TRF3 15/10/2019 - Pág. 1349 - Publicações Judiciais I - Interior SP e MS - Tribunal Regional Federal 3ª Região
78. Outrossim, ressalte-se que vem descrita na inicial acusatória, como crime conexo descoberto no bojo da mesma operação Lama Asfáltica e praticado, em tese, no âmbito da mesma organização criminosa que vem
denunciada no presente feito, a prática de fraudes nas obras de implantação e pavimentação da rodovia federal BR-359, também a atrair a competência federal, por tratar-se de um bem da União (art. 20, II c/c art. 109, IV da
CRFB).
79. Portanto, é nítida a competência da Justiça Federal para processamento e julgamento deste feito, o que impõe o afastamento da preliminar suscitada.
III – Cerceamento de defesa e ausência de documentos essenciais para apresentação de resposta à acusação
80. A presente Ação Penal é derivada das investigações realizadas no âmbito da denominada “Operação Lama Asfáltica”.
81. Os requerimentos de documentação adicional em questão dizem respeito a cópias integrais de Inquéritos Policiais ainda em andamento – mesmo em relação a procedimentos investigatórios realizados após o
oferecimento da denúncia –, bem como cópia integral de todo processo ou procedimento administrativo mencionado, ainda que lateralmente ou en passant, na denúncia.
82. Alegações sobre falta de documentos tornaram-se razoável e identificável “padrão” dentro das Ações Penais da “Lama Asfáltica”, sendo que paralisaram o andamento dos processos mesmo em fase embrionária, com
denúncias já recebidas, mas sem que as respostas à acusação fossem ofertadas ou apreciadas. As partes manifestavam-se dizendo que não havia condições de apresentar a defesa pertinente.
83. Porém, se não houvesse uma imputação razoavelmente segura na denúncia, a conter somenos os documentos essenciais, o resultado processual haveria de ser a rejeição da peça de acusação por inépcia ou ausência de justa
causa, o que não tem sido o caso. Há uma circundelimitação documental à qual está cingido o órgão de acusação quando da denúncia: os documentos essenciais à formulação da versão acusatória (art. 648, I do CPP) devem vir
ao processo porque são eles que permitirão à defesa conhecer, ao lado da construção da denúncia sobre os pilares do art. 41 do CPP, a ratio essendi dos motivos de acusar.
84. No geral, as d. defesas têm formulado alegações bastante genéricas sobre a ventilada falta de documentos, ou indicado de forma genérica a documentação que entendem necessária para o exercício pleno da defesa.
85. Acerca da documentação pleiteada pelos acusados, tem-se que:
85.1. Quanto ao IPL 398/2012, as d. defesas já obtiveram cópia digitalizada, além de vista física dos autos enquanto armazenados provisoriamente no cartório desta 3ª Vara Federal, conforme constou na decisão que
restabeleceu a fluência do prazo processual, no bojo do habeas corpus 5008668-20.2018.4.03.0000 (fl. 1984):
“Na sua última manifestação nos autos, os impetrantes admitem que, em cumprimento da medida liminar concedida neste habeas, tiveram vistas, em meio físico, do IPL 398/12, bem como
das caixas que contêm documentos e outros anexos. Alegam, contudo, que algumas mídias, isto é, CD's, não se encontram encartadas nas respectivas páginas do inquérito; notadamente,
alegam que não localizaram determinado CD que teria embasado laudo pericial. No entanto, deixam de demonstrar exatamente como a ausência da mídia em questão impede a
compreensão e eventual refutação do áudio. A ampla defesa e o contraditório já restaram atendidos de forma suficiente pela liminar concedida, devendo outras alegações, inclusive a
inexistência nos autos da referida mídia, serem eventualmente levantadas no curso do processo, como preliminares ou matéria de mérito.”
85.1.1 Verifica-se também aqui nos presentes autos, nas manifestações posteriores ao acesso aos autos do IPL 398/2012, que as defesas requerentes não lograram esclarecer em que medida as mídias que aduzem não constar
dos autos do IPL 398/2012 correlacionam-se com as imputações descritas na presente denúncia, ou mesmo em que medida são necessárias para que, na fase de resposta à acusação, seja avaliada a estrita legalidade (da
instauração e realização) do procedimento de quebra de sigilo telefônico 00011841-24.2014.403.6000, já encerrado há mais de quatro anos.
85.2. Contrato de repasse nº. 0226003-02 (SIAFI 597683) e Processo COMAER nº. 67261.004220/2008-78 – juntados pelo Ministério Público Federal à fl. 1320.
85.3. Ausência de Boletins de Medição do processo 19/100.028/2013 – 11ª a 15ª medição: os citados boletins de medição estão disponíveis no bojo do citado processo de licitação, que acompanha a documentação juntada
pela Autoridade Policial no 3º Volume do Inquérito Policial 516/2016, fl. 721, DVD 03, no caminho “DVD3 –> MS430 – Parte 1 –> Processos Lic MS-430 –> Processo 028-2013 Agesul MS-430”, arquivo “Vol
VI.pdf”, págs. 39/112 (11ª medição), 113/177 (12ª medição), 358/427 (13ª medição), 474/597 (14ª medição), 692/830 (15ª medição/final).
85.4. Ausência de Boletins de Medição do processo 19/100.029/2013 – 11ª a 19ª medição: os citados boletins de medição estão disponíveis no bojo do citado processo de licitação, que acompanha a documentação juntada
pela Autoridade Policial no 3º Volume do Inquérito Policial 516/2016, fl. 721, DVD 03, no caminho “DVD3 –> MS430 – Parte 1 –> Processos Lic MS-430 –> Processo 029-2013 Agesul MS-430”, arquivo “Vol V.pdf”,
págs. 37/134 (11ª medição), 135/231(12ª medição), 290/391 (13ª medição), 441/568 (14ª medição), 601/798 (15ª medição), 799/1002 (16ª medição), 1003/1220 (17ª medição), 1356/1599 (18ª medição), e 1600/1839
(19ª medição/final).
85.5. Ausência de Boletins de Medição do processo 19/100.030/2013 – 11ª a 19ª medição: os citados boletins de medição estão disponíveis no bojo do citado processo de licitação, que acompanha a documentação juntada
pela Autoridade Policial no 3º Volume do Inquérito Policial 516/2016, fl. 721, DVD 03, no caminho “DVD3” – “MS430 –> Parte 1 – Processos Lic MS-430 –> Processo 030-2013 Agesul MS-430”, arquivo “Vol V.pdf”,
págs. 541/684 (11ª medição), 685/828 (12ª medição), e arquivo “Vol VI.pdf”, págs. 262/445 (13ª medição), 485/654 (14ª medição), 750/9949 (15ª medição/final).
85.5.1. Observo também que tal documentação foi juntada, em melhor resolução e formato pesquisável, também pelo corréu EDMIR FONSECA RODRIGUES, em 02/03/2018 (fls. 955/959), após requerer a
documentação diretamente à Diretoria da AGESUL, sendo atendido pelo órgão estadual dois dias após o requerimento.
85.6. Ofício 6063/GAB/SEOP/2014 – o citado documento pode ser localizado no arquivo “Proinveste VI.pdf”, no DVD 7, de fl. 723, vol. 3 do Inquérito Policial 516/2016, no caminho “DVD7 - BNDES Parte 1 –> Of
4883-15 Agesul copias BNDES –> CD Anexo ao Of 4883-15 –> BNDES Proinveste Digital”, na pág. 117.
85.7. Acerca dos pedidos formulados por EDSON GIROTO, pleiteando a juntada de cópias integrais dos inquéritos 3867, 3868 e as cautelares 3648 e 3649, todos do STF, bem como do inquérito 1017 do STJ, tudo está
disponível na Secretaria do Juízo desde a baixa com o reconhecimento da incompetência pelo STF pelo fracionamento – ao que tudo indica, aliás, desde 25/03/2015, cfr. certidão de fl. 41 dos autos 00052550520134036000,
apensado à Quebra de Sigilo Telefônico 00011804124201440360000, estando plenamente acessíveis a todas as defesas.
85.8. Sobre o pedido de juntada do processo administrativo relativo ao Contrato OV Nº. 090/2012, celebrado entre a AGESUL e a empresa CONSEGV, realizado pela defesa de EDSON GIROTO, o documento
requestado acompanha a documentação juntada pela Autoridade Policial no 3º Volume do Inquérito Policial 516/2016, fl. 721, DVD 04, no arquivo “MS 430 – VOLUME 01 – RELATÓRIO DO PROJETO Rev01.pdf”
no caminho “DVD4” –> “MS430 – Parte 2 –> ‘DVDs anexos ao Of 1796-2015 CGU –> Processo 19 100029 13 –> Volume 1 –> Processo 19 100029 13 - > Volume 1 -> Processo 19 100029 13 Vol 1 PAG 05
CD (PROJETOS)”.
86. Em síntese, a respeito desta documentação, vê-se que as defesas dos acusados não atuaram com diligência suficiente, dado que todos documentos em questão foram facilmente localizados, de acordo com os apontamentos
constantes da exordial acusatória e nos anexos correspondentes às respectivas obras investigadas, estando disponíveis para consulta nos autos desde antes do oferecimento da denúncia, e, ainda que assim não fosse,
como comprovou a atuação da I. defesa do corréu EDMIR, são documentos de fácil obtenção mediante mera requisição ao órgão administrativo respectivo, sendo que, por força de disposição legal explícita dos artigos 231 e
396-A do Código de Processo Penal, os réus poderão apresentar quaisquer documentos que entendam necessários; a atividade do Juízo na juntada de documentação há de ser, sempre, necessariamente supletiva, em caso de
negativa na obtenção documental.
87. As defesas apresentam, ainda, outros requerimentos de documentação:
87.1. Sobre o pedido de juntada aos autos de cópia integral do processo administrativo relativo ao contrato nº. 042/2011 celebrado entre a Agesul e a empresa Opção Engenharia Ltda., vê-se que se trata de documento que não
foi consultado ou utilizado pela acusação durante a elaboração da denúncia, e tampouco pelos experts da CGU responsáveis pela elaboração do Relatório de Fiscalização 201408138, que escora a tese acusatória – vê-se que,
tanto na exordial (págs. 46/47) quanto na pág. 35 do citado relatório (fl. 721 do volume 3 do IPL 516/2016, DVD 3, no caminho “DVD3-Av Ludio Coelho”, documento “2015 02 11 Relat CGU 201408138.pdf”), é
especificado que a informação quanto à celebração e valor do dito contrato decorre de consulta ao Diário Oficial do Estado de Mato Grosso do Sul – DOEMS de 04/05/2011. Assim, vê-se que é documento mencionado
bastante lateralmente na denúncia, não essencial para o exercício da defesa somenos nesta fase. Dito isso, não destoa da razoabilidade, somando ao debate processual instrutório, que tal documento seja requisitado ao órgão
estadual, de forma que, neste ponto, o pedido defensivo comporta deferimento.
87.2. Ofícios-resposta das operadoras de telefonia e pedido de obtenção de dados cadastrais das linhas telefônicas interceptadas: a respeito da vindicada necessidade de juntada da integralidade dos ofícios-resposta das
operadoras de telefonia, ou, ainda, de que estes venham a espelhar em detalhes a ordem judicial recebida, comunicando expressamente o período de duração das interceptações, não se vislumbra nos requerimentos a arguição da
necessidade ou utilidade da medida, senão como necessária à “verificação da legalidade da prova” genérica e abstratamente formulada (fls. 1240).
87.2.1. É natural que determinados fatos referentes à investigação criminal ou a instrução processual penal tenham sido conhecidos a partir de medidas invasivas a direitos individuais fundamentais, o que significa dizer que as
próprias decisões e os elementos de prova que lhe são ínsitos, na medida em que coletados e documentados (Súmula Vinculante nº 14 do STF), devem estar plenamente acessíveis não só à acusação, mas também à defesa, para
fins de ciência plena e, ainda, de impugnação em contraditório.
87.2.2. O caso das interceptações telefônicas e telemáticas é exemplo concreto: dado que mitigam centralmente o direito fundamental à intimidade e à privacidade, as investigações que dependam de tais medidas precisam
respeitar o due process of law procedimental e substantivo (art. 5º, XII da CRFB/88). Uma das limitações está na estrita necessidade da medida invasiva (arts. 4º e 2º, II da Lei nº 9.296/96), não sendo admissível, ainda, se não
houver indícios razoáveis de autoria e de participação em infração penal punível com a pena de reclusão (art. 2º, I e III da Lei nº 9.296/96).
87.2.3. Uma vez documentada a prova coletada, é natural que as defesas busquem ter acesso a tudo aquilo que se produziu contra elas. Tudo que coletado de áudio deve ser, pois, disponibilizado, ainda que o seja em mídia
digital (art. 7º, XIV da Lei nº 8.906/94, na redação dada pela Lei nº 13.245/2016). Assim, “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende ser desnecessária a degravação da audiência realizada por meio
audiovisual, sendo obrigatória apenas a disponibilização da cópia do que registrado nesse ato" (Rcl 23101, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgamento em 22.11.2016, DJe de 6.12.2016)”.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 15/10/2019 1349/1370