TJSP 16/09/2010 - Pág. 1709 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quinta-feira, 16 de Setembro de 2010
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano III - Edição 797
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inadimplente frente ao autor, discordando, no entanto, do montante devido. Ora, considerando não ser exigível, de quaisquer
dos litigantes, a comprovação de fato negativo, não há que se exigir da parte autora a demonstração da não efetivação dos
pagamentos devidos por força da contratação firmada. Mesmo porque, o próprio requerido admite o débito, limitando-se a
questionar o montante devido, diga-se, aliás, de forma genérica. Muito embora tenha sido juntado o contrato, os extratos de
evolução do débito, bem como memória de cálculo pelo autor, o réu, de sua parte, não fez qualquer apontamento concreto em
relação a tais documentos. Não se verifica a cobrança de qualquer encargo extorsivo, sendo certo que o réu se limitou a ventilar
tal possibilidade, deixando, entretanto, de indicar, com precisão, quais os índices que teriam sido aplicados de forma abusiva,
omissão esta que retira toda a plausibilidade da tese aventada. Os Embargos não esclarecem qual o valor cobrado em excesso
pelo banco réu, nem discrimina os valores tidos como devidos, apenas faz alegações esparsas de cobrança de juros abusivos,
capitalização indevida, prática de anatocismo, tecendo considerações sobre aplicação do Código de Defesa do Consumidor.
Nenhum documento ou cálculo foi apresentado junto aos embargos para indicar a este juízo a veracidade das alegações iniciais,
limitando-se os embargantes a tecer considerações genéricas. Pugnou a parte requerida pela realização de perícia contábil, não
obstante, desnecessária sua elaboração neste caso, visto que o debate resume-se apenas a questões de direito. E, neste caso,
“Se a parte discute teses de direito, afastadas pela decisão judicial, desnecessária perícia contábil.” (LEX - JTACSP - Volume
179 - Página 399). Observa-se que as partes são maiores, capazes de contratar, não sendo razoável qualquer alegação no
sentido de se desconhecer o conteúdo e as conseqüências do contrato, bem como do real valor devido. Ademais, cabia ao
embargante elidir a pretensão do embargado com provas documentais que demonstrassem eventuais ilegalidades no contrato
firmado entre as partes, o que não ocorreu, podendo-se observar que a defesa não vem acompanhada de prova neste sentido.
Consigno, ainda, que para impugnar os extratos de movimentação financeira, bem como os cálculos do banco, bastava a parte
contrária trazer aos autos outros cálculos aritméticos que os refutassem; porém, nada fez a respeito. No tocante à aplicação do
Código de Defesa do Consumidor aos Bancos, a questão é pacífica na doutrina e jurisprudência no sentido de sua aplicação,
reconhecendo-se as instituições financeiras como fornecedores de serviços. Todavia, a despeito do enquadramento da relação
contratual entre as partes às normas do CDC, no caso em exame a ação não pode prosperar, na medida em que não há prova
alguma de que o banco demandado tenha cometido qualquer irregularidade, ilicitude ou abuso, inexistindo onerosidade
excessiva, desequilíbrio contratual ou prática lesionaria, até porque o banco réu não se aproveitou, de forma intencional, da
inexperiência, necessidade ou fraqueza da outra parte. No que toca aos juros remuneratórios, diga-se: os contratos bancários
são regidos pela Lei n( 4.595/64 e pelas normas editadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil, não
se aplicando os preceitos da denominada Lei de Usura (Decreto n( 22.626/33), especialmente a norma do art. 1(, que veda a
estipulação de taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal. A questão é pacífica e ainda prevalece o teor da Súmula n( 596
do STF, “verbis”: “As disposições do Decreto n. 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas
operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional”. Além disso, desde a
Emenda Constitucional n º 40, de 29/05/03, já não incide a norma do art. 192, § 3º, da CF/88, que limitava os juros reais a 12%
ao ano. De todo modo, mesmo antes já era pacífico o entendimento que aquela norma não era auto-aplicável, dependendo sua
incidência de lei complementar que regulamente o sistema financeiro nacional. Vale dizer, ainda, que a recém editada Súmula
Vinculante nº 7 traz a seguinte redação: “A norma do § 3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional
nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar”
(D.O.U de 20.06.2008). Logo, deve prevalecer o princípio maior da boa-fé objetiva no cumprimento do contrato firmado nos
moldes em que se encontra (art. 422, do Código Civil), valendo dizer que os requeridos, ao que consta, não promoveram
qualquer ação para revisão contratual, caindo em inadimplência frente ao banco credor, vindo agora a pretender discutir as
cláusulas contratuais nos presentes embargos. Quanto à capitalização de juros, competia ao embargante, ao menos, apontar
elementos que indicassem tal prática pelo banco. Sem esta prova, pouco há para dizer, a não ser que desde a edição da Medida
Provisória n º 1963, a partir de sua 17ª edição, em 30/03/00, é possível a capitalização de juros em periodicidade inferior a um
ano, ex vi do disposto no art. 5º daquele diploma legal: “Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema
Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”. Colocada a questão em outros
termos, mesmo sabendo, o embargante, que os juros do mercado financeiro são livres e elevados, tomou dinheiro junto ao
banco. Certamente o fez de forma consciente, não demonstrando, em momento algum, que não tivesse conhecimento do
mercado financeiro (vale dizer, que era inexperiente) ou que estivesse em situação de estado de necessidade. Em relação aos
juros moratórios, também não incide o limite da Lei de Usura, prevalecendo a taxa que tiver sido pactuada pelas partes nos
contratos firmados, até o limite de 12% (doze por cento) ao ano. Neste ponto, pode-se visualizar pelos cálculos apresentados
com a inicial (fls. 36 e 37), que a taxa de juros aplicada pelo banco não excedeu a 1,5% ao mês em relação aos remuneratórios,
e não foi de 1% para os moratórios. Portanto, dentro dos parâmetros do mercado financeiro. Por outro prisma, entendo que não
cabe ao Poder Judiciário a intromissão no sistema financeiro, a ponto de interferir nos lucros e suas respectivas margens. Se o
spread é exagerado, não cabe ao Juiz, a seu talante, dizer qual deve ser o adequado. O mercado deve funcionar de forma livre,
obedecendo a suas próprias regras e sob controle do Conselho Monetário Nacional e não do Judiciário. Volta-se ao que acima
foi dito: o embargante não foi obrigado a contratar e se utilizar dos limites postos à sua disposição. Assim agindo, sujeitou-se às
regras convencionadas. Demais disso, a proteção do contratante mais fraco na legislação consumerista, com direito à revisão
dos contratos nos casos de adoção de práticas e cláusulas abusivas (art. 6º, IV do CDC), lesão ao consumidor (art. 6º, V do
CDC) e onerosidade excessiva decorrente de fatos supervenientes (art. 6º, V, in fine, do CDC), não pode ser encarada como um
direito potestativo, ou em termos menos jurídicos, como um verdadeiro cheque em branco concedido ao consumidor. Ao
contrário, a revisão contratual no CDC além de não prescindir da precisa comprovação das hipóteses previstas no Código, deve
ser interpretada em consonância com os princípios maiores da proteção ao ato jurídico perfeito e da segurança jurídica. Assim,
a incidência do CDC não altera o fato de que inexiste limitação legal para a taxa de juros remuneratórios quando exigida por
bancos. Ademais, cumpre reiterar, a questão da limitação há muito foi superada, não se sujeitando as instituições financeiras ao
Dec. 22.626/33. Ainda que exigidos juros capitalizados, não há abusividade a ser reconhecida, porque permitida a prática em
contratos firmados após a vigência da MP n.º 1.963-17/2000, exatamente a hipótese em tela. Enfim, de bom alvitre consignar
que a alegação reiterada nos Embargos de que os valores exigidos pelo réu “estariam carregados de encargos ilegais” e que
devem ser “declaradas nulas as cláusulas que são excessivamente onerosas”, sem maiores especificações, configura comodismo
inaceitável, que não pode ser tolerado. Vale, ainda, trazer à baila a súmula n.º 381 do STJ: “Nos contratos bancários, é vedado
ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.” Por todas as razões acima expostas os embargos são
improcedentes, devendo o réu. Diante do exposto e do mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTES os embargos
monitórios, e JULGO PROCEDENTE a presente ação monitória, nos termos do art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil,
para condenar o requerido-embargante FABIO JOSÉ LOZANO ME a pagar ao requerente BANCO SANTANDER S/Aa quantia de
R$78.503,29 (setenta e oito mil quinhentos e três reais e vinte e nove centavos), com juros de mora de 1% ao mês e correção
pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça de São Paulo, tudo a partir da citação. Sucumbente, o requerido fica, ainda, condenado
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º