TJSP 01/03/2010 - Pág. 157 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Segunda-feira, 1 de Março de 2010
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano III - Edição 662
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022.01.2010.000912-1/000000-000 - nº ordem 180/2010 - Mandado de Segurança - LUIZ HENRIQUE BELLUCCI PETERLINI
X PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE MONTE ALEGRE DO SUL E OUTROS - Fls. 230/235 - Vistos, etc. Trata-se de
pedido liminar em mandado de segurança impetrado por LUIZ HENRIQUE BELLUCCI PETERLINI contra PRESIDENTE DA
CÂMARA MUNICIPAL DE MONTE ALEGRE DO SUL, e pelos integrantes da comissão processante nº 004/09, AMARILDO
ORTIZ DE SOUA e MÁRCIA APARECIDA CAMPANARI, objetivando sua reintegração no exercício do mandato de Vereador na
Câmara Municipal do município, anulando todos os atos atinentes ao procedimento interno denominado “comissão processante
nº 004/2009. Fundamenta, em síntese, no sentido de que o procedimento administrativo disciplinar que culminou na aplicação
de penalidade consistente na cassação do exercício de seu mandato de Vereador está maculado de nulidade, já que desta
denúncia desencadeadora do processo, (1) não consta a tipificação legal, (2) não observa a necessidade da condição de eleitor
do denunciante, (3) não observou a necessidade de prévia elaboração de projeto de resolução previsto no art. 124, §§ 1º e 3§
da casa, (4) que o sorteio realizado não se deu da forma legalmente prevista, (5) deixou de observar a chamada “proporcionalidade
partidária”, (6) ocorreu o reavivamento de comissão anterior sem a produção de nova prova, (7) existência de coisa julgada, (8)
decadência, (9) não houve a observância da necessidade de intimação pessoal do denunciado e seu defensor, (10) não houve
nomeação de defensor dativo, (11) não houve a justificação do voto de nenhum dos vereadores que o fizeram, (12) não houve a
convocação do impetrante, como vereador. A inicial foi instruída de cópias (fls. 34/226). É o relatório. DECIDO. Em primeiro
lugar, há que se asseverar que o Poder Judiciário, em respeito ao princípio constitucional da separação dos Poderes da
República, ordinariamente não se manifesta sobre processos ou procedimentos internos do Poder Legislativo, mormente quando
a controvérsia envolve discussão sobre a normativa interna do referido órgão, por ser tema “interna corporis”. Especificamente
quanto à aplicação de sanções disciplinares administrativas, tampouco há espaço para a apreciação judicial, posto que este
juízo de valor é afeto aos próprios Poderes Legislativo ou Executivo e também se encontra resguardado pela cláusula da
separação dos poderes. Invocada, porém, a não observância de princípios ou direitos constitucionais por parte dos demais
Poderes, no trâmite dos feitos administrativos e, dentre eles, notadamente os de cunho disciplinar, o Poder Judiciário, com
fundamento no art. 5.º, XXXV da Carta, passa a deter jurisdição sobre a controvérsia. No caso presente, o impetrante sustenta,
como fundamentos jurídicos de seu pedido, os princípios do juiz natural e a agressão ao Decreto-Lei n.º 201/67 no feito
administrativo que lhe importou na aplicação de sanção, de modo que sob este prisma a matéria escapa à esfera interna do
Poder Legislativo Municipal e a seu respeito o Poder Judiciário do Estado de São Paulo pode conhecer e julgar. Superada esta
prévia questão, tenho que, desde logo, necessária a adequação da pertinência subjetiva do writ. Embora o autor tenha incluído
no pólo passivo todos os vereadores que requereram a instauração do processo administrativo, assim como a própria Câmara
dos Vereadores de Amparo, para os fins do rito do mandado de segurança, é necessário verificar quem se enquadra na condição
de autoridade coatora e, assim, tem aptidão para compor a lide em sua esfera passiva. Neste ponto, já se verifica a inadequação
da Câmara dos Vereadores para integrar a lide, posto que não se insere na noção de autoridade coatora, estabelecida pela
Constituição Federal, art. 5.º, LXIX (que alude a autoridade pública) e pela Lei 12.016/2009. O pólo passivo do mandamus deve
ser integrado pela autoridade que impôs, representando a vontade colegiada, o ato reputado como ilegal e violador de direito
líquido e certo do impetrante, isto é, o Presidente da Câmara Municipal de Monte Alegre do Sul. Em assim sendo, os demais
vereadores apresentados pelo impetrante, por não ostentarem a condição de autoridades coatoras, tampouco devem ser
admitidos na presente lide. Por oportuno, quadra ressaltar a orientação jurisprudencial: MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DA
CÂMARA CÍVEL DO TJ/SE. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO IMPETRADO. Afastamento da Câmara Cível antes da impetração do
mandamus. Órgão colegiado. Autoridade coatora. Presidente do órgão. Carência de ação. Artigo 267, VI do código de processo
civil. Extinção do feito sem resolução do mérito. Decisão unânime. (...) A autoridade coatora no caso de órgãos colegiados é o
presidente daquele órgão e não o desembargador relator. (TJ-SE; MS 2007109126; Ac. 6210/2008; Tribunal Pleno; Relª Desª
Maria Aparecida S. Gama da Silva; DJSE 02/09/2008; Pág. 5) CPC, art. 267 Consoante entendimento jurisprudencial desta
Corte, a autoridade coatora é aquela que pratica ou ordena concreta e especificamente a execução ou inexecução do ato
impugnado e responde pelas suas conseqüências administrativas. Precedentes. (Superior Tribunal de Justiça STJ; AgRg-REsp
897.870; Proc. 2006/0225596-4; PR; Quinta Turma; Rel. Min. Gilson Langaro Dipp; Julg. 24/04/2007; DJU 11/06/2007; Pág. 373)
Com relação à liminar pleiteada, verifico a presença do requisito relativo ao periculum in mora, já que sobre o impetrante já se
operam os efeitos da suspensão que lhe foi imposta e o prejuízo ao exercício da função para o qual foi eleito é patente.
Outrossim, o fumus boni juris a autorizar a concessão da medida pretendida se mostra presente pela alegada ausência de
observância dos pressupostos legais impostos pela própria casa para a abertura e processamento de procedimentos desta
natureza. Com efeito, o fundamento legal invocado pelo impetrante como causa de nulidade do processo administrativo
disciplinar, de fato, pode levar a cassação do ato em si. Diz o art. 5.º, I, do Decreto-Lei 210/67: Art. 5.º. O processo de cassação
do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito, se outro não foi
estabelecido pela legislação do Estado respectivo: I - a denúncia escrita da infração poderá ser feita por qualquer eleitor, com
exposição dos fatos e a indicação das provas. Se o denunciante foi Vereador, ficará impedido de votar sobre a denúncia e de
integrar a Comissão processante, podendo, todavia, praticar os atos da acusação. Se o denunciante for o Presidente da Câmara
passará a Presidência ao substituto legal, para os atos do processo, e só votará se necessário para completar o quorum de
julgamento. Será convocado o suplente do Vereador impedido de votar, o qual não poderá integrar a Comissão processante.
Como se depreende da mera leitura do dispositivo, o rito estabelecido pelo art. 5.º, I, do Decreto-Lei n.º 201/67 é aplicável ao
processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, de modo que pertinente ao caso presente. Os arts. 7.º e 8.º do
mesmo diploma, ao tratarem da cassação do mandato dos vereadores, não estipulam igual procedimento, e, assim, em sumária
cognição, o fundamento apresentado se presta perfeitamente para os fins de demonstração do fumus boni juris. Traz
verossimilhança ao alegado a invocação do princípio do “juiz natural”, eis que este princípio, insculpido nos art. 5.º, XXXVII e
LIII da Constituição Federal, veda a instauração de tribunais ou juízos de exceção e assegura o direito ao julgamento por
autoridade competente, previamente definida. O processo administrativo guerreado, ao menos para os fins da análise liminar,
gera dúvida quanto à observância de todas estas garantias, eis que o impetrante foi julgado pelo órgão em questão, cuja
previsão de existência e competência, assim como a forma de seu processamento, é albergada pela legislação e pelo regimento
interno do Poder Legislativo Municipal. Quanto à “ausência de justa causa”, tenho que se confunde com o mérito da sanção
administrativa e incide na hipótese, já tratada, de tema afeto ao próprio Poder Legislativo, não cabendo revisão judicial, além do
processamento do processo disciplinar. Ante o exposto, presentes os pressupostos legais, DEFIRO A LIMINAR PLEITEADA,
DECLARANDO SUSPENSA A DECISÃO DE CASSAÇÃO DO MANDADO DE VEREADOR DO IMPETRANTE, até decisão final
do feito. Oficie-se com urgência, cabendo ao interessado a retirada e encaminhamento do ofício ao seu destino. Confira a
serventia se foi cumprido integralmente o disposto no artigo 6º, da Lei nº 12.016/09, ou seja, se foram apresentadas para
contra-fé cópias da inicial e de toda a documentação que a instrui no feito. Se for negativa a resposta, intime-se o impetrante a
fornecer o necessário no prazo de 10 dias, sob pena de cassação da liminar ora concedida. Após, nos termos do artigo 7º, inciso
I, da lei retro mencionada, notifique-se a autoridade coatora - Presidente da Câmara Municipal de Monte Alegre do Sul SP - para
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º