TJBA 07/06/2022 - Pág. 1824 - CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.113 - Disponibilização: terça-feira, 7 de junho de 2022
Cad 4/ Página 1824
(foto da fase inquisitorial mostrada em audiência) que as vítimas reconheceram. Que tinha mais um indivíduo próximo à agência, no dia
dos fatos, que não conseguiram identificar. Que não foi mostrada apenas uma fotografia em fase inquisitorial. Que foram várias fotos.
Que quem tinha certeza da autoria da ação delituosa supostamente praticada por Raimundo Porfirio (conhecido como “Capitão”) era
Marcos, na época dos fatos. Que não se comunicavam por nomes, mas por apelidos. Que Marcos e Artemys informaram que todos se
dirigiam a Raimundo como capitão, como se fosse uma patente. Que José Davi ficou preso e depois de um tempo foi solto. Que não
sabe porque foi solto. Que não acompanhou o inquérito, por ser na cidade de Canudos. Que, no início, eram apresentadas a Marcos
todas as fotos dos indivíduos que cometiam ações delituosas com violência/relevância na região e ele sempre negava. Que quando
apresentou a foto de Raimundo Porfirio e José David, Marcos os reconheceu de imediato. Que não tem conhecimento de que José
Davi foi absolvido. Que ficou à frente da investigação. Que houve interceptação telefônica. Que o resultado da interceptação foi juntado
aos autos. Que através desta interceptação conseguiram obter a localização dos indivíduos (Canudos). Que ficaram perto de uma
represa. Que o reconhecimento foi feito através da visualização de várias fotografias. Que Marcos e Artemys foram bem incisivos em
afirmar que os autores eram Raimundo Porfirio e José Davi. Que o carro utilizado pelos indivíduos foi encontrado nas proximidades da
cidade de Canudos queimado, em local ermo.
(destaques acrescidos)
Particularmente sobre o último depoimento transcrito, proveniente do delegado de polícia, cabe uma breve ponderação: Marcos Evangelista, a própria vítima que o testigo reputa melhor conhecedora da identidade dos delinquentes, por tê-los apontado imediatamente,
ao ver as fotos, não teve a segurança necessária para ratificar, em juízo, a alegação da autoria de nenhum dos acusados.
Averbe-se, por fim, que o demandado refutou, na audiência de Id 86338404, a prática dos ilícitos penais que lhe são imputados, negativa esta que resiste ao contraste do frágil conjunto de provas sedimentado neste caderno eletrônico. In verbis:
Que não se recorda de onde estava na data dos fatos. Que não conhece José Davi. Que morou cinco anos na cidade de Bendengó,
cerca de 20km de Canudos. Que conhecia a estrada que liga Euclides da Cunha a Bendengó. Que trabalhava em firma na cidade de
Bendengó. Que morou entre 2000 a 2004 na cidade de Bendengó. Que conhece a BR 116. Que não sabe se a BR 116 dá acesso ao
Estado de Sergipe. Que para chegar em Sergipe precisaria passar na cidade de Ribeira do Pombal. Que em 2016 trabalhava na roça,
plantando frutas. Que faz muitos anos que não vai à cidade de Monte Santo. Que não participou da ação delituosa. Que foi para a casa
de um rapaz chamado Silvinho, para que, juntos, plantassem melancia na cidade de Canudos, mas não o encontrou em casa. Que
estava na praça, foi abordado e informou que não era da região, tendo sido preso juntamente com outros indivíduos. Que não tinha
carro na época dos fatos. Que, em 2016, residia no projeto Pedra Branca, município de Curaçá/BA, a cerca de 160km de Canudos.
Que chegou à cidade de Bendengó por meio de lotação. Que foi de moto para a cidade de Canudos. Que no momento em que foi
abordado não tinha nenhum pertence. Que foi levado a delegacia, conversou com o delegado e foi liberado. Que, em seguida, voltou
para Pedra Branca. Que tem um Sítio no estado de Pernambuco. Que foi preso no dia 18/07/2018, no Sítio Pocinho, Pernambuco.
Que tem antecedentes criminais, sendo que responde por ter dado carona a assaltantes de banco. Que foi sentenciado a 07 (sete)
anos. Que, em Sergipe, também responde processo por ter dado carona a assaltantes de banco, sendo que foi condenado a 02 (dois)
anos. Que a roça que possui é herança do pai. Que tem cerca de 06 (seis) hectares. Que não teve participação neste fato. Que, desde
2009, não tem contato com os assaltantes de banco. Que os conheceu em Salvador. Que estudou até a 4ª série. Que é casado. Que
tem 05 (cinco) filhos. Que os filhos são menores de idade. Que tem 53 (cinquenta e três) anos. Que os filhos dependem de sua renda.
Que sua esposa cuida da roça.
Imperioso concluir, destarte, que a narrativa ministerial carece de sustentação empírica robusta quanto ao envolvimento do acusado,
haja vista a escassez de signos de responsabilidade penal despontados durante o desenrolar do processo, sob o filtro do contraditório
e da ampla defesa.
Averbe-se que ao juiz não é dado constringir a liberdade pessoal, nota ontológica radical da existência humana, a partir de conjeturas
ou de um horizonte inseguro de probabilidades fáticas, correndo o risco de condenar um inocente. Daí porque incumbe à acusação
estatal a laboriosa tarefa de consolidar um arcabouço de provas convincente e consistente, o que não foi feito no presente caso, razão
por que se deve aplicar o princípio in dubio pro reo.
Destarte, diante da insuficiência do material probatório constituído nos autos, faz-se imperiosa a absolvição o réu em relação às infrações penais narradas na inicial acusatória, em atenção ao artigo 386, V e VII, do Código de Processo Penal.
Ante o exposto:
1) Julgo improcedente a pretensão estatal punitiva e absolvo Raimundo Profiro Neto da prática dos crimes previstos nos artigos 159,
§ 1º, e 288 do Código Penal (extorsão mediante sequestro qualificada e associação criminosa), com fulcro no artigo 386, V e VII, do
Código de Processo Penal.
2) Revogo a prisão preventiva do acusado e determino a expedição do competente alvará de soltura em seu favor, sem prejuízo de
outra eventual ordem de prisão em vigor, forte no artigo 386, parágrafo único, I, do Código de Processo Penal.
3) Sem condenação ao pagamento de custas [CPP, Art. 804], por ser o sucumbente isento.
4) Intimem-se as partes e as vítimas [CPP, Art. 201, § 2º].
5) Havendo recurso, façam-se os autos conclusos para juízo inicial de admissibilidade.
6) Caso contrário, decorrido o prazo recursal, certifique-se o trânsito em julgado e arquivem-se os autos.