TJSP 08/05/2009 - Pág. 2425 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Sexta-feira, 8 de Maio de 2009
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano II - Edição 468
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proporcionando-lhe bem da vida que aquiete as dores na alma que lhe foram infligidas” (STJ, REsp 1022103 / RN, Terceira
Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 16.05.2008 - g.n.o.). E, na mesma direção, este outro: “Na linha da jurisprudência deste
Tribunal, a imunidade profissional, garantida ao advogado pelo Estatuto da Advocacia, não alberga os excessos cometidos pelo
profissional em afronta à honra de qualquer das pessoas envolvidas no processo” (STJ, REsp 438734 / RJ, Quarta Turma, Min.
Sálvio De Figueiredo Teixeira, DJ 10.03.2003). Destarte, como se percebe, o advogado tem, em princípio, ampla liberdade para
atuar, podendo arrazoar peças e se pronunciar, de forma geral, incisivamente. Porém, não tem possibilidade de, sob o manto da
garantia profissional, atacar a honra das pessoas envolvidas nos processos, sendo passível de responsabilização, por corolário,
quando o faz. Há que se perquirir, em resumo, se a manifestação é necessária, imprescindível, no contexto dos autos, para a
defesa dos interesses do cliente; ou se, não sendo necessária, é lesiva à honra de algum dos envolvidos. Esse - difícil - exame
é que deve ser feito, caso a caso. Pois bem. Assentadas as premissas, vê-se que no caso dos autos o co-requerido, ilustre
advogado da Comarca de Praia Grande, realmente se excedeu na linguagem, tendo ofendido a honra do autor, prestador de
serviço público estadual por delegação. Conquanto tenha atuado de forma absolutamente regular no primeiro requerimento
formulado, endereçado ao MM. Juiz de Direito Corregedor do Cartório de Registro de Imóveis, requerimento no qual desenvolveu
sua argumentação com base em elementos técnicos (fls. 28-31), a partir da manifestação seguinte deixou de assim fazer. Na
petição acostada a fls. 53-55, e também dirigida ao MM. Juiz de Direito Corregedor, o co-requerido, depois de expor novamente
os argumentos técnicos, lançou acusação direta ao autor, nos seguintes termos: “Nos presentes autos resta cabalmente
demonstrado que o Sr. Oficial do CRI local, de forma dolosa, exigiu da ora peticionante custas, emolumentos, contribuições e
despesas que são indevidas e também excessivas, sujeitando-se portanto às penalidades legais”. Na mesma oportunidade, é
bom que se consigne, o mesmo advogado postulou, em nome do condomínio, a instauração de procedimento administrativo
disciplinar contra o autor, ratificando, pois, sua acusação. Mais tarde, no mesmo procedimento, o advogado, em novo petitório
dirigido ao MM. Juiz Corregedor, formulou outra acusação. Disse, textualmente, o seguinte: “Ao revés do que se declina, o
representante por exaustivas vezes solicitou do Sr. Oficial explicações convincentes e estribadas em documentos, o qual,
limitou-se a fornecer as cópias utilizadas, querendo confundir e induzir a erro o requerente, não restando ao mesmo outra
alternativa que buscar os seus direitos de esclarecimentos, perante o MM. Juiz” (fls. 245-248). Por fim, com o procedimento
administrativo já em grau recursal, o advogado, em manifestação endereçada, agora, ao Excelentíssimo Desembargador
Corregedor-Geral de Justiça, voltou à carga, deduzindo acusações de que o autor teria exigido, inexplicavelmente, valor superior
ao devido a título de complementação de emolumentos (fls. 293) e de que não teria, instado, justificado essa cobrança (fls. 294).
No mesmo petitório o patrono voltou a postular a instauração de procedimento disciplinar. O advogado não logrou êxito em suas
postulações. Percorridas todas as instâncias pertinentes, a exigência do Oficial Registrador, ora autor, foi mantida, porque
considerada legal e pertinente. Por desdobramento, a conclusão a que se chega é a de que o patrono não tinha razão em suas
postulações, circunstância, de resto, normal, considerada a natureza da matéria e a atividade do advogado. Porém, sem
embargo, o que não pode ser considerado normal, como já adiantado, é o procedimento do co-requerido, advogado, de acusar,
gravemente, a pretexto de defender os interesses do cliente, o registrador imobiliário. Não somente as exigências deste foram
consideradas legítimas como se evidenciou não ter ele, em qualquer momento do procedimento, exigido de forma dolosa valores
que sabia indevidos e nem tampouco tentado induzir em erro o advogado. A acusação do advogado, pelo seu teor, se amolda ao
crime de concussão, previsto no art. 316 do Código Penal, tipificado nesses termos: Exigir, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida. E, como acima exposto,
a imunidade não abarca a calúnia, nem tampouco tolera agressões à honra dos envolvidos no processo. Diante do acima
consignado, e com o registro de que é certo o dano à honra do requerente, dano este que atingiu, ainda que abstraída a
divulgação afirmada na inicial (fls. 461-462), a honra subjetiva do autor, imperioso o reconhecimento de seu direito à indenização,
não alterando esse quadro a absolvição no órgão de classe, que não vincula o Poder Judiciário. Lembre-se, quanto ao dano
moral, que se configura quando violado algum dos chamados direitos da personalidade, protegidos constitucionalmente, o que
se verificou na espécie. A condenação do co-requerido, pois, se impõe, valendo destacar, em abono do exposto, respeitável
julgado que apreciou questão similar à presente: “A imunidade judiciária, outorgada ao advogado, não pode se constituir em
salvo-conduto, para fins cíveis, a fim de dar plena liberdade ao causídico de assacar fatos ou usar as expressões que quiser,
ofensivos de honra, mesmo da parte adversa, em processo judicial, sob pena de se estar colocando esse profissional acima dos
valores éticos mais relevantes, que devem ser observados no exercício de qualquer profissão, mormente em detrimento dos
direitos de personalidade dos cidadãos que são compelidos a estar em juízo” (TJ-RJ; AC 3858/1999; Rio de Janeiro; Oitava
Câmara Cível; Rel. Des. Paulo Lara; Julg. 25/05/1999). Também: “Ultrapassando os limites da urbanidade necessária nos litígios
judiciais e administrativos, com a ofensa à honra subjetiva da parte adversa, condena-se o agressor à reparação por dano moral
ao agredido” (TJDFT - AC 2002 01 1 053550-5 - Rel. Des. Fábio Eduardo Marques - DJe 12.05.2008). Resta a fixação do
montante da indenização. E, nesse particular, tem-se que, à míngua de critérios legais expressos, a jurisprudência tem
recomendado que sejam consideradas a extensão do dano e as condições das partes, e que se atente para o fato de que a
indenização não pode consubstanciar, para o lesado, enriquecimento sem causa. Tendo-se em conta, pois, que o dano, embora
dotado de certa gravidade, não teve maior repercussão, ao menos não tendo sido esta comprovada cabalmente, tendo se
concentrado na esfera íntima do lesado, de rigor a fixação da verba em R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Acrescente-se que a
indenização tem somente caráter reparatório, não punitivo ou sancionador, diante do disposto no art. 944, “caput”, do Código
Civil e da regra do artigo 5o, XXXIX, segunda parte, da Carta Política de 1988. Por derradeiro, analisa-se a situação do
condomínio. E o desfecho de extinção sem resolução do mérito, quanto a ele, é imperioso porque, de fato, não tem legitimidade
para o feito, à míngua de ato ilícito perpetrado, sequer em tese. O condomínio, ao contratar o co-requerido, requereu a prestação
de um serviço que é considerado, como se sabe, obrigação de meio, assentado ser o advogado o técnico habilitado a escolher
que requerimentos são cabíveis e como devem ser elaborados. Logo, se o advogado, na execução do serviço, se excedeu, não
há como se responsabilizar o seu mandante, nem mesmo com base no art. 932, III, do Código Civil, já que existe, a afastar essa
regra geral, a regra específica do art. 32, “caput”, do Estatuto da Advocacia, que impõe a solidariedade em caráter excepcional,
somente na hipótese de lide temerária. O profissional, “in casu”, deve responder sozinho pela reparação civil, extinguindo-se
sem resolução do mérito, por corolário, por se tratar de matéria de ordem pública, o feito quanto ao condomínio, Sobre o tema:
“Tem-se, inicialmente, que não há se cogitar em solidariedade, nos moldes previstos no parágrafo único do art. 32 do Estatuto
da Ordem dos Advogados do Brasil, não cabendo, tampouco, invocar-se referido instituto com base no art. 932, inciso III, do
CC/2002, de sorte a ensejar solidariedade por ato supostamente ilícito perpetrado pelo causídico em nome do cliente, dado que
o mandato tem a aplicabilidade para a prática dos atos nele previstos ou a ele vinculados, dentro das balizas legais. Desta feita,
expressões eventualmente injuriosas lançadas na peça jurídica elaborada pelo causídico são de sua exclusiva responsabilidade,
o que torna o constituinte parte ilegítima em eventual ação por danos morais” (TJ-GO; AC 106898-2/188; Nerópolis; Rel. Des.
Luiz Eduardo de Sousa; DJGO 30/11/2007). Ante o exposto, e pelo mais que dos autos consta, JULGO (a) EXTINTO o feito, sem
resolução do mérito, na forma do art. 267, VI, do Código de Processo Civil, relativamente ao Condomínio Edifício Residencial
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