TJCE 24/01/2019 - Pág. 783 - Caderno 2 - Judiciário - Tribunal de Justiça do Estado do Ceará
Disponibilização: quinta-feira, 24 de janeiro de 2019
Caderno 2: Judiciario
Fortaleza, Ano IX - Edição 2067
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decretada a prisão preventiva do acusado. O réu constituiu advogado. Mandado de prisão expedido no BNMP 2.0 em 30 de
maio de 2018. Na instrução, foram ouvidos a vítima, as testemunhas de acusação, realizado o interrogatório do acusado, que
confessou a prática descrita na denúncia e era menor de 21 anos na data do fato. A prisão foi relaxada por excesso de prazo em
01 de agosto de 2018 com alvará de soltura no BNMP 2.0. No entanto, o réu permanece preso por responder ação penal por
crime posterior ao praticado nestes autos. O Ministério Público, em sede de alegações finais, entendeu que o acusado deve ser
condenado pelo delito de furto qualificado pela escalada e repouso noturno, previsto no art. 155, §1º e §4º, II CP, haja vista a
prova da autoria e materialidade delitiva. A defesa requereu o reconhecimento da ausência de dolo de furtar do acusado, na
medida em que não era essa a sua intenção, pois já trabalhou junto com a vítima e só queria dormir no local. É o relatório. II
FUNDAMENTAÇÃO A presente ação é penal pública incondicionada, detendo o Ministério Público a necessária legitimidade
para o desenvolvimento válido e regular do processo, de modo que não havendo preliminares ventiladas, passo à análise do
mérito. A materialidade e autoria delitivas restam suficientemente caracterizadas nos autos, conforme inquérito de fl. 4/24, bem
como através dos depoimentos da vítima e das testemunhas, corroborados pelo interrogatório do acusado. Restou certo que a
vítima estava com seu comércio (bar) fechado, por volta de 01:00h da madrugada, mesmo local que servia de residência para a
vítima. Na madrugada, o acusado subiu o muro, destalhou o imóvel para adentrar no mesmo, no entanto ficou preso nos caibos
e ripas apertadas colocados pelo dano do estabelecimento. A vítima disse em Juízo que tinha medo de ser vítima de furtos e
roubos, por isso reduziu o espaço da madeira de seu telhado para não permitir a passagem de indivíduos com intenções ilícitas.
O acusado tentou passar pelo local e ficou com o corpo preso. Somente se desvencilhou com o apoio da Polícia Militar que foi
acionada. O furto não ocorreu, posto que o acusado restou preso no telhado. A tese da defesa é de que tal fato destelhamento
e bloqueio do réu constituiu ato preparatório ao crime de furto, o que seria impunível pela teoria adotada pelo Código Penal.
Ocorre que a tese não merece acolhida. De fato, o acusado concluiu todo o destalhamento de parte do bar e se imiscuiu no
telhado para ter acesso ao interior do mesmo, ou seja, iniciou a execução do crime de furto qualificado pelo rompimento de
obstáculo, mas que não o concluiu por circunstâncias alheias à sua vontade, uma vez que ficou preso no telhado. Quanto ao
rompimento de obstáculo, sobreleva observar que as testemunhas de acusação Harryson Cartney Alves Melo e Igor Silveira
Camerino, policiais que atenderam a ocorrência, disseram em Juízo que encontraram o réu preso nas madeiras do telhado,
quase sufocado, posto que seu tronco estava bloqueado pelas ripas, com dificuldade de respiração, chegando a pensar que o
mesmo iria falecer, caso o socorro não fosse logo prestado pela PMCE. O acusado confessou a autoria delitiva, afirmando,
inclusive a forma como destelhou o local. Em autodefesa, diz que não tinha a intenção de furtar, mas que apenas ia dormir no
local, pois já trabalhou para a vítima. Ora, o homem médio que quer dormir na casa de seu ex-empregador, pede autorização
para tanto e entre no local pela porta da frente. Jamais destalhando o imóvel como foi a hipótese dos autos. Tal fato faz cair por
terra a tese defensiva de ausência de dolo para o crime de furto. No que diz respeito ao furto no período de repouso noturno,
presente a causa de aumento, pois a tentativa criminosa foi cometida durante a madrugada e o local servia também de residência
da vítima que estava dormindo no local, o que permite a aplicação da qualificadora, segundo jurisprudência do STJ: Para a
incidência de causa especial prevista no §1º do art. 155 do Código Penal, é suficiente que a infração ocorra durante o repouso
noturno, período de maior vulnerabilidade para as residências, lojas e veículos, sendo irrelevante o fato de que o crime tenha
sido cometido em estabelecimento comercial que se encontrava fechado. Precedentes (REsp 1.191.065-MG, 5ª Turma, Rel.
Min. Gilson Dipp, Dj 17.04.2002). A autoria e a materialidade restaram provas pela prova oral colhida em Juízo, de modo que
resta a condenação do acusado. Não incidem na espécie quaisquer das causas excludentes da ilicitude (art. 23 do Código
Penal) ou da culpabilidade (arts. 20 § 1º, 21, 22, 26 e 28 § 1º do Código Penal). Portanto, restando comprovadas a tipicidade e
ilicitude do fato, acompanhadas da culpabilidade de seu autor, uma vez que é imputável, era-lhe exigível conduta diversa e tinha
plena consciência da ilicitude de seus atos. Destarte, perfazendo-se todos os elementos do conceito analítico de crime, exigese, como consequência, a aplicação da sanção penal no tocante ao réu. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO
PROCEDENTE o pedido formulado pelo Ministério Público do Estado do Ceará para condenar o acusado ALISSON FERREIRA
DE SOUSA, qualificado na denúncia, nas tenazes do art. 155, §1º e § 4º, II c/c art. 14, II do Código Penal. Por imperativo legal,
passo à dosimetria da pena considerando a situação pessoal do condenado. 1ª. Fase - Circunstâncias judiciais (art. 59 do
Código Penal) Vê-se que a culpabilidade é normal da espécie, nada se tendo a valorar, pois o acusado não agiu com dolo que
ultrapasse os limites da norma penal. Antecedentes criminais: não consta condenações penais anteriores. Conduta social, ou
seja, como o réu é visto em sociedade, é desfavorável, pois, quando adolescente, praticou diversos atos infracionais, conforme
certidão acostada à denúncia. Quanto à personalidade, deixo de avaliá-la como circunstância judicial, seguindo entendimento
do douto Jurista Rogério Greco, que afirma que o julgador não possui capacidade técnica necessária para a aferição de
personalidade do agente e que somente os profissionais de saúde é que, talvez, tenham condições de avaliar essa circunstância
judicial, concluindo, ainda, que a consideração da personalidade é ofensiva ao chamado direito penal do fato, pois prioriza a
análise das características penais do seu autor. Circunstâncias: comund do tipo. Motivos: não há como valorar Consequências:
sem maiores considerações. Comportamento da vítima: nada a considerar. Assim, com a ponderação própria do art. 59 do CP e,
considerando as circunstâncias judiciais narradas acima, fixo a pena-base em 2 (dois) anos de reclusão e 10 dias-multa. 2ª.
Fase - Circunstâncias legais Reconheço a atenuante da confissão espontânea, uma fez que o acusado admitiu os fatos tanto na
fase policial quanto na fase judicial, bem como da menoridade, posto que não tinha 21 anos na data do fato. Por sua vez, deixo
de aplicá-las, uma vez que a pena está no mínimo legal.. 3ª. Fase - Causas especiais de aumento e/ou diminuição de pena
Aplico a causa de aumento de pena do furto noturno (1/3) e a causa de diminuição do crime tentado (1/3). Ambas as causas se
anulam, devendo a permanecer a pena no patamar em que se encontra. Após o sistema trifásico, fixo definitivamente o teor da
pena de ALISSON FERREIRA DE SOUSA em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, cada dia no valor de um trigésimo
do salário mínimo vigente à época do fato, corrigido monetariamente. Fixo o regime de cumprimento ABERTO, em razão do art.
33, §2º, c, CP. Deixo de realizar a detração neste momento processual por ausência de certidão da unidade carcerária nos
autos. Considerando que a pena aplicada é inferior a 4 anos, que o réu não é reincidente e as circunstâncias judiciais,
SUBSTITUTO a pena privativa de liberdade por DUAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO (art. 44, §2º, CP), quais sejam
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE e LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA, a serem especificadas pelo Juízo da
Execução Penal. Considerando que o réu já se encontra em liberdade provisória nesta ação e que compareceu à audiência de
instrução, CONCEDO o direito de apelar em liberdade, devendo o alvará de soltura deixar de ser expedido posto que decretada
sua prisão preventiva por crime diverso na 1ª Vara de Crateús (Processo 0048218-45.2016.8.06.0070). Custas na forma da lei.
Extraia-se carta de guia de execução definitiva ou provisória, conforme o caso, observando-se o disposto nos artigos 105 à 107
da Lei n. 7.210/84, para o acompanhamento da execução da pena imposta, computando-se como cumprimento de pena o
período de prisão provisória. Após o trânsito em julgado da presente decisão, tomem-se as seguintes providências: (I) lance o
nome do condenado no Livro de Rol dos Culpados desta Comarca; (II) oficie-se à autoridade policial para inclusão da decisão
no INFOSEG; e (III) anote-se no Sistema Pólis do TRE-CE a condenação do réu, com sua identificação para cumprimento do
disposto pelo artigo 15, III, da Constituição Federal e pelo artigo 71, §2º, do Código Eleitoral. Oportunamente, arquivem-se com
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º