TJAL 14/02/2013 - Pág. 66 - Caderno 2 - Jurisdicional - Primeiro Grau - Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas
Disponibilização: Quinta-feira, 14 de Fevereiro de 2013
Diário Oficial Poder Judiciário - Caderno Jurisdicional - Primeiro Grau
Maceió, Ano IV - Edição 869
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seja, disparo de arma de fogo, com pena de reclusão de 02 (dois) a 04 (quatro) anos, e multa. Trata-se de crime de mera conduta, sendo
suficiente a ação de disparar a arma de fogo para que haja a consumação do delito. É também crime de perigo abstrato, ou seja, a lei
não exige a comprovação de efetiva ofensividade ao bem jurídico tutelado pela norma, não há, portanto, a necessidade de se comprovar
que a conduta do agente expôs ou não outrem a risco, a não ser que com o disparo o agente tenha a finalidade de praticar outro crime,
caso em que responderia por este outro delito e não apenas pelo disparo. Outro fator que deve ser analisado para a consumação deste
delito é que o disparo deve ser efetuado em lugar habitado ou nas suas adjacências, sendo lugar habitado aquele em que concentra ao
seu redor pessoa(s) residindo. No caso em análise esse fator (lugar habitado) resta totalmente comprovado conforme se vê no laudo de
constatação (fls. 62) realizado na residência da vítima, bem como pelo fato de haver mais de 3 (três) pessoas dentro da residência no
momento do disparo. Como dito acima, o réu efetuou o disparo na presença de várias pessoas. Além disso, o próprio réu confessou o
disparo da arma de fogo em juízo (fls. 171/173). Isto posto, a autoria é induvidosa e a materialidade está devidamente comprovada pelo
laudo pericial de constatação de fls. 62, pelo exame de balística de fls. 63/65, e pelos depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo
que sustentaram a mesma versão, sem qualquer tipo de contradição. Quanto à tese de legítima defesa sustentada pela defesa, não há
qualquer possibilidade de reconhecê-la. Analisando-se os depoimentos prestados em juízo tem-se: Testemunha do MP, Rosineide de
Freitas Barroso, fls. 1235/236, dos autos, disse: “(...) que no dia do crime, o réu tinha ido até a casa da vítima pegar o filho para passear;
que houve uma discussão entre o réu e a vítima, chegando ambos a entrarem em luta corporal; que várias pessoas estavam na casa
interviram e conseguiram afastar o réu da vítima ...que esta luta ocorreu no final da tarde; que já no começo da noite, o réu retornou a
residência da vítima, não sabendo a depoente como aquele conseguiu entrar ...que o réu foi até à cozinha com um revólver na mão...que
o disparo atingiu a cadeira que estava na frente da vítima, e ricocheteou, atingindo a geladeira(...)”. Testemunha do MP, Maria Pereira de
Lima, fls. 237/238, dos autos, disse: “(...) que no dia do crime, estava na residência da mãe da vítima, quando o réu chegou no período
da tarde...que houve uma troca de agressões entre a vítima e o réu...que por volta das 19hrs, o
réu retornou à casa da vítima armado com um revólver; que a depoente estava na cozinha, juntamente com a vítima, Rosineide
e Maria Inácio da Silva...que o disparo atingiu uma cadeira e a geladeira da cozinha(...)”. O Réu, Paulo Vicente de Lima Filho, em seu
interrogatório de fls. 174/176, dos autos, disse: (...) que de fato o seu filho Davi presenciou toda a cena e estava no momento em que
fez o disparo, na casa da sua sogra; que não atirou no encosto da cadeira, como a vítima falou e sim no acento, pois a sua intenção era
dar-lhe um susto; que o revólver estava completamente carregado, não sabendo a capacidade de tiro; que se quisesse efetuar outros
disparos teria feito (...)”. A Legítima defesa é causa que exclui a ilicitude da conduta. O Legislador ao prevê-la buscou dar uma alternativa
para o agente que se encontra diante de uma injusta agressão, permitindo que ele sacrifique bens alheios para proteger o seu próprio
bem, desde que os bens possuam valores, no mínimo, semelhantes e que a ação repressora da agressão seja necessária e moderada.
São requisitos da legítima defesa: 1) Agressão injusta, real, atual ou iminente; 2) Ameaça ou ataque a direito próprio ou alheio; 3)
Necessidade da reação e proporcionalidade entre o ataque e a reação; 4) Aspecto subjetivo. A defesa alega, em suma, que: “(...) ali
estava um pai de família assustado, pela iminência de voltar a sofrer as agressões que suportara na presença de seus filhos, naquele
mesmo dia. Ele réu, diante da presença, daquele que há bem pouco tempo o agredira em atitude que supôs tratra-se de uma nova
agressão ficou intimidado e fez um único disparo, sendo certo que dito disparo, suja direção até mesmo pelo que consta da “pericia”, não
poderia atingir seu desafeto... A hipótese de legítima defesa em sua forma putativa merece vênia concessa, consideração desse juizo
e pode justificar a homologação da conduta do acusado (...)”. Em primeiro lugar vale analisar que a vítima encontrava-se dentro de sua
residência quando o delito ocorreu. O réu foi quem chegou portando a arma de fogo, e mesmo diante de várias pessoas e da tentativa
de intervenção delas efetuou o disparo contra a vítima que não portava qualquer tipo de arma e que foi surpreendida com a chegada
do réu em sua casa. Somente com essas considerações já se pode deduzir que não houve qualquer agressão, no momento do disparo
da arma de fogo pelo réu, por parte da vítima, muito menos agressão injusta, real, atual ou iminente. O Doutrinador Luiz Flávio Gomes,
conhecido garantista, ensina: “(...) A agressão, por último, precisa ser atual (que está acontecendo) ou iminente (prestes a acontecer; atos
preparatórios muito próximos da execução já autorizam a legítima defesa); Agressão pretérita (que já não coloca qualquer bem jurídico
em risco) ou futura não autoriza a legítima defesa. Diante de uma agressão futura, não é cabível a chamada legítima defesa preventiva
ou antecipada (...)”. (GOMES, Luiz Flávio. Direito penal: parte geral: volume 2. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2009). Pois
bem, como já analisado e visto no depoimento das testemunhas não houve qualquer iniciativa de agressão por parte da vítima no
momento do disparo. Houve troca de lesões entre a vítima e o réu horas antes do crime em análise, ou seja, as agressões já haviam
cessado. O réu inclusive foi embora da casa da vítima e somente por volta das 19 hrs, o réu, de forma livre, voltou a casa da vitima.
Sendo assim, não há como acolher a tese da defesa de que o réu estava supondo uma nova agressão por parte da vítima, eis que, mais
uma vez, o réu foi quem surpreendeu a vítima ao chegar na casa dela com a arma em punho, e como explicitado pelo doutrinador citado
acima a agressão pretérita ou futura não autoriza a legítima defesa, a reação legítima precisa ser imediata. Por fim, não havia como o
réu estar em legítima defesa putativa, eis que a conduta ativa, o inicio da agressão, partiu do próprio réu que invadiu a casa da vítima
para concretizar a ação violenta. Desta forma, a autoria e materialidade do crime estão comprovadas nos autos e recaem sobre o Réu
Paulo Vicente de Lima Filho, ficando configuradas nos autos por meio das provas documentais e testemunhais, configurando a tipicidade
do crime de disparo de arma de fogo e devendo ser aplicada as sanções previstas no artigo 15 da Lei 10.826/03. Ante o exposto, e por
tudo mais que consta nos autos, JULGO PROCEDENTE A DENÚNCIA, para em consequência CONDENAR o réu PAULO VICENTE
DE LIMA FILHO, anteriormente qualificado, pela prática do
crime de DISPARO DE ARMA DE FOGO, previsto no art. 15, da Lei nº 10.826/03, passando a dosar a pena a lhe ser aplicada, em
estrita observância ao disposto no artigo 68, “caput”, do Código Penal. Analisando as diretrizes do artigo 59, do Código Penal, sobre as
circunstâncias do crime, em relação ao réu PAULO VICENTE DE LIMA FILHO, concluo: Culpabilidade - conduta altamente reprovável,
eis que praticada na presença de várias pessoas, sendo uma dela menor e filha do próprio réu; Antecedentes - bons antecedentes;
Conduta social - nada existe sobre a conduta social do réu; Personalidade - homem comum; Motivação - torpe; Circunstâncias - não
favorecem o réu; Consequências - Não houve maiores consequência; Situação econômica do réu - boa. À vista dessas circunstâncias
analisadas individualmente é que fixo para o réu condenado PAULO VICENTE DE LIMA FILHO a pena-base, para o crime de porte ilegal
de arma de fogo de uso permitido, em 3 (três) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e ao pagamento de 30 (trinta) dias-multa, cada uma
no equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato delituoso. Verifico a existência da atenuante prevista
nos inciso III, alínea “d”, do art. 65 do CP, por ter confessado espontaneamente a autoria do crime, inexistindo agravantes, previstas no
referido código, redimensiono a pena aplicada para 3 (três) anos e 1 (um) mês de reclusão e o pagamento de 25 (vinte e cinco) diasmulta. Por fim, por também inexistir causa de diminuição ou aumento de pena, mantenho a pena do crime de porte ilegal de arma de
fogo de uso permitido em 03 (três) anos e 01 (um) mês de reclusão e ao pagamento de 25 (vinte e cinco) dias-multa, cada um no valor
já anteriormente fixado, na qual fica o réu condenado em definitivo. Deixo de aplicar a substituição da pena, por restritivas de direito
por entender que o réu condenado não satisfaz as condições do art. 44, III, do CP, e por ser ela mais adequada pedagogicamente. A
pena deverá ser cumprida no regime aberto, como estabelece o art. 33, §2º, “c”, do CP. Custas pelo réu. Delego ao Juiz das Execuções
Penais a cobrança da pena de multa imposta, e da conta de custas. Após o trânsito em julgado desta decisão, o Cartório adote as
seguintes providências: 1º Expeça-se a carta de guia; 2º Lance o nome do réu condenado no rol dos culpados; 3º Oficie-se ao TRE/AL,
comunicando a condenação do réu, com cópia desta sentença, para os fins do art. 71, §2º, do Código Eleitoral, e art. 15, inciso III, da
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º