TJSP 21/06/2017 - Pág. 2511 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quarta-feira, 21 de junho de 2017
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano X - Edição 2371
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imóvel da Sra. ANA necessitava de reforma e, enquanto estas ocorriam, ela ficou em uma casa que antigamente era uma casa
de repouso e ainda era utilizada por uma das cuidadoras para receber idosos. Que sempre visitava a Sra. ANA. e que era
chamada por ela de Pepita, apelido muito utilizado na Espanha. Quanto ao imóvel doado, informa que estava ciente de que o
imóvel havia sido lacrado, mas não sabe afirmar se o foi por Oficial de Justiça, pois a pessoa que o fez não se identificou. Que
recebeu autorização de seu advogado para quebrar os cadeados do imóvel e nele ingressar. Que os materiais de construção
utilizados na reforma do imóvel foram adquiridos com dinheiro da Sra. ANA, pois a reforma era para proveito desta. A testemunha
da autora, CAROLINA, que trabalha no escritório do patrono da autora, relatou que acompanhou o advogado na diligência
realizada para localizar a Sra. ANA, pois ficaram sabendo que ela não estava na casa dela e estaria em um asilo. Após contato
com a Polícia obtiveram o endereço e foram até o local que era uma casa bem simples com vários idosos e, ao pedirem à
pessoa responsável, conseguiram ver a Sra. ANA. Que ela tinha muita dificuldade de se comunicar. Ao tentarem levar a Sra.
ANA embora a responsável informou que não poderia autorizar a retirada da idosa, pois isso dependeria da autorização de outra
pessoa. Quando a responsável pelo local percebeu que estavam ligando para a Polícia, liberou a Sra. ANA. Que a Sra. ANA
estava com frio e fome. Não soube dizer a quanto tempo a sobrinha não via a tia. Que não ficou claro se a Sra. ANA chamava
pela sobrinha ou pela requerida, já que ambas têm o mesmo apelido (PEPITA). Que não se lembra da Sra. ANA ter afirmado que
havia vendido sua casa à sua sobrinha. Que a Sra. ANA não sabia responder o que estava fazendo naquele local. Às perguntas
do advogado da requerida afirmou que trabalha no escritório do patrono da autora. Que não sabe dizer quantas vezes a sobrinha
veio a Mongaguá visitar a tia. Que quando foi levada para São Paulo a Sra. ANA ficou na casa da sobrinha. Que a casa da
sobrinha era uma casa de padrão simples, mediano. Quando questionada, não soube informar se no local havia um dormitório
para a Sra. ANA. A testemunha da requerida, MARIA, afirma que cuidava da Sra. ANA e mais duas senhoras no local que era
uma antiga casa de repouso. Que quem deixou a Sra. ANA sob seus cuidados foi a requerida, JOSEFA CERDA. Que a requerida
cuidava da Sra. ANA pois esta era sozinha. Que ela pagava R$ 300,00 (trezentos reais) pelos cuidados com Sra. ANA. Que o
rapaz do consulado levava cesta básica e pagava a mensalidade de seus cuidados. Que a Sra. ANA era lúcida e não gostava de
falar da família. Depois de uns 2 meses que Sra. ANA estava sob os seus cuidados sua sobrinha, JOSEFA GREGORI, apareceu.
Que Sra. ANA gostava de seus cuidados e que ela caminhava com a Sra. ANA. Qua a Sra. ANA era lúcida e não tomava
medicamentos. Que ela somente falou da sobrinha quando a sobrinha apareceu lá. Que nunca recebeu ligações da sobrinha
desde quando estava sob seus cuidados. Que a Sra. ANA decidiu ir embora com a sobrinha para que não houvesse mais
confusão. Que além da Sra. ANA haviam apenas outras 2 idosas sob seus cuidados, nenhum homem. Que a Sra. ANA não
aparentava sintomas de Alzheimer. A testemunha da requerida, BENEDITO, informou conhecer a Sra. ANA do bairro em que
moravam. Que os vizinhos comentavam que a casa dela precisava de uma reforma. Que nunca viu familiares da Sra. ANA a
visitando. Que todos sabiam que era a requerida quem cuidava da Sra. ANA. Que ela não aparentava sintomas de demência,
pois sempre caminhava pelo bairro. Que a Sra. ANA era bem cuidada e nunca viu sua sobrinha pelo bairro. Que não sabia que
a Sra. ANA tinha família. Presenciou quando a autora e seu patrono estavam tentando ingressar no imóvel da requerida para
pegar os documentos da Sra. ANA. Que tem conhecimento que a requerida atualmente reside na casa que era da Sra. ANA e
que teve conhecimento de que ela passou a morar naquele local pois a Sra. ANA teria lhe deixado aquele imóvel. A testemunha
da requerida, SR. MANOEL, representando a SRA. ROSÁLIA DE CASTRO, informou que a requerida lhe contou que a Sra. ANA
havia lhe transmitido o imóvel. Declarou que mensalmente visitava a Sra. ANA e lhe levava uma cesta básica e certa quantia em
dinheiro. Que pelo que conversavam nas visitas ela não aparentava nenhuma anormalidade em sua lucidez. Que a última vez
que a visitou ela estava na casa de uma senhora, semelhante a um asilo. Que a requerida foi quem lhe informou o endereço de
onde estava a Sra. ANA e, assim, ele pôde ir visitá-la. Que depois que a visitou nesta casa não teve mais informações da Sra.
ANA. Que quando a visitou nesta casa (asilo) ela manifestou estar contente pois tinha mais duas ou três pessoas de sua idade
com quem conversar. Que naquela ocasião ela estava lúcida e, inclusive, eles conversaram em espanhol, já que ambos são
espanhóis. Que lhe comunicaram pelo Governo Espanhol o óbito da Sra. ANA passado mais de ano. Que todo o tempo que
conversaram, e por todas as vezes, ela aparentava plena lucidez, conversando normalmente. A testemunha da requerida,
ADEMIR, é escriturário do cartório de Mongaguá e foi quem lavrou a escritura de doação da Sra. ANA para a requerida. Afirmou
que o procedimento para lavratura da escritura é minucioso e que a Sra. ANA estava lúcida no momento da elaboração daquele
documento. Que não se recorda que naquela ocasião tenha a Sra. ANA mencionado a respeito da existência de sua sobrinha.
Pois bem. Inicialmente, quanto ao primeiro laudo médico juntado às fls. 68/69, por se tratar de laudo produzido após a lavratura
da escritura pública, não tem ele o condão de servir de prova da incapacidade da autora ao tempo da declaração de vontade.
Quanto ao segundo laudo (fls. 70/73), por estimar que o início da doença se deu em período que antecede a lavratura da
escritura, teria ele, em tese, o condão de resvalar naquele ato jurídico, pois serviria de elemento apto a corroborar com a
incapacidade da autora ao tempo da declaração de vontade. No entanto, compulsando detalhadamente aquele laudo, observo
que no item “III”, na parte de antecedentes familiares e pessoais, foram colhidas da sobrinha da autora, JOSEFA GREGORI,
informações gerais a respeito do estado de saúde da pericianda e por aquela fora prestada a seguinte informação: “Segundo
dados objetivos de anamnese fornecidos por sua sobrinha, há dois anos, de modo insidioso e progressivo, a pericianda passou
a apresentar desordens psíquicas e comportamentais, inicialmente com “esquecimentos”, confusão mental, falsos
reconhecimentos, desorientação têmporo-espacial, atos desarrazoados de toda espécie, deixando panelas no fogo, portas e
torneiras abertas, etc. (...)” (fl. 71) (grifei). Posteriormente, em relação ao quesito das partes, assim esclareceu: “1- A paciente
apresenta anomalia ou anormalidade psíquica? Resp.: Sim. 2- Em caso afirmativo, qual a natureza da moléstia? É de caráter
permanente ou transitório?Resp.: Psicose Orgânica. Permanente 3- Se positivo, o primeiro quesito, esse mal é congênito ou
adquirido? Resp.: Adquirido 4- Se adquirido o mal, qual a data ou a época, ainda que aproximada, de sua eclosão? Resp.: Há
dois anos, aproximadamente, segundo dados objetivos de anamnese.” (fl. 72 grifei). Evidentemente, se o laudo foi elaborado em
junho de 2012, as informações prestadas pela sobrinha se referiam aos últimos dois anos, ou seja, a partir de junho de 2010.
Ocorre, porém, que até janeiro do ano de 2012 (fls. 64/65), quando a sobrinha da autora, JOSEFA GREGORI, compareceu nesta
cidade para visitá-la, ela tinha raro contato com a tia, como demonstraram todas as testemunhas ouvidas em Juízo. O pouco
contato que tinha evidentemente não lhe permitiria saber se a tia deixava panelas no fogo, portas e torneiras abertas, pois não
convivia com ela. O convívio diário com a tia iniciou-se apenas em janeiro de 2012, quando a levou desta Comarca para morar
consigo em São Paulo. Portanto, tais informações somente poderiam se referir aos últimos 6 (seis) meses, e não aos últimos 2
(dois) anos. Ademais, a única testemunha da autora, JOSEFA GREGORI, que poderia corroborar com a conclusão de que esta
tinha contato com a Sra. ANA a ponto de ter conhecimento de seu estado de saúde dos últimos dois anos relata que somente
teve contato com a sobrinha por ocasião da diligência de busca da Sra. ANA, e que não sabia dizer se a sobrinha visitava a tia
com frequência. No mais, todas as outras testemunhas ouvidas em Juízo, que eram moradores do bairro, foram uníssonos em
informar que a sobrinha nunca ia visitar a tia e que sequer sabiam que a Sra. ANA tinha familiares. Portanto, bem demonstrado
ficou que não tinha como a sobrinha declarar ao médico perito que a tia há dois anos (a contar de junho de 2012) apresentava
sinais de senilidade, com esquecimento frequente, inclusive “deixando panelas no fogo, portas e torneiras abertas, etc”, pois
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