TJDFT 10/04/2019 - Pág. 650 - Caderno único - Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios
Edição nº 69/2019
Brasília - DF, disponibilização quarta-feira, 10 de abril de 2019
a ser considerado na apuração do ITBI. De início, entendo de extrema relevância a questão posta nestes autos, porquanto existem diversos
precedentes, tanto acolhendo a tese da Fazenda Pública quanto acolhendo a tese do contribuinte. Além disso, não se desconhece o impacto
direto que o acolhimento do pleito pode causar nas receitas do ente federado requerido. Pois bem. É cediço que o ITBI está previsto no art.
156, II, da Constituição Federal, que dispõe acerca da incidência do imposto sobre transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso,
de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua
aquisição. Confira-se, in verbis: ?Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) II - transmissão "inter vivos", a qualquer título,
por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão
de direitos a sua aquisição;? No que tange à instituição do ITBI pelo Distrito Federal, bem como à sua base de cálculo ? cerne da questão aqui
controvertida ? citam-se os artigos 5º e 6º da Lei 3.830/2006, que dispõe acerca da legislação tributária do DF, in verbis: ?Art. 5º A base de
cálculo do Imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos ou cedidos. § 1º Não são dedutíveis do valor venal, para fins de cálculo do
Imposto, eventuais dívidas que onerem o imóvel transmitido. § 2º Sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, para os efeitos deste artigo: I ?
o valor venal dos direitos reais corresponde a 70% (setenta por cento) do valor venal do imóvel; II ? o valor da propriedade nua corresponde a
30% (trinta por cento) do valor venal do imóvel. acrescentado o § 3º ao art. 5º pela Lei nº 5.548, de 15/10/15 - publicada no DODF de 16/10/15.
§ 3º A base de cálculo do imposto, no caso de aquisição em hasta pública, é o valor da arrematação. Art. 6º O valor venal é determinado
pela administração tributária, por meio de avaliação feita com base nos elementos de que dispuser e, ainda, na declaração do sujeito passivo.
(...) § 2º. Para efeito do cálculo do Imposto, prevalecerá o valor declarado no instrumento quando este for superior ao valor da avaliação da
administração apurada na forma deste artigo.? Do referido texto percebe-se que (i) a base de cálculo do ITBI é o valor venal do imóvel, (ii) tal
valor é determinado pela administração tributária, (iii) para se chegar ao valor, a administração deverá efetuar uma avaliação com base nos
elementos que dispuser e, também, com base na declaração do sujeito passivo. Expostas essas premissas, indubitável que não se pode chegar
à conclusão de que não há irregularidade quando a administração, sem qualquer procedimento administrativo fiscal, discorda do valor lançado
pelo sujeito passivo da obrigação e procede ao recálculo da avaliação. Registra-se que deve a administração tributária, ao discordar do valor
lançado pelo contribuinte no instrumento de compra e venda, seja por qual motivo for, instaurar processo regular com o fito de arbitrar o valor
venal do imóvel, nos termos do art. 148 do Código Tributário Nacional a seguir transcrito, in verbis: ?Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha
por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo
regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os
documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória,
administrativa ou judicial.? Ora, certo é que o referido Decreto Distrital deve retirar o seu fundamento de validade da norma infraconstitucional,
qual seja, o Código Tributário Nacional, a quem cabe, com fundamento no artigo 5º, XV, ?b?, da Constituição Federal de 1988, ?as normas gerais
de direito tributário aplicáveis à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, sem prejuízo da respectiva legislação complementar,
supletiva ou regulamentar.? (art. 1º, CTN). Assim, verifica-se ser inaplicável à hipótese vertente o referido Decreto Distrital, porquanto a regra
geral instituída pelo Código Tributário Nacional é a abertura de processo regular quando o cálculo do tributo tenha por base o valor de bens e a
autoridade não concorde com o valor apresentado pelo contribuinte. Registra-se que não pode a administração tributária, a pretexto de vislumbrar
má-fé em todas as negociações praticadas por particulares, deixar a cargo do contribuinte a abertura do procedimento administrativo, quando
a lei é clara que será da responsabilidade da administração tal procedimento. A propósito, repita-se a lição do renomado professor Hugo de
Brito Machado, in verbis: ?Em se tratando de imposto que incide sobre a transmissão por ato oneroso, tem-se como ponto de partida para a
determinação de sua base de cálculo na hipótese mais geral, que é a compra e venda, o preço. Este funciona no caso, como uma declaração de
valor feita pelo contribuinte, que pode ser aceita ou não, pelo fisco, aplicando-se, na hipótese de divergência, a disposição do art. 148 do CTN.? (In
Curso de Direito Tributário, Ed. Melhoramentos, 29ª ed., p. 398) Nessa linha de entendimento, recentemente, decidiu o colendo STJ, conforme se
infere do seguinte julgado, in verbis: ?PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DISPOSITIVO
APONTADO COMO VIOLADO. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. ITBI. BASE DE CÁLCULO. VALOR REAL
DA VENDA DO IMÓVEL OU DE MERCADO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL. PRECEDENTES. (...) 2. A jurisprudência do STJ
firmou-se no sentido de que o valor da base de cálculo do ITBI é o valor real da venda do imóvel ou de mercado, sendo que nos casos de
divergência quanto ao valor declarado pelo contribuinte pode-se arbitrar o valor do imposto, por meio de procedimento administrativo fiscal, com
posterior lançamento de ofício, desde que atendidos os termos do art. 148 do CTN. 3. Vale destacar que que o valor venal do imóvel apurado para
fins de ITBI não coincide, necessariamente, com aquele adotado para lançamento do IPTU. 4. Agravo regimental não provido.? (AgRg no REsp
1550035/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015) Confira-se, ainda, a
seguinte decisão unipessoal proferida pelo eminente Ministro Herman Benjamin, que espanca qualquer dúvida acerca da faculdade conferida à
administração, quando não com o valor venal apresentado pelo contribuinte: ?A contribuinte defende que a base de cálculo para o imposto sobre
a transmissão do imóvel (ITBI) deve ser exatamente a mesma adotada pelo Município para o cálculo do IPTU. O Tribunal de Justiça acolheu o
pleito, considerando que tanto o art. 33 do CTN, que trata do IPTU, como o art. 38 do mesmo Código, que cuida dos impostos sobre transmissão
de bens (ITBI e ITCMD), definem a base de cálculo como sendo o valor venal. O acórdão merece reforma. Isso porque é amplamente sabido que
valor venal significa valor de venda do imóvel. Basta consultar os bons dicionários para confirmar que venal indica "referente a venda" (Aurélio),
"relativo a venda" (Houaiss). Aliomar Baleeiro, em lição sempre acatada, confirma que "valor venal é aquele que o imóvel alcançará para compra
e venda à vista, segundo as condições usuais do mercado de imóveis" (Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense. 11ª ed., 2003,
p. 249). Na verdade, a distorção existe relativamente ao IPTU, e não ao ITBI, tributo em análise neste processo. Isso porque os Municípios
lançam o imposto sobre propriedade de ofício e, para viabilizar a cobrança, acabam adotando fórmulas genéricas que abarcam os milhares e, no
caso de São Paulo, milhões de imóveis tributados anualmente. Refiro-me às famosas plantas genéricas de valores que, exatamente por serem
avaliações unilaterais do valor venal desses bens, devem ser veiculadas por lei. Seria absurdo imaginar que o Município de São Paulo avaliasse
individualmente cada um dos milhões de imóveis urbanos existentes em seu território para lançar anualmente o IPTU de ofício, daí a adoção das
plantas genéricas. Cito a lição de Misabel Derzi, atualizada na já citada obra de Aliomar Baleeiro: Como é tarefa difícil para a Administração, em
um tributo lançado de ofício, como é o caso do IPTU, avaliar a propriedade imobiliária de milhares de contribuintes, medidas de simplificação da
execução da lei têm sido tomadas pelo Poder Executivo. Uma dessas medidas são as plantas ou tabelas de valores, que retratam o preço médio
do terreno por região ou o preço do metro quadrado das edificações, conforme padrão construtivo, portanto o valor presumido do bem. (op. cit.,
p. 249). É cediço que os valores existentes nas plantas genéricas de valores acabam situando-se abaixo, muitas vezes, do valor de mercado
dos imóveis, não apenas por conta da sistemática adotada em sua elaboração, mas principalmente pelo fato de não serem, no mais das vezes,
refeitas anualmente. Com efeito, sabemos que a jurisprudência não aceita o reajuste real das plantas genéricas de valores por ato do Executivo.
Na prática, isso significa complexos projetos de lei, de longa tramitação e discussão política, que inviabilizam, nas grandes cidades, o reajuste
anual, de modo que a defasagem em relação à real avaliação dos imóveis urbanos acaba aumentado a cada ano que passa. A sistemática de
cálculo e cobrança do ITBI é muito mais próxima da realidade. Nesse caso, o lançamento é por homologação ou por declaração. Ou seja, em
vez de milhões de lançamentos de ofício anuais, caso do IPTU paulistano, há apenas milhares de operações claramente individualizadas, com
a declaração do real valor de venda do imóvel pelos próprios particulares que transmitem os bens. No ITBI, o preço efetivamente pago pelo
adquirente do imóvel tende a refletir, com grande proximidade, seu valor venal, considerado como, repito, o valor de uma venda regular, em
condições normais de mercado. Não é por outra razão que a jurisprudência do STJ é pacífica ao admitir que, na hipótese de hasta pública, o preço
da arrematação (e não o da avaliação) reflete o valor venal do imóvel e, portanto, deve ser adotado como base de cálculo do ITBI: TRIBUTÁRIO.
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. ITBI. ARREMATAÇÃO JUDICIAL. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA ARREMATAÇÃO E NÃO
O VENAL. PRECEDENTE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL DEMONSTRADO. DIREITO LOCAL. SÚMULA 280 DO STF. OMISSÃO ? ART. 535,
CPC. INOCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO PELA ALÍNEA "C". 1. A arrematação representa a aquisição do bem alienado judicialmente,
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