TJSP 01/06/2010 - Pág. 2502 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Terça-feira, 1 de Junho de 2010
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano III - Edição 725
2502
(fls.26/39), argüindo que a prescrição do medicamento deve ser feita por médico do SUS, que o fornecimento deve ser
padronizado, que a verba para a Saúde é prevista em orçamento, que muitas pessoas podem deixar de receber o tratamento
adequado com a concessão do tratamento via Judiciário. Pugnou pela realização de perícia médica para constatar a enfermidade
e pela improcedência do feito. Citada, a Fazenda Pública Municipal contestou a ação (fls.42/54). Em preliminar, argüiu carência
de ação por ilegitimidade passiva e impossibilidade jurídica do pedido, requerendo a extinção do feito sem resolução do mérito.
Ofereceu denunciação da lide em razão da responsabilidade do Estado de São Paulo. No mérito, aduziu que a responsabilidade
pelo fornecimento é do Estado de São Paulo, pois não está relacionado no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do
Ministério da Saúde, que o direito à saúde não corresponde em direito a medicamentos, que a Secretaria Municipal de Saúde
possui orçamento próprio e o atendimento ao pedido da autora prejudicará o atendimento à população, que não há laudo médico
oficial atestando a necessidade do medicamento, que não foi provada a doença e necessidade do medicamento, que é
necessária prova pericial para atestar a doença. Ressaltou que deve ser autorizada a aquisição de medicamentos genéricos,
como o Pimecrolimo. Pugnou pela improcedência do feito. Foi oferecida réplica à fl. 66. O Ministério Público opinou pela
procedência do pedido (fls.73/93). Foi indeferida a produção de prova pericial e testemunhal (fl.95). É o relatório. Fundamento e
decido. Julgo antecipadamente a lide, pois, apesar de questão ser de fato e direito não há necessidade de produção de provas
em audiência (art. 330, I, CPC). No tocante à ilegitimidade passiva, a responsabilidade solidária dos entes de direito público Estados, Municípios e União - decorre da própria finalidade do Sistema Único de Saúde, a qual foi criada para atender a
exigência contida no artigo 196 da Constituição Federal, que impõe ao Estado (em seu sentido lato) o dever de zelar pela saúde
dos indivíduos. Segundo o estabelecido no art. 18, da Lei nº 8.080/90, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção
e recuperação da saúde, cabe à direção municipal do SUS planejar, organizar, controlar e avaliar as ações e os serviços de
saúde e gerir e executar os serviços públicos de saúde, dentre os quais deve ser compreendido a distribuição gratuita de
medicamentos. Já os artigos 16 e 17, da referida Lei, fixam a competência da União e Estado, respectivamente. Assim, há
responsabilidade solidária entre União, Estado e Município pela prestação do serviço de saúde. Nestes termos, tem-se decidido:
DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS
ENTES PÚBLICOS. DENUNCIAÇÃO À LIDE DO ESTADO. INCABIMENTO. O fornecimento de medicamento à pessoa
comprovadamente carente é também de responsabilidade do Município, gestor local do Sistema Único de Saúde, tal como foi
afirmado no AgInst nº 70014069330. Paciente portadora de doença pulmonar obstrutiva crônica. Manutenção da decisão
combatida pelo recurso. A responsabilidade solidária dos entes públicos não obriga ao chamamento ao processo ou a
denunciação à lide dos entes não demandados pela agravada. Questões orçamentárias ou financeiras que não devem embaraçar
o pronto atendimento à vida e saúde. AGRAVO IMPROVIDO MONOCRATICAMENTE. (Agravo de Instrumento Nº 70016055485,
Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, j. 19/07/2006, destaquei). Nesse
contexto, é certo que o Município deve contribuir para a manutenção do sistema único de saúde, não podendo se eximir do
cumprimento estrito dos princípios constitucionais, sob alegação de que é dever do Estado o fornecimento dos medicamentos
solicitados pela autora, razão pela qual rejeito a preliminar argüida. A possibilidade jurídica do pedido consiste na admissibilidade
em abstrato da tutela pretendida, vale dizer, na ausência de vedação explícita no ordenamento jurídico para a concessão do
provimento jurisdicional. Assim, a alegada impossibilidade jurídica do pedido, sustentada em razão da inexistência de obrigação
de fornecer os medicamentos, não merece acolhida. Com efeito, além de não haver vedação legal à pretensão da autora não
existe dúvida acerca da responsabilidade do Município para o fornecimento de medicamentos. Como já ressaltado, a saúde é
dever do Estado, incluindo nesse vocábulo todos os entes políticos da federação, uma a obrigação solidária que pode ser
cumprida por apenas um dos entes. Destarte, não há necessidade de a ação ser proposta contra os demais e não é o caso de
denunciação da lide. Nestes termos, cite-se o julgado: DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES PÚBLICOS. DENUNCIAÇÃO À LIDE DO ESTADO.
INCABIMENTO. O fornecimento de medicamento à pessoa comprovadamente carente é também de responsabilidade do
Município, gestor local do Sistema Único de Saúde, tal como foi afirmado no AgInst nº 70014069330. Paciente portadora de
doença pulmonar obstrutiva crônica. Manutenção da decisão combatida pelo recurso. A responsabilidade solidária dos entes
públicos não obriga ao chamamento ao processo ou a denunciação à lide dos entes não demandados pela agravada. Questões
orçamentárias ou financeiras que não devem embaraçar o pronto atendimento à vida e saúde. (TJRS, Agravo de Instrumento nº
70016055485, Terceira Câmara Cível, Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, j. 19/07/2006, destaquei). Ante o exposto,
rejeito as preliminares argüidas pela Municipalidade. Cuida-se de ação de obrigação de fazer aforada por pessoa que necessita
de medicamentos (fls.10/11) e possui parcos recursos financeiros, tendo em vista que não foi contestada a falta de recursos
econômicos do requerente, a qual foi corroborada pela declaração de pobreza à fl.08. O pedido merece procedência. Não
merece acolhida o argumento de que tal tratamento não foi receitado por médico do SUS, pois a conveniência ou não do
tratamento, no caso, é da competência do Dr. Elísio de Bastos (CRM n.º 133.367), como decorre do Código de Ética Profissional
(Resolução n° 1.146, de 09.01.88 do Conselho Federal de Medicina) e já foi decidido pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo (MC n° 414.661-5/8 - Rel. Des. Marrey Uint e MC n° 653.686-5/9 - v.u. j.: 20.08.07 - Rel. Des. Oliveira Santos). Ora,
se prescreveu o tratamento aqui pleiteado é porque considerou que é o mais apropriado às peculiaridades clínicas do paciente.
O fato de não fazer parte do programa de padronização, não tem o condão de justificar a indisponibilidade e nem o
descumprimento do disposto na Lei nº 8.080/90 e de preceitos constitucionais. Ressalto que é dever do Estado garantir aos
cidadãos o direito à saúde de forma a preservar o bem maior. Desta feita, o fornecimento de medicamentos e tratamento ao
paciente portador de doença grave, que não possui condições financeiras para o obter de outra forma, faz parte da efetivação
do direito à saúde, garantido pela Constituição Federal nos artigos 5º e 196 e pela Constituição do Estado de São Paulo nos
artigos 219, parágrafo único, item 2, e 223, inciso V. Cabe ao Poder Público a obrigação de adotar os meios necessários às
“ações e serviços para promoção, proteção e recuperação” da saúde (art. 198, da CF, e 9º, III, da Lei 8.080/90), prestando
“assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica” (art. 6º, I, letra “d”, da Lei n. 8.080/90), sendo a “integralidade de
assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo de ações e serviços preventivos e curativos, individuais exigidos
para cada caso... “ (art. 7º, II, da Lei 8.080/90), não lhe sendo lícito, portanto, deixar de fornecer o tratamento necessário à parte
autora. Não pode, pois, o Estado recusar-se a fornecer o medicamento ou o tratamento sob a alegação de necessidade de
previsão orçamentária e nem mesmo sob falta de disponibilidade em programas públicos, já que o direito à saúde não pode
estar adstrito à mera formalidade, visto que a morosidade pode acarretar danos irreversíveis ao cidadão, ferindo, desta maneira,
o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e, ainda, cerceando o exercício do direito à saúde. A norma
constitucional, portanto, deve ter plena eficácia e utilidade social, máxime porquanto cabe ao Poder Público “concretizar” a
ordem constitucional (PIOVESAN, Flávia, in Proteção Judicial contra Omissões Legislativas, RT, 2ª ed., p. 20). Frise-se que não
existe qualquer intromissão indevida do Poder Judiciário nas políticas públicas. O E. Supremo Tribunal Federal pacificou
entendimento a respeito do tema em caso análogo, nos seguintes termos: “Paciente com HIV/AIDS - Pessoa destituída de
recursos financeiros - Direito à vida e à saúde - Fornecimento gratuito de medicamentos - Dever Constitucional do Poder Público
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º