DOEPE 08/10/2022 - Pág. 1 - Poder Executivo - Diário Oficial do Estado de Pernambuco
Diário Oficial
Estado de Pernambuco
Ano XCIX • No 194
Poder Executivo
Recife, sábado, 8 de outubro de 2022
Shirley e o empoderamento
feminino através das artes marciais
F
Inspirada pelo pai, um policial civil, a servidora
tornou-se a primeira e única mulher a ministrar
aulas de defesa pessoal na Acadepol.
S
P
W
G
hirley Nascimento, 40 anos, ocupou um território tomado por homens. Diversas vezes, ouviu que
o jiu-jitsu e a carreira policial não
eram para ela pelo fato de ser
mulher. Insistiu, inspirou-se na história do
próprio pai, Luiz Augusto Nascimento, e tornou-se a primeira e única mulher a ministrar
aulas de defesa pessoal para policiais na Academia da Polícia Civil de Pernambuco (Acadepol). Não houve tempo para o pai de Shirley, comissário de Polícia Civil, acompanhar
as conquistas da filha. No ano da formatura
dela como servidora da corporação, em 2009,
Luiz morreu.
A perita papiloscopista despertou, ainda
criança, para o desejo de ser policial. “Via o
amor que meu pai tinha pela profissão e queria fazer o mesmo. Vestir uma farda de policial e honrá-la. No momento que eu pensei
que fosse dizer a ele: pai, você foi meu maior
inspirador, meu maior exemplo, ele faleceu”,
lembra.
Com a luta foi a mesma coisa. O pai de
Shirley foi seu maior incentivador. Achava
que ela precisava aprender a se defender. A
paixão pela luta aumentou quando ela frequentou a academia de jiu-jitsu na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em
2003. Na época, cursava educação física.
Após seis meses de treinamentos, conquistou os primeiros títulos, entre eles, de campeã mundial, em 2004; três vezes campeã
pernambucana de jiu-jitsu; e campeã Norte/
Nordeste, em 2004. Depois destes, vieram
outros. Hoje, é faixa preta, graduação no jiujitsu que permitiu à policial tornar-se a primeira instrutora feminina a dar aulas de defesa pessoal policial para homens e mulheres
no curso de formação da Acadepol.
Shirley também é professora na academia
ZR Team, na Ilha do Retiro, no Recife, onde treina diariamente. No espaço, ela é responsável pelas turmas femininas. Nas aulas,
Shirley trabalha nas alunas, além dos ganhos
físicos, o aumento da autoconfiança, a segurança e a autoestima. “As artes marciais e
a defesa pessoal ajudam muitas mulheres a
vencerem seus medos e preconceitos.”
Ao longo dos anos, tem sido cada vez
mais comum ver mulheres desmistificando
pensamentos e desfazendo padrões sociais.
Sem medo de preconceito, elas assumem
profissões antes consideradas masculinas.
Porém, ainda é um caminho bastante árduo.
Quando uma mulher exerce profissões consideradas masculinas, significa que ela precisará ser forte para encarar olhares tortos
e comentários machistas pelo padrão cultural imposto.
Shirley teve que quebrar paradigmas e
mostrar que de frágil o sexo feminino não
tem nada. Desde que iniciou a carreira de
perita papiloscopista, lembra que enfrentou muitos desafios e preconceitos dos próprios colegas de profissão. Muitos diziam
que ela não era capaz e que polícia não era
lugar para mulheres. E isso fez com que ela
se dedicasse ainda mais e não desistisse dos
seus sonhos. Hoje, tem o respeito e a admiração dos seus colegas de profissão e percebe que esse conceito está se transformando
aos poucos. “Hoje eu tenho amigos que me
escolhem para ficar na equipe, ao invés de
escolherem um homem. Me escolhem pelas minhas qualidades, que não são menores do que as dos colegas homens. Infelizmente, o machismo está na raiz cultural de
nossa sociedade e o combate a ele tem que
ser contínuo.”
Shirley ainda deixa um recado para todas
as mulheres que estão enfrentando esse momento na carreira “Seja forte, corajosa e vá
à luta. Faça a sua parte. É fato que já houve
uma evolução e que as mulheres estão mais
conscientes de seus direitos, mas, se não for
feito por nós algo no sentido de superar esse tipo de violência, ela não vai passar, nem
muito menos acabar.”
Como policial, Shirley também foi convidada a integrar o quadro de funcionários
do Departamento Nacional de Segurança
Pública (SENASP). “Representar o Estado de Pernambuco em operações em outros
membros federativos, como Alagoas, Rio
Grande do Norte, Goiás e Distrito Federal,
trouxe grandes benefícios na minha carreira policial. Um deles foi à capacidade de me
adaptar em diversos meios e situações e a
troca de experiências com profissionais de
outros estados, na qual tive um aprendizado
ímpar sobre diversas outras culturas, ou seja, inúmeras maneiras de agir, exigidas pela profissão.”
Casada há 18 anos com Douglas Rodrigues, que também é policial civil integrante
do grupo tático do grupo CORE e atleta de
jiu-jitsu, Shirley lembra que iniciaram juntos na polícia e no tatame. Desde então, não
se separaram mais. Hoje são pais dos gêmeos Saulo e Vitor (7 anos) e de Isadora (5
anos), que já dão os primeiros passos no esporte. “Estamos sempre conectados. Minha
família sempre está comigo nos campeonatos. Meu marido e meus filhos sempre estão nas arquibancadas na torcida pela ma-
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mãe. É também um momento de lazer para
todos nós.”
V
– Relatório do Anuário Brasileiro de Segurança Pública do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2018, aponta que foram registrados
mais de 50 mil casos de violência sexual no
país e, destes, 81,8% tiveram mulheres como
alvo principal. Outro dado chocante do estudo revela que a cada 11 minutos uma mulher
é vítima de estupro no Brasil. Estas estatísticas alarmantes têm gerado o crescimento do
público feminino em aulas de artes marciais,
ficando evidente a importância de aprenderem a forma correta de autodefesa.
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