TJBA 04/03/2022 - Pág. 2007 - CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.050 - Disponibilização: sexta-feira, 4 de março de 2022
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Assim, diante da clara conjugação dos pressupostos insertos no art. 6º, VIII, do CDC, INVERTO O ÔNUS DA PROVA, detendo o réu
a absoluta suficiência técnica para a produção probatória e evidência da prestação do serviço de forma adequada aos preceptivos do
CDC.
Deixo de apreciar o pedido de concessão dos benefícios da ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA formulado pela parte autora.
Isto porque, em primeiro grau de jurisdição, é dispensado o pagamento de custas processuais, conforme dispõe o art. 54 da Lei nº
9.099/95, sendo a fase recursal o momento adequado para tal solicitação (§ único, do art. 54).
Ultrapassadas as questões preambulares, urge analisar o MÉRITO.
Insta definir, neste momento, a regra de julgamento no caso concreto como a estabelecida no art. 373, do CPC, cabendo à parte autora
a prova do fato constitutivo e à parte ré, a dos fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito da autora.
Capitaneada por essas premissas, no caso concreto, diante da análise dos elementos de informação encerrados nos autos, percebo
que a controvérsia gravita em torno da legitimidade da cobrança de tarifa.
Diante da análise dos elementos de informação encerrados nos autos, percebo que a parte autora assevera e comprova, através de
extrato colacionado no ID 96723729 , o lançamento de cobranças de tarifas por parte do réu.
A requerida, a seu turno, sustenta que tais cobranças são devidas. Entretanto, deixou de colacionar qualquer prova da contratação
do referido serviço, o que poderia fazer, por exemplo, pela apresentação do instrumento negocial assinado pelo demandante ou pela
gravação telefônica do momento do ajuste ou, ainda, por qualquer outro meio idôneo que viabilizasse o controle judicial do fato.
Verifica-se que, apenas após a audiência o réu trouxe aos autos o suposto contrato objeto da lide, conforme se verifica no ID 114306811
. Entretanto, esses novos documentos são extemporâneos, tendo em vista que se operou a preclusão temporal/consumativa. O art.
33 da Lei nº 9.099/95 é claro ao estatuir que “todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, ainda que não
requeridas previamente, podendo o Juiz limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias”.
Vê-se, pois, que o termo final para a produção probatória corresponde ao momento da audiência de instrução e julgamento, após a
qual somente será admitida a juntada de documento que espelhe fato novo ou não conhecido pelas partes quando da propositura da
ação ou contestação, a teor do art. 435 do Código de Processo Civil, o que não é o caso concreto.
Conhecer destes documentos após a audiência seria ofender frontalmente princípios básicos do processo, quais sejam, o do contraditório e ampla defesa, já que não se deu à parte contrária a oportunidade de refutá-lo.
Assim, não houve apresentação tempestiva do contrato entabulado entre as partes. Logo, o réu não comprovou a existência e validade
de sua contratação.
Destarte, não havendo prova da contratação entre as partes, presume-se favoravelmente à parte autora.
Com efeito, a responsabilidade da ré, como prestadora de serviço, na esteira do art. 14 caput do CDC, é de natureza objetiva, somente
podendo ser afastada por culpa exclusiva da vítima ou de terceiros, e não pelo fato da prática do ato por terceiro, que se vale das facilidades decorrentes da falta de cautela do fornecedor de serviços, na fase pré contratual e contratual.
Se terceiro agiu fraudulentamente, acredito que só o fez em face das facilidades ofertadas pelo próprio réu, que ao viabilizar métodos
menos burocráticos para realização dos contratos, não disponibiliza mecanismos irrefutavelmente seguros que impeçam ou dificultem a ação daqueles que fraudam. Nesse caso, aplicando-se o preceptivo do art. 14, caput do CDC, a empresa ré assume os riscos
decorrentes da forma facilitada de pactuação, sujeitando-se a suportar as consequências de eventual fraude praticada por terceiros,
mormente porque as regras e princípios do CDC impõem cautelas no sentido de resguardar o patrimônio e o moral dos consumidores.
No que tange ao dano moral, sabe-se que a doutrina e a jurisprudência majoritárias se alinham no sentido de que o prejuízo imaterial
é uma decorrência natural (lógica) da própria violação do direito da personalidade ou da prática do ato ilícito, caracterizando-se in re
ipsa, ou seja, nas palavras do festejado Sérgio Cavalieri Filho: “deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de modo que, provada
a ofensa... está demonstrado o dano moral” (Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Editora Malheiros. 2003. p. 99).
Mas, também pelo viés punitivo e da prevenção de danos, a repercussão da conduta da ré merece ser sancionada.
Perceba-se que o “paradigma reparatório”, calcado na teoria de que a função da responsabilidade civil é, exclusivamente, a de reparar
o dano, tem-se mostrado ineficaz em diversas situações conflituosas, nas quais ou a reparação do dano é impossível, ou não constitui resposta jurídica satisfatória, como se dá, por exemplo, quando o ofensor obtém benefício econômico com o ato ilícito praticado,
mesmo depois de pagas as indenizações pertinentes, de natureza reparatória e/ou compensatória; ou quando o ofensor se mostra indiferente à sanção reparatória, vista, então, como um preço que ele se propõe a pagar para cometer o ilícito ou persistir na sua prática.
Essa “crise” do paradigma reparatório leva o operador do direito a buscar a superação do modelo tradicional, a qual não se traduz no
abandono da ideia de reparação, mas no redimensionamento da responsabilidade civil, que, para atender aos modernos e complexos
conflitos sociais, deve exercer várias funções.