TJBA 08/04/2022 - Pág. 1310 - CADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.075 - Disponibilização: sexta-feira, 8 de abril de 2022
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tuário/correntista, o que, por outro lado, em razão justamente da robustez dessa garantia, reverte em taxas de juros significativamente menores em seu favor, se comparado com outros empréstimos. 2.1 Uma vez ajustado o empréstimo consignado em folha
de pagamento, não é dado ao mutuário, por expressa disposição legal, revogar a autorização concedida para que os descontos
afetos ao mútuo ocorram diretamente em sua folha de pagamento, a fim de modificar a forma de pagamento ajustada. 2.2 Nessa
modalidade de empréstimo, a parte da remuneração do trabalhador comprometida à quitação do empréstimo tomado não chega
nem sequer a ingressar em sua conta-corrente, não tendo sobre ela nenhuma disposição. Sob o influxo da autonomia da vontade, ao contratar o empréstimo consignado, o mutuário não possui nenhum instrumento hábil para impedir a dedução da parcela
do empréstimo a ser descontada diretamente de sua remuneração, em procedimento que envolve apenas a fonte pagadora e a
instituição financeira. 2.3 É justamente em virtude do modo como o empréstimo consignado é operacionalizado que a lei estabeleceu um limite, um percentual sobre o qual o desconto consignado em folha não pode exceder. Revela-se claro o escopo da lei
de, com tal providência, impedir que o tomador de empréstimo, que pretenda ter acesso a um crédito relativamente mais barato
na modalidade consignado, acabe por comprometer sua remuneração como um todo, não tendo sobre ela nenhum acesso e
disposição, a inviabilizar, por consequência, sua subsistência e de sua família. 3. Diversamente, nas demais espécies de mútuo
bancário, o estabelecimento (eventual) de cláusula que autoriza o desconto de prestações em conta-corrente, como forma de
pagamento, consubstancia uma faculdade dada às partes contratantes, como expressão de sua vontade, destinada a facilitar a
operacionalização do empréstimo tomado, sendo, pois, passível de revogação a qualquer tempo pelo mutuário. Nesses empréstimos, o desconto automático que incide sobre numerário existente em conta-corrente decorre da própria obrigação assumida
pela instituição financeira no bojo do contrato de conta-corrente de administração de caixa, procedendo, sob as ordens do correntista, aos pagamentos de débitos por ele determinados, desde que verificada a provisão de fundos a esse propósito. 3.1 Registre-se, inclusive, não se afigurar possível - consideradas as características intrínsecas do contrato de conta-corrente - à instituição financeira, no desempenho de sua obrigação contratual de administrador de caixa, individualizar a origem dos inúmeros
lançamentos que ingressam na conta-corrente e, uma vez ali integrado, apartá-los, para então sopesar a conveniência de se
proceder ou não a determinado pagamento, de antemão ordenado pelo correntista. 3.2 Essa forma de pagamento não consubstancia indevida retenção de patrimônio alheio, na medida em que o desconto é precedido de expressa autorização do titular da
conta-corrente, como manifestação de sua vontade, por ocasião da celebração do contrato de mútuo. Tampouco é possível
equiparar o desconto em conta-corrente a uma dita constrição de salários, realizada por instituição financeira que, por evidente,
não ostenta poder de império para tanto. Afinal, diante das características do contrato de conta-corrente, o desconto, devidamente avençado e autorizado pelo mutuário, não incide, propriamente, sobre a remuneração ali creditada, mas sim sobre o numerário existente, sobre o qual não se tece nenhuma individualização ou divisão. 3.3 Ressai de todo evidenciado, assim, que o mutuário tem em seu poder muitos mecanismos para evitar que a instituição financeira realize os descontos contratados, possuindo
livre acesso e disposição sobre todo o numerário constante de sua conta-corrente. 4. Não se encontra presente nos empréstimos
comuns, com desconto em conta-corrente, o fator de discriminação que justifica, no empréstimo consignado em folha de pagamento, a limitação do desconto na margem consignável estabelecida na lei de regência, o que impossibilita a utilização da analogia, com a transposição de seus regramentos àqueles. Refoge, pois, da atribuição jurisdicional, com indevida afronta ao Princípio da Separação do Poderes, promover a aplicação analógica de lei à hipótese que não guarda nenhuma semelhança com a
relação contratual legalmente disciplinada. 5. Não se pode conceber, sob qualquer ângulo que se analise a questão, que a estipulação contratual de desconto em conta-corrente, como forma de pagamento em empréstimos bancários comuns, a atender aos
interesses e à conveniência das partes contratantes, sob o signo da autonomia da vontade e em absoluta consonância com as
diretrizes regulamentares expedidas pelo Conselho Monetário Nacional, possa, ao mesmo tempo, vilipendiar direito do titular da
conta-corrente, o qual detém a faculdade de revogar o ajuste ao seu alvedrio, assumindo, naturalmente, as consequências contratuais de sua opção. 6. A pretendida limitação dos descontos em conta-corrente, por aplicação analógica da Lei n. 10.820/2003,
tampouco se revestiria de instrumento idôneo a combater o endividamento exacerbado, com vistas à preservação do mínimo
existencial do mutuário. 6.1 Essa pretensão, além de subverter todo o sistema legal das obrigações - afinal, tal providência, a um
só tempo, teria o condão de modificar os termos ajustados, impondo-se ao credor o recebimento de prestação diversa, em prazo
distinto daquele efetivamente contratado, com indevido afastamento dos efeitos da mora, de modo a eternizar o cumprimento da
obrigação, num descabido dirigismo contratual -, não se mostraria eficaz, sob o prisma geral da economia, nem sequer sob o
enfoque individual do mutuário, ao controle do superendividamento. 6.2 Tal proceder, sem nenhum respaldo legal, importaria
numa infindável amortização negativa do débito, com o aumento mensal e exponencial do saldo devedor, sem que haja a devida
conscientização do devedor a respeito do dito “crédito responsável”, o qual, sob a vertente do mutuário, consiste na não assunção de compromisso acima de sua capacidade financeira, sem que haja o comprometimento de seu mínimo existencial. Além
disso, a generalização da medida - sem conferir ao credor a possibilidade de renegociar o débito, encontrando-se ausente uma
política pública séria de “crédito responsável”, em que as instituições financeiras, por outro lado, também não estimulem o endividamento imprudente - redundaria na restrição e no encarecimento do crédito, como efeito colateral. 6.3 A prevenção e o combate ao superendividamento, com vistas à preservação do mínimo existencial do mutuário, não se dão por meio de uma indevida
intervenção judicial nos contratos, em substituição ao legislador. A esse relevante propósito, sobreveio - na seara adequada,
portanto - a Lei n. 14.181/2021, que alterou disposições do Código de Defesa do Consumidor, para “aperfeiçoar a disciplina do
crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. 7. Ratificação da uníssona jurisprudência formada no âmbito das Turmas de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça, explicitada por esta Segunda Seção
por ocasião do julgamento do REsp 1.555.722/SP. 8. Tese Repetitiva: São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos
bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo
mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n.
10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento. 9. Recurso especial da instituição financeira
provido; e prejudicado o recurso especial da demandante. (REsp 1863973/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/03/2022, DJe 15/03/2022) Dano Moral Diante das provas produzidas nessa ação, entendo que
não houve ato ilícito cometido pelo banco capaz de ensejar danos na esfera moral do autor. Conclusão Ante os fatos aqui expostos e tudo mais que dos autos constam, julgo improcedentes pedidos constantes na inicial, por força da Tese firmada pelo STJ