TJSP 12/08/2013 - Pág. 1704 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Segunda-feira, 12 de Agosto de 2013
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano VI - Edição 1474
1704
‘Confiança e consciência que só podem existir quando alicerçadas nas normas morais a que deve estar vinculado o advogado’
(in A ÉTICA PROFISSIONAL E O ESTATUTO DO ADVOGADO, SP, 4a ed. LTR, SP., 1991, p. 57) VI. Assim, de par à exegese da
lei adjetiva (art. 339) e, desde PEDRO BAPTISTA MARTINS, em lúcido magistério, provém a lição de que ‘Há uma constante na
legislação de todos os povos e que se tem manifestado em todos os momentos históricos: a preocupação de prevenir ou reprimir
a atividade maliciosa ou fraudulenta dos litigantes’ (cf O ABUSO DO DIREITO E O ATO ILÍCITO, 3a ed. Forense, 1997, p. 65) De
notar-se que as lições retro e supra transcritas, refletindo posição doutrinária do próprio Direito Português, fazem salientar
adequado escólio de FERNANDO LUSO SOARES que, em obra maiúscula sobre tal tema, houve por bem transcrever V. acórdão
da SUPREMA CORTE DE LISBOA, que decidiu ‘Relativamente à má fé material de que se trata, tem a doutrina considerado má
fé material ou dolo material os casos de dedução de pedido ou oposição cuja falta de fundamento se conhece, e a alteração
consciente da verdade dos factos ou a omissão de factos essenciais, e má fé instrumental ou dolo instrumental aquele que
respeita ao uso reprovável do processo, ou dos meios processuais para conseguir um fim ilegal, para entorpecer a acção da
justiça ou para impedir a descoberta da verdade (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Lisboa, de 9 de dezembro de
1975, BMJ. 252, 105)’ (cf. A RESPONSABILIDADE PROCESSUAL CIVIL. Ed. ed. Livraria Almedina, Coimbra, 1987, p. 189)
(...)”. Assim, contribuindo decisivamente para a configuração da litigância de má-fé (má-fé material) ou a praticando como
estratégia resultante de sua livre opção (má-fé instrumental), deve o profissional da advocacia responsabilizar-se,
respectivamente, de forma solidária ou exclusiva. Nada obstante respeitáveis entendimentos em contrário, a prática revela que
nem sempre se vislumbra utilidade ou mesmo justiça no condenar-se exclusivamente o jurisdicionado leigo em decorrência de
desobediência ao comando das disposições contidas nos arts. 14 e 17 do Código de Processo Civil, como já se observou, com
muita propriedade: “Sancionar a parte sem sancionar o patrono é conduta que a nada leva; pune quem nada fez e protege quem
fez, mas não devia ter feito; e deixa no julgador um sabor de injustiça, por saber que a parte o mais das vezes desconhece o que
se faz em seu nome e acaba pagando com dinheiro próprio o malfeito do outro” (TJSP - Agravo Interno nº 89.806.5/6-02 Rel.
Des. Torres de Carvalho). Afirma-se que não se vislumbra utilidade ou justiça em condenações que têm por mira exclusivamente
o jurisdicionado leigo e explica-se: (a) não há utilidade porque se “A” pratica conduta abusiva e desleal e “B” sofre a sanção
processual daí decorrente, é justo supor que “A” não ver-se-ia motivado a alterar seu comportamento; (b) igualmente não se
vislumbra justiça porque, adotado o mesmo exemplo, “B” seria condenado pelo malfeito de outrem, situação que revela
responsabilidade objetiva do jurisdicionado pelo ilícito, muito embora, nesses casos, sequer compreenda o que se passa.
Malgrado proferido em outro contexto, inspira reflexão o raciocínio assim expendido: “O advogado que, atuando de forma livre e
independente, lesa terceiros no exercício de sua profissão responde diretamente pelos danos causados” (STJ, REsp 1.022.103/
RN Rel. Min. Nancy Andrighi). Já se teve oportunidade de se sustentar a desnecessidade de atividade legislativa a respeito,
consoante artigo publicado na Escola Paulista da Magistratura, sob o título “Condenação solidária de advogado com cliente em
lide temerária e o Projeto de Lei nº 4.074/08” (disponível no sítio da EPM na Internet, Seção de Artigos, nº 228), para o qual ora
se remete a atenção do leitor para eventual consulta, evitando-se a prolixidade e o vício da tautologia. E assim se sustenta,
porque, data venia, cuida-se de matéria de conteúdo eminentemente jurisdicional, como, bem a propósito, vem reconhecendo o
Egrégio Tribunal de Justiça Bandeirante: “(...) De sorte que, constatada a má-fé processual, por ela respondem a parte e seus
advogados, nos moldes do artigo 14, do Código de Processo Civil, cc. parágrafo único do art. 32, do Estatuto do Advogado e art.
17, cc. art. 18, ambos do Código de Processo Civil (...)” (Agravo de Instrumento n° 7.063.767-7 Rel. Des. Souza Lopes j.
1º.8.2007). Confira-se, ainda: Apel. n° 562.340.4/5 Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani; Agravo n° 7.295.859-1 Rel. Des. Jacob
Valente; Apelação 193.682.4/0-00, Rel. Des. Grava Brazil, j. 27.07.2005; Embargos de Declaração n.° 261.880.4/6-01 Rel. Juiz
Antonio Marcelo Cunzola Rimola j. 14.11.2008; Apel nº 842.579.5/0-00 - Rel. Des. Urbano Ruiz; Agravo Interno nº 689.806.5/602 Rel. Des. Torres de Carvalho; Embargos de Declaração nº 157.183-0/7-01 Rel. Des. Viana Santos; Apel. nº 854.914.5/2-00
Rel. Des. Pires de Araújo; Embargos de Declaração n.° 7.252.575-6/01 Rel. Des. Araldo Telles J. 3.3.2009; Embargos de
Declaração n° 542.448.4/5-02 - Rel. Des. José Luiz Gavião de Almeida j. 3.3.2009; Apelação Cível com Revisão n° 531.929-4/100 Rel. Des. Dimas Carneiro j. 15.10.2008. Confira-se, outrossim, do voto condutor do V. Acórdão de lavra do Nobre
Desembargador Ademir Benedito, proferido no julgamento da Apelação com Revisão nº 7.246.238-1, registrado em 14 de
setembro de 2009: “(...) A condenação de forma solidária da patrona dos apelantes, nas penas por litigância de má-fé, também
deve ser mantida. Correto o entendimento esposado pelo nobre magistrado sentenciante, ao ponderar que não só as partes,
mas também seus advogados, têm o dever de agir com lealdade processual, nos termos do art. 14, II, do CPC. A patrona dos
requerentes efetivamente agiu de forma temerária e sua condenação não foi por defender alguém que não seja titular do direito
material, mas sim pela forma como o fez. Todos têm direito à defesa, mas não pode a conduta ardilosa e protelatória ser tida
como tal. Deixa de ser defesa e passa a ser mero expediente odioso, que atravanca a máquina judiciária e impede que causas
verdadeiramente relevantes sejam analisadas com maior rapidez. Quanto ao art. 32 do Estatuto da Advocacia, por ferir os
princípios constitucionais da isonomia e da celeridade processual garantida a todos, foi corretamente declarado inconstitucional
de forma incidental, permitindo-se, assim, a condenação da advogada, o que, aliás, encontra-se em consonância com o
entendimento jurisprudencial do E. STJ colacionado no decisum, ao qual se reporta como razão de decidir. Por outro lado, não
se faz apropriada a majoração de sobredita condenação. O valor a que condenados os litigantes é suficiente ao intuito do
instrumento, de modificação da atuação processual das partes. Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, mantida a r.
sentença por seus próprios fundamentos (...)”. A condenação do advogado em lide temerária não é vedada por qualquer
disposição do Código de Processo Civil, que, ao contrário, impõe os deveres de probidade e lealdade às partes e “a todos
aqueles que de qualquer forma participam do processo” (art. 14) e responsabiliza “autor, réu ou interveniente” que “pleitear de
má-fé” (art. 16). A expressão “a todos aqueles que de qualquer forma participam” lembra, e parece não ser obra do acaso, a
fórmula prevista no art. 29 do Código Penal, cujo sentido e alcance são por demais conhecidos dos profissionais do direito. Daí
decorre que qualquer interpretação dos arts. 14 a 18 do Código de Processo Civil tendente a elidir a responsabilidade advocatícia
pelas condutas abusivas e desleais, sob o fundamento de ausência de previsão expressa quanto à figura do advogado, parece,
s.m.j., partir de um sofisma, porquanto diante de cláusula genérica que se destina a todos que participam do processo (Código
de Processo Civil, arts. 14 e 16), o que se exigiria para a exclusão do advogado seria, ao contrário do que se supõe, a previsão
expressa de sua imunidade. Entender-se de outro modo, permissa venia, significa conferir maior proteção ao litigante de má-fé
(por vezes responsável único pela eternização dos litígios) do que aquela que se empresta a quem concorre para um crime,
muito embora em dadas hipóteses as situações se equivalham, como, por exemplo, no caso de fraude processual (Código
Penal, art. 347). Ademais, a responsabilização do profissional da advocacia tem previsão expressa no Estatuto da Ordem dos
Advogados do Brasil (art. 32, § único da Lei nº 8.906/94 - “em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável
com seu cliente”) e o tópico final do dispositivo (necessidade de ação própria, que gera a repetição imotivada de atos processuais)
parece incompatível com a ratio da Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, de modo a não mais subsistir na
ordem jurídica vigente qualquer empecilho para que aja o magistrado de acordo com sua convicção e senso de justiça, com a
consciência de que, com isso (responsabilizando pelo malfeito o seu autor), contribuirá para que a razoável duração do processo
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º