TJBA 21/06/2022 - Pág. 3399 - CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.121 - Disponibilização: terça-feira, 21 de junho de 2022
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Exequente: Hemerson Cardoso Goncalves
Advogado: Aquila Silva De Almeida (OAB:BA39243)
Executado: Multimoveis Industria De Moveis Ltda
Advogado: Gabrielle Tesser Gugel (OAB:RS83212)
Executado: Mercadolivre.com Atividades De Internet Ltda
Advogado: Eduardo Chalfin (OAB:BA45394)
Intimação:
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE UAUÁ
Processo: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL n. 8000206-81.2022.8.05.0262
Órgão Julgador: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE UAUÁ
AUTOR: HEMERSON CARDOSO GONCALVES
Advogado(s): AQUILA SILVA DE ALMEIDA (OAB:BA39243)
REU: MULTIMOVEIS INDUSTRIA DE MOVEIS LTDA e outros
Advogado(s): EDUARDO CHALFIN (OAB:BA45394), GABRIELLE TESSER GUGEL (OAB:RS83212)
SENTENÇA
1 – RELATÓRIO
Relatório dispensado, conforme art. 38 da Lei n. 9.099/95. Passo a fundamentar e a decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Em síntese, narra a inicial que, em 23 de janeiro de 2022, adquiriu junto à primeira Ré, com intermediação da segunda Ré, 01 (um)
Rack c/ painel e suporte para TV, Retrô/Flórida, pela quantia de R$ 429,90. Afirma que o produto seria entregue no prazo estimado de
25.02.2022, no entanto, até a data do protocolo da inicial não havia sido entregue. Deste modo, requer a condenação das partes em
obrigação de fazer e danos morais.
O primeiro requerido Multimóveis Industria de móveis Ltda, afirma que realizou atendimento para o litígio e que apesar do atraso da
entrega ter sido motivado por culpa da Transportadora, assim que tomou conhecimento dos fatos, fez de tudo para agilizar a entrega.
Comunica que a entrega da mercadoria foi efetuada no endereço indicado pelo autor em 16/03/2022.
O segundo requerido, Mercado Livre, afirma resumidamente que é uma plataforma virtual de anúncios de produtos e que o único responsável pela entrega dos produtos é o vendedor.
2.1 DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO
Conclusos os autos, constata-se a hipótese do artigo 335, inciso I, do CPC, 2º parte, cabendo o julgamento antecipado, porquanto,
embora a questão de mérito seja de direito e de fato, não há necessidade da produção de novas provas.
2.2 PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA
No que tange à preliminar de ilegitimidade passiva suscitada, esta não merece prosperar, porquanto, tratando-se de vício de produto ou
serviço, a responsabilidade de todos aqueles inseridos na cadeia de produção, distribuição ou comercialização do produto ou serviço
é solidária.
Com efeito, o CDC, em seu sistema de proteção do consumidor, ao definir a figura do fornecedor em seu art. 3º, considera assim todos
os que participem da cadeia de fornecimento de produtos e da cadeia de fornecimento de serviços, em toda a sua complexidade, não
importando sua relação direta ou indireta, contratual ou extracontratual com o consumidor. Assim, define a responsabilidade solidária
do fabricante, produtor, comerciante, distribuidor e garantidores de assistência técnica, enfim, de todos os que desenvolvam atividades
tipicamente profissionais com certa habitualidade (fornecimento de produtos) e atividades de prestação de serviços (fornecimento de
serviços).
O reflexo do aparecimento plural dos sujeitos fornecedores é a solidariedade entre os mesmos, tratada nos Arts. 18 e 20., o fenômeno
da repersonalização desmaterializada do fornecedor ou pós-personalização, e a conexidade dos contratos, todos decorrentes, em
ultima ratio, do mandamento de proteção da confiança, oriundo da boa fé contratual e eticamente ligado ao anonimato das relações
sociais.
A solidariedade se faz imprescindível dada a nítida vulnerabilidade do consumidor frente a complexidade das relações entre os fornecedores que unem esforços e atividades para oferecer no mercado produtos e serviços muitas vezes de forma não visualizada pelo
consumidor. A propósito, Cláudia Lima Marques leciona
(...) O consumidor muitas vezes não visualiza a presença de vários fornecedores, diretos e indiretos, na sua relação de consumo, sequer tem consciência no caso dos serviços principalmente que mantém relação contratual com todos ou que, em matéria de produtos,
pode exigir informação e garantia dos produtos diretamente daquele fabricante ou produtor com o qual não mantém contrato. (...). A
nova teoria contratual, porém, permite esta visão de conjunto do esforço econômico de fornecimento e valoriza solidariamente a participação destes vários atores dedicados a organizar e realizar o fornecimento de produtos e serviços (...).
O fenômeno da pós-personalização resulta da observação na sociedade de massa de que a personalização do fornecedor praticamente desapareceu através de uma repersonalização através de símbolos, fazeres, condutas sociais, práticas comerciais ou da
própria organização da cadeia de fornecimento. É comum entes da cadeia de fornecimento apoiarem a marca de outros ou emprestar
nome comercial; veicular informação ou publicidade; organizarem mix de serviços; contratarem com o consumidor diretamente e organizarem os serviços credenciados ou autorizados. É um fenômeno complexo, pois ao mesmo tempo que a marca ou grupo importa
ao consumidor e faz parte das suas legítimas expectativas estar vinculado a este fornecedor, a verdadeira personalidade jurídica do
fornecedor não importa (pode se tratar de grupo de empresas, franqueado, comerciante individual...), o que importa é justamente a
marca. Tem-se, assim, um novo fator de garantia ao consumidor. A propósito, Cláudia Lima Marques leciona que a pós-personalização
trata-se aqui de uma reação à fluidez e à fragmentação cada vez maior das relações contratuais. A cessão de direitos ou da posição
contratual por parte do fornecedor, muitas vezes utilizada como técnica para poder modificar as cláusulas contratuais iniciais, pode
abalar o sinalagma funcional e afetar a realização das expectativas legítimas do consumidor.