Justiça condena à prisão ex-prefeito de Morro Agudo por desvios durante mandato

Esquema chefiado por Gilberto Barbeti desviou R$ 1 milhão da administração pública, segundo MP. Fraudes em licitações foram reveladas em abril de 2018 pela Operação Eminência Parda.

A Justiça de Morro Agudo (SP) condenou à prisão o ex-prefeito Gilberto Barbeti, acusado de chefiar uma organização criminosa que desviou R$ 1 milhão da prefeitura durante a gestão dele, entre 2016 e 2019.

O esquema foi revelado em abril de 2018 na operação Eminência Parda, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de Franca (SP). Barbeti teve o mandato cassado pela Câmara dos Vereadores em junho de 2019.

Na decisão, o juiz Samuel Bertolino dos Santos condenou o ex-prefeito às penas de 13 anos de reclusão, em regime inicial fechado, e mais quatro de detenção, esses em regime semiaberto, além do pagamento de multa.

Segundo a denúncia do Ministério Público, o esquema de fraudes em licitações envolveu secretários municipais, um vereador, funcionários públicos, empresários e um ex-servidor de Morro Agudo, com intuito de obter vantagem ilícita (veja abaixo detalhes).

Ao decidir pela condenação, o magistrado reafirmou as acusações.

“No que se refere às suas circunstâncias, observo que o acusado, para a prática do crime em questão, valeu-se do auxílio de outros servidores públicos, ocupantes de cargo em comissão, fazendo uso de sua superioridade hierárquica para determinar a prática do delito”, diz trecho da decisão.
A reportagem ligou na manhã desta quarta-feira (24) para o escritório de advocacia responsável pela defesa do ex-prefeito, mas ninguém havia atendido até a última atualização desta matéria.

Outros condenados
Em junho de 2020, a Justiça já havia condenado outros nove acusados de integrar a organização criminosa.

Considerado peça fundamental na engrenagem da organização, Tiago Stolarique fechou acordo de delação premiada com o MP e foi condenado a quatro anos de prisão, em regime semiaberto.

Acusados, cargos ocupados na época da operação e penas:

Tiago Stolarique: ex-assessor de Assuntos Urbanos e marido da secretária da Saúde. Condenado a quatro anos e um mês de prisão, em regime inicial semiaberto;
Daiana Stolarique: secretária da Saúde. Condenada a três anos e 11 meses de reclusão, em regime semiaberto;
Cleire de Souza: secretária de Administração e Planejamento. Condenada a oito anos e um mês de prisão, em regime inicial fechado;
Átila Juliano da Silva: empresário e marido de Cleire. Condenado a oito anos e um mês de prisão, em regime inicial fechado;
João Marcos Ficher: secretário de Serviços Urbanos, Transportes e Obras Públicas. Condenado a sete anos e um mês de reclusão, em regime inicial fechado;
Mara Cristina Braga Pereira: chefe do Setor de Licitações e Despesa da Prefeitura. Condenada a sete anos e um mês de prisão, em regime inicial fechado;
Élvis Júnio Marques, o Juninho Serralheiro: vereador pelo PT, condenado a seis anos de prisão, em regime inicial semiaberto;
Elisiane Ferreira: secretária do prefeito. Condenada a seis anos de reclusão, em regime inicial semiaberto;
Adenilton Germana: empresário e marido de Mara. Condenado a quatro anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituídos por pagamento de multas e prestação de serviços comunitários.

Absolvidos:

Willian Jorge, Gerson Braga e Neurandi Nogueira dos Anjos foram absolvidos por falta de provas.

O esquema
De acordo com o Gaeco, os suspeitos direcionavam contratos aos membros da quadrilha, dispensando processos licitatórios para contratação de prestadores de serviços à Prefeitura. As práticas irregulares foram apontadas e condenadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Ao tomar posse em 2017, segundo a Promotoria, Barbeti nomeou secretários com o intuito de dar continuidade aos desvios. O mesmo grupo já teria agido em duas gestões anteriores do prefeito, de 2005 a 2012, mas de forma menos engenhosa.

Cada chefe de secretaria ficava responsável para que a contratação dos serviços necessitados pela pasta fossem conduzidos de maneira ilícita.

Marido da secretária de Saúde, o ex-servidor público Tiago Stolarique foi apontado como o negociador de operações, sem ocupar cargo na Prefeitura de Morro Agudo. Em 2012, a Justiça o proibiu de ocupar público devido a uma ação de improbidade administrativa.

Para o Ministério Público, a ação da quadrilha foi dividida em quatro células:

Gerencial/executiva: formada por Cleire, Mara, João Marcos e Tiago, que estavam abaixo do prefeito, considerado o chefe do esquema, mas tinham autonomia em relação aos demais membros.
Subordinada: formada por Daiana, Willian e Elisiane, que recebiam ordens e as executavam para garantir o sucesso dos atos ilícitos.
Particular/beneficiária: formada por Adenilto e Neurandi, que eram beneficiados com as contratações indevidas.
Familiar: formada por Átila e Gerson, casados com Cleire e Mara, e que eram contratados para serviços utilizando até mesmo empresas deles nos nomes de terceiros para as fraudes.
Legislativa: o vereador Elvis fornecia apoio político ao grupo criminoso, em troca de favorecimento com recebimento de doação de bens públicos e contratações fraudulentas.

Conjunto de provas
A participação de cada um deles foi identificada após buscas e apreensões autorizadas pela Justiça em abril de 2018 e pela interceptação telefônica dos suspeitos.

Ao ser deflagrada, a operação prendeu seis investigados. Tiago Stolarique fechou acordo de delação premiada. Na sentença condenatória, o juiz Samuel Bertolino dos Santos, citou trecho de um dos depoimentos do acusado para resumir as práticas ilegais ocorridas na Prefeitura de Morro Agudo.

“O Gilberto fez três compromissos, ele falou na campanha, ele falou: “Tiago, eu não tenho dinheiro, então nós vamos prometer três coisas”, para quem era efetivo, designar cargos, quem era cargo de comissão, alguns ele ia nomear em comissão, que não eram efetivos, e outros que trabalhavam, alguma firma terceirizada que viesse ele ia colocar essas pessoas na firma terceirizada.”

Segundo o magistrado, o trecho corrobora a denúncia do MP e serve para demonstrar que os atos administrativos praticados durante a gestão de Barbeti “foram levados a efeito de forma viciada e criminosa, com finalidades espúrias e em descompasso com aquilo que se espera de todo e qualquer ocupante de cargo público”.

Ainda de acordo com o juiz, um elemento essencial para a caracterização do crime de organização criminosa é a “forma estruturada e caracterizada pela divisão de tarefas”, consistente na existência das chamadas células ou núcleos do grupo que atuava em Morro Agudo.

“Pode-se afirmar por comprovada a existência de uma organização criminosa, chefiada pelo então prefeito Gilberto César Barbeti e integrada, diretamente, pelos acusados Tiago, Cleire, João Marcos, Átila, Daiana, Elisiane e Elvis”, afirma Santos na sentença.

 

Ex-prefeito de São João da Ponte (MG) é condenado por improbidade administrativa

O Ministério Público Federal (MPF) obteve a condenação de três pessoas (duas físicas e uma jurídica) em razão da prática de ato doloso de improbidade administrativa que resultou em dano ao erário federal no valor de R$ 207.608,49. Os condenados são Fábio Luiz Fernandes Cordeiro, ex-prefeito de São João da Ponte, município com aproximadamente 25 mil habitantes, situado na região Norte de Minas Gerais; o Instituto Mundial de Desenvolvimento e Cidadania (IMDC) e seu representante legal, Deivson Oliveira Vidal.

Além de terem sido obrigados ao ressarcimento integral do dano no valor de R$ 207.608,49 e ao pagamento de multa civil de mesmo valor, os três réus foram proibidos de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica, pelo prazo de seis anos, a contar do trânsito em julgado da sentença.

Os fatos ocorreram entre 2010 e 2012 durante a execução de contrato cujo objeto era a implementação do programa Projovem Trabalhador no município de são João da Ponte.

De acordo com o MPF, cuja investigação teve início a partir de relatório de fiscalização da Controladoria-Geral da União (CGU), o ex-prefeito, auxiliado por agentes públicos municipais, teria direcionado procedimento licitatório para a contratação do IMDC, que não possuía capacidade operacional para a execução do ProJovem, sendo mero intermediário de mão de obra.

Além de alegar fraude à licitação, o Ministério Público Federal também apontou, entre outras irregularidades, preços superfaturados, ocorrência de ilícita antecipação de pagamento e alterações no plano de implementação do programa “com a retirada de cursos inicialmente previstos e o acréscimo de outros não contemplados no plano original, bem como a realização de alterações nos quantitativos de alunos e ausência de comprovação da efetiva inserção de jovens qualificados no mercado de trabalho”.

Pagamento ilícito – Para o Juízo Federal, no entanto, embora não se possa ignorar que houve diversos problemas na execução do convênio, a análise do caso impõe o cotejo com a realidade local. “Em outras palavras, conquanto a inclusão no mercado de trabalho de pouco mais de uma centena de jovens em atividades de natureza urbana possa se dar com alguma tranquilidade em cidades como Uberlândia (MG) – mencionada na inicial -, a alocação do mesmo quantitativo em um município pequeno e pouco desenvolvido como São João da Ponte (MG) – altamente dependente do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) – é de concretização absolutamente improvável”.

Nesse sentido, a sentença registra que, ainda que tenha havido falhas e omissões na execução do convênio, não houve prova suficiente para demonstrar “ajuste prévio entre os réus no sentido de algum tipo de direcionamento ou favorecimento no certame em questão. Não há comprovação acerca de um artifício, ardil ou o meio enganoso no intuito de se perpetrar intencionalmente uma fraude elaborada previamente e consistente na contratação e execução fraudulenta do programa”.

Contudo, o julgador reconhece que, diferentemente do previsto em contrato, os réus Fábio e Deivson promoveram ilícita antecipação de pagamento no valor de R$ 273.549,92, o que é expressamente proibido pela Lei 8.429/1992, no artigo 10, inciso XI.

De acordo com o relatório de fiscalização da CGU, “(…) embora o contrato tenha sido assinado em 24 de março 2010, as aulas de capacitação dos jovens, que deveriam ter sido parâmetro para o pagamento avençado, tiveram início somente em 28 de junho de 2010 (…)”. No entanto, apenas 17 dias após o início das aulas de qualificação, a prefeitura pagou ao IMDC a quantia de R$ 273.549,92, montante que o contratado somente faria jus dois meses depois, em 12 de setembro de 2010.

Nesse contexto, registra o Juízo Federal, tem-se que, objetivamente, foi realizado pagamento antes de contraprestação do serviço em favor do poder público”, em violação inclusive ao próprio contrato celebrado entre as partes, que, em sua cláusula quarta, previa que “o pagamento decorrente da concretização do objeto desta licitação será efetuado mensalmente, conforme a prestação dos serviços, em parcelas fixas e iguais, após apresentação de nota fiscal/fatura hábil acompanhada das guias de recolhimento dos encargos sociais (INSS e FGTS) dos empregados lotados na execução do contrato, referentes ao mês da prestação dos serviços e ainda as CNDs do INSS e do FGTS e comprovante de cumprimento da carga horário de capacitação”.

Restituição ao erário – “Há clara necessidade de restituição do dano ao erário nesse importe”, afirma a sentença, lembrando que “inexiste justificativa para o pagamento realizado sem comprovação de contraprestação. No caso, não se trata de simples desrespeito a comando legal, mas de clara malversação de recursos públicos com prejuízo efetivo ao erário, caracterizando dilapidação de numerário aplicado sem justificativa ou contraprestação”.

Portanto, “sem a atuação consciente do representante da IMDC em cobrar por algo não prestado e do dirigente máximo do município em ordenar pagamento manifestamente indevido não haveria desfalque ao erário, causador de claro prejuízo ao erário de R$ 207.608,49 e em desrespeito manifesto à lei”, conclui o magistrado.

Recurso – O MPF recorreu da sentença, pedindo que a decisão judicial seja reformada em vários pontos, entre eles, o reconhecimento de fraude à licitação (por exemplo, a prefeitura realizou tomada de preços para um contrato de valor superior ao limite estabelecido pela Lei 8.666/1993 para essa modalidade) e pagamento/recebimento indevido de valores destinados à quitação de tributos e contribuições.

O MPF pede ainda que, em relação ao ato de improbidade administrativa referente à antecipação do pagamento, os réus Fábio e Deivson também sejam condenados à pena de suspensão dos direitos políticos.

O recurso será julgado pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6).

(AIA 1000479-40.2017.4.01.3807)

Íntegra da sentença

Íntegra do recurso apresentado pelo MPF

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