TJAC 08/06/2020 - Pág. 117 - Diário da Justiça - Tribunal de Justiça do Estado do Acre
DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO
Ministério Público em face do acusado Bruno Damasceno de Souza, imputando-lhe o crime descrito no art. 129, §9º do CP c/c com a Lei 11.343/06. Relata
a denúncia que no dia 15 de março de 2019, o acusado agrediu fisicamente
a vítima Ana Paula Maciel da Luz, causando-lhe lesões corporais de natureza
leve. A denúncia foi recebida no dia 11 de setembro de 2019. Houve regular
defesa prévia e nesta data procedeu-a instrução do feito. Ausente preliminar a
ser analisada ou nulidade a ser reconhecida, passo a decidir o mérito. A materialidade delitiva do crime de lesões corporais leves está devidamente comprovada nos autos pela juntada do termo de declaração da vítima (fls.04/05),
do laudo de exame de corpo de delito à fl. 06, e demais provas coligidas aos
autos, em especial o depoimento da vítima em juízo confirmando os fatos, de
acordo com o seu depoimento prestado em sede inquisitorial.
A autoria delitiva também restou comprovada, pelo depoimento da vítima que,
embora o fato não tenha sido presenciado por mais ninguém, a vítima corroborou seu depoimento em juízo, mas esclarecendo parte de seu depoimento
quanto a uma suposta agressão em 2018. Esclareceu a vítima que após o réu
ingerir bebida alcoólica, quis manter relações sexuais contra a sua vontade,
momento em que, diante da negativa dela, o réu passou a lhe agredir, gerando
as agressões atestadas no exame de corpo de delito.
Embora o réu afirme que chegou a segurar a vítima pelos braços e empurrá-la, o fez após agressão primeira desta, em ação de legítima defesa. Ocorre
que não restou comprovados os seus requisitos, uma vez que a ação admitida
pelo réu de apenas segurar e empurrar a vítima é incompatível com as lesões
atestadas, inclusive com o corte no lábio da vítima e hematomas nos braços e
punho, de modo que se houve inicial legítima defesa, houve evidente excesso
e desproporcionalidade nos meios empregados.
Restou evidenciado também que a vítima sofreu sequelas psicológicas do fato,
mostrando-se abalada e afirmando ter necessitado de atendimento e acompanhamento psicológico e inclusive foi firme ao afirmar que após a agressão não
quis se relacionar mais com o réu. Nesse sentido, verifica-se abalo moral. Não
há comprovação de dano material, referente a sumiço de quantia em dinheiro
ou do capacete que o réu afirma que entregou na delegacia para ser entregue
à vítima, cabendo a esta a busca por tal bem junto à Dean.
Assim, pelas provas acostadas aos autos, verifica-se que o réu, de fato, agrediu fisicamente a vítima, causando-lhe as lesões corporais descritas no laudo
de exame de corpo de delito à fl. 09. Cumpre destacar que segundo o art. 5º
da Lei 11.340/06, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual
ou psicológico e dano moral ou patrimonial no âmbito da unidade doméstica,
no âmbito da família e no que concerne a relação íntima de afeto, sendo que
este último caso se refere ao “relacionamento estreito entre duas pessoas,
fundamento em amizade, amor, simpatia, dentre outros sentimentos de aproximação” (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p.864).
Ainda tem-se que nas infrações cometidas no âmbito doméstico e familiar há
grande dificuldade de se colher provas testemunhais do ato, haja vista que, em
regra, são cometidos na intimidade do lar, na grande maioria das vezes sem
que haja terceiros no local ou no momento da prática delitiva de modo a presenciar o ocorrido, razão pela qual a jurisprudência pátria tem sido, remansosa
acerca da palavra da vítima, quando proferida em sede policial e confirmada
de modo firme e serene em Juízo, tendo a mesma, por tais razões, especial
relevância:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NOS ACLARATÓRIOS NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LESÃO CORPORAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. CONDENAÇÃO. PALAVRA DA VÍTIMA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. (I) - AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO
LEGAL OBJETO DE INTERPRETAÇÃO DIVERGENTE. APELO ESPECIAL
COM FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. (II) - DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ART. 255/RISTJ. INOBSERVÂNCIA. (III) - PALAVRA DA
VÍTIMA CORROBORADA POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A falta de
indicação do dispositivo de lei federal a que os acórdãos teriam conferido interpretação divergente evidencia deficiência na fundamentação recursal que
impede o conhecimento do recurso especial ante à incidência do enunciado
284 da súmula do Supremo Tribunal Federal. 2. A não observância dos requisitos do artigo 255, parágrafo 1º, do Regimento Interno do Superior Tribunal
de Justiça torna inadmissível o conhecimento do recurso com fundamento na
alínea “c” do permissivo constitucional. 3. “É firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que, em crimes praticados no âmbito doméstico, a
palavra da vítima possui especial relevância, uma vez que, em sua maioria,
são praticados de modo clandestino, não podendo ser desconsiderada, notadamente quando corroborada por outros elementos probatórios (AgRg no
AREsp 1003623/MS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado
em 01/03/2018, DJe 12/03/2018). 4. Agravo regimental desprovido.(AgRg nos
EDcl no AREsp 1256178/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe 04/06/2018).
Em relação à tese defensiva quanto ao uso de álcool não há exclusão da imputabilidade penal a embriaguez voluntária, consoante art. 28, inc. II e tampouco
restou comprovada a legítima defesa empregada em face de injusta e anterior
agressão da vítima, com uso de meios moderados e proporcionais a esta.
Diante da prova da materialidade e autoria delitiva, e ausente causa que exclua
a culpabilidade ou isente o réu de pena, JULGO PROCEDENTE o pedido da
Rio Branco-AC, segunda-feira
8 de junho de 2020.
ANO XXVIl Nº 6.610
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denúncia para CONDENAR o réu Bruno Damasceno de Souza nas penas do
art. 129, §9° do CP c/c a Lei 11.343/06.
Com fulcro no critério trifásico previsto no art. 68 do CP, passo dosar a pena.
Em relação às circunstâncias judicias verifico que não há o que sopesar negativamente em desfavor do acusado. O mesmo é tecnicamente primário (fl.
46/47), pois a condenação registrada é posterior aos fatos ora apurados, razão
pela qual fixo a pena-base em 03 (três) meses de detenção. Não há atenuantes a serem aplicadas. Quanto à agravante da violência doméstica, esta
já é elementar do tipo penal ora analisado. Ausentes causas de aumento ou
diminuição de pena, fixo a pena definitiva em 03 (três) meses de detenção, no
regime inicial aberto para cumprimento da pena.
Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ante a
vedação para crimes cometidos com grave ameaça ou violência à pessoa, de
acordo com a Súmula 588 do STJ.
Deixo de aplicar-lhe o sursis, pois este mostra-se mais gravoso ao apenado
que o próprio cumprimento da pena aplicada, visto que o prazo de suspensão
e, consequentemente, de cumprimento das condições a serem impostas será
de no mínimo 02 (dois) anos, sendo a pena aplicada de 03 (três) meses de
detenção. Neste prisma, cito o seguinte julgado:
EMENTA : APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME DE AMEAÇA LESÃO CORPORAL
- RECURSO MINISTERIAL - SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA (SURSIS) - ARTS. 77 E 78 DO CP - SITUAÇÃO MAIS GRAVOSA - MANUTENÇÃO
DO CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM REGIME
ABERTO - MATÉRIA PREQUESTIONADA - APELO IMPROVIDO. 1. A aplicação da suspensão condicional da pena, prevista no art. 77 do CP, sursis
, se mostra, na prática, como situação mais grave para o réu, já que a sua
pena privativa de liberdade, que fora fixada em patamar baixo, é de detenção
e em regime aberto, sendo seu efetivo cumprimento situação mais benéfica
para o recorrido, pois evita que o mesmo tenha que cumprir as condicionantes
previstas no § 2º do art. 78 do CP, pelo prazo de dois anos. 2. Apelo improvido. (TJ-ES - APL: 00000733020178080049, Relator: ADALTO DIAS TRISTÃO,
Data de Julgamento: 08/08/2018, SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL, Data de
Publicação: 14/08/2018) APELAÇÃO CRIMINAL - RÉU CONDENADO A 02
ANOS DE RECLUSÃO NOS TERMOS DO ART. 304 DO CP - USO DE DOCUMENTO FALSO - FIXADO O REGIME ABERTO PARA O CUMPRIMENTO
DA PENA - INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - PRETENDIDA
SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS
DE DIREITOS OU APLICAÇÃO DO SURSIS PENAL -INVIABILIDADE - DIREITO SUBJETIVO DO RÉU - SUBSTITUIÇÃO A QUAL SE MOSTRA MAIS
GRAVOSA AO RÉU CONDENADO NO REGIME ABERTO - DECISÃO MANTIDA NA INTEGRALIDADE - RECURSO MINISTERIAL IMPROVIDO. Não há
se falar em substituição da pena privativa de liberdade fixada no regime aberto
por pena restritiva de direitos quando esta se mostra mais gravosa ao sentenciado. (Ap 123377/2009, DES. TEOMAR DE OLIVEIRA CORREIA, SEGUNDA
CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 24/03/2010, Publicado no DJE 07/04/2010)
(TJ-MT - APL: 01233771620098110000 123377/2009, Relator: DES. TEOMAR
DE OLIVEIRA CORREIA, Data de Julgamento: 24/03/2010, SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 07/04/2010).
Fixo de acordo com o art. 115, da Lei 7.2010/84, as condições do regime aberto:
1.
com a intimação para início da execução, comparecer na VEPMA,
dentro do prazo de cinco dias, para apresentar comprovante de endereço atualizado.
2.
Comparecer bimestralmente na VEPMA para justificar sua atividades, inclusive laborais.
3.
não mudar de residência sem prévia comunicação ao Juízo.
4.
não se ausentar da cidade onde reside sem autorização judicial.
5.
recolher-se ao seu domicílio, diariamente, após às 19:00 horas., com
exceção nos dias em que o reeducando trabalha em regime de plantão noturno
no Hospital da Mulher e da Criança Irmã Inete.
6.
não ingerir bebida alcoólica ou fazer uso de substância entorpecente
ou que cause dependência física ou psíquica.não praticar crimes ou contravenções.
Condeno-o ao pagamento das despesas do processo, suspensas no entanto,
pelo prazo de 05 anos, em razão da aplicação da Lei 1.060/50, deferindo ao
réu, assistido por advogado dativo nomeado nos autos, ante a ausência de
atuação da Defensoria Pública do Estado do do Acre, os benefícios da assistência judiciária gratuita, com efeito retroativo a todos os atos desse processo.
Incabível a decretação da prisão preventiva, razão pela qual é garantido ao
réu o direito de recorrer em liberdade.
Na esteira do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recusos repetitivos, analisada a questão no Resp 1.643.051-MS, donde se firmou
o entendimento de que é cabível a fixação de valor mínimo de indenização
à vítima da violência doméstica, para reparação dos danos morais ínsitos à
referida violência. Desta feita, fixo em 500,00 (quinhentos) reais a indenização
para reparação mínima dos danos morais, devendo a vítima executar o título
executivo judicial na vara cível competente.
Transitada em julgado a presente decisão: A) certifique-se, anote-se nos livros
respectivos da escrivania e distribuidor, bem como à Delegacia de Polícia por
onde tramitou o Inquérito Policial. B) lance-se o nome do réu no rol dos cul-