TJSP 30/05/2014 - Pág. 29 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: sexta-feira, 30 de maio de 2014
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano VII - Edição 1661
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- Marcelo Silva Guimarães - Aymoré Crédito Financiamento e Investimento Sa - Vistos. I. Trata-se de ação ordinária de revisão
contratual e amortização de débito c.c. tutela antecipada que Marcelo Silva Guimarães move em face de Aymoré Crédito e
Financiamento e Investimentos S.A., alegando, em síntese, que mantém junto à ré contrato de crédito garantido por alienação
fiduciária em garantia tendo por objeto veículo descrito na inicial. Afirma que o cálculo do débito está eivado de ilegalidades,
quais sejam: prática de anatocismo, taxas diversas indevidas e que a porcentagem contratada não estaria sendo aplicada.
Teceu considerações explicando a sistemática para cálculo de juros, alegando indevida a utilização da Tabela Price, no que
deveria ser usado o chamado método de Gauss. Requer a concessão da tutela antecipada com o depósito judicial do valor que
entende correto, pedindo seja extirpado o cômputo de juros sobre juros, alterando o método de amortização de dívida de Price
para Gauss. Pede, outrossim, declare-se ilegal a cobrança das tarifas mencionadas na inicial e que, subsidiariamente, caso
entenda legal o anatocismo, sejam aplicados os juros contratados. Requer a concessão da benesse da justiça gratuita, juntando
documentos (f. 15/55). Concedida a gratuidade e indeferida a tutela antecipada a f. 57. Regularmente citada, a ré apresentou
contestação a f. 61 e ss., sustentando inexistirem os requisitos para revisão contratual. Afirma a legalidade do anatocismo e das
tarifas cobradas contratualmente. Cita julgados que entende amparar-lhe a defesa. Requer, assim, a improcedência dos pedidos,
juntando documentos (f. 80/92 e 95/96). Instadas as partes a especificarem provas (f. 98), quedaram-se inertes. Suspensão do
curso processual até decisão do REsp. 1.251.331 RS (f. 101), seguido de certidão informando o trânsito em julgado do mesmo.
É o relatório. II. DECIDO. O caso comporta julgamento antecipado, nos termos do CPC, art. 330, I. As provas até aqui produzidas
são já suficientes para o deslinde da causa, sendo desnecessária a designação de audiência de instrução. Afasto as preliminares
arguidas. O provimento jurisdicional pedido é em tese admitido pelo ordenamento, além do que, há interesse de agir, vez que a
via eleita é adequada ao fim pretendido e necessária, portanto, útil. No presente, antevê-se que as partes firmaram, livremente,
contrato de crédito bancário. Observa-se também que o contrato consigna de modo expresso e claro todas as tarifas e taxas de
juros incidentes (39/41). Por isso, nada há de obscuro que pudesse induzir a erro o autor, que ao firmar a avença tinha plena
consciência das consequências que adviriam posteriormente durante o desenrolar do contrato. Tem plena incidência ao caso o
princípio pacta sunt servanda, que vincula as partes, afastando-se a possibilidade de incidência da revisão pretendida pela
autora. Fábio Ulhoa Coelho, comentando a teoria da imprevisão, sintetizada pela cláusula rebus sic stantibus, após asseverar
sua inaplicabilidade aos contratos de execução imediata bem como aos aleatórios, aponta que: “(...) Para a aplicação da teoria
da imprevisão, é necessário que as condições econômicas de uma das partes, ao tempo do cumprimento do contrato, sejam
substancialmente diversas daquelas existentes quando de sua celebração. A alteração das condições econômicas, por sua vez,
não poderia ter sido razoavelmene antevista, ou seja, é imprescindível a sua imprevisibilidade. Finalmente, o cumprimento do
contrato, na nova situação econômica, deve revelar-se excessivamente oneroso para uma das partes e, em conseqüência,
exageradamente benéfico para a outra (...)” (Manual de Direito Comercial. São Paulo, Saraiva, 15º ed., 2004, p. 426) (grifei).
Ainda segundo Fábio Ulhoa Coelho, autores há (com os quais alinha-se este magistrado) que entendem que a revisão somente
pode ser obtida se o contratante que a postula age com inequívoca boa-fé e se socorre do Judiciário antes do vencimento da
obrigação. Assim, é evidente que as normas protetivas do consumidor não invalidam, mas convivem, com os princípios regentes
das relações contratuais, entre os quais indiscutivelmente está a intangibilidade dos contratos. Oportuna a transcrição de trecho
de acórdão proferido pelo E.Tribunal de Justiça de Pernambuco, onde bem se avalia a relação entre as normas de proteção e
defesa do consumidor frente ao princípio ora invocado: “(...)É válido aclarar para a importância do equilíbrio que deve existir
entre o princípio da Pacta Sunt Servanda e as prescrições do Código de Defesa do Consumidor. Clara é, nos dias atuais, a
importância do Diploma legal Consumerista, posto proteger a figura do consumidor, na maior parte das vezes hipossuficiente,
contra os abusos advindos dos negócios jurídicos realizados com as empresas. Todavia, o paradigma de que os Contratos/
Acordos devem ser cumpridos não perde sua validade. Do contrário: observada a boa-fé dos contratantes e a razoabilidade das
cláusulas contratuais, a avença deve ser cumprida em sua integralidade (...)”(TJPE AgRg 101137-8/01 Rel. Des. Bartolomeu
Bueno de Freitas Morais DJPE 15.01.2004). No mais, é de se ressaltar que as instituições financeiras, conforme entendimento
que se pacificou em sede doutrinária e jurisprudencial, não se sujeitam à limitação das taxas de juros estabelecida pela Lei de
Usura. Não se pode deixar de reconhecer que ainda que admitida a existência de capitalização de juros no contrato firmado
entre as partes ou a cobrança de taxas maiores que aquelas previstas pela Lei da Usura, as instituições integrantes do sistema
financeiro nacional estão sujeitas a regramentos próprios. Com efeito, é a Lei nº 4.595/64 que regulamenta sua atuação. Em seu
art. 4º, IX, a mencionada lei comete ao Conselho Monetário Nacional limitar, sempre que necessário, as taxas de juros,
descontos, comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros. Neste sentido,
tranquila a jurisprudência: “As disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos
cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional” (Súmula
nº 596 do Colendo Supremo Tribunal Federal). No mesmo sentido: STF em RE 78.953 (RTJ 72/916); RE 82.508 (RTJ 77/966) e
RTJ 79/620; JSTF Lex 5/124; JTARS 29/338. E ainda: “(...) Não se aplica a limitação de juros de 12% ao ano prevista na Lei de
Usura aos contratos de abertura de crédito bancário, nem se considera excessivamente onerosa a taxa média do mercado.
Precedente da 2ª Seção do STJ.” (STJ RESP 493812 RS 4ª T. Rel. Min. Aldir Passarinho Junior DJU 08.09.2003 p. 00340).
Transcrevo a seguir importante lição doutrinária de Nelson Abrão no mesmo sentido: “(...) É, pois, fora de dúvida que as
restrições impostas pelas leis comuns às taxas de juros não se aplicam aos bancos, que estão sujeitos às fixações pelo Conselho
Monetário Nacional (...) A liberdade de pactuar os juros obedece ao termômetro da economia, a solidez da instituição que
contrata, a realidade da inadimplência, enfim, aos predicados objetivos e subjetivos que mesclam em cada operação bancária
(...)” (Direito Bancário, 9º ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 100). No que se refere à capitalização de juros, inicialmente a
doutrina admitia tradicionalmente apenas a anual, com fundamento no antigo art. 1.262 do diploma civil de 1916. Contudo,
passou-se a entender que a proibição contida no art. 4º da Lei de Usura revogava aquela autorização, de modo que vedada a
capitalização, ainda que anual (Súmula nº 121 do Colendo Supremo Tribunal Federal). Novamente sobreveio autorização para a
capitalização anual, prevista no atual Código Civil, em seu art. 591, parte final. É de se ressaltar que com a edição da Medida
Provisória, atualmente sob o nº 2.170-36, houve autorização expressa para sua convenção pelas instituições financeiras. O art.
5º do ato normativo em questão assim dispôs: “Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro
Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano.” É certo que a medida provisória em
questão não pode incidir retroativamente aos pactos firmados antes de sua vigência. Contudo tal argumento no presente caso
não socorre ao autor, pois o contrato foi firmado em maio de 2010, quando já vigia a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, de 31
de março de 2000 (ato normativo originário da atual MP nº 2.170-36, que daquela constitui reedição com inalterada redação).
Neste sentido: “(...) Admite-se a capitalização mensal nas operações realizadas pelas instituições financeiras integrantes do
Sistema Financeiro Nacional, celebradas a partir de 31 de março de 2000, data da primitiva publicação do art. 5º da Medida
Provisória 1963-17/2000, atualmente reeditada sob o nº 2.170-36/2001 (...) (STJ, 3º Turma, AgRg no REsp 700.145/RS, Rel.
Min. Castro Filho, j. 1/09/2005, DJ 26/9/2005, p. 373)”. “JUROS - Anatocismo - Instituições financeiras - Admissibilidade Incidência da Medida Provisória n° 1.963-17/2000 (reeditada sob o n° 2.170/36), que admite a capitalização mensal dos juros
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º