenização de R$ 1 bilhão?”, diz o delegado Luciano Flores de Lima, que comandou as investigações da PF. Atualizado pelo IPC da Fipe, os Cr$ 6 milhões de patrimônio negativo da empresa AC, da família Gruenberg, equivaleriam hoje a R$ 1,3 milhão.

Em 2006, quando a indenização a Wolf em R$ 754 milhões foi confirmada, em segunda instância, pelo desembargador Edgar Lippmann, do TRF da 4a Região, a PF reforçou sua investigação contra ele. Na época, surgiram denúncias de que Lippmann vendera uma sentença favorável à reabertura de uma casa de bingos. Por causa dessas denúncias, Lippmann , desde 2008, é investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ele responde a um processo administrativo disciplinar, que deverá ser julgado até março. Pelas mesmas acusações, Lippmann enfrenta um processo criminal no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Os investigadores da PF sugerem que Lippmann pode ter sido permeável às pressões de Wolf. O empresário nega. “Lippmann não nos ajudou em nada”, diz ele. No vaivém de recursos e liminares relativos aos processos, dois juízes deram decisões contrárias aos interesses de Wolf. Os dois foram denunciados por ele como parciais. Para a PF e o MPF, foi uma tentativa de Wolf para desacreditá-los e retirá-los do caso. Pelas ações contra os juízes, Wolf responde a processo por denunciação caluniosa. “Dizem que enganei juízes, mas não dizem a quem enganei”, afirma Wolf. “Ou sou um gênio, mais inteligente que Albert Einstein, ou os mais de 40 juízes que atuaram no caso são todos uns incapacitados.”

Atualização (16 de março de 2016): Não houve qualquer imputação de corrupção ou tentativa de corrupção por parte de Wolf em relação a Lippmann. Em relação aos magistrados que estão no contexto das acusações de denunciação caluniosa, as representações foram feitas por advogado nomeado pela Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas do Advogado da OAB-RS, órgão de classe que deferiu assistência em favor de Wolf por entender violadas suas prerrogativas profissionais.

Trinta e um anos depois do calote, em abril de 2008, a então ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), reviu todas as decisões anteriores que mandaram a União pagar indenização a Wolf. Acatando um pedido da AGU, ela suspendeu o pagamento. Na ocasião, Wolf já recebera quase R$ 11 milhões dos R$ 754 milhões que a União lhe devia. Boa parte do dinheiro fora enviada ao Uruguai, onde Wolf tem casa em Punta del Este. De acordo com a PF e o MPF, a transferência do dinheiro era um ardil para evitar que ele fosse confiscado para o pagamento de dívidas trabalhistas das empresas da família Gruenberg. Wolf foi então acusado de evasão de divisas. Ele chama essa acusação de “balela”. Diz que transferiu seu dinheiro por meio do Banco Central e, por isso mesmo, as autoridades brasileiras sabiam onde ele estava. E que, como tinha negócios no Uruguai, resolveu manter seus recursos por perto.

Atualização (16 de março de 2016): A transferência foi feita através de instituição financeira oficial, com a chancela do Banco Central. O mesmo juiz que prendeu Wolf pela suposição da prática do ilícito de evasão de divisas, veio a absolvê-lo sumariamente após a resposta à acusação, em decisão confirmada pelo TRF da 4ª Região.

A investigação da PF contra Wolf colheu mais elementos do que chamava de “conduta criminosa” do empresário. Monitorado por telefone, e-mail e escutas ambientais, Wolf foi flagrado, segundo os investigadores, tentando constranger autoridades e influenciar o curso de seus processos. Num telefonema a sua mulher, Betty, Wolf, de acordo com as investigações, dissera estar disposto a gastar “de R$ 10 a R$ 15 milhões” em subornos a servidores federais, entre eles o então chefe da AGU, José Dias Toffoli, hoje ministro do STF. Em outro diálogo, com dois advogados de Brasília, disse, de acordo com as gravações: “Contratem juristas de renome, para atuar detrás das cortinas, no STF e no STJ”. As escutas serviram de justificativa para a ação da Operação Mãos Dadas que prendeu Wolf, sua mulher e alguns de seus funcionários, em 11 de julho de 2008. “Isso é mentira. Tenho um amigo em comum com o Toffoli, mas não teria cabimento abordá-lo para falar do meu caso”, diz Wolf.

Responsável por decretar as prisões, o juiz federal criminal de Porto Alegre João Paulo Baltazar nega qualquer tipo de excesso ou maus-tratos em relação aos réus. “Houve várias perícias na senhora Betty. Ela foi internada no hospital particular que escolheu. Na minha interpretação, não houve violação de nenhum direito”, afirma Baltazar. Segundo ele, Betty não teve contatos com nenhum homem em sua cela, porque estava numa solitária. Reconhece que, no local, não havia vaso sanitário, mas afirma que essa é uma determinação legal para evitar que os detentos tenham qualquer instrumento capaz de facilitar um suicídio. E diz que as algemas foram necessárias no período no hospital, porque Betty ameaçava fugir. Recentemente, Wolf tentou afastá-lo do caso por meio de um instrumento jurídico conhecido como exceção de suspeição. A ação de Wolf contra Baltazar, juiz especializado em lavagem criminal e ex-auxiliar do CNJ, foi rejeitada pelo TRF da 4ª Região. Baltazar só concordou em receber a reportagem de ÉPOCA para falar em tese, e não sobre o caso específico de Wolf.

Atualização (22 de março de 2016): A exceção de suspeição movida contra o juiz José Paulo Baltazar Junior foi rejeitada pelo argumento de que a vinculação ideológica do juiz não é motivo indicado na lei para suspeição.

A prisão pela PF e as denúncias feitas pelo MPF transtornaram completamente a vida da família Gruenberg. Mais de três anos depois da Operação Mãos Dadas, Wolf continua empenhado em receber a indenização da União pela qual briga há 33 anos. O pagamento da dívida continua suspenso. A essa batalha judicial, acrescentou outra: move dois processos contra a União por tortura e tenta derrubar as últimas acusações que subsistem contra ele na Justiça: falsidade ideológica, formação de quadrilha e denunciação caluniosa. Os crimes de evasão de divisas, estelionato judicial e lavagem de dinheiro foram considerados inexistentes ou improcedentes. Os processos relativos a eles foram trancados na primeira e na segunda instâncias e no STJ. Os remanescentes devem ser julgados dentro de seis meses pelo juiz Baltazar, cujas decisões têm sido desfavoráveis a Wolf. Curiosamente, é o próprio Baltazar quem resume a insólita história de Wolf, um homem que passou mais da metade de sua vida envolvido em disputas nos tribunais brasileiros: “A Justiça brasileira é disfuncional e sem fim”.

Atualização (22 de março de 2016): Os delitos de evasão de divisas, estelionato judicial e lavagem de dinheiro foram considerados inexistentes ou improcedentes. As acusações em relação aos demais delitos — falsidade ideológica de documento particular, formação de quadrilha e denunciação caluniosa — ainda aguardam a análise de embargos infringentes no TRF-4.