TJDFT 20/11/2018 - Pág. 1514 - Caderno único - Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios
Edição nº 219/2018
Brasília - DF, disponibilização terça-feira, 20 de novembro de 2018
mesma renda. Requer correção do valor da causa para R$ 1.166.000,00. Também destaca a impossibilidade jurídica de postulação genérica
contra o poder de polícia e defende a demolição imediata das edificações irregulares situadas em área pública, com espeque no art. 178 da
Lei 2.105/98, mesmo porque os autores não apresentaram qualquer autorização válida para a ocupação, situada em parcelamento irregular
do solo para fins urbanos. Finalmente, dizem que as construções dos autores não contaram com autorização de projeto e alvará por parte do
poder público, indispensáveis segundo o Código de Edificações. Em Réplica (ID 22139160), os autores repisam os argumentos trazidos na
inicial. As partes informaram não possuírem interesse na produção de outras provas (IDs 22862884 e 23344895) O Ministério Público pugna pela
improcedência dos pedidos formulados na inicial (ID 23545099). É o relatório. Decido. Preliminares: Impugnação ao Valor da Causa e Gratuidade
A demanda visa o estabelecimento de privilégio da isenção da fiscalização administrativa de construções ilegais. É evidente o proveito econômico
almejado nesta demanda correspondente ao valor do imóvel sobre o qual pretende a instituição do privilégio. Como se sabe, o valor da causa deve
corresponder ao proveito econômico pretendido pelo autor, sendo que tal requisito é estabelecido em norma de ordem pública, mormente porque
o valor da causa, entre outras funções, presta-se de base de cálculo para a definição das custas e dos honorários, em caso de sucumbência.
No caso dos autos, o valor fixado de R$ 1.000,00 é ínfimo e não corresponde ao proveito econômico pretendido. Em contrapartida, o valor
informado pelo réu com base no anúncio à venda de chácaras semelhantes naquela área, qual seja, R$ 1.160.000,00, não só é exagerado,
como especulativo. Portanto, na ausência de parâmetros precisos, considerando estarmos diante de 12 casas de população de baixa renda,
tendo em vista as profissões informadas na inicial por aquelas famílias, na maioria, agricultores, é razoável o montante de R$ 120.000,00 o
valor da causa. Em face do exposto, defino em R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) o valor da causa neste processo. Passo a examinar a
impugnação à gratuidade. O art. 98 do CPC estabelece que para alcançar os benefícios da assistência judiciária é suficiente a declaração do
interessado de que não dispõe de recursos para custear o processo sem prejuízo do sustento próprio ou da família. Tal presunção, contudo,
é relativa, cabendo ao Juiz analisar, pelas condições pessoais, como profissão (Resp 57.531-RS, Relator Ministro Vicente Cernicchiaro), local
de residência ou outras, se, de fato, estão reunidos os requisitos legais para a concessão do benefício (art. 2º, da Lei 1060/50). No caso em
exame, apesar do inconformismo da ré, não há elementos nos autos que infirmem a alegação de miserabilidade dos autores, razão pela qual
mantenho a decisão de ID 1877789 que lhes conferiu a gratuidade. MÉRITO O direito de construir é subordinado à função social da propriedade.
O atendimento à função social da propriedade, pressupõe, antes de mais nada, a harmonia entre o uso da propriedade e o ordenamento jurídico.
O ordenamento jurídico por sua vez, condiciona o direito de construir ao prévio licenciamento administrativo. Trata-se de exigência comezinha em
qualquer cidade, posto que tal exigência não decorre de capricho do legislador, mas de determinantes relacionadas à segurança, salubridade e
viabilidade das construções, respeito à ordem urbanística e ambiental, dentre outros interesses. A dispensa do licenciamento e acompanhamento
das construções pelas autoridades administrativas competentes é ato extremamente temerário, que no limite põe em risco a vida não só dos
que trabalham nas construções clandestinas, como também nos que se dispõe a residir nas edificações erguidas deste modo. Por isto é que a
Lei Distrital 2105/98 (Código de Obras e Edificações do DF- COE/DF exige, em seu art. 51, o licenciamento administrativo como condição para
se exercer o direito de construir. Sublinhe-se: sendo a licença condição para o direito de construir, aquele que não dispõe de licença prévia não
tem o direito de construir, realizando, pois, ato ilícito. A prática de ato ilícito provoca a sanção legal que é exatamente a resposta dada pela lei à
violação de conduta por ela prescrita. Dentre as sanções decorrentes da edificação ilegal, consta a da demolição, que pode se dar imediatamente,
ou seja, independentemente de qualquer procedimento administrativo prévio, tudo conforme o art. 178 do COE/DF. E bem verdade que a Lei
nº 13.465/17 institui mecanismos que facilitam os procedimentos de regularização das invasões e construções clandestinas, o que não significa
dizer que todas as invasões e construções com esse predicado convalidaram-se automaticamente pela mera edição da lei. A regularização da
titulação imobiliária não elide a vigência das normas edilícias, nem tampouco exime o ocupante do imóvel da obrigação de licenciamento para
construir. E nem poderia eximir, sob pena de se instituir para o ocupante ilegal privilégio que não é estendido ao proprietário regular e que também
é obrigado a obter licença antes de iniciar qualquer construção. Nesse contexto, o Judiciário não tem atribuição legal para regularizar construções
clandestinas, mas apenas exercer o controle de legalidade dos atos administrativos. Se a Administração reputa a construção ilegal e insuscetível
de regularização, não compete ao Judiciário ultrapassar a decisão administrativa, que é amparada pelo poder discricionário. Não se pode mais
tolerar a prática de invasões e construções clandestinas que se instalou como um câncer no Distrito Federal, se não pela simples necessidade
de se respeitar a lei e a ética, pela constatação de que tal prática vem ocasionando severos danos ambientais e urbanísticos na Capital, sendo
que a crise hídrica que a todos atinge é apenas a faceta hoje mais visível das nefastas conseqüências dessa conduta imoral e ilícita. Licença
para construir: exigência constitucional e infraconstitucional. Função social da propriedade. A propriedade não é direito ilimitado. Antes, sendo o
direito de propriedade exercido numa sociedade civilizada e que se pretende um estado democrático de direito, deve atender à sua função social,
conforme estipula a Constituição Federal (5º, XXII): "a propriedade atenderá à sua função social". É a mesma Constituição que esclarece que "a
propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor",
vale dizer, a função social atrela-se não somente a uma perspectiva de utilização econômica benéfica ou não lesiva a toda a coletividade, mas
sobretudo ao respeito ao ordenamento jurídico. É em decorrência da função social da propriedade que a lei civil condiciona o direito de construir
à observância dos normativos administrativos pertinentes: "o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o
direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos". Como se vê, o direito de construir é ínsito à propriedade, mas a liberação de seu exercício
prende-se à observância dos "regulamentos administrativos". A regulação administrativa do direito de construir, no Distrito Federal, subordinase à Lei Distrital n. 2.105/98 (Código de Edificações do Distrito Federal), que exige o prévio e indispensável licenciamento administrativo, como
condição para a construção de qualquer obra, em área urbana, rural, pública ou privada: "as obras de que trata esta Lei, em área urbana ou
rural, pública ou privada, só podem ser iniciadas após a obtenção de licenciamento na respectiva Administração Regional". Logo, ainda que a
ocupação da parte autora tivesse algum respaldo jurídico (o que não parece ser o caso) ou mesmo que fosse proprietária do imóvel, não estaria
automaticamente autorizada a erguer edificações ou alterar o estado de fato do bem. Toda e qualquer edificação deve ser previamente autorizada
pelo poder público competente, sob pena de ser considerada irregular, desafiando as sanções legais. Não há prova de que a edificação que
a autora pretende eximir da ação fiscalizatória tenham sido licenciada ou que tenha recebido carta de "habite-se". Se não está licenciada, a
obra desconforme se submete às sanções previstas no Código de Edificações do DF, em rigorosa igualdade de condições para com as demais
pessoas sob o império da lei brasileira. O exercício do poder de polícia na fiscalização das construções e intervenções urbanísticas (dentre outras
atividades socialmente relevantes) é atribuição elementar e legítima da Administração Pública. É atividade que só se submete ao estrito controle de
legalidade pelo Judiciário. Vale, então, a análise do ato administrativo aqui impugnado. Análise das condições de existência, validade e eficácia do
ato administrativo A Lei n. 4.717/65 estabelece a tipologia das causas de nulidade do ato administrativo, da seguinte maneira: Art. 2º. São nulos os
atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto;
d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes
normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma
consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade
do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica
quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido;
e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de
competência. Cabe, então, na aferição da validade da iminente operação de demolição das construções ilegais, analisar cada um dos requisitos
objetivos, o que se faz adiante. a. Competência A entidade ré teve sua criação, indicação de sua natureza jurídica e definição de competências
na Lei Distrital n. 4.150/08: LEI Nº 4.150, DE 05 DE JUNHO DE 2008. Publicação DODF nº 108, de 06/06/08 - Págs. 1 a 4. Dispõe sobre a
criação da Agência de Fiscalização do Distrito Federal e dá outras providências. O GOVERNADOR DO DISTRITO FEDERAL, FAÇO SABER
QUE A CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL DECRETA E EU SANCIONO A SEGUINTE LEI: CAPÍTULO I DOS OBJETIVOS Art.
1º Fica criada a Agência de Fiscalização do Distrito Federal - AGEFIS, autarquia sob regime especial, com autonomia administrativa e financeira,
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