TJSP 10/08/2011 - Pág. 2024 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quarta-feira, 10 de Agosto de 2011
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano IV - Edição 1013
2024
411.01.2011.000632-2/000000-000 - nº ordem 175/2011 - Medida Cautelar (em geral) - JOSE ISSAMU IDEHARA X ANTONIO
MADUREIRA PARA E OUTROS - Fls. 175/180 - VISTOS. JOSÉ ISSAMU IDEHARA ajuizou a presente AÇÃO CAUTELAR
INOMINADA em face de ANTONIO MADUREIRA PARRA e OUTROS, argumentando, em síntese, que aderiu ao projeto de
empreendimento comunitário (programa estadual de microbacias hidrográficas) firmado pelos requeridos, o que propiciava o
usufruto, na sua propriedade rural, do abastecimento de água, mediante o pagamento de sua cota-parte. Menciona que, apesar
de cumprir com suas obrigações, teve o abastecimento de água interrompido pelo representante do grupo, sem qualquer motivo
a tanto. Asseverando tratar-se de bem essencial à vida, pediu a antecipação da tutela, para o imediato restabelecimento da
água, com provimento final que confirmasse a medida extrema, condenando-se os requeridos nos ônus sucumbenciais e dando
à causa o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais). A Inicial (fls. 02/06) veio acompanhada de instrumento de procuração e
documentos (fls. 07/88). Concedida a antecipação dos efeitos da tutela, os réus foram citados (fls. 103, verso). Contestação do
réu Hugo Hideio Ikegami a fls. 98/101. Pediu, em preliminar, a suspensão da medida concedida, pela ausência dos requisitos
para a antecipação. No mérito asseverou que o autor não fazia parte do projeto (pec 03), mas de outro anterior (pec 02) que, por
estar com a implementação atrasada, ensejou, aos requeridos (participantes deste), a permissão para o ingresso no grupo,
enquanto a pec 02 não fosse instalada. Descreveu também que o autor não cumpria com sua parte, ferindo os termos do
contrato, seja porque instalara hidrômetro com capacidade maior que a dos demais proprietários, seja porque consumia
quantidade exagerada de água, que, por isto, faltava aos demais. O réu Antonio Madureira Parra contestou a fls. 105/109.
Alegou que o autor não participava do projeto comunitário dos requeridos, reforçando, outrossim, a utilização excessiva da água
pelo mesmo. Pediu a revogação da liminar, e a improcedência do pedido, juntando documentos (fls. 112/119). José Ricardo
Sacoman, contestando a fls. 120/125, alegou, preliminarmente, ilegitimidade ativa e passiva “ad causam”. No mérito teceu as
mesmas considerações formuladas pelo requerido Antônio. A contestação do réu Natal Tadashi Idehara trouxe à baila as mesmas
argumentações já descritas, acrescentando que o corte no fornecimento de água do autor foi precedido de anterior advertência
pelos réus (consequência de prévia reunião), a respeito do exagero no consumo (fls. 132/138). Juntou documentos (fls. 142/148).
Ilda Brejão Ferreira contestou a fls. 149/152. Aduziu, em preliminar, inépcia da inicial e carência da ação. No mérito reforçou as
mesmas ilações anteriormente descritas, nada acrescentando. Réplica a fls. 165/169, rebatendo os argumentos das contestações
e insistindo na procedência do pedido. É relatório. Fundamento e Decido. Prescinde o feito de dilação probatória comportando
seu julgamento antecipado, conforme o disposto no art. 330, I do Código de Processo Civil. As preliminares não se sustentam.
Vejamos. As partes são legítimas. O autor, porque o corte no fornecimento da água ocorreu em sua propriedade. Os réus porque
a responsabilidade pelo corte, fato incontroverso, partiu do grupo. A inicial não é inepta, pois dos fatos decorre logicamente o
pedido. Ademais, a ação apresenta todos os requisitos processualmente exigidos. Ressalto, ainda em preliminar, da possibilidade
do ajuizamento de medida cautelar inominada que, em hipóteses excepcionais, como a ora descrita, pode se apresentar com
caráter satisfativo. No mérito, o pedido é improcedente. Conforme se extrai dos autos, principalmente pela documentação
acostada, os réus concordaram com o ingresso do autor no projeto comunitário (pec 3), enquanto, ao que consta, o projeto em
que o autor participava (pec 2) não fosse instalado. Portanto, não se discute o direito do autor em usufruir a irrigação, instalando
um hidrômetro na sua propriedade, compartilhando da água, mesmo não fazendo, como não fazia, parte do grupo associado.
Posição contrária acarretaria ofensa ao brocardo jurídico “venire contra factum proprium” (vedação à adoção de um procedimento
contraditório). No entanto, a utilização de um direito deve obedecer aos limites anteriormente estabelecidos pela norma jurídica.
Uma vez ultrapassada esta fronteira, a conduta acarreta ato ilícito na modalidade abuso de direito, nos exatos termos do artigo
187 do Código Civil, que prescreve: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente
os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. Tratando-se, como na hipótese, de
limites impostos não pela norma jurídica, mas pelas partes da relação contratual, a ideia de abuso de direito vem atrelada aos
conceitos de função social do contrato e boa-fé objetiva, descritos, respectivamente, nos artigos 421 e 422 do Código Civil, “in
verbis”: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”; “Os contratantes são
obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”. Pois bem.
Observa-se que os requeridos foram uníssonos em afirmar que o autor abusou do direito contratualmente acordado, utilizando
água em percentual superior ao limite estabelecido. Fato incontroverso, pela ausência de impugnação específica, se encontra
na efetivação de prévia advertência, ao autor, a respeito de infrações contratuais, quais sejam, colocação de hidrômetro maior
que o permitido e abuso na utilização da água (vide fls. 135, último parágrafo). Também incontroverso que, pelo abuso em tela,
alguns produtores ficaram privados do fornecimento, em determinados dias. Aliás, além da juntada de documentos que
comprovam a utilização de hidrômetro maior, o próprio autor, em resposta às contestações, admitiu que “por alguns meses
utilizou de água além do limite de 20 mil litros por cada dia do mês”, e que “a mudança de registro para ¾ (três quartos) se fez
necessária não com o intuito de aumentar o consumo de água, mas, sim, para que houvesse uma pressão maior na irrigação”
(fls. 168). Ou seja, admitiu que infringiu cláusulas contratuais, ensejando, pois, as conseqüências contratualmente previstas,
dentre as quais se encontra o corte no fornecimento de água. Senão, vejamos: Item 7.1.1: “Na hipótese de ultrapassar o limite
pré-determinado para o mês, o produtor irá pagar uma taxa de cinco por cento (5%) do total das despesas referentes ao mês do
consumo, no caso de falta de água...(omissis). Com a reincidência, e caso falte água para os demais produtores do grupo, o
infrator poderá ter sua água desligada, por um mês subseqüente inteiro, ou conforme decisão a critério dos outros produtores
participantes do grupo, definido em reunião” (fls. 58); Item 7.1.2: “O hidrômetro instalado em cada propriedade não poderá ser
substituído por outro de diâmetro maior, nem poderá ser violado de nenhuma forma, podendo o usuário ser multado em 100% do
valor da cota mensal, ou até mesmo tendo seu registro lacrado ou retirado” (fls. 60); Ressalto, por fim, que, tendo o autor
aderido, como integrante, ao PEC 02/2007, e não tendo questionado (apesar de ter tido oportunidade a tanto) a afirmação de
que, como já participa de referido projeto, “não há se falar em privação de recursos para irrigar suas hortaliças” (fls. 107),
conclui-se que a improcedência do pedido não trará a possibilidade de privá-lo do consumo de água na propriedade rural. Desta
feita, a improcedência do pedido é medida imperiosa. Ante o acima exposto e o mais que dos autos consta, JULGO
IMPROCEDENTES os pedidos formulados, tornando sem efeito a liminar anteriormente concedida e, em conseqüência, JULGO
EXTINTO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil.
Condeno o autor ao pagamento das custas, despesas processuais, além de honorários advocatícios, que fixo, por equidade, em
R$ 400,00 (quatrocentos reais) para cada patrono dos réus. P.R.I.C. Pacaembu, 29 de junho de 2011. RODRIGO ANTONIO
MENEGATTI Juiz de Direito Certifico e dou fé, nos termos do Provimento CG nº 16/2009, que o teor da presente sentença
corresponde com o da constante dos autos. Pacaembu, 30 de junho de 2011.______________________Álvaro Roberto
Vecchiatti -Diretor Técnico de Serviço - MTJ -306.315 valor do preparo = R$87,25 - valor do porte = R$25,00 - ADV ANTONIO
ARAUJO NETO OAB/SP 117948 - ADV EDMUNDO FUJISHIMA OAB/SP 132953 - ADV HUGO HIDEIO IKEGAMI OAB/SP 164328
- ADV RAUPH APARECIDO RAMOS COSTA OAB/SP 139204 - ADV SILVIA PAULA DE SOUSA CAVALCANTE OAB/SP 283826
- ADV RAFAELA MIYASAKI OAB/SP 286313
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