Hinos ofensivos, maus-tratos a animais e ‘paredão de bunda’: excessos de estudantes ligam alerta de prefeituras e especialistas

Prefeituras do interior de SP estudam instalar câmeras em ginásios para flagrar abusos em jogos universitários, e especialistas destacam responsabilidade de universidade na preparação de futuros profissionais.

A expulsão de alunos de medicina da Universidade de Santo Amaro (Unisa), após a simulação de uma masturbação coletiva numa competição universitária, abriu discussão sobre os excessos e o mau comportamento dos estudantes nesses encontros, que geralmente acontecem em cidades do interior de São Paulo.

Recentemente, jogos como o Calo 2023, o CaloMed, e o Pré-Intermed 2023 foram marcados não apenas pela disputa esportiva entre os cursos de medicina do estado, mas também por brigas, hinos, cantos preconceituosos e até maus-tratos a animais.

Além dos alunos da Unisa, que exibiram as genitálias durante jogo de mulheres, imagens divulgadas por estudantes que participaram do mesmo evento mostram alunos da São Camilo exibindo as nádegas e fazendo o que eles chamam de “paredão de bunda”, em abril, na cidade de São Carlos, para provocar alunos de outras faculdades (veja mais abaixo).

Briga generalizada e maus-tratos a galinhas
No início daquele mês, uma briga generalizada entre estudantes de medicina da PUC-Campinas e da Faculdade de Medicina de Catanduva (Fameca) interrompeu o Pré-Intermed 2023.

No mesmo Pré-Intermed, o Ministério Público e a Polícia Civil iniciaram um inquérito para apurar maus-tratos contra duas galinhas levadas por estudantes da Fameca ao evento.

Esses dois últimos casos também foram registrados em São Carlos, no ginásio Milton Olaio Filho, palco dos atos libidinosos dos estudantes da Unisa – que aconteceram menos de um mês depois, no Calo 2023, entre 28 de abril e 1º de maio deste ano.

Costume universitário nocivo

Para o advogado Henderson Fürst, especialista em direito médico e Presidente da Comissão Especial de Bioética da OAB–SP, todo esses casos ilustram que “há tempos os estudantes têm passado dos limites éticos nessas disputas”.

Ele defende que as faculdades de medicina trabalhem a humanidade dos estudantes, sob pena de entregarem profissionais ruins para atuar no sistema de saúde do país.

“Há um costume universitário nocivo, tóxico e criminoso que se instaurou em certas universidades e não está sendo adequadamente tratado”, afirmou.

“É fundamental que todas as universidades realizem agora uma autocrítica e uma avaliação com as suas atléticas e com seus estudantes de como eles têm se portado fora da instituição. E até mesmo como eles têm se portado lá dentro, porque isso vai refletir muito na qualidade de profissionais que as instituições estarão entregando ao mercado”, completou.
“Chama atenção o fato de que vídeos como esses [da Unisa] são de abril, mas vieram à tona só agora. Fico pensando quantas outras situações como essas não aconteceram e foram acobertadas. Quantas outras universitárias tiveram que passar por situações vexatórias? É preciso que nós criemos um ambiente universitário seguro e saudável para formarmos os melhores profissionais possíveis aqui no Brasil”, declarou Fürst.

Câmeras de vigilância
Após os episódios, a Prefeitura de São Carlos disse ao g1 que estuda ações para coibir práticas abusivas nas competições.

“As secretarias de Esportes e Turismo estudam a instalação de câmeras no ginásio das competições, para que excessos fiquem registrados no momento dos acontecimentos, ou até cláusulas contratuais para que as atléticas se responsabilizem por atos excessivos”, disse a pasta de Comunicação da cidade.
A prefeitura declarou, ainda, que mantém sua política de atração de eventos universitários, porque eles fortalecem a economia da cidade, tendo no Ginásio Milton Olaio Filho um importante equipamento público para esse fim.

“São Carlos é uma cidade universitária. Além dos eventos de medicina, nós recebemos o Economíadas [competição dos estudantes de Economia] – e o Tusca [Taça Universitária de São Carlos], sem nenhum registro recente de abusos. O Tusca, por exemplo, chega a atrair mais de 30 mil pessoas para o município. São eventos essenciais para movimentar hotéis, restaurantes e transportes.”

Rio de Janeiro
Os excessos coletivos não são uma exclusividade dos estudantes paulistas. Em outubro do ano passado, um vídeo de estudantes de medicina da Universidade de Nova Iguaçu (Unig), no Rio de Janeiro, também viralizou.

Durante os Jogos Universitários de Medicina (Intermed-RJ/ES), disputados na cidade de Vassouras, os alunos provocavam os adversários cantando: “Sou playboy, não tenho culpa se seu pai é motoboy” (veja abaixo).

O vídeo provocou revolta nas redes sociais, e o prefeito de Vassouras, junto com a organização do evento, decidiu expulsar da cidade os alunos da Unig.

Para o advogado Henderson Fürst, esses episódios refletem uma perda de sensibilidade social e ética de parte dos estudantes de medicina do país.

“É em situações assim que nós vemos como a perda de sensibilidade ética está ficando cada vez mais forte [entre os profissionais de saúde]. Compete às faculdades e às atléticas tomarem providências para uma mudança de comportamento e melhora de seus estudantes”, declarou.

“As universidades precisam se preocupar. E precisam não só reforçar disciplinas como bioética, humanidades na medicina, ética médica, como também o tempo todo sensibilizar [os estudantes] para as vulnerabilidades humanas”, completou.

‘Paredão de bunda’
O Centro Universitário São Camilo informou ao g1, por meio de nota, que teve conhecimento do vídeo em que os estudantes de medicina da entidade fazem o chamado “paredão de bunda” na segunda-feira (18). Com base em seu Regimento Disciplinar Interno, a faculdade disse estar “tratando o assunto com foco em medidas socioeducativas”.

“Reforçamos nosso compromisso com o respeito a todo tipo de vida humana e entendemos que mesmo na alegria da juventude há limite entre as comemorações pelas vitórias e a conduta ética”, declarou a São Camilo.

A universidade informou ainda que, entre as medidas que estão sendo estudadas internamente contra os alunos estão a elaboração de um Código de Conduta das Atléticas, que será feito com representantes de todas as organizações esportivas estudantis da instituição.

O que dizem as atléticas
O g1 tentou contato com a Liga Esportiva das Atléticas de Medicina do Estado de São Paulo (Leamesp), entidade que promove as principais competições de estudantes de medicina de São Paulo, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.

Na segunda-feira (18), em razão da repercussão do caso dos alunos da Unisa, a entidade emitiu uma nota pública dizendo que “não compactua com atitudes que ofendam, humilhem e constranjam mulheres ou qualquer pessoa”.

“A LEAMESP sempre se posicionou com veemência a combater todas as formas de ataque aos direitos humanos e condenar, de forma clara, todo tipo de misoginia e todo tipo de desrespeito às mulheres. Assim, atletas, torcedores, equipe técnica e todos os envolvidos em nossas competições e eventos são, por nós, incentivados a manterem comportamentos pautados em princípios éticos e sociais em que prevaleça o respeito, a inclusão, igualdade e sobretudo, ao respeito para com as mulheres”, declarou a entidade.

“Atitudes como essas jamais serão normalizadas em ambientes e eventos promovidos pela LEAMESP; ao contrário, serão combatidas e punidas com o rigor da lei”, completou.

 

Polícia investiga participação de youtuber americano em operação da PM; SSP diz que prática não é permitida

Influenciador estava dentro da viatura, com colete da PM, e conversa com os policiais em inglês. Ele gravou os vídeos de uma perseguição e divulgou em seu canal no Youtube. Secretaria da Segurança Pública apura circunstâncias e diz que tomará ‘providências necessárias’.

A Secretaria da Segurança Publica (SSP) investiga a participação de um youtuber americano que filmou ações da Polícia Militar em favelas da Zona Norte de São Paulo.

Ele estava dentro da viatura e documentou toda a operação. Segundo a pasta, tal prática é proibida e não foi autorizada pelo comando da PM.

“Toda a dinâmica mostrada nas imagens, envolvendo um civil em práticas exclusivamente militares, não é permitida e fará parte das investigações.”
As imagens foram divulgadas no canal de Gen Kimura, criador de conteúdo digital. No vídeos, ele aparece de colete da PM e narra perseguições feitas pelos agentes dentro de comunidades.

“Esse sou eu numa perseguição policial no país mais mortal do mundo”, diz o influenciador.
Ele também descreve a forma como os policias atuam nas periferias da cidade:
“Nós não achamos nada suspeito nas casas em que reviramos, mas isso não os parou [os policiais] de revistar as pessoas. Acho que muitas pessoas nos EUA chamariam isso de ‘profiling’ (ficar caçando pessoas com histórico criminal ou que parecem ter envolvimento em crimes), mas nesse caso parece um recurso que eles precisam utilizar, especialmente em um ambiente tão imprevisível, não apenas pela segurança deles, mas para achar mais pistas sobre membros do tráfico. Como veremos adiante, eles foram certeiros no ‘profiling’ deles.”

“Esse tempo todo, não sei se vocês estão conseguindo ver, mas eu estou tenso. Espero que esteja conseguindo transmitir o que eu tô sentindo nesse momento” (…) “É muito perigoso, mas é muito lindo [a favela].”

Em uma das conversas, um policial afirma, em inglês, que as mortes de criminosos são comemoradas “com cigarro e bebidas”.

“Quando matamos um bandido, nós celebramos com cigarro e bebidas. [Com o batalhão?] Não, só o pelotão. Como dissemos antes, o pelotão é como uma família.”

A SSP diz que a frase “não condiz com as práticas adotadas pelas forças de segurança do Estado”.

Em nota, a secretaria afirmou que solicitou esclarecimentos à Polícia Militar logo após ter acesso aos vídeos e que foi instaurada uma “sindicância para apurar todas as circunstâncias e adotar as providências necessárias.”

“As polícias paulistas são instruídas e continuamente capacitadas para agirem dentro da lei. Excessos e desvios não são tolerados e todos os casos são punidos com rigor. Além disso, a dinâmica do vídeo não é permitida de acordo com as regras internas da Corporação.”

O Youtuber conta ainda que acompanhou o trabalho das polícias científica e técnica. E diz ter visto cenas de um crime com vítimas.

 

Polícia Identifica Suspeito de Assassinato de PM da Rota por Meio de Perfil do Instagram em Celular Abandonado na Fuga

Suspeito de assassinar o PM da Rota Samuel Wesley Cosmo em Santos, litoral de São Paulo, Kaique Coutinho do Nascimento, conhecido como ‘Chip’, foi capturado após deixar seu celular cair enquanto fugia da polícia logo após o crime.

O celular perdido por Kaique Coutinho do Nascimento, apelidado de ‘Chip’, durante sua fuga após o trágico incidente que resultou na morte do PM da Rota Samuel Wesley Cosmo em Santos, litoral de São Paulo, foi fundamental para a identificação do suspeito pela Polícia Civil. Documentos do caso, divulgados pelo G1 nesta terça-feira (12), revelam que a corporação utilizou fotos presentes nas redes sociais do indivíduo, as quais estavam associadas a outro nome no aparelho, durante o processo investigativo.

O policial foi fatalmente ferido durante uma patrulha na Praça José Lamacchia, no bairro Bom Retiro, em 2 de fevereiro. Apesar de ter sido levado para a Santa Casa de Santos, ele não resistiu aos ferimentos e veio a óbito no local. ‘Chip’ foi detido em Uberlândia (MG) em 14 de fevereiro.

De acordo com o registro policial, após o disparo que atingiu o rosto do PM em um beco na comunidade, ‘Chip’ retornou pelo mesmo caminho até alcançar o manguezal próximo. Em seguida, ele se dirigiu a outro beco antes de chegar às águas do canal. Durante o percurso, o suspeito deixou cair o celular, um carregador de pistola contendo munição de 9 milímetros, além de danificar seu próprio chinelo. Todos os itens foram submetidos à perícia.

O celular de ‘Chip’ foi submetido a exames pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil, mediante autorização judicial obtida em colaboração com o Ministério Público. A atuação da corporação foi considerada “essencial” para o desenvolvimento das investigações.

No dispositivo, a polícia encontrou uma conta no Instagram associada ao nome ‘Riquelme’. O perfil logado no celular continha diversas fotos de Kaique, incluindo uma imagem em que ele estava vestindo a mesma bermuda utilizada no dia do crime que resultou na morte do PM da Rota Samuel Wesley Cosmo (ver imagem acima).

Além disso, foi identificado que Kaique participava de um grupo vinculado a uma facção criminosa em um aplicativo de mensagens. Nas conversas, foram encontradas menções a ocorrências em pontos de tráfico de drogas, bem como atividades de ‘monitoramento’ de viaturas.

A Operação Verão foi iniciada na Baixada Santista em dezembro de 2023. No entanto, após a morte do PM Samuel Wesley Cosmo em 2 de fevereiro, o Estado lançou a segunda fase da operação com o reforço policial na região.

Em 7 de fevereiro, outro PM foi morto, o cabo José Silveira dos Santos. Isso marcou o início da terceira fase da operação, que incluiu a instalação do gabinete de Segurança Pública em Santos e o aumento do contingente policial nas cidades do litoral paulista. O gabinete da SSP-SP permaneceu na Baixada Santista por 13 dias.

A terceira fase da Operação Verão continua em andamento por tempo indeterminado. Até o momento, foram registradas 40 mortes de suspeitos (veja tabela abaixo).

A repercussão do caso levou a Defensoria Pública de São Paulo, em conjunto com a Conectas Direitos Humanos e o Instituto Vladimir Herzog, a solicitar o fim da operação policial na região e a obrigatoriedade do uso de câmeras corporais pelos policiais militares.

A Ouvidoria da Polícia de São Paulo, juntamente com entidades de segurança pública e proteção dos direitos humanos, apresentou à Procuradoria-Geral de Justiça do Estado um relatório detalhando irregularidades nas abordagens policiais durante a Operação Verão na Baixada Santista.

Além das denúncias, o documento contém uma série de recomendações aos órgãos públicos para cessar as violações de direitos humanos praticadas pela polícia.

O Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial (Gaesp) do Ministério Público de São Paulo abriu uma investigação para apurar as denúncias de profissionais de saúde de Santos de que os corpos de pessoas mortas na Operação Verão da PM na Baixada Santista estavam sendo levados aos hospitais como se estivessem vivos.

Recentemente, o secretário da Segurança Pública do estado de São Paulo, Guilherme Derrite, afirmou que não reconhece excessos na ação da Polícia Militar na Baixada Santista durante as operações. Entretanto, a declaração foi contestada pelo ouvidor da Polícia, Cláudio Aparecido da Silva, que descreveu o cenário como “um massacre e uma crise humanitária”.

Na manhã de sábado (9), uma manifestação a favor da Operação Verão reuniu moradores, representantes de associações, policiais militares e deputados estaduais, que fazem parte da chamada ‘Bancada da Bala’. O protesto ocorreu na Praça das Bandeiras, na orla da praia do Gonzaga, em Santos.

Mortes de policiais:

Em 26 de janeiro, o policial militar Marcelo Augusto da Silva foi morto na rodovia dos Imigrantes, em Cubatão. Ele foi baleado enquanto retornava para casa de moto. Embora uma grande quantidade de munições tenha sido encontrada na rodovia, o armamento de Marcelo não foi localizado.

Segundo a Polícia Civil, Marcelo foi atingido por um tiro na cabeça e dois no abdômen. Ele era parte do 38º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (BPM/M) de São Paulo, mas estava atuando no reforço da Operação Verão em Praia Grande (SP).

Em 2 de fevereiro, o policial das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Samuel Wesley Cosmo faleceu durante uma patrulha de rotina na Praça José Lamacchia. Ele foi socorrido para a Santa Casa de Santos (SP), mas não resistiu aos ferimentos.

MP-SP pede intimação de ex-técnico do Santos FC que acionou jogadora por calúnia após denúncia de assédio

Kleiton Lima deixou o comando das Sereias da Vila em setembro de 2023. Ele acionou uma jogadora na Justiça como tendo sido a responsável por enviar cartas à diretoria o caluniando, mas a pericia considerou as provas inconclusivas.

O Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) enviou um parecer à Justiça de Santos, no litoral paulista, sugerindo que o ex-treinador do time feminino do Santos FC, Kleiton Lima, seja intimado e se manifeste sobre a ação movida contra uma atleta do time feminino, a quem acusa de tê-lo caluniado por assédio moral e sexual em cartas enviadas à diretoria do clube.

O promotor de Justiça de Santos, Daniel Azadinho Palmezan Calderaro, apontou no documento que a perícia considerou inconclusiva a autoria dos textos nas cartas e que, portanto, não há hipótese de que atleta acionada tenha cometido calúnia — o material foi entregue anonimamente.

Ainda de acordo com o parecer, o MP-SP fez uma requisição para que o inquérito policial seja encaminhado ao Juizado Especial Criminal (Jecrim). O promotor entende que, portanto, que podem ser consideradas soluções conciliatórias e penas mais leves.

Cartas periciadas
O parecer do MP-SP foi dado após a Polícia Civil concluir o inquérito, instaurado a pedido de Kleiton. Durante as investigações, a jogadora acionada na Justiça foi obrigada a escrever o começo do texto presente na carta alvo da ação para a perícia comparar as grafias. O resultado foi “inconclusivo”, ou seja não é possível afirmar que ela escreveu.

Em setembro de 2022, o ge teve acesso a 19 cartas escritas à mão que relatavam situações vividas por atletas com o ex-treinador. As queixas eram referentes ao comportamento do ex-comandante, como cobranças excessivas, constrangimentos, ameaças e “toques indevidos”.

Na época, Kleiton Lima entregou o cargo e deixou o comando das Sereias da Vila. Com ele, também saíram mais de oito funcionários.

A carta que motivou as denúncias do ex-treinador diz o seguinte: “Uma vez, na feira, eu estava perto de uma barraca de pastel. Lá, o treinador chegou e perguntou se eu estava comendo pastel. Aí eu respondi: ‘Não, estou esperando as meninas’, então ele deu a volta por mim, olhou para minha bunda e disse: ‘Acho que não’. Insinuando que minha bunda parecia grande, isso significava que eu estaria comendo pastel” (veja na íntegra abaixo).

Kleiton já havia entrado com um processo civil na Justiça de São Paulo contra a jogadora pelo mesmo motivo — este foi arquivado.

Inquérito policial
O inquérito policial foi instaurado para apurar a prática de crime de calúnia. Conforme apurado pelo g1, dois dirigentes do Santos e duas jogadoras das Sereias da Vila prestaram depoimento à Polícia Civil a favor do ex-treinador. As atletas possuem relacionamento pessoal com Kleiton.

No relatório final da autoridade policial, foi constatado que as testemunhas não presenciaram a situação na feira. Elas apenas relataram que o caso aconteceu em março de 2023 e a jogadora em questão teria denunciado em setembro do mesmo ano.

De acordo com o promotor, os fatos e as pessoas envolvidas apresentadas por Kleiton foram relacionadas por uma das testemunhas, que não presenciou o suposto assédio sexual. “A prova pericial realizada, contudo, resultou inconclusiva quanto à autoria dos escritos”, disse Daniel.

Acusações
A defesa do ex-treinador afirmou que a carta sobre a situação na feira é a única que configura delito. As advogadas da jogadora, baseadas em notícias veiculadas na mídia, destacaram que pelo menos três dos 19 relatos podem ser considerados assédio sexual e moral.

O ex-técnico também acusa a atleta de ter sido a responsável por iniciar as denúncias e instigar outras jogadoras que, de acordo com ele, teriam perdido cargos de titularidade ou não aceitavam as exigências técnicas impostas.

À Polícia Civil, Kleiton afirmou que a atleta assumiu ser a autora da carta em uma reunião com um dos dirigentes do Santos — ele não estava presente.

Como haviam outras atletas na feira, a defesa da atleta destacou que trata-se de uma carta sem assinatura, ou seja, pode ter sido escrita por qualquer uma delas. As advogadas da jogadora também afirmaram que ela teve poucas interações com Kleiton.

Defesa da jogadora
As advogadas Patrícia Gorisch e Paula Carpes Victório, responsáveis pela defesa da jogadora, enviaram uma nota à equipe de reportagem. De acordo com elas, o resultado inconclusivo do exame grafotécnico reflete a ausência de provas que possam vincular a jogadora às acusações.

“[O parecer do MP] reforça a posição que temos mantido desde o início: [A atleta] é inocente das acusações levantadas contra ela. Em face destas informações, iremos ingressar com as medidas judiciais cabíveis”, afirmaram, em nota.

Após manutenção em Fórum de SP, 1ª audiência do caso de jovem morto por motorista de Land Rover é adiada para junho de 2024: ‘Indignação total’, diz pai de vítima

Fernando Zambori morreu atropelado na frente de uma casa noturna na Zona Sul de São Paulo em 13 de agosto de 2022; motorista Gustavo dos Santos Soares teve pedido de prisão revogado duas vezes e segue em liberdade com medidas cautelares.

Após o Fórum Criminal da Barra Funda passar por uma manutenção no dia 4 de setembro, a primeira audiência sobre a morte do jovem Fernando Zambori, que foi atropelado por um motorista de Land Rover em agosto de 2022, foi remarcada para 10 de junho de 2024. O motorista segue em liberdade com medidas cautelares (veja mais abaixo).

A família de Fernando, que chegou a fazer uma mobilização pedindo por Justiça em 10 endereços de SP, relatou indignação com a nova data.

“Até agora estamos mesmo sem entender o porquê o juiz está protelando tanto para marcar esta audiência. Foi apenas um dia de atraso por conta de uma manutenção do Fórum Barra Funda e o excelentíssimo joga a audiência para quase um ano. E com isso o assassino do meu filho fica livre como se a vida continuasse numa boa. Indignação total”, diz Maurício Zambori, pai de Fernando.

Em decisão no dia 12 de setembro, o juiz Jair Antonio Pena Junior alegou: “este juízo já não possui mais pauta livre para designação de audiências de réus soltos nesta Vara para o ano de 2023. Ainda, há inúmeros outros processos com fatos mais antigos aguardando a realização de audiências, pelo que não há nenhuma razão plausível para a antecipação do ato”.

Ainda conforme Maurício, a manutenção no Fórum justamente na data da audiência foi informada dias antes à família.

“Única informação que tivemos na época foi que por conta dessa uma manutenção emergencial não haveria nenhum agendamento presencial. Até pensei que poderia ser online, mas não ocorreu, infelizmente. Fui até o Fórum e realmente estava tudo fechado”, afirmou Maurício.

No comunicado colocado na frente do prédio do Fórum havia a informação sobre a suspensão de atendimento ao público, suspensão de prazos processuais dos processos físicos e suspensão das audiências e custódia presenciais, no dia 4 de setembro, “devido à troca de switches e indisponibilidade da rede lógica, conforme comunicado nº 367/2023”.

Em nota, o Tribunal de Justiça confirmou que a audiência não ocorreu e disse apenas que será designada nova data oportunamente. “Essa é a única informação disponível, pois esse processo tramita em segredo de justiça”, afirmou o TJ em nota ao g1.

Atropelamento com morte
A morte de Fernando completou um ano no dia 13 de agosto. O jovem foi atropelado na saída de um estacionando na frente de uma casa noturna no Itaim Bibi, Zona Sul de SP. O laudo do Instituto Médico Legal apontou traumatismo craniano grave como a causa da morte.

Segundo boletim de ocorrência, um amigo da vítima contou à polícia que estava com Fernando, quando o motorista de uma Land Rover Velar, que estava sem placas e atrás do veículo deles, passou a ofendê-los.

O amigo relatou que retirou o carro e colocou do outro lado da rua. Na sequência, Fernando desceu para conversar com o motorista, quando foi atropelado. Uma câmera de segurança registrou o momento do atropelamento.

O motorista fugiu do local. Ele foi identificado como Gustavo dos Santos Soares após o responsável pela casa noturna fornecer as imagens de câmera de segurança.

A prisão temporária dele chegou a ser decretada, mas no dia 8 de setembro a Justiça considerou desnecessária.

De acordo com a decisão do juiz Roberto Zanichelli Cintra, Gustavo contratou advogado e se comprometeu a colaborar com a investigação, como apresentar o carro envolvido na delegacia.

Com isso, o juiz substituiu o mandado de prisão por medidas cautelares: não sair da cidade de São Paulo por mais de 8 dias ou mudar de endereço sem avisar a Justiça, não se aproximar das testemunhas e manter o contato atualizado.

Houve, então, pedido de prisão preventiva para Gustavo, mas foi indeferido pela Justiça no dia 4 de outubro com a alegação de que ele estaria respeitando as medidas cautelares.

‘Fica tranquila, não aconteceu nada’

Uma jovem que estava no carro com o motorista deu detalhes do momento do atropelamento à polícia. Segundo o depoimento da jovem, o motorista havia bebido uísque antes de ela aceitar uma carona para casa.

Quando os dois estavam no estacionamento, Gustavo pediu que meninos que vendiam bala falassem para que um outro motorista retirasse o veículo do caminho.

Conforme o relato dela, Gustavo disse para uma pessoa fora do carro: “Estou pedindo na humildade”. Em seguida, o rapaz, que seria Fernando Palominio Zambori, questionou se o veículo de Gustavo não passaria no espaço.

Irritado, o motorista teria acelerado e atingido a vítima. A testemunha não detalhou se foi com intenção de atropelar ou assustar o pedestre.

Na sequência, o motorista perguntou para os vendedores de bala e eles teriam falado que “só tinha quebrado uma perna”.

Ainda segundo a jovem, assustada com a situação, disse: “Você é louco?” Gustavo teria respondido: “Fica tranquila, não aconteceu nada. Só quebrou a perna do menino”.

Mobilização da família

Ponte da Freguesia do Ó, Avenida do Anastácio, Avenida Paulista, Ponte do Piqueri, Avenida Francisco Mattarazo e Cidade Universitária. Esses foram alguns dos endereços que os familiares e amigos do jovem Fernando Zambori foram por 15 dias para pedir por Justiça.

A mobilização diária começou no dia 15 de agosto e ocorreu até o dia 3 de setembro. “Nós queremos que essa mobilização chegue ao máximo de pessoas para todo mundo ver que não foi acidente. O vídeo do dia do crime prova isso. Uma pessoa com todos os antecedentes criminais mais esse assassinato. O motorista não pode ficar livre”, afirmou a irmã de Fernando, Andressa Zambori.

O pai de Fernando também ressalta que o grande objetivo foi mobilizar tanto pelo caso de Fernando quanto por outros envolvendo atropelamento com morte.

“Esperamos despertar o sentido de Justiça. Não somente no caso do meu filho Fernando, mas que também possamos de alguma forma ajudar outras famílias. Nossas leis têm que mudar”, ressaltou Maurício.

Com o adiamento da audiência, a mobilização vai retornar assim que uma nova data for informada.

“Pretendemos continuar, porém, vamos primeiro aguardar uma manifestação do juiz para podermos nos organizar melhor. Os amigos do Fernando usam a seguinte frase: aqui ninguém larga a mão de ninguém e vamos até o fim”.

 

Apoiado por Tarcísio, favorito a vaga no Tribunal de Contas do Estado de SP é alvo de 4 investigações

Órgão tem o papel de fiscalizar a gestão estadual e Assembleia Legislativa é quem faz a indicação. Deputado federal e ex-prefeito de Mogi das Cruzes, Marco Bertaiolli (PSD) diz que apenas uma das quatro ações propostas pelo Ministério Público foi acolhida pela Justiça.

O deputado federal Marco Bertaiolli (PSD) é o nome mais cotado para assumir a vaga de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), que abrirá em setembro. A indicação dele é apoiada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), pelo secretário de governo, Gilberto Kassab, e do presidente do PL, Valdemar Costa Neto.

Bertaiolli é ex-presidente do Mogi das Cruzes, cidade que administrou por dois mandatos entre 2009 e 2016, e reduto político de Valdemar Costa Neto.

Ele é alvo quatro Ações Civis Públicas (ACP) por dano ao erário ajuizadas pelo Ministério Público Estadual de São Paulo, que apuram possíveis irregularidades cometidas na época em que ele era prefeito.

À GloboNews, Bertaiolli afirmou nesta quarta-feira (23) que, “das quatro ações, três nem foram acolhidas pela Justiça”.

Ainda de acordo com o deputado, em relação à quarta ação, única acolhida, “o juiz pediu uma perícia judicial e que o laudo da perícia afastou qualquer irregularidade”.

O Ministério Público Estadual informou por meio de nota que as ações seguem em andamento no Tribunal de Justiça de São Paulo e que não houve até agora condenação em nenhum dos casos.

Tarcísio X Bolsonaro
A próxima vaga no TCE-SP será aberta em setembro em razão da aposentadoria do conselheiro Edgard Camargo Rodrigues, que completa 75 anos no dia 24 de setembro.

Em tese, a última sessão no Tribunal que contará com a participação dele será no dia 20 de setembro. Todavia, ele pode se aposentar antes disso caso tenha, por exemplo, férias para tirar antes desse período.

Rodrigues é integrante da Corte de Contas desde 1991 e foi indicado pelo então governador Luiz Antônio Fleury Filho (1949/2022).

Além de Bertaiolli, disputam, nos bastidores, o advogado Maxwell Borges de Moura Vieira, apoiado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, André Mendonça, e pelo entorno do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, e o deputado estadual Ricardo Madalena, do PL, maior bancada da Alesp.

A vaga é de indicação da Alesp. A Constituição estadual de São Paulo prevê que dois terços do TCE são indicados pela Alesp e um terço pelo governador. Na prática, porém, o ocupante do Palácio dos Bandeirantes costuma exercer sempre forte influência nessas escolhas.

O deputado Ricardo Madalena disse à GloboNews que “a vaga pertence à indicação da Alesp, que o sentimento da Casa é de que tem que ser um deputado da Alesp, alguém do dia a dia deles”.

Jantar no Palácio dos Bandeirantes
Além de julgar anualmente as contas do governador, o TCE é responsável, entre outras funções, por analisar a legalidade de contratos feitos pelo governo estadual e todas as prefeituras paulistas, com exceção da Prefeitura de São Paulo, que faz parte da jurisdição do Tribunal de Contas do Município.

Cabe ao TCE ainda analisar a legalidade dos contratos de concessão e privatização assinados pelo governo do estado, uma das principais apostas de Tarcísio de Freitas para a atual gestão.

O governador Tarcísio de Freitas convidou para um almoço, ocorrido na noite desta quarta-feira (23) no Palácio dos Bandeirantes, os conselheiros do TCE e a procuradora-geral do Ministério Pública de Contas, Leticia Feres.

A reportagem solicitou à Assessoria do governador informações sobre o jantar mas não obteve resposta.

 

PF prende mais de 40 envolvidos com máfia dos combustíveis

A PF (Polícia Federal) iniciou nesta segunda-feira a Operação Poeira no Asfalto, destinada a desmantelar uma quadrilha de adulteração de combustíveis. Pelo menos 42 pessoas já foram detidas, 21 delas da Polícia Rodoviária Federal, que recebiam propina para liberar caminhões de combustíveis, principalmente de álcool, com notas fiscais frias. Outros 14 mandados de prisão ainda devem ser cumpridos.
Além dos mandados de prisão temporária expedidos pelo juiz Alexandre Libonati de Abreu, da 2ª Vara Criminal Federal do Rio, os policiais cumpriam mais de 100 pedidos de busca e apreensão no Rio, em Volta Redonda, em Campos dos Goitacazes e nos Estados de São Paulo e do Paraná.

Participam da operação, que começou às 6h, cerca de 300 policiais federais e policiais rodoviários federais. Eles cumprem mandados de prisão nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná.

Um dos presos é o ex-superintendente da Polícia Rodoviária Federal no Rio Francisco Carlos da Silva, conhecido como Chico Preto. Ele foi preso em casa, no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste da cidade. Com ele foram apreendidos vários documentos, um computador, uma escopeta calibre 12 e três pistolas. A maioria dos policiais rodoviários federais acusados mora num condomínio de luxo na Barra da Tijuca.

Também foram detidos sete fiscais, dois policiais civis e um bombeiro, além de empresários ligados ao setor de combustíveis. Os presos foram levados para a Superintendência da Polícia Federal no Rio.

Segundo a PF, empresários do setor de combustíveis adquirem o produto bruto em usinas de álcool e refinarias com notas fiscais frias, em nome de distribuidoras com registros cassados pela ANP (Agência Nacional de Petróleo) ou em nome de empresas ‘laranja’, ou até mesmo sem nota fiscal. Eles sonegam o ICMS e o PIS/Cofins dos combustíveis, fazem adulteração no combustível e trafegam com o produto com a escolta de policiais que fariam parte do esquema. A quadrilha agia havia cinco anos.

O analista de sistemas Everaldo Oliveira da Silva, 33, também preso no Rio, é considerado o principal falsificador de notas. Entre os comerciantes presos, Paulo Roberto Prette, 42, é apontado como um dos maiores corretores do combustível irregular. Já Renan de Macedo Leite, 40, e Sidmar Ribeiro da Silva, 39, aparecem como os revendedores que mais se aproveitavam do esquema.

Os fiscais e policiais corruptos agiam nos postos da PRF na Via Dutra (entre Itatiaia e Volta Redonda) e da BR-101, que estão nas rotas que abastecem o Rio com combustível de Paulínia (SP) e Campos (RJ). Os caminhões que transportavam combustível com notas falsas ou do tipo bate-volta (a mesma para vários carregamentos) só passavam pelos postos quando os integrantes do esquema estavam. Em alguns casos, passavam sem nota. O delegado Cláudio Nogueira, responsável pela operação, afirmou que os policiais recebiam propinas que variavam de R$ 5 mil a R$ 10 mil.

A PF suspeita que as usinas que forneciam combustíveis à quadrilha estejam envolvidas no esquema — como as notas fiscais frias vinham de gráficas da cidade de Londrina, há a possibilidade de que esses documentos eram passados à quadrilha no próprio ato da compra do combustível feita nas usinas de Campos e do interior paulista.

“Vamos tentar provar que as usinas, de alguma forma, participavam do esquema de corrupção. Até porque as usinas não são controladas pela ANP, mas pelo Ministério da Agricultura. E o controle do excedente de produção é ineficaz, onde gera a capacidade de corrupção e sonegação”, 

Em ação de cobrança, Banco SAFRA trata família de Andres Sanches (PT) como “organização criminosa”

“Aponta o laudo do ilustre administrador que comprova a existência de dezenas de empresas, com denominação semelhante, mesma atividade empresarial, constituída pelos mesmos sócios, com o intuito de desviar/transferir todo o dinheiro emprestado.”

O Banco SAFRA, através do processo nº 2226514-84.2014.8.26.0000, vem tentando receber R$ 5,4 milhões, tomados em “golpe” na praça, pela SOL Embalagens Plásticas, em nome de José Sanchez Oller, primo do Deputado Federal Andres Sanches (PT), também beneficiário do “esquema”.

Em resumo, a empresa tomou empréstimo, à época de R$ 3,3 milhões, com endereço fajuto em São Paulo, quando, na verdade, já operava no estado da Bahia.

O SAFRA teve pedido, até o momento, negado, de desconsideração da personalidade jurídica, mesmo após comprovar que a quadrilha “abre e fecha” empresas no mesmo endereço, e que Sanchez Oller fez “doações” a seus filhos, que, comprovadamente, sairam dum patrimônio de apenas R$ 500 para mais de R$ 3,8 milhões, sem justificativa para origem dos recursos.

Em relatório, o desembargador Heraldo de Oliveira alega que precisam ser esgotadas todas as tentativas de cobrança à empresa, antes de partir-se para a execução dos sócios.

A falta de escrúpulos da família Sanches é tamanha que uma das “sócias” colocadas no negócio, a garota Débora, tem apenas 4 anos de idade.

É mais um caso que será resolvido, tudo indica, não apenas em esfera cívil, mas também criminal (com novas investigações).

Por razões óbvias, o Deputado Federal Andres Sanches (PT) ingressou na ação como “interessado” (documento abaixo), tendo como advogado um de seus empossados no Gabinete Parlamentar, o “doutor”João de Oliveira, espécie de “topa tudo”,  que também o defenderá, amanhã, em julgamento de desvios de conduta eleitorais.

CONFIRA ABAIXO TRECHOS MAIS RELEVANTES DO PROCESSO:

“No caso dos autos, o exequente Banco Safra manifestou-se nos autos às fls. 408/432, informando ao Juízo que, em diligências administrativas, constatou que a executada está em plena atividade, requerendo a penhora de seu faturamento.”

“A providência foi deferida, tendo sido nomeado Administrador Judicial (fls. 435), que estimou seus honorários em 12% do benefício alcançado nos autos e sugeriu, de plano, no lugar de buscar a penhora do faturamento já deferida, uma ampla desconsideração da personalidade jurídica, buscando viabilizar a execução que já totalizaria R$ 5.423.456,60.”

“Detectou o perito nomeado a existência de um grupo econômico caracterizado por empresas que atuariam no mesmo ramo de atividade, tomando por base a denominação das empresas, a identidade de sócios e o cadastro nos mesmos endereços.”

“Após informar que a empresa executada jamais foi encontrada neste Estado, e que se mudou para a Bahia, afirmou que deixou de realizar a penhora determinada por não tê-la encontrado, não obstante não haja nenhuma diligência naquele Estado da Federação.”

“Mantenho, no entanto, a desconsideração e a constrição realizada em face de Kroller Consultoria Educacional Ltda ME e as sócias Laura Krolikowski Sanchez Oller (filha do executado matéria discutida nos embargos de terceiro nº ) e Debora Krolikowski Sanchez Oller,” mulher do executado, convertendo em penhora os valores constritos e determinando a transferência dos valores em conta do Juízo.”

“Com efeito, da análise das declarações de renda de Laura Oller (DIRPF 2009 a 2014 arquivadas em pasta própria), extrai-se que, entre os anos 2010 e 2011, observou evolução patrimonial de R$ 500,00 para R$ 3.816.713,00 (!!!), daí para R$ 4.150.960,91 (2012), constando de sua última declaração o total de R$ 3.153.992,15, com dívidas no importe de R$ 300.000,00, isto para uma assalariada de 27 anos com renda mensal de R$ 5.000,00, que aliás, só por isso, nunca teria o montante bloqueado como ‘economias próprias‘.”

“Também há 2 doações que totalizaram R$ 1.800.000,00 oriundas do executado José Sanchez Oller, que tudo indica seja o proprietário de todos os bens que repentinamente passaram a constar da declaração da filha, ora embargante.”

“Nesses termos, e isto sim são elementos de solidez, há dúvidas sobre a origem do patrimônio que ostenta, que é vasto e totalmente incompatível com sua atividade profissional (afirma-se simples assalariada), além de que há doações vultosas do executado José Sanchez Oller, seu pai, a seu favor.”

“Estendem-se os efeitos da desconsideração efetuada em Kroller à outra sócia, Débora. 4.”

Revogo a determinação de tramitação em segredo de justiça, determinada às fls. 802, ausente qualquer das hipóteses do art. 155 do Código de Processo Civil. A documentação juntada pelo sr. perito e que o levou a sugerir tal providência, não tem caráter sigiloso. Proceda-se da mesma forma nos autos de nº 0116546-18.2012; 0203748.33.2012; 0102337.44.2012; 0104084.29.2012.”

“Inconformado, a instituição financeira interpôs o presente recurso, alegando a necessidade de restabelecimento parcial da decisão proferida às fls.822/839 para manutenção no polo passivo da execução, das pessoas jurídicas e físicas que possuem ligação direta com os executados.”

“Ressalta que há mais que indícios do abuso da personalidade jurídica, ou seja, há provas do desvio de finalidade e da confusão patrimonial, e menciona a inexistência de bens imóveis em nome dos agravados, a existência de inúmeras execuções contra a empresa agravada e seus sócio José Sanchez Oller, que tomam empréstimos de elevados valores, entregam garantias que não existem e deixam seus credores à mingua, repassando o dinheiro a outras empresas do mesmo grupo econômico.

Aponta o laudo do ilustre administrador que comprova a existência de dezenas de empresas, com denominação semelhante, mesma atividade empresarial, constituída pelos mesmos sócios, com o intuito de desviar/transferir todo o dinheiro emprestado.

Aduz que, com exceção das pessoas jurídicas Norpack, Europack, Packduque, Empresa Paulista de Embalagens, Multipack, Geopetro, e das pessoas físicas Peter Reiter, Washington Dias, Rubnes Tadeu, Rogério José Mani, Luciane Geraldo e Wanderley Gomez, os demais fazem parte do grupo econômico e devem permanecer no polo passivo da execução.”

Justiça Federal do RS condena réus de operação da PF

A Justiça Federal de Porto Alegre condenou quatro réus da operação mãos dadas, da Polícia Federal, pelos crimes de formação de quadrilha, falsidade ideológica e denunciação caluniosa. Entre os condenados, está o casal Wolf Gruenberg e Betty Guendler, acusados de fazer parte de um esquema de “prática de estelionato contra a União, para obter precatórios que lhes foram concedidos”. O caso corre sob sigilo de Justiça e ainda não transitou em julgado.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A ação movida contra o casal por estelionato foi trancada pelo Superior Tribunal de Justiça, pois não há sequer lei penal sobre o chamado “estelionato judicial” do qual são acusados e, ainda que houvesse a tipificação de tal crime, a acusação não conseguiu comprovar as supostas manobras e inverdades usadas no processo, segundo acórdão do dia 1º de outubro de 2009.

Os réus foram condenados, por maioria de votos, a penas que variam entre dois e nove anos de prisão, além de multas que vão de 63 a 7,6 mil salários mínimos. Foi fixada, ainda, fiança de R$ 30 milhões a um dos acusados, que reside no Uruguai. Não foram divulgados os nomes dos condenados.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A fiança de R$ 30 milhões foi revogada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

A defesa de Gruenberg declarou que ainda não foi notificada da condenação. Afirmou que é uma “total surpresa dos advogados terem tomado conhecimento pelo site da Justiça Federal e por órgãos de imprensa”.

A sentença veio um dia depois da publicação de uma reportagem da revista Época narrando os vários casos judiciais de Gruenberg. Intitulada O homem que processou o Brasil, a reportagem em três capítulos conta a história do empresário e de seus embates com a Justiça brasileira. O primeiro deles data de 1978, quando Gruenberg entrou na Justiça para reclamar de uma venda pela qual não recebeu o dinheiro. A compradora, à época do negócio, era uma empresa controlada pelo Banco do Brasil, e poucos meses depois do início do caso, a família Gruenberg foi à falência.

O homem que processou o Brasil

A insólita história de Wolf Gruenberg, o empresário que dedicou sua vida a cobrar uma dívida, foi preso sob acusação de manipular a Justiça – e hoje acusa a polícia de tortura e quer fazer seu caso chegar às Nações Unidas

Capítulo 1

UM CASAL NA PRISÃO

Sentado na cafeteria de um shopping center no bairro paulistano de Higienópolis, Wolf Gruenberg narra sua história. O terno e as rugas de seus 63 anos lhe conferem um ar de respeitabilidade. Ele entremeia seu relato com um sem-número de documentos que vai sacando de uma pasta de couro preta. Todo tipo de artefato jurídico sai lá de dentro: há certidões, sentenças, recursos, registros, agravos de instrumento, exceções de suspeição e um emaranhado de fios que vão se cruzando nos pontos e nós de um enredo que, por seu relato, daria um thriller ao estilo dos best-sellers de autores como John Grisham ou Scott Turow.

Wolf nasceu em 1948, pouco depois da Segunda Guerra Mundial, no campo de refugiados de Wolfrathausen, onde seus pais se conheceram. Quando a guerra acabou, era inviável para judeus como eles permanecer na Alemanha. O casal Gruenberg e o filho de 3 anos, nascido apátrida, cruzaram então o Atlântico para se estabelecer na Bolívia, depois no Brasil. Wolf viveu em Corumbá, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Porto Alegre. Aos 18 anos, recebeu a cidadania brasileira. Formou-se em Direito e, adulto, tornou-se um empresário dedicado a recuperar companhias em processo falimentar. Às vésperas dos 60 anos, foi acometido de um incomum e virulento câncer sublingual, que quase lhe tirou a voz e a vida. Quando foi diagnosticado, o tumor crescia a cada 26 horas. Havia duas saídas: uma cirurgia radical ou uma combinação agressiva de sessões de quimioterapia e radioterapia. A opção escolhida foi a segunda. A doença regredia de acordo com os planos médicos, até que a vida de Wolf sofreu uma súbita reviravolta.

Às 6 horas da manhã do dia 11 de julho de 2008, cerca de 30 policiais federais armados de submetralhadoras arrombaram o portão de sua casa em Porto Alegre. Prenderam Wolf e sua mulher, Betty. Até então, Wolf apenas suspeitava ser o foco de investigações policiais. Desconhecia detalhes das pilhas de processos resultantes de uma investigação de mais de um ano em sua vida, suas contas, seus negócios, suas relações pessoais. Ele era monitorado pela Polícia Federal (PF) por meio de escutas telefônicas, telemáticas e ambientais. Passara de empresário renomado, com bom trânsito na alta sociedade, a principal alvo da operação da Polícia Federal batizada de mãos dadas. Nas páginas dos jornais que noticiaram a operação, Wolf Gruenberg foi qualificado como chefe de uma quadrilha que arquitetou um esquema bilionário de fraudes contra a União.

Wolf afirma ter sido privado, ao longo dos 150 dias que passou na prisão, da fase final de seu tratamento contra o câncer. Ainda assim, diz ele, suas agruras no cárcere foram pequenas em comparação com o suplício da mulher. Quando foi presa, Betty Gruenberg acabara de sair de uma cirurgia para redução nos seios. Nem sequer tinha retirado os pontos da delicada operação. Ela foi então instalada pelas autoridades numa cela da Penitenciária Feminina Madre Pelletier, em Porto Alegre. Lá, contraiu uma infecção que deixou seus seios purulentos e quase se transformou em septicemia. Transferida para o melhor hospital de Porto Alegre, o Moinhos de Vento, Betty quase perdeu as mamas. Na UTI do hospital, foi mantida algemada pelos pés à maca em que convalescia. “O Estado quase a matou. Eles foram extremamente cruéis com ela”, afirma Wolf. Ele retira então da pasta de couro fotografias que mostram as lesões da mulher e os boletins médicos que relatavam a gravidade de seu quadro. Quando saiu do hospital, Betty foi colocada na carceragem da Polícia Federal, onde, de acordo com os relatos de Wolf, dividiu uma cela com homens.

As arbitrariedades de que Wolf se julga vítima não cessaram aí. Conversas dele com seus advogados foram grampeadas – prática repudiada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Câmeras de vídeo foram instaladas em quartos de hotéis em que o casal Gruenberg se hospedou. Em 2009, a casa de Wolf em Punta del Este, no Uruguai, foi vasculhada pela polícia uruguaia, de posse de um mandado de busca e apreensão oriundo do Judiciário brasileiro. Documentos, computadores, chaves dos carros e objetos da família foram apreendidos. Wolf deu por falta até de uma caneta da marca Mont Blanc que seu filho mais novo ganhara por ocasião de seu bar mitzvah, cerimônia judaica que marca a entrada do homem na vida adulta, aos 13 anos. Os objetos nunca mais foram vistos pela família Gruenberg. Tampouco a Polícia Federal brasileira os recebeu. Espera por eles há quase três anos para prosseguir com as investigações. A polícia uruguaia não soube explicar onde foram parar os pertences dos Gruenbergs.

Depois de ser libertado, graças a um habeas corpus, Wolf começou uma cruzada a que tem se dedicado nos últimos quatro anos. Nela, tem investido tempo e dinheiro. Contratou assessores de imprensa e alguns dos mais badalados advogados do Brasil, como Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, Luiz Roberto Barroso, Carlos Eduardo Caputo Bastos e o ex-deputado federal e delegado da Polícia Federal Marcelo Itagiba. Wolf também buscou o apoio de ONGs internacionais, como a Justiça Global. A pedido dele, a Justiça Global remeteu um relatório sobre as condições de sua prisão e de sua mulher para a análise da Relatoria Especial da Organização das Nações Unidas contra tortura. “Temos muitas demandas de violações de direitos humanos em cadeias brasileiras. Em geral, as vítimas são pobres. No caso de Wolf, não tivemos tempo de averiguar tudo, mas ele trouxe fotos e documentação para comprovar o que nos disse”, afirma Sandra Carvalho, da Justiça Global.

Em mais de oito horas de conversa, em dois encontros com ÉPOCA, Wolf procurou relatar seu caso incomum. “Sou um perseguido, e meus inimigos usam o Estado brasileiro para me atingir”, diz. Essa é a explicação, de acordo com sua versão, para a extensa lista de crimes que lhe imputam e que enumera com sua voz mansa, enquanto alisa a barba espessa e grisalha: formação de quadrilha, estelionato judicial, falsidade ideológica, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, denunciação caluniosa. “Nem na época da ditadura uma coisa dessas aconteceria.” Ri, nervosamente.

Capítulo 2

GRUENBERG X UNIÃO

A contenda entre Wolf e as autoridades é uma história longa e complicada, que se estende por quase todos os desvãos do labiríntico sistema Judiciário brasileiro. Seu início data de 1977. Naquela ocasião, a família Gruenberg tocava a AC Indústria e Comércio, Importação e Exportação S.A., uma indústria têxtil em São Paulo. Um dos negócios da AC era vender mercadorias a uma empresa no Paraguai. A operação de exportação era intermediada pela Companhia Brasileira de Entrepostos Comerciais, ou Cobec, uma empresa de capital misto, da qual a União era acionista. A operação comercial, segundo Wolf, teve um desfecho desastroso. A Cobec comprou, mas não pagou. A família Gruenberg vendeu, mas não levou. Restou a Wolf apenas uma coleção de duplicatas não pagas no valor, na moeda de então, de Cr$ 15 milhões. Isso é o equivalente, em valores atualizados, a aproximadamente R$ 2,7 milhões, de acordo com a evolução do Índice de Preços ao Consumidor de São Paulo (IPC-SP), da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).

Depois de mais de um ano de tentativas para receber o crédito, Wolf recorreu à Justiça pela primeira vez em 1978. Moveu dois processos contra a Cobec. Um para receber o montante que a empresa paraguaia pagaria por suas mercadorias. E outro para obter reparação pelo que a família deixara de ganhar em lucros futuros por causa do calote. Poucos meses depois de sofrê-lo, a empresa da família Gruenberg foi à falência. Wolf ganhou o primeiro processo no final da década de 1980. Na ocasião, a Cobec, então controlada pelo Banco do Brasil, já fora rebatizada de Infaz. A Justiça fixou o valor a ser recebido por Wolf em US$ 1,06 milhão. Esse montante, segundo as contas da Infaz, incluía o valor corrigido das mercadorias e as perdas futuras da AC. E somava também uma multa estipulada pela Justiça, que considerou a Infaz culpada de ter tentado postergar a sentença usando argumentos desleais ou, no jargão jurídico, de ter praticado litigância de má-fé. A família Gruenberg discordou. De acordo com Wolf, o que lhes foi pago estava aquém do justo. “Além disso, a Infaz não dispunha de recursos para liquidar a dívida e nos pagou apenas 10% do que a Justiça determinou”, diz ele.

A trama se embaralhou ainda mais quando Wolf insistiu no segundo processo contra a Cobec, para receber indenização por perdas e danos. Nesse ponto da narrativa, sua contida indignação começa a aumentar. Mas sua voz rouca jamais sobe de tom. Sem precisar consultar nenhuma anotação, cita nomes e datas com precisão. Quando questionado sobre algum trecho da história, retoma a explicação sem cair em contradição. Chega a repetir frases inteiras, palavra por palavra, em conversas distintas, quase como se tivesse decorado um texto. Na Justiça, a Infaz acusou Wolf de cobrar o pagamento de um prejuízo pelo qual ele já fora ressarcido no primeiro processo. A disputa se deu no âmbito cível da Justiça de São Paulo. Em 30 de outubro de 1991, 14 anos depois do calote, Wolf obteve outra decisão favorável nesse segundo processo. O juiz Aclibes Burgarelli decidiu que uma perícia contábil deveria ser realizada para fixar o valor da indenização a ser paga pela Infaz a Wolf. O perito contratado pela Infaz calculou-o em US$ 10 milhões. O perito de Wolf estimou-o em US$ 58 milhões. O perito nomeado pelo juiz Aclibes Burgarelli estipulou o valor de US$ 41 milhões.

Bastaria superar o imbróglio contábil para que esse capítulo da vida de Wolf se encerrasse. A essa altura, já fazia 17 anos que ele levara o calote. No entanto, antes que o juiz desse a sentença final sobre o valor da indenização, em 10 de junho de 1994, houve mais uma reviravolta na já rocambolesca história. A Infaz foi absorvida pela União. Daí em diante, quem se sentaria no banco dos réus da ação movida por Wolf era o próprio Estado brasileiro – e não mais uma empresa de capital misto. A briga começava a ganhar contornos ainda mais kafkianos. A discussão, que até então seguia na Justiça de São Paulo, teve de ser reaberta em âmbito federal, a instância jurídica adequada para processos que envolvem o Estado brasileiro. Por conveniência de Wolf, que morava em Porto Alegre, o processo foi transferido para a Primeira Vara Cível Federal na capital gaúcha.

Apenas em 1999, 22 anos depois do calote, a União assumiu efetivamente seu papel de parte no processo. A Advocacia-Geral da União (AGU) acusou Wolf de tentar cobrar uma dívida que a Infaz já pagara, ato chamado, no jargão jurídico, de dúplice cobrança. A AGU também pediu a entrada do Ministério Público Federal no caso, a anulação do processo e novas perícias contábeis. A tramitação foi morosa, a despeito da disposição do juiz federal Alexandre Lippel em julgar com celeridade. “O processo já tramitava havia muitos anos, e o doutor Wolf sempre vinha me pedir rapidez”, diz Lippel. “Queria que ele saísse do meu pé.” Só em 2004, 27 anos depois do calote e 13 anos depois da primeira decisão favorável à indenização, Lippel pronunciou sua decisão. Fixou a indenização devida a Wolf em R$ 754 milhões, ou mais de R$ 1 bilhão em valores corrigidos pela inflação.

Em dezembro de 2011, o juiz Lippel demonstrou perplexidade ao ser questionado sobre sua decisão de sete anos atrás. Seus olhos azuis ficaram perdidos. Lippel disse que se baseou nos três laudos contábeis que constavam do processo que corria na Justiça de São Paulo. Sua decisão levou em conta correções monetárias a partir da variação do dólar e de uma expectativa de lucro calculada em quase 20% ao ano para a empresa de Wolf. “É um valor enorme, me surpreendeu, mas, pelo tempo que a ação corria, imaginei que fosse isso mesmo”, disse Lippel. “Dei até um prazo dilatado para a União se manifestar.” Ao longo das investigações da Operação Mãos Dadas, da PF, Lippel foi chamado a depor na ação criminal contra Wolf. Em seu depoimento, afirmou que nunca foi pressionado a decidir em favor do empresário e que olhou o processo “com capricho”. “Estava convencido dos critérios que usei para julgar”, disse a ÉPOCA. “Mas fica sempre a dúvida, eu não sei (se fui enganado). A gente atua na boa-fé, confiando na lealdade das pessoas. Dizem que eu teria sido manipulado. Até hoje, fica essa desconfiança.”

A União apelou contra a decisão de Lippel e argumentou que devia apenas R$ 47,6 milhões. Mesmo com uma decisão que lhe atribuía um crédito de quase R$ 800 milhões, Wolf também apelou para reclamar um valor maior. O processo subiu para o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, com sede em Porto Alegre. Foi nesse mesmo período que o Ministério Público Federal e a Polícia Federal iniciaram uma investigação contra Wolf por suspeita de “estelionato judicial”, uma tentativa de ludibriar a Justiça para lesar a União. De acordo com a investigação, longe de ser vítima do Estado brasileiro, Wolf era o responsável por uma criminosa alquimia que transformou uma dívida de alguns milhares de cruzeiros – de que ele era credor no final da década de 1970 – numa conta de mais de R$ 1 bilhão a ser paga pela União. Segundo a PF e o MPF, Wolf manipulou fatos, provas e juízes para conseguir essa façanha.

Atualização (dia 16 de março de 2016): A ação movida contra o casal por estelionato foi trancada pelo Superior Tribunal de Justiça, pois não há sequer lei penal sobre o chamado “estelionato judicial” do qual são acusados e, ainda que houvesse a tipificação de tal crime, a acusação não conseguiu comprovar as supostas manobras e inverdades usadas no processo, segundo acórdão do dia 1º de outubro de 2009.

Capítulo 3

A INVESTIGAÇÃO POLICIAL

O resumo das atividades criminosas de que Wolf foi acusado consta dos volumes de processos que tramitam em caráter sigiloso na Justiça. Eles foram elaborados, sobretudo, ao longo de mais de um ano de trabalho exclusivo de um único delegado e dois agentes da Polícia Federal, no Rio Grande do Sul. “Como pode uma empresa que tinha patrimônio negativo, em 1977, de Cr$ 6.976.510,35 e faliu ser capaz de gerar uma indenização de R$ 1 bilhão?”, diz o delegado Luciano Flores de Lima, que comandou as investigações da PF. Atualizado pelo IPC da Fipe, os Cr$ 6 milhões de patrimônio negativo da empresa AC, da família Gruenberg, equivaleriam hoje a R$ 1,3 milhão.

Em 2006, quando a indenização a Wolf em R$ 754 milhões foi confirmada, em segunda instância, pelo desembargador Edgar Lippmann, do TRF da 4a Região, a PF reforçou sua investigação contra ele. Na época, surgiram denúncias de que Lippmann vendera uma sentença favorável à reabertura de uma casa de bingos. Por causa dessas denúncias, Lippmann , desde 2008, é investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ele responde a um processo administrativo disciplinar, que deverá ser julgado até março. Pelas mesmas acusações, Lippmann enfrenta um processo criminal no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Os investigadores da PF sugerem que Lippmann pode ter sido permeável às pressões de Wolf. O empresário nega. “Lippmann não nos ajudou em nada”, diz ele. No vaivém de recursos e liminares relativos aos processos, dois juízes deram decisões contrárias aos interesses de Wolf. Os dois foram denunciados por ele como parciais. Para a PF e o MPF, foi uma tentativa de Wolf para desacreditá-los e retirá-los do caso. Pelas ações contra os juízes, Wolf responde a processo por denunciação caluniosa. “Dizem que enganei juízes, mas não dizem a quem enganei”, afirma Wolf. “Ou sou um gênio, mais inteligente que Albert Einstein, ou os mais de 40 juízes que atuaram no caso são todos uns incapacitados.”

Atualização (16 de março de 2016): Não houve qualquer imputação de corrupção ou tentativa de corrupção por parte de Wolf em relação a Lippmann. Em relação aos magistrados que estão no contexto das acusações de denunciação caluniosa, as representações foram feitas por advogado nomeado pela Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas do Advogado da OAB-RS, órgão de classe que deferiu assistência em favor de Wolf por entender violadas suas prerrogativas profissionais.

Trinta e um anos depois do calote, em abril de 2008, a então ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), reviu todas as decisões anteriores que mandaram a União pagar indenização a Wolf. Acatando um pedido da AGU, ela suspendeu o pagamento. Na ocasião, Wolf já recebera quase R$ 11 milhões dos R$ 754 milhões que a União lhe devia. Boa parte do dinheiro fora enviada ao Uruguai, onde Wolf tem casa em Punta del Este. De acordo com a PF e o MPF, a transferência do dinheiro era um ardil para evitar que ele fosse confiscado para o pagamento de dívidas trabalhistas das empresas da família Gruenberg. Wolf foi então acusado de evasão de divisas. Ele chama essa acusação de “balela”. Diz que transferiu seu dinheiro por meio do Banco Central e, por isso mesmo, as autoridades brasileiras sabiam onde ele estava. E que, como tinha negócios no Uruguai, resolveu manter seus recursos por perto.

Atualização (16 de março de 2016): A transferência foi feita através de instituição financeira oficial, com a chancela do Banco Central. O mesmo juiz que prendeu Wolf pela suposição da prática do ilícito de evasão de divisas, veio a absolvê-lo sumariamente após a resposta à acusação, em decisão confirmada pelo TRF da 4ª Região.

A investigação da PF contra Wolf colheu mais elementos do que chamava de “conduta criminosa” do empresário. Monitorado por telefone, e-mail e escutas ambientais, Wolf foi flagrado, segundo os investigadores, tentando constranger autoridades e influenciar o curso de seus processos. Num telefonema a sua mulher, Betty, Wolf, de acordo com as investigações, dissera estar disposto a gastar “de R$ 10 a R$ 15 milhões” em subornos a servidores federais, entre eles o então chefe da AGU, José Dias Toffoli, hoje ministro do STF. Em outro diálogo, com dois advogados de Brasília, disse, de acordo com as gravações: “Contratem juristas de renome, para atuar detrás das cortinas, no STF e no STJ”. As escutas serviram de justificativa para a ação da Operação Mãos Dadas que prendeu Wolf, sua mulher e alguns de seus funcionários, em 11 de julho de 2008. “Isso é mentira. Tenho um amigo em comum com o Toffoli, mas não teria cabimento abordá-lo para falar do meu caso”, diz Wolf.

Responsável por decretar as prisões, o juiz federal criminal de Porto Alegre João Paulo Baltazar nega qualquer tipo de excesso ou maus-tratos em relação aos réus. “Houve várias perícias na senhora Betty. Ela foi internada no hospital particular que escolheu. Na minha interpretação, não houve violação de nenhum direito”, afirma Baltazar. Segundo ele, Betty não teve contatos com nenhum homem em sua cela, porque estava numa solitária. Reconhece que, no local, não havia vaso sanitário, mas afirma que essa é uma determinação legal para evitar que os detentos tenham qualquer instrumento capaz de facilitar um suicídio. E diz que as algemas foram necessárias no período no hospital, porque Betty ameaçava fugir. Recentemente, Wolf tentou afastá-lo do caso por meio de um instrumento jurídico conhecido como exceção de suspeição. A ação de Wolf contra Baltazar, juiz especializado em lavagem criminal e ex-auxiliar do CNJ, foi rejeitada pelo TRF da 4ª Região. Baltazar só concordou em receber a reportagem de ÉPOCA para falar em tese, e não sobre o caso específico de Wolf.

Atualização (22 de março de 2016): A exceção de suspeição movida contra o juiz José Paulo Baltazar Junior foi rejeitada pelo argumento de que a vinculação ideológica do juiz não é motivo indicado na lei para suspeição.

A prisão pela PF e as denúncias feitas pelo MPF transtornaram completamente a vida da família Gruenberg. Mais de três anos depois da Operação Mãos Dadas, Wolf continua empenhado em receber a indenização da União pela qual briga há 33 anos. O pagamento da dívida continua suspenso. A essa batalha judicial, acrescentou outra: move dois processos contra a União por tortura e tenta derrubar as últimas acusações que subsistem contra ele na Justiça: falsidade ideológica, formação de quadrilha e denunciação caluniosa. Os crimes de evasão de divisas, estelionato judicial e lavagem de dinheiro foram considerados inexistentes ou improcedentes. Os processos relativos a eles foram trancados na primeira e na segunda instâncias e no STJ. Os remanescentes devem ser julgados dentro de seis meses pelo juiz Baltazar, cujas decisões têm sido desfavoráveis a Wolf. Curiosamente, é o próprio Baltazar quem resume a insólita história de Wolf, um homem que passou mais da metade de sua vida envolvido em disputas nos tribunais brasileiros: “A Justiça brasileira é disfuncional e sem fim”.

Atualização (22 de março de 2016): Os delitos de evasão de divisas, estelionato judicial e lavagem de dinheiro foram considerados inexistentes ou improcedentes. As acusações em relação aos demais delitos — falsidade ideológica de documento particular, formação de quadrilha e denunciação caluniosa — ainda aguardam a análise de embargos infringentes no TRF-4.