TJSP 03/12/2010 - Pág. 1416 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Sexta-feira, 3 de Dezembro de 2010
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano IV - Edição 846
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danos causados aos consumidores. Dessa forma, deverá ser mantida no pólo passivo da demanda. No mérito, ressalto que a
relação objeto da presente demanda é de consumo e como tal, perfeitamente aplicável as normas protetivas do Código de
defesa do consumidor. Informalmente ouvido em juízo, o autor alegou que os colchões que lhe foram entregues possuem as
mesmas características daquele constante no mostruário da ré, não havendo defeito em relação ao produto. Entretanto, notou
que o colchão recebido, apesar de possuir as mesmas características do exposto na loja, não se tratava do mesmo colchão,
afirmando categoricamente que o constante na loja era mais confortável e macio. O técnico da empresa ré, Techfoam foi à casa
do autor examinar os colchões que lhe foram entregues e constatou que possuem as mesmas características daquele exposto
na loja. Indagado sobre a disparidade de conforto alegada pelo autor mencionou que não houve modificação no processo de
confecção do produto, sendo utilizado o mesmo material. Alegou que talvez a disparidade mencionada seja ocasionada pelo fato
de o colchão exposto na loja ter sido produzido há mais tempo do que aquele entregue ao autor. Mesmo não havendo modificação
na matéria-prima empregada, em virtude do colchão ficar exposto na loja e de os clientes se sentarem e se deitaram
constantemente para experimentar o produto, tal fato leva a um amaciamento do colchão. Acrescentou que o uso leva ao
amaciamento do sistema interno do colchão, que se acomoda. Entretanto, todo colchão possui uma vida útil, e, dessa forma, o
uso pode levar a deformidades. A testemunha, ouvida como informante do juízo, esclareceu que quando decidiu comprar o
colchão, foi juntamente com seu marido fazer pesquisa de mercado e obteve preço inferior em relação ao mesmo produto numa
loja localizada no Jabaquara. Entretanto, optou por comprar na loja da ré, localizada em São Caetano, pois ao experimentar o
colchão notou que aquele exposto na ré era mais macio e, portanto, mais confortável. Acrescentou que na loja do Jabaquara
sequer havia colchão exposto, tendo o atendente que buscá-lo no estoque. Por fim, mencionou que o colchão que lhe foi
entregue em sua casa é igual àquele existente na loja do Jabaquara, a qual a depoente e o autor recusaram, apesar de possuir
preço inferior, por entenderem que o da loja ré lhe trazia mais conforto. O representante da techfoam ao ser ouvido em juízo
mencionou que o colchão adquirido pelo autor é vendido tanto para a ré Eskina colchões, quanto para a alegada loja localizada
no Jabaquara. Ocorre que as lojas possuem sistemas de exposição diversos. Na loja do Jabaquara os colchões ficam
acondicionados em plásticos, enquanto que na loja da ré ficam expostos aos clientes sem qualquer tipo de proteção. Assim, a
constante exposição à luz e poeira acarretam modificação na tonalidade do tecido. Além disso, o fato de os clientes se sentarem
e deitarem para experimentar o produto faz com que gere o amaciamento do mesmo. Dos argumentos expostos em juízo, é
possível concluir que não há defeito no produto entregue ao autor. A disparidade de conforto alegada não advém do processo de
fabricação do produto, já que o técnico, bem como o representante do fabricante, alegaram que não há qualquer modificação na
matéria prima empregada. Apesar de afirmarem tratar-se do mesmo produto, as rés não afastaram a disparidade de conforto
alegada pelo autor, esclarecendo que tal possibilidade advém do fato de que o colchão já estava exposto na loja há meses e o
constante uso pelos clientes, que ao experimentá-lo deitam-se e sentam-se no mesmo acarreta um acomodamento da estrutura
interna levando à maior maciez. Soma-se isso a exposição à luz e poeira. Restou comprovado pelas provas produzidas que não
há defeito no processo de fabricação do produto, sendo a disparidade de maciez em virtude do constante experimento do
produto na loja pelos clientes. Desse modo, entendo que a ação deve ser julgada improcedente em relação à fabricante
Techfoam, já que não se vislumbrou qualquer defeito atribuído a seu processo de fabricação. Em relação às rés Skina colchões/
Night & Day tem-se que a disparidade de conforto existente decorreu do fato de que o autor experimentou produto exposto
há meses na loja e, pelo constante uso dos clientes, o colchão estava acomodado e mais macio, proporcionando a quem o
experimentasse maior conforto. Evidentemente, o produto entregue ao autor encontra-se mais rijo em razão do não uso. Ocorre
que essa disparidade de conforto, apesar de não representar defeito, está em desconformidade com o produto que o autor
experimentou e aprovou na loja, pelas razões já explicitadas. Ao contrário da alegação da ré Skina, o conhecimento de que o
uso pelos clientes gera maior maciez no produto, não pode ser atribuído ao homem médio, já que na órbita da relação de
consumo, o consumidor não está em pé de igualdade em relação ao comerciante que detém todas as informações em relação
ao produto que expõe à venda. Assim, entendo que houve falta de informação ao autor nesse ponto, já que este adquiriu o
produto na crença de que aquele que lhe seria entregue, seria tão confortável quanto o exposto na loja. Caberia ao vendedor da
ré esclarecer que o colchão que seria entregue ao autor, num primeiro momento, não seria tão macio quanto o exposto, já este,
devido ao constante uso, encontrava-se amaciado, mas que posteriormente, conforme o uso, o produto se amoldaria acarretando
mais maciez e conforto. Sob esse aspecto, houve violação ao dever de informação previsto no art. 6º do CDC. E ainda, violação
da boa-fé objetiva (regra de conduta ética imposta aos contratantes), no que tange ao dever anexo de informação nas relações
contratuais. A violação da boa-fé objetiva acarreta, segundo Judith Martins Costa, a violação positiva do contrato. Embora tenha
havido o cumprimento da obrigação principal, entrega do produto com as mesmas características do adquirido houve violação
de dever anexo notadamente, em relação à informação. Caso houvesse a devida informação no caso concreto, talvez o produto
sequer teria sido adquirido pelo autor, ou adquirido em outra loja, ou ao menos, adquirido consciente de que só com o uso, o
produto ficaria a contento do autor. De acordo com a doutrina moderna a violação dos deveres anexos do contrato constitui
espécie de inadimplemento que independe de culpa, logo há responsabilidade objetiva. Assim, é possível obter a resolução do
contrato não apenas por violação da obrigação principal (dar, fazer, entregar), mas também em relação aos deveres laterais ou
implícitos que possuem igual exigibilidade jurídica e originam-se da boa-fé objetiva, princípio basilar do novo Código Civil e que
também encontra fundamento no CDC. Por entender que houve violação do dever de informação, o contrato com a ré Skina/
Night & Day colchões deve ser rescindido, cabendo à mesma a devolução do valor dos cheques sacados em seu favor no
valor de R$ 2.700,00 (dois mil e setecentos reais), já que referidos cheques foram endossados à Losango, com a conseqüente
devolução dos colchões pelo autor, devendo a ré providenciar a retirada dos mesmos da residência do autor em dia e hora
previamente combinado entre as partes. Ressalto que a devolução do valor pela ré deve ser integral, pois houve o endosso dos
cheques à Losango, terceira de boa-fé. Assim, como os cheques não estão em poder a ré Skina, a devolução deve ser total.
Ademais, pelo fato de que a ré losango poderá voltar-se contra o autor, emitente do cheque e, até mesmo, contra a ré, já que
endossante do título, caso em que esta poderá voltar-se em regresso contra o emitente. Já quanto ao pedido de dano moral por
propaganda enganosa, entendo que este não deve prosperar, haja vista não ter havido qualquer publicidade enganosa pela ré
com relação às características do produto, pois estas correspondiam àquele entregue ao autor. Houve na hipótese, falta de
informação quanto à maciez, ante ao fato de estar exposto ao constante uso dos clientes. A publicidade enganosa, que não se
confunde com a propaganda enganosa, sendo que aquela, somente se caracteriza na hipótese do art. 37 do CDC, o que não é
o caso dos autos. Pelo que se verificou o autor efetuou o pagamento dos produtos que adquiriu junto à ré Skina colchões/ Night
& Day por meio de cinco cheques no valor de R$ 540,00 (quinhentos e quarenta reais). Ocorre que tais cheques foram
endossados à ré Losango, conforme autorizado pelo autor na nota fiscal de fls. 68. Pela disciplina que rege os títulos de crédito,
do qual o cheque faz parte, quando há o primeiro endosso, o título se abstrai da relação jurídica originária e deve ser honrado
pelo emitente junto ao terceiro de boa-fé. Trata-se do sub-princípio abstração. Assim, eventuais vícios ou defeitos existentes na
relação originária não contaminam as relações subseqüentes. Disso se extrai que ainda que o produto, objeto da negociação
que deu origem a emissão do título esteja viciado, isto não exime o sacador de honrá-lo junto aos terceiros de boa-fé, como é o
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º