TJSP 01/06/2016 - Pág. 2020 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quarta-feira, 1 de junho de 2016
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano IX - Edição 2126
2020
momento, pontua-se a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso sob julgamento, pois as partes se enquadram
nos conceitos de consumidor e fornecedor, a teor do disposto nos artigos 2º e 3º, da Lei nº 8.078/90.No mérito, o pedido exibese procedente.A autora fez prova da solicitação da portabilidade da linha telefônica indicada na inicial, demonstrando, também,
que tal pedido foi regularmente recepcionado pela empresa requerida (fls. 18/20). Não há, a propósito, impugnação específica
nesse particular.A empresa requerida, por sua vez, argumenta que adotou todos os procedimentos necessários à portabilidade
numérica, dentro dos trâmites legais, não havendo qualquer irregularidade na prestação dos serviços.Em face das alegações da
requerente, sustentando que, após a portabilidade numérica, sua linha telefônica ficou impossibilitada de realizar e receber
chamadas, incumbia à requerida o ônus de comprovar a adequação e regularidade da prestação do serviço de telefonia, já que
não é possível impor à autora a comprovação de fato negativo.Não se trata de inversão do ônus da prova, mas atribuição de tal
ônus (v. art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil). Bastaria, então, para atender o ônus processual, que a empresa
requerida juntasse aos autos documentação comprobatória de que a autora realiza e recebe ligações utilizando-se da linha
telefônica de forma contínua. Nem se diga que houve cerceamento de defesa, uma vez que referidos documentos deveriam
acompanhar a contestação, conforme disposto no art. 434 do novo CPC, aplicável à espécie, e, mormente porque a própria
requerida informou não possuir outros documentos para acostar aos autos, pugnando pelo julgamento antecipado do feito (fls.
88).Ocorre que, para demonstrar a regularidade na prestação dos serviços, a requerida limitou-se a apresentar, no bojo da
contestação, telas de computador de sistema informatizado, sustentando que a portabilidade numérica foi concretizada em
31/12/2015 (fls. 42). Ainda, negou a indisponibilidade da linha telefônica, aduzindo que os documentos juntados a fls. 18/19
comprovam que a autora utilizou o terminal telefônico para efetuar chamadas.Sem razão, contudo, a requerida.Isso porque as
telas de computador exibidas pela requerida não se prestam a comprovar que a linha telefônica da autora estivesse ativa e apta
a receber ou efetuar chamadas. Para tanto, repita-se, bastaria a requerida juntar aos autos demonstrativo discriminado de
eventuais chamadas telefônicas realizadas ou recebidas pela requerente.Por outro giro, o documento carreado às fls. 18/19,
trazido pela própria autora, aponta a realização de uma chamada telefônica no dia 04/01/2016, e duas ligações no dia 11/01/2016,
com duração de segundos (42s, 30s e 42s, respectivamente).Entretanto, a autora assevera que tal não passou de meras
tentativas de realizar ligações, ou seja, ela não conseguiu, de fato, “completar” referidas chamadas telefônicas.Com efeito, o
conjunto probatório carreado aos autos, notadamente as informações prestadas pela requerida à Agência Nacional de
Telecomunicações, bem se coaduna com as assertivas da parte autora, demonstrando a existência de falhas no procedimento
de portabilidade do terminal telefônico da requerente.Assim não fosse, observe-se o teor das informações prestadas pela
requerida à Anatel, no dia 13/01/2016, ou seja, dois dias após a última tentativa da autora de utilizar a linha telefônica: “...após
análise sistêmica evidenciamos que a portabilidade ocorreu uma falha pontual no cadastro na base Vivo...” (fls. 28). Não
bastasse, e para corroborar tal entendimento, no dia 19/01/2016, mais uma vez, a requerida reconheceu a existência de
problemas concernentes à portabilidade da linha telefônica, esclarecendo à Anatel “...após análise sistêmica evidenciamos que
a portabilidade ocorreu uma falha pontual no cadastro na base Vivo...” (fls. 25). Em face desses elementos, fácil é denotar que
a requerida além de reconhecer expressamente a existência de falhas no procedimento de portabilidade numérica, sequer
adotou providências a fim de sanar tais irregularidades, o que somente ocorreu após determinação judicial (fls. 31/33).Nessas
circunstâncias, ausente motivo legítimo a justificar as irregularidades na prestação dos serviços, tenho que merece ser acolhido
o pedido inicial para que a ré seja compelida a ativar a linha telefônica da autora, conforme, aliás, restou assentado na decisão
de fls. 31/33, que antecipou os efeitos da tutela.Aferem-se danos morais e o quantum indenizável.Danos morais são aqueles
que atingem ou vulneram os direitos de personalidade; caracterizados pela privação ou diminuição de valores precípuos na vida
das pessoas, como paz, tranquilidade de espírito, liberdade individual, integridade física e honra, entre outros.O dano puramente
moral ressarcível é o que se tem na dor anímica, desde que assuma caráter razoável, numa equação entre a suscetibilidade
individual da vítima (que não se admite excessiva, para não se transformar a figura em motivo de satisfação pessoal e
enriquecimento injusto) e a potencialidade lesiva do ato do agressor (que deve ser capaz de causar incômodo relevante ao
ofendido).Pois bem. No caso concreto, fácil é vislumbrar que a conduta da ré, consistente na prestação defeituosa do serviço
relacionado à portabilidade numérica da linha telefônica, extrapolou os meros transtornos inerentes à vida moderna. Isso porque,
conforme se extrai dos documentos coligidos com a inicial, a parte autora buscou, por várias oportunidades, inclusive formulando
reclamações junto ao Procon, Anatel e Cejusc, visando compelir a requerida a regularizar o funcionamento do terminal telefônico,
permitindo a realização e recebimento de chamadas, porém não logrou êxito, tendo de se socorrer da intervenção do Poder
Judiciário para reativação dos serviços telefônicos.Dessa forma, não resta dúvida que tal situação repercute na esfera dos
direitos de personalidade da requerente, à medida que ela se sente desconsiderada, com abalo no seu estado emocional diante
de tamanho desgaste. Além disso, o serviço de telefonia, atualmente, mostra-se como essencial à vida das pessoas, quer ao
lazer, trabalho, estudos, contato social etc. Assim, tolhida de usufruir do bem, com certeza, como se abstrai das regras ordinárias
de experiência, a consumidora sentiu-se desprestigiada e deixada a mercê de sua própria sorte, ao se conjugar pelo calvário
que suportou em busca da efetivação de seu direito.Tratando-se de sentimento, não há como exigir sua prova. As regras da
experiência comum o tornam notório, dispensando-se a prova (art. 334, I, do Código de Processo Civil), pois o contrário instigaria
prova forjada, que deve ser evitada. Esse sofrimento representa dano moral indenizável. Nesse sentido, ensina Sérgio Cavalieri
Filho:”Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de
depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos
meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de
fatores instrumentais” (Programa de responsabilidade civil, 2ª ed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 79/80).Ante tais considerações,
conclui-se que a dor moral da parte autora encontra-se suficientemente comprovada nos autos. Em casos análogos o Egrégio
Superior Tribunal de Justiça vem decidindo reiteradamente o seguinte: “Não há que se falar em prova do dano moral, mas, sim,
na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam” (RESP nº 86.271/SP, 3ª T., relator Min
CARLOS ALBERTO MENEZES, julg. 09/12/97).Caracterizada a responsabilidade da requerida pelo dano moral, passo a fixar o
valor da indenização, que deve ser a importância satisfatória para que a vítima retome ao estado de normalidade do qual foi
retirada com o dano, aliviando a dor suportada. Tem, portanto, caráter reparatório, baseado na proporcionalidade e na
razoabilidade, visando amenizar o sofrimento, sem que represente um enriquecimento da lesada em detrimento das rés.
Recomenda a prudência que o Juiz considere o padrão econômico da vítima, objetivando não permitir que seja o evento causa
de enriquecimento do ofendido (RSTJ 112/216), além de outros aspectos de igual importância, como a necessidade de justa
compensação do lesado (JTJ-Lex 236/167) e a capacidade econômica do ofensor (RSTJ 121/409). O que importa, em última
análise, é a observância da dúplice finalidade da sanção pecuniária por ofensa moral, ou seja, que a indenização ao mesmo
tempo compense a vítima pelos efeitos do ato danoso e constitua adequada resposta da ordem jurídica ao autor da ofensa (RT
742/320 e Bol. AASP 2.089/174).Tendo em vista os elementos e considerações acima discriminados, estipulo a indenização
devida em R$3.500,00 (três mil e quinhentos reais), equivalente a 4 vezes, aproximadamente, o valor do salário mínimo nacional,
que desde logo retiro qualquer indexação futura.Como ressalvado, o Magistrado, para a avaliação do dano moral, deve ser, a
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º