TJSP 14/12/2011 - Pág. 1951 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quarta-feira, 14 de Dezembro de 2011
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano V - Edição 1095
1951
Titular - ADV ANTONIO CARLOS BRESEGHELLO OAB/SP 139577
438.01.2011.003785-9/000000-000 - nº ordem 430/2011 - Procedimento Sumário - MARIA ELISA SANTOS DE NADAI X
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Fls. 81/83 - Proc. 438.01.2011.003785-9/000000-000 - Controle 430/2011
Pela requerente: Dr. Antonio Carlos Breseghello - constituído (fl. 11); Pelo requerido: Procuradoria Federal. I. Relatório Maria
Elisa Santos de Nadai, RG nº 42.830.673-1/SP, CPF nº 341.332.858-16 e NIT nº 1.290.615.016-0, ajuizou ação previdenciária
contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) objetivando a concessão de salário-maternidade. Aduziu que o benefício lhe
é direito, por ocasião do nascimento do seu filho, Gustavo de Nadai Santana, evento ocorrido aos 30/4/2010. Relatou que é
trabalhadora rural diarista, mas alegou que nunca teve registro em carteira. Referenciou propriedades em que teria atuado.
Informou que o companheiro também exerce atividade rural, sendo que essa condição lhe é extensível. Salientou que o benefício
em questão independe do cumprimento de carência. Defendeu que é desnecessário o esgotamento da via administrativa.
Solicitou gratuidade processual. Atribuiu à causa o valor de R$ 7.200,00. Juntou documentos. Gratuidade processual concedida
à fl. 21. Instado a comprovar o indeferimento administrativo ou a inércia do requerido (fl. 21), o autor agravou (fls. 22/31), e o
egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu pelo prosseguimento do feito (fls. 32/34). O INSS foi citado (fl. 39v) e
apresentou contestação. Suscitou preliminar de ausência de interesse de agir, uma vez que não houve requerimento
administrativo. Quanto ao mérito, alegou que não houve o preenchimento do requisito “qualidade de segurada”. Discorreu sobre
o conceito de trabalhador rural eventual e de empregado. Salientou que o companheiro da autora laborou como empregado
durante o período de carência do benefício, motivo pelo qual não há que se falar em trabalho em regime de economia familiar.
Defendeu que o salário-maternidade não é devido aos desempregados. Calcado nesses fundamentos, pugnou pela
improcedência. Juntou documentos (fls. 40/60). Produziu-se prova oral (fls. 77/79). II. Fundamentação Decido pela improcedência.
Prevê a Lei 8.213/1991: Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte)
dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e
condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. O filho Gustavo nasceu aos 30/4/2010 (fl. 19). A
questão controversa diz respeito ao fato da requerente ter laborado no campo ao tempo do parto ou nos 10 meses que o
antecederam. Maria Elisa trouxe aos autos a cópia da carteira de trabalho do companheiro, Marcio Júnior de Jesus Santana,
onde constam registros recentes como trabalhador rural junto à Companhia Açucareira de Penápolis (fls. 17/18). Vejamos o teor
da prova oral. A requerente relatou que em 2008 se desligou de um salão onde exercia a função de manicure e foi trabalhar na
roça, plantando cana-de-açúcar, tomate e pimentão. Aduziu que depois que engravidou laborou no plantio até o começo de abril.
Contou que prestou serviço para “Flavinho”, Osvaldir e “José Galinha”. Esclareceu que o cônjuge labora na roça como cortador
de cana. Por fim, salientou que sempre morou no Distrito de São Martinho, que dista 17 quilômetros de Alto Alegre(SP) (fl. 77).
Jediane Cristina Silveira disse que acompanhou a gestação de Gustavo e que naquela época a requerente trabalhava na roça,
ali permanecendo até um mês antes do parto. Contou que Maria era contratada por “gatos” para laborar nas lavouras de cana,
tomate e pimentão. No mais, esclareceu que atualmente a autora faz faxinas (fl. 78). No mesmo sentido testemunhou Sueli Vaz,
pessoa que mora perto da autora e que também acompanhou a gestação de Gustavo (fl. 79). Mas não estou convencido de que
a autora prestava serviços no campo ao tempo do parto ou nos meses que os antecederam. Muito embora o seu cônjuge possua
diversos registros laborativos ligados ao campo desde junho de 2007 (fl. 56), a autora já foi registrada num salão de cabeleireiro
no curso de 2008 (fl. 54). Causou estranheza o fato de a requerente ter alegado que trocou aquele emprego pelo trabalho rural
porque o primeiro “era muito puxado”. “Tinha que fazer unhas, vender cosméticos e ainda ajudava a patroa a fazer almoço e
limpava a casa dela”, afirmou. Difícil é acreditar que o movimento fosse tão intenso num Distrito que possui cerca de mil
habitantes... Ela arrolou Jediane, que disse ser faxineira. E também disse que depois do parto se tornou faxineira, ou seja, que
não se manteve no alegado trabalho rural (fl. 77). Não desconheço entendimentos no sentido de que a carteira de trabalho do
marido/companheiro pode ser considerada início de prova material em favor da esposa. Mas o contexto demonstra que nunca
houve dedicação exclusiva à roça. Ademais, ouvida, a autora afirmou que antes de atuar no salão de beleza, não trabalhava. Foi
registrada pelo empregador no ano em que completou 24 anos. Esse não é o perfil das trabalhadoras rurais, que, na sua
maioria, se iniciam nas atividades durante a adolescência. A condição de rurícola do seu companheiro não lhe é extensível,
segundo entendimento deste Juízo, mormente nos tempos atuais, em razão do aumento do número de contratos formais de
trabalho envolvendo mulheres. A prova oral, embora coesa, não poderia suprir a falta do início de prova material. É o que ventila
a Súmula 149 do Egrégio Tribunal de Justiça: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade
rurícola, para efeito de benefício previdenciário. A minha linha de entendimento não permite a procedência. Afinal, devo decidir
com coerência com aquilo que venho decidindo. Ainda que vigore para o Magistrado, em seara de apreciação de provas, o
princípio da livre convicção motivada, entendo que não há início de prova razoável de que a requerente foi trabalhadora. É bem
verdade que no passado a situação, principalmente no que tange às mulheres, dificilmente era documentada, o que não acontece
atualmente. Não é aceitável que a requerente não tenha obtido sequer um documento que possa embasar o pedido. É temerário
acatar o pedido, pois padece do atendimento de requisito legal. O princípio da livre convicção motivada não pode sustentar a
inobservância da lei, mormente porque ela já facilitou demasiadamente a conquista de benefícios. Flexibilizar ainda mais a
concessão pode importar em desrespeitar o intuito e o comando do legislador e em sobrecarregar os cofres públicos com
pagamentos de benefícios insuficientemente embasados. Creio que as regras excepcionais sobre a comprovação da qualidade
de segurado especial devem ser interpretadas nos seus exatos limites, ou seja, que não comportam interpretação ampliativa.
Para não fugir da discussão, sem querer polemizar, mas em atenção ao comando constitucional que trata da motivação das
decisões, agora falando das ações previdenciárias de uma maneira geral, infelizmente o cotidiano forense tem me obrigado a
ser mais rigoroso na análise da prova oral. Isso porque é comum depararmos com alguns Advogados orientando testemunhas
de forma velada ou até explícita (mesmo quando o Magistrado passa) nos corredores ou na frente do Fórum. Aliás, na maioria
das vezes a parte e as testemunhas se deslocam juntas ao Fórum (em alguns casos no veículo do Defensor). É claro que as
versões serão sempre favoráveis, mas nem por isso costumam ser consistentes. Na maioria das vezes abrangem referências
vagas a antigos produtores rurais ou empreiteiros rurais, tornando inócua qualquer tentativa de defesa. Mas voltando a tratar do
cotidiano das ações previdenciárias, na Comarca de Cafelândia, por exemplo, comparei os relatos de uma testemunha (que
depunha semanalmente, diga-se de passagem) com o seu depoimento pessoal no processo em tinha conseguido a aposentadoria
e constatei que não havia coerência entre as falas no que tange às propriedades rurais em que ela teria atuado. Era, em
verdade, uma testemunha profissional. Em Penápolis(SP) uma testemunha, ao ingressar no prédio, com o fito de saber em que
sala seria ouvida, acabou apresentando na portaria uma carta por meio da qual um(a) Advogado(a) a tinha orientado a passar
antes no seu escritório para que fosse orientada sobre o que deveria dizer para que o desfecho fosse de procedência. Ninguém
desconhece que há muitos casos de captação de clientela nessa seara. É evidente que a maior parte dos profissionais atua de
acordo com a lei e os preceitos éticos, mas como o Juízo tem dificuldade para comprovar algumas irregularidades e não pode
discriminar o trabalho de quem quer que seja, precisa adotar um posicionamento uniforme que, se por um lado, reconheço, pode
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