TJSP 18/08/2009 - Pág. 2462 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Terça-feira, 18 de Agosto de 2009
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano II - Edição 536
2462
certidão: Decorreu “in albis” prazo para interposição de recurso de apelação - ADV CESAR AUGUSTO DE ARRUDA MENDES
JUNIOR OAB/SP 149876 - ADV VINICIUS DA SILVA RAMOS OAB/SP 121613
481.01.2008.000029-7/000000-000 - nº ordem 2/2008 - Procedimento Ordinário (em geral) - MITSU FUGIFARA X INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Fls. 189/197 - VISTOS. MITSU FUGIFARA ajuizou ação em face do INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, visando a contagem de tempo de serviço no período de 14.06.1960 A 30.04.1975,
pois trabalhou no meio rural, em propriedade da família. Postulou a procedência do pedido para reconhecer o período trabalhado
como rural, com a conseqüente condenação do réu ao fornecimento da respectiva certidão de contagem de tempo de serviço.
Juntou documentos (fls. 08-140). Deferidos os benefícios da assistência judiciária gratuita (fls. 141). O réu foi citado e apresentou
contestação às fls. 152-159. Alegou que os documentos apresentados são insuficientes para a comprovação do período
pleiteado, sendo inadmissível prova exclusivamente testemunhal. Requereu ainda improcedência lastreada no fato de que há
necessidade do recolhimento das contribuições previdenciárias para que seja efetuada a contagem. Aduziu que, no caso remoto
de procedência, somente deveria ser computado o período de 13.06.1964 a 30.04.1975, haja vista que antes disso o autor ainda
não tinha dezesseis anos, conforme exige o art. 9°, inciso VII, do Decreto 3.048/99. Réplica às fls. 162-164, refutando os termos
da contestação. O feito foi saneado (fls. 171). Em audiência de instrução foi colhido o depoimento pessoal do autor (fls. 183) e
ouvidas duas testemunhas (fls. 185-186) e as partes reiteraram seus argumentos anteriores. É O RELATÓRIO. DECIDO. O
pedido é procedente. Trata-se de ação, por meio da qual o autor pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço em que laborou
no meio rural em propriedade de seu genitor. Afirmou que trabalhou naquele local no período de 14 de junho de 1960 a 30 de
abril de 1975. O autor demonstrou pela prova oral e documental a veracidade de suas alegações, senão vejamos. Os documentos
de fls. 11 denotam que o genitor do autor era proprietário rural e que a propriedade rural produzia e comercializava a produção.
Destarte, existe início de prova documental no sentido de que o autor laborava no meio rural em propriedade da família. A prova
testemunhal, colhida em juízo, sob o crivo do contraditório, soou no sentido de que o autor residia e trabalhava no sítio de seu
pai e que naquele local não havia empregados contratados, isto entre 1960 e 1975, sendo que, no mesmo período, também
laborava para terceiros, na lavoura, como diarista. Desta forma, percebe-se que a prova não é exclusivamente testemunhal,
pois corrobora a prova documental, sendo de rigor a procedência do pedido deduzido na inicial. De outra parte não colhe a
assertiva do réu, no sentido de que necessário é o recolhimento das contribuições previdenciárias para que seja conferido à
parte o direito de ver declarado o tempo de serviço prestado no meio rural. Não é esse o entendimento que ressai dos artigos
122 e 123 do Decreto-lei n( 3.048/99 e 9(, inciso VII da Lei 8.213/91. Também não é o entendimento majoritário da jurisprudência
pátria, in verbis: “Art. 11, VII. Trabalhador rural. Tempo de serviço anterior à Lei 8.213/91. Contribuições previdenciárias.
Recolhimento. Comprovação. Aos segurados especiais rurais enquadrados no inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/91, em regime de
economia familiar, não é exigida a comprovação de recolhimento de contribuições, senão a prova da atividade rural anterior por
05 anos” (STJ - Rec. Esp. 177.381 - Rel. Min. Gilson Dipp - J. em 15/04/99 - DJ de 10/05/99 - Boletim Informativo da Juruá
221/18237). “Ao trabalhador rural enquadrado no inc.VII do art. 11 da Lei 8.213/91 não é exigido o número mínimo de
contribuições (carência) para obtenção da aposentadoria por idade estabelecida no art. 39, I, da referida Lei. A obrigatoriedade
da contribuição é substituída pela comprovação do exercício de atividade rural, em número de meses idêntico à carência do
referido benefício. Trabalho rural realizado em período superior a 44 anos, provado através da declaração do sindicato rural,
devidamente ‘homologada’ pelo Ministério Público, antes da vigência da Lei 9.063/95, e sem impugnação da autarquia apelante.
Satisfação das exigências legais” ( TRF 5ª Região - Ap. Cív. 105.897 - Rel.: Juiz Ridalvo Costa - J. Em 20/03/97 - Jurisprudência
Informatizada da Juruá 5/367). Por outro lado, no que concerne à idade do autor, em nada interfere na contagem do tempo de
serviço. Em 1960, vigorava a Constituição Federal de 1946, que, em seu art. 157, inciso IX, proibia o trabalho aos menores de
quatorze anos, com as exceções admitidas pelo juiz competente. Permitia a Carta que, analisando o caso concreto, o juiz,
verificando que o trabalho precoce era necessário para a sobrevivência do infante ou da família, flexibilizasse a norma proibitiva
(Oliva, José Roberto Dantas. O princípio da proteção integral e o trabalho da criança e do adolescente no Brasil. Editora LTr.
Abril. 2006). Como se percebe, à época, era proibido o trabalho aos menores de quatorze anos. A regra, assim como a atual
proibição constitucional de trabalho aos menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendizes, a partir dos quatorze,
visa, todavia, proteger a criança/adolescente e não tolher-lhe direitos. À luz da Constituição anterior, o Supremo Tribunal Federal
já havia se pronunciado, em julgamento no qual se reconheceu direitos previdenciários a menor de doze anos, no seguinte
sentido (extraído de: Oliva, José Roberto. Obra citada, páginas 187-188): “Está claro, ainda, que a regra do inciso X [da antiga
Constituição] do mesmo dispositivo constitucional - proibindo qualquer trabalho ao menor de doze anos [agora dezesseis] - foi
inscrita na lista das garantias dos trabalhadores em proveito destes, e não em seu detrimento. Não me aprece, assim, razoável
o entendimento da origem, que invoca justamente uma norma voltada para a melhoria da condição social do trabalhador, e faz
dela a premissa de uma conclusão que contraria o interesse de seu beneficiário, como que a prover nova espécie de ilustração
para a secular ironia summum jus, summa injuria. (STF, RE n. 104.654-6-SP - 2ª. T., em 11.3.86, v.u., Rel. Min. Francisco Rezek,
DJ 25.4.86). Em julgamento mais recente, Gilmar Ferreira Mendes, em voto que reconheceu o trabalho rural de adolescente
com menos de 14 anos para efeito de aposentadoria, fundamentou (extraído de: Oliva, José Roberto. Obra citada, página 190):
EMENTA: Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola, menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art.
11, VII, da Lei n. 8.213. Possibilidade. Precedentes. 3. Alegação de violação aos arts. 5º. , XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente.
Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento
similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, frança e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se
interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte. 4. Precedentes citados:
AgRAI 105.794, 2ª. T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 25.04.86. 5. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (STF AI 529.6941-RS - 2ª. T., em 15.02.2005, Rel. Min. Gilmar Ferreira Mendes apud TEMPO ...on-line, 2005, p. 1). Assim, o trabalho aos doze
anos de idade, devidamente comprovado, gera, inequivocadamente, efeitos previdenciários. Não se pode interpretar normas de
proteção em detrimento do protegido. Seria uma interpretação aberrante e de todo injusta, além de contrária ao espírito da lei.
Comentando a proibição constitucional, Oliva, na obra citada, ressalta com acerto que (páginas 184): Em última análise, declarar
a nulidade ex tunc seria o mesmo que desamparar justamente aquele a quem o legislador - constitucional e ordinário - visou a
proteger, fazendo com que a limitação de idade e condições de trabalho, que foram instituídas e favor da criança e do
adolescente, contra eles se voltassem ...” E acrescenta: Despudor mental talvez seja mesmo a designação mais adequada. É
semelhante ao que ocorre, por exemplo, quando o empregador exige a prestação de horas extraordinárias além dos limites
legais, invocando depois os preceitos limitadores de jornada (até duas horas diárias) para a limitação do pagamento. Pura
desfaçatez. Seria a consagração o absurdo acolher tese tão despropositada. Como se oporia ao bom senso e à razão obstar o
pagamento de direitos à criança ou adolescente, pelo fato de ter realizado trabalho proibido, pois as normas devem ser
interpretadas em favor daqueles aos quais protegem (fl. 185). Ante todo o exposto e o mais que destes autos consta, JULGO
PROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial da ação movida por MITSU FUGIFARA em face do INSTITUTO NACIONAL DO
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º