TJSP 07/04/2010 - Pág. 723 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quarta-feira, 7 de Abril de 2010
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano III - Edição 687
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traz consigo riscos de danos de igual medida. O risco está na existência de instrumentos e meios de certificação da veracidade
das informações, especialmente quando se trata de meios eletrônicos ou digitais, como é a simples transmissão da voz. Daí
porque é indispensável é a segurança na recepção e verificação da veracidade das manifestações de vontade. Neste ponto, em
nosso convencimento, está o ponto-chave da controvérsia dos autos. Afinal, quais foram as verificações e ditas “precauções”
que a empresa requerida tomou para considerar firmado o contrato com o autor? Concretamente, a requerida não elencou
nenhuma medida de precaução, além de solicitar o número do CPF da pessoa contratante. Está claro, tanto pela dicção da
contestação como pela falta de juntada de quaisquer documentos, que a autora não firmou contrato por meio de qualquer
documento escrito, assinatura ou mediante apresentação de cópia de qualquer documento de identidade ou de identificação. O
número do CPF e nome completo são dados pessoais, é verdade, porém, não são informações secretas, indisponíveis, não
constituem senha ou contém, em si, qualquer elemento que permita a certificação ou identificação da veracidade de quem os
fornece. Ora, estas são informações facilmente obtidas em qualquer simples folha de cheque. Ademais, não passam de palavras
e números que podem ser ditos por qualquer pessoa, sem que haja qualquer colaboração ou conhecimento do verdadeiro
portador de tais dados pessoais. Aliás, não é por outra razão que a empresa requerida não dispõe de quaisquer meios para
identificar com precisão quem firmou o contrato em questão. Não pode sequer provar se foi o autor, nem quem teria sido o
terceiro que supostamente utilizou os dados pessoais do autor. Importante ressaltar que nada impede que a empresa requerida
aceite o simples fornecimento de tais dados pessoais como meio suficiente de identificação do contratante. No entanto, a
requerida não pode transferir a terceiros os riscos que assume com tal procedimento. Evidentemente, se a requerida aceita a
simples verbalização do nome e do número de CPF de uma pessoa para firmar contrato de prestação de serviços de telefonia,
deve arcar com os riscos de tal forma de contratação. ‘ E o risco é exatamente ter que se certificar da exatidão da identidade do
contratante para a cobrança em caso de inadimplência. Se a requerida pactuou em tais condições de precariedade de
identificação, assume o dever de cuidado de redobrar suas cautelas caso tenha que tomar medidas que venham a interferir na
esfera de direitos do suposto contratante, evitando que inexatidões causem danos a terceiros. No caso, quando a empresa
requerida firmou contrato com quem quer que seja que se identificou com o nome e CPF do requerido, sem tomar precauções
para identificar a veracidade, assumiu o risco de ter que buscar a exatidão das informações em caso de inadimplência. Não
poderia, na inadimplência, simplesmente remeter os dados pessoais a cadastro de inadimplentes, quando os obteve sem
qualquer medida de precaução. Pode a requerida assumir os riscos de sofrer prejuízo pela precária identificação, pois, afinal,
diz respeito a disponibilidade de seu próprio patrimônio. Porém, não pode arriscar o patrimônio de terceiros com tal
comportamento. Sujeitar qualquer pessoa ao cadastro em lista de inadimplentes sem verificar antes a identidade do contratante
que aceitou mediante meio absolutamente precário de certificação da veracidade da informação. Ora, no caso, a requerida
simplesmente remeteu o nome e CPF do autor ao cadastro de inadimplentes, apesar de não possuir qualquer mínimo elemento
de certificação da veracidade da identificação do contratante. Por estas razões, a nosso ver, configura-se evidente comportamento
de negligência, falta de cuidado de empresa requerida que, sem certificar-se da identidade do contratante, fez a inserção em
lista de inadimplentes. Com efeito, praticou ato ilícito a empresa requerida realizar a inserção do nome do autor em lista de
inadimplentes sem antes certificar ou verificar, diante de elementos absolutamente precários, a identidade real do devedor.
Inclusão e manutenção indevida no SPC e SERASA - Responsabilidade da requerida O pressuposto que autoriza o credor a
proceder ao cadastramento do devedor em órgãos de inadimplentes, evidentemente, é a inadimplência. No caso, a prova dos
autos é clara no sentido de que inexiste dívida a sustentar a inserção do nome da parte autora em lista de inadimplentes. No
entanto, no caso, houve grave falha no serviço prestado pela requerida, pois, indevidamente, a parte requerida manteve o nome
da parte autora por aproximadamente quatro meses em lista de inadimplentes (fls. 23). Ressalte-se que o credor leva o débito
ao cadastro de inadimplentes à revelia do consumidor, inserindo em cadastro público informação de natureza privada e que
interfere significativamente nas relações negociais do consumidor, visto que a existência da inserção em lista de inadimplentes,
a chamada “negativação”, implica o cerceamento da obtenção de crédito. Em vista disto, configurado o ato ilícito do qual se
origina o direito à indenização, o cadastro indevido do nome do consumidor em lista de inadimplentes com constrangimento
ilegal e abusivo por veiculação de informação inverídica e depreciativa; houve explícita ofensa ao dever anexo de cuidado
positivado nas regras do art. 43, §1º e art. 42 caput, ambos do Código de Defesa do Consumidor. Dano moral em decorrência do
ato ilícito de responsabilidade da requerida A informação inverídica a respeito do consumidor ocasiona dano moral por ofensa
direta à sua honra e imagem. Não se pode admitir que se imponha indevidamente ao cidadão restrição de crédito e o
constrangimento do rótulo de inadimplente. Numa sociedade capitalista, o crédito é componente da honra subjetiva, e até
mesmo objetiva, das pessoas naturais. Leciona Antônio Herman de Vasconcelos e Benjamin que: “a idoneidade financeira
sempre foi - e cada vez mais é - um componente essencial da honorabilidade do ser humano. Representa o próprio ar que
respira o homo economicus, que dele destituído perece por asfixia, levando consigo parte substancial da cidadania de cada
indivíduo e inviabilizando o usufruto de outro interesse primordial reservado pela Constituição: a qualidade de vida” (Código
Brasileiro de Defesa do Consumidor, Comentado pelos autores do Anteprojeto, Saraiva, 8ª Edição, pg. 406/407). Daí a conclusão
de que emerge necessariamente dano moral do cadastro indevido do nome do consumidor em cadastro de inadimplentes. O
dano moral decorrente do cadastro em inadimplentes dispensa prova do prejuízo, pois é damnum in re ipsa. Ao denominado
damnum in re ipsa basta apenas o resultado lesivo e sua conexão com o fato causador para que se origine o direito à reparação
integral pelo simples fato da violação. Trata-se de presunção absoluta sobre a ocorrência dos prejuízos à imagem, à honra e à
psique, visto que tal sofrimento é insuscetível de demonstração no plano material, uma vez que deixa marcas internas,
perceptíveis somente pela própria vítima. É a lição de Antônio Jeová Santos, de que é comum que haja discussão “em Juízo
que, em decorrência de ter seu nome no rol destinado aos maus pagadores, foi impedido de conseguir financiamento ou que
passou por humilhação em uma determinada loja (...) Nada disso é necessário, porque o dano exsurge vitosamente pelo fato de
o nome constar erroneamente do cadastro. Nada mais é necessário provar. Houve o lançamento irregular, ilícito e injusto, o
dano ocorre in re ipsa” (Dano Moral indenizável, 3.ª Edição, Ed. Método, 2001,pg. 495/496). Ainda no dizer de Sérgio Cavalieri
Filho “o dano moral existe em re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso
facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das
regras de experiência comum” (Programa de Responsabilidade Civil, São Paulo, Malheiros, p. 80). Como prova, portanto, basta
a demonstração da existência da ofensa e presume-se o dano moral como conseqüência inexorável. “Nos termos da
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, nos casos de inscrição indevida no cadastro de inadimplentes, considera-se
presumido o dano moral, não havendo necessidade da prova do prejuízo, desde que comprovado o evento danoso” (STJ RESP 419365 - MT - 3ª T. - Relª Min. Nancy Andrighi - DJU 09.12.2002) “CIVIL - DANO MORAL - REGISTRO NO CADASTRO
DE DEVEDORES DO SERASA - IRRELEVÂNCIA DA EXISTÊNCIA DE PREJUÍZO - A jurisprudência desta corte está consolidada
no sentido de que na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do
agente se opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto. A
existência de vários registros, na mesma época, de outros débitos dos recorrentes, no cadastro de devedores do serasa, não
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