Ex-prefeito de São João da Ponte (MG) é condenado por improbidade administrativa

O Ministério Público Federal (MPF) obteve a condenação de três pessoas (duas físicas e uma jurídica) em razão da prática de ato doloso de improbidade administrativa que resultou em dano ao erário federal no valor de R$ 207.608,49. Os condenados são Fábio Luiz Fernandes Cordeiro, ex-prefeito de São João da Ponte, município com aproximadamente 25 mil habitantes, situado na região Norte de Minas Gerais; o Instituto Mundial de Desenvolvimento e Cidadania (IMDC) e seu representante legal, Deivson Oliveira Vidal.

Além de terem sido obrigados ao ressarcimento integral do dano no valor de R$ 207.608,49 e ao pagamento de multa civil de mesmo valor, os três réus foram proibidos de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica, pelo prazo de seis anos, a contar do trânsito em julgado da sentença.

Os fatos ocorreram entre 2010 e 2012 durante a execução de contrato cujo objeto era a implementação do programa Projovem Trabalhador no município de são João da Ponte.

De acordo com o MPF, cuja investigação teve início a partir de relatório de fiscalização da Controladoria-Geral da União (CGU), o ex-prefeito, auxiliado por agentes públicos municipais, teria direcionado procedimento licitatório para a contratação do IMDC, que não possuía capacidade operacional para a execução do ProJovem, sendo mero intermediário de mão de obra.

Além de alegar fraude à licitação, o Ministério Público Federal também apontou, entre outras irregularidades, preços superfaturados, ocorrência de ilícita antecipação de pagamento e alterações no plano de implementação do programa “com a retirada de cursos inicialmente previstos e o acréscimo de outros não contemplados no plano original, bem como a realização de alterações nos quantitativos de alunos e ausência de comprovação da efetiva inserção de jovens qualificados no mercado de trabalho”.

Pagamento ilícito – Para o Juízo Federal, no entanto, embora não se possa ignorar que houve diversos problemas na execução do convênio, a análise do caso impõe o cotejo com a realidade local. “Em outras palavras, conquanto a inclusão no mercado de trabalho de pouco mais de uma centena de jovens em atividades de natureza urbana possa se dar com alguma tranquilidade em cidades como Uberlândia (MG) – mencionada na inicial -, a alocação do mesmo quantitativo em um município pequeno e pouco desenvolvido como São João da Ponte (MG) – altamente dependente do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) – é de concretização absolutamente improvável”.

Nesse sentido, a sentença registra que, ainda que tenha havido falhas e omissões na execução do convênio, não houve prova suficiente para demonstrar “ajuste prévio entre os réus no sentido de algum tipo de direcionamento ou favorecimento no certame em questão. Não há comprovação acerca de um artifício, ardil ou o meio enganoso no intuito de se perpetrar intencionalmente uma fraude elaborada previamente e consistente na contratação e execução fraudulenta do programa”.

Contudo, o julgador reconhece que, diferentemente do previsto em contrato, os réus Fábio e Deivson promoveram ilícita antecipação de pagamento no valor de R$ 273.549,92, o que é expressamente proibido pela Lei 8.429/1992, no artigo 10, inciso XI.

De acordo com o relatório de fiscalização da CGU, “(…) embora o contrato tenha sido assinado em 24 de março 2010, as aulas de capacitação dos jovens, que deveriam ter sido parâmetro para o pagamento avençado, tiveram início somente em 28 de junho de 2010 (…)”. No entanto, apenas 17 dias após o início das aulas de qualificação, a prefeitura pagou ao IMDC a quantia de R$ 273.549,92, montante que o contratado somente faria jus dois meses depois, em 12 de setembro de 2010.

Nesse contexto, registra o Juízo Federal, tem-se que, objetivamente, foi realizado pagamento antes de contraprestação do serviço em favor do poder público”, em violação inclusive ao próprio contrato celebrado entre as partes, que, em sua cláusula quarta, previa que “o pagamento decorrente da concretização do objeto desta licitação será efetuado mensalmente, conforme a prestação dos serviços, em parcelas fixas e iguais, após apresentação de nota fiscal/fatura hábil acompanhada das guias de recolhimento dos encargos sociais (INSS e FGTS) dos empregados lotados na execução do contrato, referentes ao mês da prestação dos serviços e ainda as CNDs do INSS e do FGTS e comprovante de cumprimento da carga horário de capacitação”.

Restituição ao erário – “Há clara necessidade de restituição do dano ao erário nesse importe”, afirma a sentença, lembrando que “inexiste justificativa para o pagamento realizado sem comprovação de contraprestação. No caso, não se trata de simples desrespeito a comando legal, mas de clara malversação de recursos públicos com prejuízo efetivo ao erário, caracterizando dilapidação de numerário aplicado sem justificativa ou contraprestação”.

Portanto, “sem a atuação consciente do representante da IMDC em cobrar por algo não prestado e do dirigente máximo do município em ordenar pagamento manifestamente indevido não haveria desfalque ao erário, causador de claro prejuízo ao erário de R$ 207.608,49 e em desrespeito manifesto à lei”, conclui o magistrado.

Recurso – O MPF recorreu da sentença, pedindo que a decisão judicial seja reformada em vários pontos, entre eles, o reconhecimento de fraude à licitação (por exemplo, a prefeitura realizou tomada de preços para um contrato de valor superior ao limite estabelecido pela Lei 8.666/1993 para essa modalidade) e pagamento/recebimento indevido de valores destinados à quitação de tributos e contribuições.

O MPF pede ainda que, em relação ao ato de improbidade administrativa referente à antecipação do pagamento, os réus Fábio e Deivson também sejam condenados à pena de suspensão dos direitos políticos.

O recurso será julgado pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6).

(AIA 1000479-40.2017.4.01.3807)

Íntegra da sentença

Íntegra do recurso apresentado pelo MPF

Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal em Minas Gerais
Tel.: (31) 2123-9010 / 9008
E-mail: [email protected]
Serviço de Atendimento a Jornalistas: https://saj.mpf.mp.br/saj/

Operação Navalha: 12 dos 17 acusados agora são réus em ação penal

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceitou denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra 12 dos 17 acusados de envolvimento no desvio de dinheiro público investigado pela Operação Navalha. Entre os réus estão o atual prefeito de Aracaju e ex-governador de Sergipe, João Alves Filho, e o empresário Zuleido Veras, dono da construtora Gautama, apontado como chefe do suposto esquema.

Também vão responder à ação penal Flávio Conceição de Oliveira Neto, conselheiro do Tribunal de Contas de Sergipe; os empresários João Alves Neto e Sérgio Duarte Leite; o ex-deputado federal José Ivan de Carvalho Paixão; os então ocupantes de cargos públicos Victor Fonseca Mandarino, Renato Conde Garcia, Max José Vasconcelos de Andrade, Gilmar de Melo Mendes e Kleber Curvelo Fontes; e o engenheiro da Gautama Ricardo Magalhães da Silva.

Flávio de Oliveira Neto, apesar de ter sido aposentado compulsoriamente do cargo, recorre judicialmente da decisão do TCSE. Em razão disso, a Corte Especial entendeu por afastá-lo das funções até a conclusão da instrução da ação penal, que pode durar mais de um ano.

Os ministros rejeitaram a denúncia contra cinco dos 17 acusados. São eles os funcionários da Gautama Florêncio Brito Vieira (office-boy), Gil Jacó Carvalho Santos, Humberto Rios de Oliveira e Maria de Fátima César Palmeira, além de Roberto Leite, ex-diretor técnico da Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso).

A operação

A investigação da Polícia Federal apontou a existência de um grupo organizado para a obtenção ilícita de lucros através da contratação e execução de obras públicas. O inquérito foi deslocado para o STJ devido à constatação do envolvimento de autoridades governadores e conselheiro de TCE com foro privilegiado. Em 2007, a Operação Navalha foi deflagrada, com prisões de suspeitos e buscas e apreensões de documentos. No total, 61 pessoas foram denunciadas.

A atuação do grupo seria tão ampla que a denúncia foi dividida por eventos, conforme o local de execução das obras que tiveram recursos públicos desviados. Em razão da prerrogativa de foro do conselheiro Flávio Conceição de Oliveira Neto, apenas o chamado Evento Sergipe ficou no STJ.

O alvo da investigação desse evento foi a execução das obras do Sistema da Adutora do Rio São Francisco. O contrato, no valor de R$ 128 milhões, foi firmado em 2001 entre a construtora Gautama e a Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso), sociedade de economia mista que tem 99% do capital em mãos do estado de Sergipe.

Parte dos recursos da obra vinha de convênio celebrado com o Ministério da Integração Nacional. Foram pagos à Gautama R$ 224,6 milhões, em razão de reajustes efetivados.

Relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União (CGU) apontou diversas ilegalidades na concorrência pública da obra, que direcionaram o contrato para a Gautama. A análise também indicou que grande parte dos recursos públicos federais e estaduais pagos à construtora foi fruto de irregularidades. Segundo a denúncia, o desvio foi de R$ 178,7 milhões, quase 80% do valor da obra.

Crimes

O suposto esquema envolveria desde a identificação das verbas públicas destinadas a obras, coopetação de servidores públicos, elaboração de projetos, fraude nas licitações e aprovação das obras até ser concluído com a distribuição das propinas.

O ex-governador de Sergipe e autal prefeito de Aracaju responde por corrupção passiva, peculato e formação de quadrilha. Seu filho, João Alves Neto, é acusado de corrupção passiva e formação de quadrilha. Zuleido Veras e Ricardo Magalhães, acusados de oferecer vantagens ilícitas a agentes públicos, respondem por corrupção ativa, peculato e formação de quadrilha. Os demais respondem por corrupção passiva, peculato e formação de quadrilha.

Voto da relatora

Relatora do caso, a ministra Eliana Calmon afirmou em seu voto que o relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) que apontou as irregularidades na obra está aparado por inúmeros documentos, com descrição de repasses de recursos e alterações no contrato.

A defesa havia alegado que o relatório da CGU seria falho por ter sido coordenado por economista e não por engenheiro capacitado para fazer avaliação de obra. Para a relatora, não há ilegalidade no relatório elaborado pela chefe da Controladoria de Sergipe porque, como ocupante do cargo de analista de finanças e controle, a servidora que assina o documento cumpriu suas atribuições de supervisão, coordenação, direção e execução de trabalhos especializados. Ela está qualificada sim pelo seu grau de conhecimentos técnicos, disse a ministra.

Outro argumento amplamente defendido pelos advogados era que o relatório da CGU contrariava diversas auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A ministra Eliana Calmon afirmou que as inspeções do TCU não foram desprezadas e que a corte de contas encontrou, sim, irregularidade nas obras, como superfaturamento, inclusive vindo a suspender o repasse de recursos federais.

Apesar de o TCU, em data posterior, ter autorizado o prosseguimento das obras, houve a constatação preliminar de irregularidades na aplicação dos recursos federais, apontou Eliana Calmon. Ela citou diversos acórdãos do TCU com constatação de irregularidades e recomendações, inclusive de realização de novas licitações.

Michel Temer e Moreira Franco são presos em Operação Radioatividade

O ex-presidente Michel Temer e o ex-ministro de Minas e Energia, Moreira Franco, foram presos nesta quinta-feira (21) pela força-tarefa da Operação Lava-Jato do Rio de Janeiro. A ação é um desdobramento da Operação Radioatividade, que investiga desvios nas obras da Usina de Angra 3 e tem como base a delações do doleiro Lúcio Funaro, apontado como operador do MDB, e do empresário José Antunes Sobrinho, dono da Engevix. Na ação, a Polícia Federal cumpre mandados contra mais seis pessoas, entre elas empresários.

O ex-presidente foi preso preventivamente em São Paulo e levado para o Aeroporto de Guarulhos, de onde será levado ao Rio de Janeiro em um avião da PF. Na capital fluminense, Temer fará exame de corpo de delito no IML.. Os mandados foram expedidos pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio. O ex-presidente está em São Paulo e deve ser levado para a capital fluminense.

O ex-ministro Moreira Franco (Minas e Energia) também foi preso. Ele estava no Rio de Janeiro no momento da prisão. O ex-ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) também é alvo da operação.

MDB critica prisão

Logo após as prisões, o MDB emitiu nota lamentando a postura “açodada da Justiça à revelia do andamento de um inquérito em que foi demonstrado que não há irregularidade”. Confira a íntegra da nota:

Veja nota:

“O MDB lamenta a postura açodada da Justiça à revelia do andamento de um inquérito em que foi demonstrado que não há irregularidade por parte do ex-presidente da República, Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco. O MDB espera que a Justiça restabeleça as liberdades individuais, a presunção de inocência, o direito ao contraditório e o direito de defesa”.

Delação

No ano passado, Funaro entregou à Procuradoria-Geral da República (PGR) informações complementares do seu acordo de colaboração premiada. Entre os documentos apresentados estão planilhas que, segundo o delator, revelam o caminho de parte dos R$ 10 milhões repassados pela Odebrecht ao MDB na campanha de 2014.

Ao ficar sem mandato neste ano, Temer perdeu a prerrogativa de foro perante o Supremo, e denúncias contra ele foram mandadas para a primeira instância da Justiça Federal. Recentemente, o ministro Luís Roberto Barroso deferiu pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) para que se abram cinco novas investigações sobre o emedebista, que tramitarão na primeira instância.

Temer foi denunciado em dezembro pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, sob acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia decorreu de investigação aberta em 2017, na esteira da delação da JBS, sobre supostas irregularidades na edição do Decreto dos Portos, assinado por Temer em maio daquele ano.

Ex-presidente preso

Michel Temer é o segundo presidente a ser preso após ação na esfera penal -?o primeiro foi Luiz Inácio Lula da Silva, em abril de 2018. Durante a República, outros presidentes foram presos apenas por crimes políticos, em meio a crises e golpes. O caso que mais se aproxima do caso de Lula e Temer, que tiveram tramitação na esfera judicial, aconteceu há quase 97 ?anos -?trata-se da prisão de Hermes da Fonseca, que chefiou o Poder Executivo federal entre 1910 e 1914.

E, como mostrou reportagem do jornal Folha de S.Paulo, mesmo com processo judicial envolvido, o caso do marechal foi essencialmente político.

Novas investigações

Das 5 novas apurações abertas, 3 têm a Argeplan Arquitetura e Engenharia como peça central. A PGR sustenta que a empresa, que aparece na denúncia dos portos como intermediária de propina e que tem como um de seus sócios o coronel Lima, pertence de fato ao ex-presidente.

Um dos pedidos de abertura de inquérito envolve um contrato milionário da Eletronuclear para a construção da usina de Angra 3 que foi paralisado devido a suspeitas levantadas pela Lava Jato. O contrato, de R$ 162 milhões, foi firmado pela multinacional AF Consult, que subcontratou a AF Consult do Brasil, que por sua vez tem a Argeplan em seu quadro societário.

Ao lado da Argeplan, a empreiteira Engevix também foi subcontratada para a obra. Em 2016, um dos donos da Engevix, José Antunes Sobrinho, tentou, sem sucesso, fechar um acordo de delação com o Ministério Público relatando que o coronel Lima cobrou dele R$ 1 milhão para a campanha de Temer em 2014.

Dodge requereu que a apuração desse caso seja feita perante a 7ª Vara Criminal da Justiça Federal no Rio, sob responsabilidade do juiz Marcelo Bretas, onde outros processos sobre a Eletronuclear já tramitaram.

A Argeplan também é suspeita de superfaturar e deixar de prestar serviços para os quais foi contratada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio do consórcio Argeplan/Concremat.

A terceira nova apuração envolve contrato celebrado entre a empresa e a Fibria Celulose, que opera no porto de Santos, com valores em torno de R$ 15,5 milhões. Dodge solicitou que se investigue também, no mesmo procedimento, transações financeiras entre a Construbase Engenharia e a PDA, a outra empresa do coronel.

A Construbase repassou à PDA, de setembro de 2010 a agosto de 2015, R$ 17,7 milhões, por meio de 58 transferências. A empresa do coronel, segundo a Procuradoria, “consta por diversas vezes em relatórios do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras], como responsável por movimentações atípicas”.

Na quarta frente de apuração aberta, Dodge apontou suspeitas de que uma das filhas do presidente, Maristela Temer, tenha praticado o crime de lavagem de dinheiro por meio de uma reforma em sua casa, em São Paulo.

Dodge considerou que a suspeita de que a obra tenha sido paga com dinheiro de propina “não guarda intrínseca relação” com o suposto crime de corrupção denunciado no âmbito do inquérito dos portos, e requereu uma investigação específica a ser feita perante a Justiça Federal em São Paulo.
A quinta nova investigação aberta é sobre um suposto contrato fictício assinado a pretexto de prestação de serviços no terminal Pérola, no porto de Santos. A empresa faz parte do grupo Rodrimar.

AS 5 APURAÇÕES CONTRA TEMER

Reforma

Maristela, filha do presidente Michel Temer, e outros são suspeitos de lavagem de dinheiro por meio de reforma na casa dela, em São Paulo. Materiais foram pagos em dinheiro vivo por mulher de coronel amigo de Temer

Eletronuclear

Coronel João Baptista Lima Filho é suspeito de pedir, com anuência de Temer, R$ 1,1 milhão a José Antunes Sobrinho, sócio da Engevix, no contexto de um contrato para a construção da usina de Angra 3

Tribunal paulista

Suspeita de superfaturamento e de serviços não executados pelo consórcio Argeplan/Concremat, contratado por cerca de R$ 100 milhões para realizar obras no Tribunal de Justiça de São Paulo. Para PGR, Argeplan pertence de fato a Temer

Terminal Pérola

Suspeita de contrato fictício, de R$ 375 mil, para prestação de serviço no porto de Santos

Construbase e PDA

PDA, uma das empresas do coronel Lima que consta de relatórios de movimentação financeira atípica feitos pelo Coaf, recebeu da Construbase, em 58 transações, R$ 17,7 milhões de 2010 a 2015. Outro contrato suspeito, de R$ 15,5 milhões, é entre Argeplan e Fibria Celulose, que atua no porto de Santos

Operação Hefesta: oito pessoas são presas por fraudes e desvio de R$ 7,9 milhões em obras do Museu do Trabalhador

MPF pediu o sequestro de bens dos envolvidos; também foram cumpridos oito mandados de condução coercitiva e 16 de busca e apreensão em SP, RJ e DF

Coletiva de imprensa realizada nesta terça-feira. Foto: Diego Mattoso - Ascom MPF/SP

Coletiva de imprensa realizada nesta terça-feira. 

Oito pessoas foram presas nesta terça-feira, 13 de dezembro, por envolvimento em fraudes e desvio de pelo menos R$ 7,9 milhões durante a construção do Museu do Trabalho e do Trabalhador, em São Bernardo do Campo/SP. As prisões temporárias, de cinco dias, foram autorizadas pela Justiça após pedido do Ministério Público Federal em São Paulo. Também foram cumpridos oito mandados de condução coercitiva (quando a pessoa tem sua liberdade restringida por algumas horas até que preste esclarecimentos à polícia) e 16 mandados de busca e apreensão. A ação faz parte da Operação Hefesta, deflagrada em conjunto com a Polícia Federal e a Controladoria Geral da União (CGU).

Entre os presos estão os atuais secretários municipais de Obras e Cultura de São Bernardo do Campo, Alfredo Buso e Osvaldo de Oliveira Neto, e o ex-secretário de Obras, Sérgio Suster, bem como gestores de construtoras que participaram das irregularidades. Segundo as investigações, pelo menos 18 pessoas, entre agentes públicos e empresários, formaram organização criminosa para obter vantagens ilícitas por meio de fraude à licitação e na execução de contrato, peculato, inserção de dados falsos no sistema de gestão de convênios do governo federal e falsidade ideológica.

A operação foi autorizada pela 3ª Vara Federal de São Bernardo do Campo, que aceitou todos os requerimentos do Ministério Público Federal. Os mandados foram cumpridos em nove cidades brasileiras, simultaneamente: São Paulo, São Bernardo do Campo, Brasília, Santana do Parnaíba, Santos, São Vicente, Rio de Janeiro, Barueri e Brasília. Foram apreendidos documentos, grandes quantias em dinheiro e bens, como veículos de luxo. A sede do Ministério da Cultura também foi alvo de busca e apreensão e o envolvimento de agentes do ministério será apurado.

A Justiça determinou ainda o arresto e sequestro de bens de 29 pessoas, com o objetivo de garantir a reparação integral dos prejuízos causados ao erário. Os valores desviados poderiam ter chegado a R$ 11 milhões, mas parte dos recursos referentes ao convênio firmado entre o MinC e o Município de São Bernardo do Campo para a criação do museu ainda não foram efetivamente pagos às empresas envolvidas.

A operação também garantiu que outros R$ 19 milhões em recursos federais deixassem de ser desviados pelo esquema. Isso porque obteve o bloqueio do projeto de incentivo cultural aprovado em 2013 junto ao Ministério da Cultura, por meio da empresa Base 7, que visava a captação do valor via Lei Rouanet. O projeto tinha o mesmo objetivo do convênio firmado em 2010 para construção do museu, representando um duplo gasto de recursos que resultaria em novos danos aos cofres públicos.

O CONVÊNIO. O Museu do Trabalhador, conhecido popularmente como “Museu do Lula”, deveria ter sido concluído em janeiro de 2013, com o custo inicial de R$ 18 milhões. A obra, contudo, permanece inacabada, após três prorrogações do contrato. O valor atual do convênio passa de R$ 21 milhões, dos quais R$ 14,6 milhões caberiam ao Ministério da Cultura e R$ 7 milhões, ao município de São Bernardo do Campo, na forma de contrapartida. Entre as causas para o aumento do valor total do projeto estão o superfaturamento de serviços de engenharia e arquitetura, o desvio de recursos mediante o pagamento em duplicidade pela realização de trabalhos, a modificação do projeto original com custo acima do teto legal e as prorrogações indevidas do contrato.

LICITAÇÃO. O inquérito policial mostra que os envolvidos buscaram diminuir o caráter competitivo da licitação que deveria escolher a construtora responsável pela obra, incluindo no edital exigências de qualificação técnica ilegais. Como consequência, apenas sete empresas apresentaram propostas. Por outro lado, os agentes públicos não aferiram a idoneidade e capacidade econômica das concorrentes, permitindo que a “Construções e Incorporações – CEI Ltda.” vencesse a competição por apresentar o menor preço – uma empresa fantasma, com receita de R$ 41 mil, desprovida de patrimônio, empregados e experiência, e cujos sócios admitiram ser laranjas.

As provas colhidas até agora indicam a existência de ajuste prévio entre os envolvidos para beneficiar duas outras construtoras, a Cronacon e a Flasa, que indiretamente ficaram responsáveis pela execução da obra. Além desta interposição fraudulenta, ficou comprovada a subcontratação de inúmeras outras empresas ao longo do convênio, o que era proibido pelo contrato. Para elaboração do projeto executivo, por exemplo, a CEI recebeu R$ 1,5 milhão, mas terceirizou o serviço por R$ 850 mil para a Apiacás Arquitetos Ltda. Esta quarteirizou a demanda para a Brasil Arquitetura por R$ 723 mil, que por fim quinteirizou o projeto a outros prestadores por R$ 346 mil.

Tal forma de terceirização também foi apurada na execução da obra em si. Mas, apesar de terem conhecimento destas violações, os secretários Municipais de Obras, Alfredo Buso, e de Cultura, Osvaldo de Oliveira Neto, não rescindiram o contrato nem aplicaram qualquer penalidade à CEI. “A subcontratação, sem autorização do Poder Público, acarreta um significativo aumento no custo global da obra, com prejuízos ao erário municipal e federal, que poderiam ter pago preço global menor caso a licitante vencedora tivesse condições de executar diretamente os serviços”, reforça a procuradora da República Fabiana Rodriguez de Sousa Bortz, responsável pela investigação.

Também ficou comprovado o desvio de recursos públicos mediante o pagamento de trabalhos não realizados. Entre 2012 e 2013, a CEI deveria elaborar o projeto executivo, instalar o canteiro de obras, iniciar os serviços de terraplenagem e as fundações, entre outras atividades. Contudo, neste período não houve obra alguma. Ainda assim, Osvaldo de Oliveira Neto e o secretário Municipal de Obras à época, Sérgio Suster, atestaram a execução integral dos serviços pela empresa e autorizaram os pagamentos. A construtora emitiu notas fiscais frias cobrando por mão de obra não utilizada e materiais não fornecidos. Ao todo, entre 2012 e 2016, ela recebeu R$ 15 milhões.

AUMENTO DO CUSTO. Em 2012, o Município determinou a paralisação do contrato e a alteração do projeto arquitetônico para suprimir o auditório no subsolo e elevar o nível da obra em relação à rua, o que elevou os custos do projeto em mais de R$ 3,6 milhões. A justificativa para a mudança foi a probabilidade de chuvas e alagamentos na região do Paço Municipal, onde está sendo construído o museu. Porém, o risco de enchentes no local já era historicamente conhecido antes mesmo da abertura da licitação. Para o MPF, a inclusão do auditório servira apenas para justificar a inclusão de cláusulas restritivas no edital, de forma a direcionar o resultado da disputa à CEI, e, em um segundo momento, permitir a celebração de aditivos de valor ao contrato.

Além disso, em 2014, os agentes públicos determinaram novamente a paralisação das obras retomadas no ano anterior, alegando falta de recursos financeiros, mesmo havendo mais de R$ 6 milhões disponíveis. Estes episódios levaram a prorrogações indevidas do contrato e acarretaram vantagem à CEI calculada em R$ 3 milhões, em virtude do reajuste anual de preços. Tais dilatações do prazo ainda foram autorizadas em momentos em que o contrato já havia vencido, o que significou reativação de acordo extinto e, por consequência, recontratação sem licitação.

OUTRAS FRAUDES. As irregularidades no caso do Museu do Trabalhador podem ser percebidas antes mesmo da celebração do convênio com o MinC, tendo em vista que o processo no Ministério foi apresentado, analisado e aprovado em apenas quatro dias úteis, sem que fosse exigido o projeto básico. “A União aprovou proposta, formulada em termos tão inexatos, insuficientes e confusos, criando, assim, obrigação de dispêndio de mais de R$ 14 milhões em verbas federais, sem definir precisamente com o quê e como esse dinheiro seria gasto”, destaca a procuradora.

Em relação ao Município de São Bernardo do Campo, a contrapartida devida pela Prefeitura não foi disponibilizada dentro dos prazos previstos, mas os agentes públicos inseriram dados falsos no sistema de gestão de convênios do governo federal, informando depósitos não realizados. Ficou comprovado ainda que o projeto básico do museu foi superfaturado, com aporte de R$ 1,3 milhão em 2010. No ano seguinte, os envolvidos pagaram em duplicidade pela elaboração de novo projeto básico, gerando prejuízo de R$ 563 mil. Até o momento foi apresentada apenas a prestação de contas parcial do convênio por parte da municipalidade.