TJSP 16/05/2012 - Pág. 1990 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quarta-feira, 16 de Maio de 2012
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano V - Edição 1184
1990
e 223/227 ). Concomitantemente, Rosana Meire Murari Cavanhão e Paulo Sérgio Cavanhão, qualificados na inicial, ajuizaram a
ação declaratória de nulidade de ato jurídico apensa contra Francisco Sérgio Garcia e Marisa Junqueira Garcia, igualmente
qualificado. Em síntese, alegaram que: são legítimos proprietários de um imóvel rural situado em Sales Oliveira/SP, denominado
sítio Nossa Senhora; no início de maio de 2006, o irmão da requerente, Sr. Ronan Carlos Murari, passou por problemas de
ordem financeira, devendo a importância de R$15.000,00 aos requeridos; como não tinha condições de pagar o débito, aceitou
o parcelamento em sete vezes de R$3.643,00; como Ronan não possuía bens imóveis para dar em garantia da dívida, os
autores foram induzidos a assinarem um Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra em benefício dos
requeridos, com a promessa de que o documento apenas garantiria o cumprimento da obrigação a que se propôs o irmão da
autora; Ronan conseguiu pagar aos requeridos a importância de R$17.199,00, não conseguindo saldar o remanescente; ao
final, o Sr. Ronan conseguiu quitar o débito, mas, ainda assim os requeridos exigiram a propriedade rural dos requerentes;
requereram, ao final, a anulação do Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra, ou inexistente o contrato em
poder dos requeridos, além da condenação dos requeridos nas verbas da sucumbência. Com a inicial vieram os documentos
que se tem a fls. 19/41. Citados, os requeridos apresentaram contestação e documentos ( fls. 50/68 ), alegando, preliminarmente,
exceção de incompetência e ilegitimidade ativa. No mérito, sustentaram, em suma, que a relação comercial entre o Sr. Francisco
Sérgio Garcia e o Sr. Ronan Carlos Murari refere-se a compra de couro cujas peças jamais foram entregues ao autor pelo Sr.
Ronan; tendo em vista que as peças de couro não foram entregues, o autor requereu ao Sr. Ronan a devolução dos valores
pagos pelo couro em parcelas; foi paga apenas a quantia de R$3.500,00; a proposta de venda da chácara foi apresentada pelo
Sr. Ronan, sendo que os requeridos jamais trataram a venda com os autores; ao final, requereram a improcedência da ação,
com a condenação dos autores nas custas e sucumbência, além de indenização por danos morais. Posteriormente, os requeridos
juntaram mais documentos ( fls. 72/75 ). Os autores impugnaram a contestação, reiterando os termos da inicial ( fls. 77/81 ). Os
autos foram remetidos à Comarca de Nuporanga, e a f. 89 determinou-se o apensamento do processo nº 591/07 ao de nº
1582/06, instruindo-se neste último. São os relatórios. Decido. São decididas simultaneamente esta e a ação declaratória de
nulidade de ato jurídico em apenso ( autos 1.582/06 e 591/07, respectivamente ). Procede a anulatória e improcede a
reintegratória. I - Da ação anulatória. Evidente a nulidade, por simulação, do contrato de venda e compra datado de maio de
2006, tendo por partes, de um lado, como supostos vendedores, Rosana Meire Murari Cavanhão e Paulo Sérgio Cavanhão, e,
de outro, como supostos compradores Francisco Sérgio Garcia e Marisa Junqueira Garcia ( fs, 22/25 dos autos 591/07 ). A
propósito, dispõe o art. 167, “caput” c.c. § 1º e seu inc. II, do Código Civil: Art. 167: É nulo o negócio jurídico simulado, mas
subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. § 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: II
- contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira. Conforme esses preceitos, para configuração do vício
da simulação exige-se apenas divergência entre a vontade do contratante e a manifestação efetivamente declarada, i.e., bastará
que o ato praticado não corresponda ao interesse legítimo e real de qualquer dos contratantes. Exatamente essa a situação ora
“sub iudice”, uma vez que se pretendeu constituição de garantia e, no entanto, se documentou venda e compra de imóvel.
Convence satisfatoriamente dessa proposição a petição inicial da ação de reintegração, a contestação da ação anulatória e o
depoimento pessoal do pseudocomprador Francisco Sérgio Garcia; senão vejamos: Na inicial da reintegratória o autor se
apresentou como adquirente do imóvel e se referiu a Ronan Carlos Murari como se fosse este um estranho ( um posseiro até
então desconhecido ). Com a réplica, todavia, Francisco Sérgio apresentou toda uma história de débito e crédito entre ele e
Ronan, além do que, inovando, justificou que “ jamais tratou pessoalmente com os autores “ ( cf. final da f. 75 do proc. 1582/06
). Inovação ainda maior cometeu Francisco Sérgio ao depor pessoalmente ( a fs. 131/132 do 1º apenso ), quando admitiu
expressamente que o documento em questão fora-lhe passado por Ronan diretamente, e não pelos supostos vendedores, e,
ainda, que esse documento visara tão somente a garantir o pagamento da dívida até então existente entre ambos ( cf. últimas
seis linhas da f. 131 ). Não bastasse essa inovação, Francisco Sérgio incorreu em confusão e contradição grosseiras nesse
depoimento. Pese a contradição: veja-se que, ao replicar na reintegratória, afirmou que o imóvel valia no máximo R$60.000,00,
que foi pago: ao depor, informou que a avaliação era de R$80.000,00 e que, para pagamento, além da dívida de Ronan, no valor
de R$48.000,00, entregou, a este, R$30.000,00 em cheques e R$15.000,00 em dinheiro (total de mais de R$80.000,00). Quanto
à confusão, note-se que, pelo depoimento pessoal e testemunhas do autor, em maio/2006 ( data do contrato - reconhecimento
de firmas inclusive ) Francisco teria quitado o imóvel e solucionado toda a lide então existente entre as partes, sobretudo porque
o pagamento teria envolvido a dívida de Ronan, no suposto valor de R$48.000,00, além de R$20.000,00 em cheques e
R$15.000,00 em dinheiro. Ocorre, porém, que, conforme a prova documental apresentada com a inicial e a defesa da ação
anulatória, ocorreram também nos meses de junho a setembro de 2006 compensação de um cheque e protesto de um outro,
dados por Ronan a Francisco para pagamento da dívida havida entre ambos. Aliás esse movimento de pagamento e protesto de
cheques entre junho a setembro de 2006 é confessado na réplica da primeira e contestação da segunda ação. Ora, se se
verificaram pagamentos e protestos mesmo depois de confeccionado o contrato em questão, evidente que a lide creditória entre
as partes não se encerrou com o tal contrato e, também, evidente que tal contratação objetivou apenas e tão somente garantir a
solvabilidade da dívida havida entre Ronan e Francisco. Destacando ainda que as contradições em que incorreu Francisco
Sérgio Garcia, temos a afirmação, no 6º § da f. 72 da ação de reintegração e 1º § da f. 53 da ação anulatória, de que a aquisição
em questão teria se dado há meses atrás, quando, por outro lado, o contrato em questão é de maio/2006 e, confessadamente,
houve compensação e protesto de cheques nos meses seguintes. Há, a propósito, além da confissão citada, prova documental
na ação anulatória (cheques Ed instrumento de protesto). Aliás o próprio Francisco provou, com a petição e documento juntados
a fs. 72/75 dos autos 591/07, que até outubro de 2006 ainda houve movimento sobre pagamento de duplicatas correspondentes
a débito de Ronan, o que obviamente depõe contra a proposição, deque nos dá conta o depoimento pessoal de Francisco, de
que em maio/2006 (data do contrato) teria ocorrido a compra do imóvel envolvendo, no pagamento, a dívida de Ronan para com
Francisco. Sobreleva ressaltar que as testemunhas arroladas por Francisco confirmaram a proposição passada por Francisco
ao depor, no sentido de que no ato do negócio em questão teria havido solução de toda a lide então existente entre as partes, o
que, porém, é contraditório com a réplica e a defesa apresentadas por Francisco, respectivamente, na ação de reintegração e
na anulatória. Contraditório também com os documentos juntados na ação de anulação de ato jurídico. Por sua vez os autores
da ação anulatória e o réu da ação reintegratória afirmaram coerentemente, em seus depoimentos pessoais, que se tratou de
garantia, e não venda e compra, o ato efetivamente praticado entre as partes. Ademais, convém anotar a extrema incoerência
entre o valor da pseudocompra e o da única avaliação juntada aos autos, que merece credibilidade irrestrita porque não desafiou
impugnação legítima e concreta, instruída com documento de que constasse outro valor. Óbvio que incoerência tal sugere
indício de ilicitude. Por fim, consigno que Francisco não trouxe aos autos prova dos negócios de venda e compra de couro que
disse ter celebrado com Ronan, o que significa indício de que pode ter havido realmente entre ambos contratos de empréstimo
de dinheiro. Guarda, pois, coerência com toda a situação e documentação trazida aos autos a pressão emocional que Rosana
alegou ter sofrido para assinar o questionado contrato. Daí que se pretendeu, na verdade, com a contratação em questão,
apenas garantir o cumprimento de uma obrigação essencialmente pecuniária, e não vender e compra imóvel. E se se cuidava de
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º