TJBA 01/02/2022 - Pág. 2021 - CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.030 - Disponibilização: terça-feira, 1º de fevereiro de 2022
Cad 4/ Página 2021
A denúncia foi recebida no dia 28 de junho de 2019, em decisão de ID. 96912859.
A acusada não foi encontrada para citação, conforme certificado ao ID. 96912861.
O Ministério Público emitiu parecer ao ID. 152780154 pugnando pelo reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva da pena em
perspectiva e extinção nos moldes do art. 61 do CPP.
É o relatório. Fundamento e decido.
No âmbito do Direito Penal, a prescrição é a perda, em face do decurso do tempo, das pretensões punitiva e executória do Estado.
Como subespécie da prescrição da pretensão punitiva, a prescrição virtual ou em perspectiva leva em conta a pena que seria em tese
aplicada por ocasião da sentença, com fundamento na análise do tempo máximo previsto na tipificação do crime.
É possível o reconhecimento da prescrição antecipadamente quando, nos autos, houver demonstração inequívoca de que, mesmo
havendo condenação, em face da pena aplicada, esta resultaria sem utilidade. Insta reconhecer que desaparece o interesse de agir
do Estado quando o processo é utilizado para instrumentalizar o inócuo e para maquiar situações em que não há trabalho útil. Nessa
hipótese impõe-se o julgamento antecipado do feito, a fim de se prestar uma jurisdição útil, que atinja a sociedade. Mesmo após ter sido
afirmada a ação em juízo e viabilizado seu trâmite, pela inutilidade superveniente da situação processual, é de ser extinto o processo,
na medida da perda do interesse processual e do interesse público prevalente.
Compulsando os autos, constato que a presente ação penal foi instaurada no intuito de apurar a prática por parte da acusada da figura
típica prevista no art. 180, caput, do CP, que prevê pena de 01 (um) a 04 (quatro) anos de reclusão e atinge a prescrição da pretensão
punitiva em abstrato, em 08 (oito) anos, nos termos do art. 109, inciso IV, do Código Penal.
In casu, a denúncia foi recebida no dia 28 de junho de 2019 (ID. 96912859), última causa interruptiva da prescrição.
No caso de uma eventual condenação, a respectiva pena não ultrapassaria o mínimo legal, levando-se em consideração as circunstâncias favoráveis do art. 59 do Código Penal.
Não se observa a incidência, a priori, de circunstância agravante, de modo que a pena permaneceria no patamar da pena mínima
prevista abstratamente, ou seja, 01 (um) ano de reclusão.
Por fim, também se observa que não incidem causas de aumento ou de diminuição de pena, de modo que a pena definitiva permaneceria no mínimo legal.
Conforme prevê o art. 109, inciso V, do Código Penal, é de 04 (quatro) anos o prazo prescricional para infrações penais que a pena
máxima não exceda a 02 (dois) anos de detenção. Ademais, leva-se em consideração a diminuição em razão da menoridade relativa,
uma vez que ao tempo do crime a ré contava com 20 anos de idade (ID. 96912656), de modo que o prazo de prescrição seria reduzido
a metade, consoante art. 115 do Código Penal.
Isto posto, observa-se que não faz o menor sentido prosseguir na marcha processual, até mesmo emitindo édito condenatório, quando se sabe que a prescrição com o trânsito em julgado pela acusação contar-se-á pela pena concretamente aplicada, de modo que
haveria a incidência da prescrição retroativa, a culminar no reconhecimento tardio de que gastou-se muita energia estatal para que o
processo sequer tivesse uma sanção penal aplicada. Assim, o reconhecimento da prescrição em perspectiva encontra fundamento no
princípio da economia processual, uma vez que de nada adianta movimentar inutilmente a máquina jurisdicional com processos que
já nascem fadados ao insucesso, e nos quais, após condenar o réu, reconhece-se que o Estado não tinha mais o direito de puni-lo,
devido à prescrição.
Ademais, esta modalidade de prescrição é a solução mais adequada aos processos criminais absolutamente inúteis, não podendo,
com isso, alegar que a mesma é uma via para a descriminalização, pois, pelo contrário, busca-se, com a prescrição em perspectiva,
o afastamento da atuação penal repressiva, quando restar o processo carente de efetividade ou esvaziado da sua essência punitiva.
Por fim, insta salientar a ausência de efeito vinculante à súmula n° 438 do STJ que orienta no sentido de rejeição da aplicação do instituto da prescrição virtual, podendo o magistrado deliberar por entendimento diverso. Nesse sentido destaco julgado:
“PENAL E PROCESSUAL PENAL. PRESCRIÇÃO ANTECIPADA OU EM PERSPECTIVA. PROCESSO NATIMORTO. 1. Deve ser
reconhecida a prescrição de forma antecipada, tendo por referência, não o fato jurídico da pena aplicada, mas apenas a pena hipotética
ou em perspectiva, quando de logo se sabe, induvidosamente, que a sentença a ser proferida, se der pela condenação, não terá nenhuma eficácia. Hipótese em que, cessando o interesse de agir, de forma intercorrente, o processo revela-se tal como um “natimorto”.
2. Recurso improvido. (RCCR1997.34.00.026404-6/DF, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, DJ 24.06.2004, p. 12).”
Seguindo o mesmo entendimento, destaco o enunciado 12 do CONCRIM do Ministério Público:
“ENUNCIADO Nº 12: O órgão do Ministério Público poderá promover o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de
informação, bem como requerer o reconhecimento da extinção da ação penal, com fundamento na PROVÁVEL SUPERVENIÊNCIA
de prescrição que torne inviável a aplicação da lei penal no caso concreto, tendo em vista as circunstancias objetivas e subjetivas que
orientarão a fixação da pena. (Aprovação em 20.11.2015).”
Deste modo, é de se reconhecer a perda superveniente de interesse processual pelo órgão acusatório, a culminar na extinção do feito
sem exame do mérito, aplicando-se analogicamente o art. 485, inciso VI, do CPC, por meio da autorização constante do art. 3º do CPP.
Ante o exposto, acolho a promoção ministerial e EXTINGO O FEITO SEM EXAME DO MÉRITO, na forma do art. 485, inciso VI, do
CPC e no art. 61 do CPP, com base no enunciado 12 do CONCRIM, em decorrência da perda superveniente do interesse processual
do Estado-acusação, na forma da fundamentação supra.
Oficie-se ao CEDEP para as baixas de estilo.
Proceda-se as anotações e comunicações necessárias. Transitada em julgado, arquive-se cópia autêntica, dando-se baixa.
Ciência ao Ministério Público.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se.
TAPEROÁ/BA, data da assinatura eletrônica.
CIDVAL SANTOS SOUSA FILHO
Juiz de Direito
Maiane Oliveira de Santana
Estagiária de Direito