TRF3 22/02/2019 - Pág. 1033 - Publicações Judiciais I - Interior SP e MS - Tribunal Regional Federal 3ª Região
“DIREITO SANCIONADOR. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA POR VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS
BASILARES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ART. 11 DA LIA). APLICAÇÃO A MENOR DA RECEITA DO FUNDEF NA REMUNERAÇÃO DE MAGISTÉRIO PELO ENTÃO PREFEITO DO
MUNICÍPIO DE BELO JARDIM/PE. O TRIBUNAL DE ORIGEM MANTEVE A SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA POR ENTENDER QUE A CONDUTA DO EX-PREFEITO FOI DESPROVIDA
DO ELEMENTO SUBJETIVO NECESSÁRIO À CONFIGURAÇÃO DO ATO ÍMPROBO. PRETENSÃO DO ÓRGÃO ACUSADOR DE REFORMA DO ARESTO. NÃO COMPROVADO O
ELEMENTO SUBJETIVO DOLOSO E MALÉVOLO NEM A CULPA GRAVE NÃO HÁ QUE SE FALAR EM ATO DE IMPROBIDADE. AGRAVO INTERNO DO MP/PE A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. 1. In casu, o Tribunal de origem confirmou a sentença de improcedência da pretensão ministerial, e assim o fez por entender que o acusado, na qualidade de então Prefeito do Município de Belo
Jardim/PE, não aplicou o percentual mínimo dos recursos do FUNDEF na remuneração do magistério, mas não empreendeu o ato com má-fé, de modo que as práticas não podem ser rotuladas como improbidade
administrativa. De fato, há registro no acórdão de que não existe na auditoria do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco qualquer menção a desvio de recursos do FUNDEF para atendimento de interesse próprio
ou alheio, motivo pelo qual não há assento fático para que se conforme a improbidade administrativa na espécie, inexistindo, portanto, violação do art. 11 da LIA pelo acórdão recorrido. 2. Não se constata
a identificação clara, precisa e determinante de que aos atos do então Agente Político estivessem associadas à má-fé de menosprezar os princípios administrativos, conforme assentou o Tribunal de
origem, que declarou a inexistência de dolo voltado à prática de ato ímprobo a partir da moldura fático-probatória que se represou nos autos - gize-se, impermeável a modificações em sede de recorribilidade
extraordinária. 3. Dissociado o elemento subjetivo doloso e malévolo, qual seja, o propósito desonesto, nem mesmo a culpa grave, à conduta do ora recorrido, não há que se falar em cometimento de ato de
improbidade administrativa. 4. Agravo Interno do MP/PE a que se nega provimento.” (AgInt no AREsp 1168115/PE AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
2017/0230679-2, 1ª T., Rel. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 02/10/2018)
Essa também a lição de MARINO PAZZAGLINI FILHO, cujo texto trazido na defesa dos corréus Marco Boteon Neto e Ana Maria Preto merece ser transcrito nesta decisão por sua pertinência com os fatos trazidos na
petição inicial:
“Ilegalidade não é sinônimo de improbidade e a prática de ato funcional ilegal, por si só, não configura ato de improbidade administrativa. Para tipificá-lo como tal, é necessário que ele tenha origem em
comportamento desonesto, denotativo de má-fé, de falta de probidade do agente público. Com efeito, as três categorias de improbidade administrativa têm a mesma natureza intrínseca, que fica nítida com o
exame do étimo remoto da palavra improbidade. O vocábulo latino improbitate, como já salientado, tem o significado de 'desonestidade' e a expressão improbus quer dizer 'administrador desonesto ou de máfé'. E essa desonestidade, no trato da coisa pública, nos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública, pressupõe a consciência da licitude da ação ou omissão
praticada pelo administrador e sua prática ou abstenção, mesmo assim, por má-fé (dolo)” (Lei de Improbidade Administrativa Comentada. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2006)
De fato, não diviso nenhum elemento concreto que enseje o reconhecimento do elemento subjetivo – culpa ou dolo – nas condutas imputadas aos réus na gestão da saúde quando eram prefeita, secretários de saúde e
diretores do Departamento do Tesouro de Peruíbe.
Não há quaisquer indícios nos autos que sugerissem o enriquecimento ilícito por parte dos requeridos (como se observa especialmente no tópico “Recursos Financeiros” de Relatório do DENASUS, documento id 6819642,
páginas 14/24). Assim, verifico ser desproporcional o pedido formulado, um dos mais graves no âmbito não penal.
Seu acolhimento implicaria em equiparar aquele que se enriqueceu indevidamente (incidindo no artigo 9º da Lei nº 8.429/92) com aquele que foi pouco competente ou desrespeitou os princípios da administração pública
(incidindo nos artigos 10 e 11 do mesmo diploma legal). Não são, porém, situações equiparáveis e a lei não as equiparou, já que previu penas mais duras para aqueles agentes que incidissem no artigo 9º.
Conforme destacado na decisão de 04/05/2018, no que se refere ao montante a ser restituído ao erário, apontado no Relatório Complementar 03 (R$ 26.866,05), o qual foi sendo reduzido à medida em que foram
comprovadas documentalmente as despesas, verifico que já foi recolhido aos cofres públicos devidamente atualizado. Tal recolhimento foi feito no final de 2017, após a conclusão do relatório supracitado (o que ocorreu em
outubro de 2017, documentos id 6822231 e 10211259).
Verifico que os documentos anexados aos autos indicam que a má gestão da saúde no Município de Peruíbe é muito anterior ao ano de 2014, o que afasta o reconhecimento da responsabilidade exclusiva dos requeridos
pelos fatos narrados, a ensejar medida tão drástica como a condenação por improbidade administrativa.
Anote-se, por exemplo, que o Inquérito Civil Público que instrui a inicial iniciou-se em 2013 a partir de denúncias relacionadas ao mau uso dos recursos na área da saúde, as quais remontam a reclamações formais ao
Ministério Público Estadual em 2011 (documentos id 6819636, página 8, e 6819638, página 36).
Em que pesem as irregularidades apontadas pelo MPF em sua petição inicial – as quais foram apuradas pelo DENASUS na Auditoria nº 15134 e se encontram esmiuçadas no Relatório Complementar nº 03, anexado aos
autos - verifico que inúmeras outras foram apuradas na mesma auditoria e foram devidamente resolvidas pelos requeridos. Há várias constatações cujas justificativas foram acolhidas pelo DENASUS, que considerou
suficientes as providências dos requeridos (como, por exemplo, documentos id 6819638, página 37, 6819642, páginas 4 e 5, e 6819644, página 60, 6819646, páginas 7, 8, 15, 32 e 33, atualizados posteriormente no
Relatório Complementar nº 03, id 10207503 e 10211251).
Em outras palavras, apura-se que os requeridos, ao serem auditados, não permaneceram inertes, pois efetivamente tomaram providências para solucionar parcela considerável dos problemas apontados.
Muitas outras questões, por outro lado, remontavam a problemas ocorridos fora dos períodos de exercício dos cargos públicos ocupados pelos réus, indicados no relatório desta decisão. As vistorias realizadas em 2015,
por exemplo, não têm o condão de atribuir imediata responsabilidade aos réus Rubens e Dorival, que exerceram cargos na Prefeitura de Peruíbe até 2014 (v.g., documento id 6819638, páginas 44/46), salvo, é claro, se as
constatações fizerem específica referência aos períodos das respectivas gestões.
Não pode o Poder Judiciário, nem tampouco o Douto órgão do Ministério Público Federal, ignorar as dificuldades que os membros do Poder Executivo encontram ao tentar solucionar os incontáveis problemas referentes à
saúde pública – que, por sinal, são somente uma pequena parte de todos os problemas a serem solucionados (habitação, educação, assistência social entre outros). Tais questões não são solucionáveis em um ano, nem em
dois, nem tampouco em quatro (duração do mandato dos Prefeitos, Governadores e Presidente da República).
Nesse aspecto, convém destacar que na constatação nº 367130 do DENASUS (documento id 6819642, página 4) o Secretário entrevistado esclareceu que, diante de tantas dificuldades, optou-se por empregar recursos
nas reformas necessárias nas Unidades de Saúde a corrigir problemas de infraestrutura e acessibilidade do edifício da própria Secretaria Municipal de Saúde. Um retrato relevante da insuficiência dos recursos financeiros
frente à demanda de serviços de saúde em Peruíbe é trazido ainda na defesa prévia do réu Marco Boteon Neto (itens 3.22 e 3.23).
É bem verdade que não pode o Judiciário aceitar a inércia e o descaso total dos responsáveis, que têm a obrigação de iniciar as transformações e se empenhar na busca de soluções. Mas este, ao que consta, não é o
caso dos autos.
Insta salientar que não há descrição individualizada de conduta dos réus que indicasse má fé ou malbaratamento dos recursos, ou meros indícios de inércia em face das ações que efetivamente pudessem ser atribuídas a
um prefeito, ao secretário de saúde e aos diretores do tesouro municipal. Isso porque a improbidade requer, a um só tempo, a demonstração da gravidade da conduta e o elemento subjetivo da culpa (dolo ou culpa lato
sensu).
Assim, de rigor a rejeição da petição inicial.
Isto posto, com fulcro no § 8º do artigo 17 da Lei nº 8429/92, rejeito a petição inicial.
Tendo em vista o disposto no artigo 18 da Lei nº 7.347/85, deixo de condenar a parte autora no pagamento de custas e de honorários advocatícios.
P. R. I., inclusive o Município de Peruíbe e o MPF.
SãO VICENTE, 14 de fevereiro de 2019.
AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (64) Nº 5001166-37.2018.4.03.6141 / 1ª Vara Federal de São Vicente
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU: ANA MARIA PRETO, RUBENS RODRIGUES GOMES JUNIOR, MARCO BOTTEON NETO, DORIVAL VENANCIO, EDISON LEME
Advogado do(a) RÉU: ALEXANDRE LUIS MENDONCA ROLLO - SP128014
Advogado do(a) RÉU: ALBERTINO DE ALMEIDA BAPTISTA - SP17368
Advogado do(a) RÉU: MARION SANCHES LINO BOTTEON - SP169610
Advogado do(a) RÉU: HELIO MARCOS PEREIRA JUNIOR - SP240132
SENTENÇA
Vistos.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 22/02/2019
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