TJSP 16/02/2016 - Pág. 2048 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: terça-feira, 16 de fevereiro de 2016
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano IX - Edição 2056
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alma. E cediço que, em crimes sexuais, geralmente praticados às escondidas, a palavra da vítima constitui elemento da mais
absoluta validade, principalmente se, como na espécie, guarda perfeita identidade com os elementos de convicção apurados na
prova. Nesse sentido, tem se posicionado a jurisprudência: “Em crimes da natureza do aqui tratado, rotineiramente praticado às
escondidas, presentes apenas os agentes ativo e passivo da infração, a palavra da vítima é de fundamental importância na
elucidação da autoria. Se não é desmentida, se não se revela ostensivamente mentirosa ou contrariada, o que cumpre é aceitála sem dúvida” (RJTJSP 129/506). “PROVA CRIMINAL - Insuficiência - Inocorrência - Hipótese’ de estupro - Vítima que prestou
declarações sinceras e coerentes, que guardam perfeita harmonia com os demais elementos de convicção -’ Ofendida que não
tinha motivo algum para incriminar um inocente - Recurso não provido. “ESTUPRO - Violência presumida - Vítima menor de 14
anos - Declarações sinceras e coerentes da ofendida, que guardam perfeita harmonia com os demais elementos de convicção
- Autoria é materialidade caracterizadas - Recurso parcialmente provido para outro fim. A palavra da vítima, nos delitos contra os
costumes, surge como um coeficiente de ampla valoraçao. No caso dos autos, não tinha a menor motivo algum para incriminar
um inocente, máxime quando esta acusação se ajusta às demais provas dos autos. (...) (TJSP - Apelação Criminal n° 140.037-3
Lençóis Paulista - Rei. Sinésio de Souza - J. 21.02.94 - v.u.). “CRIME CONTRA OS COSTUMES - Prova a posteriori - Vitima
menor - Depoimento da vítima. Crime contra os costumes. Valor da palavra da ofendida. Provas complementares.
Condenação.’Sabido ser importante a palavra da ofendida nos chamados crimes sexuais onde, quase sempre, presentes aquela
e o acusado. No entanto,’ o valor dás declarações da ofendida assumem maior relevância quando às suas declarações somamse. outras provas, inclusive a técnica, e todas confirmadoras da autoria e materialidade (TDRJ - ACrn? 301/97 - São Gonçalo 2ª C.Crim. - Rei. Juiz Motta Moraes - J. 20.05.1997). ‘ “ATENTADO VIOLENTO. AO PUDOR - Menor de dez anos - Suficiência
da prova -Condenação mantida. Há de ser mantida a condenação por delito contra os costumes, cuja sentença tenha base as
declarações da vítima, menor de dez anos, quando estas se mostrem coerentes e verossímeis em si mesmas e em face dos
demais elementos da prova, indiciários inclusive. Exigir prova oral direta em processo onde se apure crime contra os costumes,
e fomentar a impunidade. Apelo improvido. Decisão unânime (TJSE - Ap. Crim. n° 27/95 - Ac. 780/97 - C. Crim. - Aracaju - Rei.
Des. José Barreto Prado - DJSE 11.09.97). “ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR - Prova - Palavra da vítima -Credibilidade Harmonia com os depoimentos das testemunhas. Álibi não sustentado pelo conjunto probatório - Negativa de autoria afastada.
REDUÇÃO DA PENA - Possibilidade - Circunstâncias do art. 59 do CP que favorecem o apelante - Circunstâncias legais
(agravantes e atenuantes) que se compensam - Pena fixada no mínimo legal. REGIME INTEGRAL FECHADO - Edição da Lei n°
11.464/07 - Alteração do § I o do art. 2° da Lei n° 8.072/90 - Progressão do regime prisional - Reconhecimento. (TJ/SP, apelação
1.103.9303/8, acórdão nº 01567147, 8 Câmara Criminal, 18/01/08) Assim, as provas produzidas, a palavra da vítima, somada a
narrativa das testemunhas e os demais indícios corroboram o quadro acusatório e formam a convicção para o decreto
condenatório, já que a negativa do reu não se sustenta, tampouco conseguiu apresentar qualquer justificativa plausível a afastar
o depoimento de Jaqueline que tanto na fase policial como em juízo manteve a coerência e apontou a ocorrência do delito
sexual que sofreu e que presenciou a vitima Odila sofrendo. A tipificação penal visa a proteger a infância e a adolescência, que
não pode ficar a mercê de adultos que não respeitam esta condição, praticando as perversões que acarretam problemas
psicológicos irreversíveis. Ademais, pela coerência dos depoimentos somados a alteração de conduta como medo, modificação
de comportamento na escola, casamento com pouca idade, ausência de maturidade para relacionamentos, dificuldade de
exposição de ideias, esquecimento dos fatos, são aspectos da personalidade que indicam um distúrbio que pode ter origem em
crime sexual, constituindo-se em elemento contundente a corroborar o quadro probatório. Nesse sentido são algumas lições
tiradas de psicólogos que escreveram obras em relação a estes temas: “Além de transtornos psicopatológicos, crianças e
adolescentes vítimas de abuso sexual podem apresentar alterações comportamentais, cognitivas e emocionais. Entre as
alterações comportamentais destacam-se: conduta hipersexualizada, abuso de substâncias, fugas do lar, furtos, isolamento
social, agressividade, mudanças nos padrões de sono e alimentação, comportamentos autodestrutivos, tais como se machucar
e tentativas de suicídio. As alterações cognitivas incluem: baixa concentração e atenção, dissociação, refúgio na fantasia, baixo
rendimento escolar e crenças distorcidas, tais como percepção de que é culpada pelo abuso, diferença em relação aos pares,
desconfiança e percepção de inferioridade e inadequação. As alterações emocionais referem-se aos sentimentos de medo,
vergonha, culpa, ansiedade, tristeza, raiva e irritabilidade (Cohen Mannarino, 2000b Predictors of treatment outcome in sexually
abused children.Child Abuse Neglect, 24(7), 983-994; Cohen et al., 2001 - Treating acute posttraumatic reactions in children and
adolescents.Society of Biologial Psychiatry, 53, 827-833.; Habigzang Koller, 2006 - erapia cognitivo-comportamental e promoção
de resiliência para meninas vítimas de abuso sexual intrafamiliar. In D. D. Dell’Aglio, S. H. Koller M. A. M. Yunes (Eds.),Resiliência
e psicologia positiva: Interfaces do risco à proteção(pp. 233-258). São Paulo, SP: Casa do PsicólogoAzevedo, G. A., Koller, S.
H., Machado, P. X. (2006), Fatores de risco e de proteção na rede de atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência
sexual.Psicologia: Reflexão e Crítica, 19(3), 379-386.; Haugaard, 2003; Jonzon Lindblad, 2004 - Disclosure, reactions and social
support: Findings from a sample of adult victims of child sexual abuse.Child Maltreatment, 9(2), 190-200). O abuso sexual
também pode ocasionar sintomas físicos tais como hematomas e traumas nas regiões oral, genital e retal, coceira, inflamação e
infecção nas áreas genital e retal, doenças sexualmente transmissíveis, gravidez, doenças psicossomáticas e desconforto em
relação ao corpo (Sanderson, 2005 - Abuso sexual em crianças: Fortalecendo pais e professores para proteger crianças de
abusos sexuais. São Paulo, SP: M. Books do Brasil).” Ora, pelos estudos acima de psicólogos de alto gabarito na questão,
pode-se analisar o quadro da vitima, a qual desenvolveu medos, mudanças de comportamento, fugas da residência, casamento
precoce, ou seja, elementos que subsidiam as alegações da criança e afastam qualquer duvida quanto a ocorrência do delito.
Realmente pelo quadro não se constata fantasia da vitima, mas sim um depoimento coerente, logico e corajoso dentro das
limitações de desenvolvimento compatíveis com a idade da vitima, ressaltando que começou a sofrer os abusos com 08 anos de
idade, e respaldado ainda pelas oitivas de Jaqueline, Dulcineia e Marlene. Por fim, a vitima narrou que o acusado chegava a
mostrar facas, e fazia ameaças constantes de morte, a qual eram recebidas por uma criança de 08 anos, e que perdurou ate
após completar 14 anos, ou seja, sem conseguir escapar do temor imposto pelo reu, chamando a atenção que o acusado
chegou ate mesmo a mostrar arma de fogo, o que reforça a gravidade da ameaça perpetrada pelo reu. Assim, é de rigor a
condenação do acusado nos termos da denúncia, tanto para os abusos com relação sexual cometidos entre 08 anos a 14 anos,
e após completar 14 anos. Passo a dosimetria da pena: Na fase do artigo 59 do Código Penal, verifico que o réu arquitetava
friamente o delito, aproveitando que não se dedicava ao labor, permanecendo no ócio do lar, e aproveitando-se que a vitima
ficava sozinha, brincando de bonecas para dar azo ao seu instinto abjeto, o que mostra uma covardia e uma periculosidade
acentuada. Alem do mais, trouxe prejuízos psicológicos a vitima, afetando de maneira impar a dignidade da criança e após da
adolescente trazendo traumas, o que deve ser pesado no momento de fixação da pena, tanto que continua em tratamento
psicológico, e foi obrigada a casar-se precocemente para conseguir fugir do reinado de terror imposto pelo acusado. Não se
olvide a personalidade destorcida, a dissimulação que manteve, já que continuou com a criança e depois adolescente na
presença da esposa como se nada tivesse ocorrido. A culpabilidade é acentuada pois atuava de maneira diária, por diversas
vezes, inclusive submetendo a vitima a ameaças constante em arma de fogo e arma branca, conseguindo com isso reduzir
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