TJBA 04/04/2022 - Pág. 2181 - CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.071 - Disponibilização: segunda-feira, 4 de abril de 2022
Cad 4/ Página 2181
às vias ordinárias a pretexto de uma pseudocomplexidade da matéria seria curvar-se a um estratagema protelatório. Em suma,
incumbia à promovida demonstrar a absoluta complexidade da matéria a ensejar prova pericial; não evidenciada a hipótese,
impõe-se a análise do pedido autoral.
No mérito, sustenta a regularidade de sua conduta e defende a inexistência do dever de indenizar.
Compulsando os autos, verifica-se que a própria parte autora alegou que a energia elétrica já foi instalada em sua propriedade
após o ingresso judicial, portanto cumprida a obrigação de fazer. Todavia, o não fornecimento do serviço essencial ao longo dos
anos merece reparação extrapatrimonial.
Sendo a ré prestadora de serviço público, impõe-se a aplicação da responsabilidade objetiva, segundo a qual há o dever de
indenizar independentemente da existência de culpa da prestadora de serviço público, consoante determina o art. 37, § 6º, da
constituição federal.
Em relação aos danos morais, verifica-se que, no caso concreto, que há um problema afeto à prestação de serviço realizada pela
parte ré, haja vista que há tempos o acionante aguarda pela ligação da energia elétrica em sua residência rural. Por isso, os fatos
causaram ao consumidor indignação e transtornos que não se consubstanciam em meros aborrecimentos.
De sorte que no caso, o dano moral decorre do constrangimento, acrescido das privações e sofrimentos advindos da falta do
fornecimento de energia, considerando que a parte autora ficou privada do serviço de natureza essencial, pela desídia da ré.
As provisões de água, esgoto e energia elétrica consistem em serviços essenciais, devendo ser assegurados pela concessionária de serviço público ao cidadão, posto que necessários para a salvaguarda da dignidade humana e do direito à saúde, constitucionalmente previstos.
Cabe salientar que o não fornecimento de energia elétrica ultrapassa os limites do simples desconforto, pois trata-se de uma
utilidade absolutamente indispensável para a vida moderna, sendo presumíveis, portanto, os danos morais que daí emanam.
Assim também tem entendido os doutos tribunais:
APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SERVIÇOS DE ENERGIA ELÉTRICA. PROGRAMA DE UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO. DEMORA INJUSTIFICADA PARA O FORNECIMENTO.
AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO. O agravo retido interposto não merece ser conhecido, uma vez que inexiste nas
razões de apelação pedido de apreciação da irresignação. Inteligência do § 1º do artigo 523 do Código de Processo Civil. DANO
MORAL. CONFIGURAÇÃO. Sabe-se que o projeto de universalização do acesso ao fornecimento de energia elétrica (“ luz para
todos “) atende a uma ordem de prioridade e está condicionado à prévia análise da viabilidade técnica e econômica da companhia em realizá-lo. Apesar disso, na hipótese dos autos, a requerida não trouxe qualquer justificativa plausível para a excessiva
demora, de cerca de oito meses a partir do requerimento, para providenciar na ligação da energia elétrica na propriedade do
autor, notadamente quando havia rede elétrica nas proximidades de sua residência, evidenciando que a instalação era de fácil
acesso. Diante da privação da energia elétrica em uma residência, não há dúvida da configuração dos danos morais, os quais se
presumem, conforme as mais elementares regras da experiência comum. Condenação mantida. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
MAJORAÇÃO. Na fixação da reparação por dano extrapatrimonial, incumbe ao julgador, atentando, sobretudo, para as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar quantum
que se preste à suficiente recomposição dos prejuízos, sem importar, contudo, enriquecimento sem causa da vítima. A análise
de tais critérios, aliada às demais particularidades do caso concreto, conduz à majoração do montante indenizatório para R$
6.000,00 (seis mil reais), que deverá ser corrigido monetariamente e acrescido de juros moratórios, conforme determinado no ato
sentencial. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO APELO DA RÉ. PROVIMENTO DO APELO
DO AUTOR. (Apelação Cível Nº 70041350216, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Lessa
Franz, Julgado em 07/10/2011).
Assim, comprovada a relação de causa e efeito entre o comportamento do Réu e o dano experimentado pela vítima, devem ser
reparados os danos causados à parte autora.
A referida Corte de justiça (STJ) recomenda que as indenizações sejam arbitradas segundo padrões de proporcionalidade, conceito no qual se insere a ideia de adequação entre meio e fim; necessidade-exigibilidade da medida e razoabilidade (justeza).
Objetiva-se, assim, preconizando o caráter educativo e reparatório, evitar que a apuração do ‘quantum’ se converta em medida
abusiva e exagerada.
Certo também que a prática dos aludidos princípios de proibição ao exagero ou vedação ao excesso, tanto para mais, como para
menos, nos casos de indenizações tão irrisórias, que fiquem desprovidas de qualquer efeito pedagógico ou reparatório.
Hodiernamente, a convicção difundida por nossos Tribunais é no sentido de que a fixação do dano moral cabe ao prudente
arbítrio do magistrado, que deverá sopesar, dentre outros fatores, a gravidade do fato, a magnitude do dano, a extensão das
sequelas sofridas pela vítima, a intensidade da culpa, as condições econômicas e sociais das partes envolvidas, de forma a proporcionar ao ofendido uma satisfação pessoal, de maneira a amenizar o sentimento do seu infortúnio.
Quanto ao pedido da ré para a condenação por litigância de má-fé, alegando que em nenhum momento é comprovado que o
número de protocolo é referente a solicitação da parte autora e o que o mesmo é utilizado dolosamente para ajuizar diversas
ações com os mesmos pedidos e causas de pedir. Todavia, não restou caracterizada a má-fé, haja vista a ausência de seus
pressupostos configuradores. Destarte, ainda que a parte autora não tenha solicitado a execução do programa luz para todos,
por se tratar de serviço essencial, a privação do serviço não é razoável.
Diante do exposto, rejeito as preliminares e JULGO PROCEDENTE A AÇÃO e CONDENO a indenizar o requerente pelos danos
morais causados no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) com juros legais atuais desde a citação e correção monetária de
acordo com os índices oficiais atuais a partir da presente data.
Fica, desde já, a parte Ré INTIMADA a cumprir todo o disposto acima relativamente à obrigação de pagar quantia certa, no prazo
de 15 (quinze) dias, após o trânsito em julgado da sentença, sob pena de multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 52, III, da Lei nº 9.099/95 c/c o art. 523, § 1º, do Novo CPC e o Enunciado 97 do FONAJE.
Em atenção ao que dispõe o Art. 55 da Lei nº 9099/95, deixo de impor à parte sucumbente o pagamento de custas e honorários
advocatícios, porque não caracterizada a litigância de má-fé.
Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se.