TJBA 06/06/2022 - Pág. 195 - CADERNO 1 - ADMINISTRATIVO - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA – DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO – Nº 3.112 - Disponibilização: segunda-feira, 6 de junho de 2022
Cad. 1 / Página 195
Indaga-se, pois: qual ordenamento dará as regras de direito internacional privado para definir a lei aplicável ao regime de
bens? Será aplicada a lei brasileira ou a lei estrangeira?
Há certa preferência pela aplicação da lex fori (a lei do foro).
Sob essa ótica, se houver alguma judicialização no Brasil, o juiz brasileiro aplicará a LINDB para resolver o conflito de
normas.
Mas não se trata de assunto consolidado. Há controvérsias. Se, por exemplo, o casal tiver imóveis em diferentes países, há
o risco de o juiz de cada país aplicar elementos de conexão diferentes para disciplinar o regime de bens.
Há ainda outro aspecto: problemas de adaptação de situações jurídicas estrangeiras. Não necessariamente o regime de
bens escolhido de acordo com uma lei estrangeira corresponderá a um regime de bens conhecido no Direito Brasileiro.
As considerações supra já são suficientes para demonstrar que não é recomendável deixar ao Cartório de Registro Civil das
Pessoas Naturais posicionar-se sobre a indicação do regime de bens vigente para o casamento realizado no exterior.
Ante o exposto, entendemos ser totalmente desaconselhável acolher a sugestão de alteração do § 3º do art. 13 da Resolução
CNJ nº 155/2012, ao menos na forma sugerida pela ARPEN-Brasil.
Tendo em vista, porém, a importância de o Conselho Nacional de Justiça deixar clara a conduta a ser adotada pelos
Cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais (RCPN) nesse tema, sugerimos um outro ajuste.
Para tanto, precisamos enxergar que há duas hipóteses envolvendo casamento de brasileiro no exterior. A primeira é a de
casamentos realizados no exterior em que haja expressa indicação da adoção de um regime de bens definido na lei
brasileira. É o caso, por exemplo, de casamentos realizados em consulados brasileiros com cônjuges domiciliados no
Brasil. Nesse caso, o registro consular de casamento já indicará qual regime matrimonial vigorará à luz da lei brasileira.
Para essa primeira hipótese, não há qualquer obstáculo a que o RCPN incumbido de promover o traslado reproduza o
regime de bens lançado pelo agente consular.
A segunda hipótese é a de casamentos realizados no exterior em que haja a adoção de algum regime de bens estrangeiro
ou em que haja omissão quanto ao regime de bens. Esses casamentos podem acontecer no consulado brasileiro ou
perante a competente autoridade estrangeira. Para esses casos, não convém o registrador civil fazer qualquer adaptação do
regime de bens estrangeiro a algum da lei brasileira. Tampouco convém o registrador posicionar-se expressamente qual
será o regime de bens que prevalecerá, tendo em vista a complexidade jurídica envolvida nesse assunto de Direito Internacional
Privado. Não deve o registrador noticiar um fato que, posteriormente, poderá ser decidido diferentemente, com potencial
prejuízo a terceiros de boa-fé. O mais adequado é que o registrador adote uma postura meramente descritiva, deixando claro
aos interessados a situação jurídica de transnacionalidade 2.
A Resolução CNJ nº 155, de 16 de julho de 2012, já dá a solução para essas duas hipóteses, embora seja recomendável
ajustar o texto para dar maior clareza.
Em relação à primeira hipótese (a de certificação, no ato de casamento realizado no estrangeiro, de adoção de regime de
bens de acordo com a lei brasileira), o registrador poderá simplesmente reproduzir essa informação no traslado. O § 3º do
art. 13 da Resolução CNJ nº 155/2012 objetivava acomodar essa hipótese. Como, porém, seu texto tem sido interpretado de
modo não uniforme entre os registradores – conforme noticia a ARPEN-Brasil –, convém reajustar seu texto para deixar essa
informação mais clara, sem prejuízo de indicar que se trata de uma situação jurídica transnacional na forma do art. 7º, § 4º,
da LINDB.
No tocante à segunda hipótese (a de regime de bens sujeito à lei estrangeira), a postura do registrador deve ser apenas
descritiva da situação jurídica de transnacionalidade, com arquivamento de documentos que possam auxiliar terceiros
interessados em inteirar-se dos efeitos jurídicos do regime de bens alienígena. A rigor, o § 4º do art. 13 da Resolução CNJ
nº 155/2012 objetivava acolher essa segunda hipótese. Convém, pois, ajustar o texto da Resolução para maior clareza.
Diante do exposto, entendemos pela inviabilidade de acolhimento do texto sugerido pela ARPEN-Brasil e recomendamos
que seja feito o seguinte ajuste no art. 13 da Resolução CNJ nº 155/2012:
Art. 13. (...)
(...)
§ 3º Faculta-se a averbação do regime de bens posteriormente, sem a necessidade de autorização judicial, mediante
apresentação de documentação comprobatória, desde que a lei aplicável ao regime de bens seja a brasileira.
§ 3º-A A documentação obrigatória de que trata o § 3º deste artigo deverá certificar o regime de bens a ser aplicado, com
remissão expressa ao pertinente pacto antenupcial se houver.
§ 3º-B Nas hipóteses que não se enquadrarem nos §§ 3º e 3º-A deste artigo, o registrador deverá: limitar-se a consignar, no
traslado, o disposto no § 4º deste artigo e a fazer as remissões devidas aos documentos apresentados, os quais deverão
ficar arquivados na serventia.
§ 4º Em qualquer das hipóteses acima, deverá sempre constar do assento e da respectiva certidão a seguinte anotação:
“Aplica-se o disposto no art. 7º, § 4º, do Decreto-Lei nº 4.657/1942”.
(...) “
Precisas as considerações apresentadas, não merecendo qualquer retoque de modo que reclamam acolhimento total
dessa Corregedoria. A Resolução n. 155 do CNJ precisa ser interpretada à luz do art. 7º, § 4º, Lei de Introdução às Normas
do Direito Brasileiro (LINDB) e do art. 32 da Lei art. 32, §1º da Lei nº 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), compreendendose que os documentos comprobatórios do regime a ser registrado a posteriori, na forma do art. 13, não estaria a depender
de aferição particular pelo registrador, mas mero registro de regime já consolidado, tratando-se de mera trasladação
demonstrada por documentos hábeis para tanto. Não se trata, pois de suprimento administrativo do regime de bens atinente
ao casamento de estrangeiro. Não é demais lembrar que o art. 1.639 do Código Civil, prevê que “é admissível a alteração do
regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das
razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiro”, reclamando, pois a alteração do regime a apreciação judicial”.
Nesta esteira, manifesta-se essa Corregedoria das Comarcas do Interior da Bahia pelo indeferimento do pedido formulado