TJSP 30/04/2015 - Pág. 797 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quinta-feira, 30 de abril de 2015
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano VIII - Edição 1875
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0,9 mg a ser aplicado dois dias antes do procedimento. Argumentou que não tem condição financeira de suportar o custo do(s)
medicamento(s). Por fim, requereu a procedência do pedido inicial. Juntou documentos. Foi deferida a antecipação dos efeitos
da tutela jurisdicional. Desnecessário o relatório. Fundamento e decido. A competência do Juizado Especial para processamento
e julgamento do pedido já foi esclarecida a fls. 19/20. Acrescento que não há que se falar em complexidade fático probatória,
pois, em regra, o julgamento da lide não demanda dilação probatória. O(s) requerido(s) tem legitimidade para figurar no polo
passivo, pois há solidariedade entre os entes federativos no tocante ao atendimento das demandas relacionadas à saúde. O
simples fato de o(s) requerido(s) ter(em) apresentado resistência à pretensão inicial já demonstra a necessidade de intervenção
do Poder Público para solucionar o conflito de interesses. Assim, está presente o interesse de agir. No mérito, o pedido inicial é
procedente. A hipossuficiência d(a) autor(a) restou satisfatoriamente demonstrada pelo(s) documento(s) de fls. 11/13. Pretende,
o(a) autor(a), o recebimento gratuito do(s) medicamento(s) especificado(s) na petição inicial, que, segundo o(a)(s) médico(a)(s)
que o(a) acompanha(m), é(são) imprescindível(is) para o seu tratamento. Como é sabido, “a saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (art. 196 da Constituição Federal).
O art. 23, inciso II, da Constituição Federal, dispõe que “é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios: cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência”. O art. 30,
inciso VII, da Constituição Federal, na mesma linha, estabelece que: “compete aos Municípios: prestar com a cooperação
técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população”. A partir da análise dos dispositivos
constitucionais, que fornecem as diretrizes básicas do sistema de saúde nacional, é possível concluir que todos os entes
federativos são solidariamente responsáveis pelo atendimento integral das demandas dos cidadãos na área de saúde. Neste
sentido, temos o venerando acórdão da E. Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: RESP 507205/PR; Recurso Especial
2003/0009776-3; Fonte: DJ, data 17/11/2003, pg. 00213; Relator: Ministro José Delgado; Ementa: RECURSO ESPECIAL.
PROCESSUAL CIVIL. OFENSA ART. 535, II, DO CPC. INEXISTÊNCIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PARA PESSOA
CARENTE. LEGITIMIDADE DA UNIÃO, DO ESTADO E DO MUNICÍPIO PARA FIGURAREM NO POLO PASSIVO DA DEMANDA.
Inexiste ofensa ao art. 535, inciso II, do CPC, quando as questões levadas ao conhecimento do Órgão Julgador foram por ele
apreciadas. Recurso no qual se discute a legitimidade passiva da União para figurar em feito cuja pretensão é o fornecimento de
medicamentos imprescindíveis à manutenção de pessoa carente, portadora de atrofia cerebral gravíssima (ausência de atividade
cerebral, coordenação motora e fala). A Carta Magna de 1988 erige a saúde como direito de todos e dever do Estado (art. 196).
Daí, a seguinte conclusão: é obrigação do Estado, no sentido genérico (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assegurar
às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária para a cura de suas mazelas, em especial,
as mais graves. Sendo o SUS composto pela União, Estados e Municípios, impõe-se a solidariedade dos três entes federativos
no pólo passivo da demanda. Recurso especial desprovido. Data da decisão: 07/10/03. Órgão julgador: Primeira Turma. Decisão:
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do
Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, por maioria, vencido o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki (voto-vista),
negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Luiz Fux e Humberto Gomes de
Barros votaram com o Sr. Ministro Relator. Não proferiu voto o Sr. Ministro Francisco Falcão (RISTJ, art. 162,§ 2o, primeira
parte). Resumindo, a Constituição Federal impôs aos entes federativos, sem exceção, o dever de prestar e financiar o
atendimento integral às necessidades dos cidadãos no âmbito da saúde, priorizando, destaque-se, as ações preventivas. Por
outro lado, atendendo às diretrizes constitucionais, criou-se o sistema único de saúde com a finalidade de descentralizar a
gestão da saúde, que gradativamente vem sendo transferida aos Municípios que detém estrutura para tanto, com o
correspondente repasse de verbas Federais e Estaduais. A gestão da saúde e da assistência farmacêutica é composta por um
conjunto complexo de normas e atos normativos com distribuição de atribuições e recursos entre os entes federativos. Diante
deste quadro, tem-se que a Constituição Federal impôs aos entes federativos o dever de prestarem solidariamente assistência
integral à saúde do cidadão (art. 30, inciso VII e art. 196), mormente em se tratando de hipossuficiente. As intrincadas regras de
gestão da saúde e da assistência farmacêutica, por sua vez, não podem dificultar o acesso do cidadão aos meios necessários à
preservação de sua saúde, cabendo aos entes federativos equacionar internamente, após o atendimento da demanda, eventual
redistribuição de recursos. Não é demais consignar que, havendo solidariedade, pode o autor pleitear o fornecimento do
medicamento ao Município de Batatais, ao Estado de São Paulo, ou à União. Pode, ainda, optar por demandar contra dois ou
mais responsáveis. Feitas estas considerações fica evidente que a discussão a respeito dos limites de atuação estabelecidos
pelas leis que regem o sistema único de saúde é desnecessária, tendo em vista que o dever do Município e do Estado de
prestar integral atendimento à saúde da população decorre da Constituição Federal. Com relação aos problemas de ordem
financeira que as determinações judiciais de fornecimento de medicamento podem gerar, estou convencido de que a suposta
escassez de recurso não é óbice para o atendimento deste tipo de demanda, pois não são raros os casos de desvio de dinheiro
público, o que me permite concluir que o problema não é a falta de recurso. Embora na cidade de Batatais não haja notícia de
malversação do dinheiro público, não há como negar que o sistema sendo único é prejudicado por inteiro, independentemente
de o desvio ter ocorrido na esfera Federal, Estadual ou Municipal. Não bastasse, os gastos com publicidade “institucional” não é
insignificante, o que reforça a tese de que o dinheiro público muitas vezes é mal empregado. Por fim, registro que não se
configura a indevida ingerência do Poder Judiciário no Executivo quando o primeiro determina ao segundo a realização de
desembolsos para cumprimento de obrigações constitucionalmente estabelecidas e que não vêm sendo atendidas. Haveria
ingerência indevida se o Poder Judiciário criasse novas obrigações para o Executivo, sem respaldo em Lei ou Norma
Constitucional. No tocante à conveniência e necessidade da utilização do medicamento decorre da prescrição médica, não
cabendo a este Magistrado, por falta de conhecimento técnico, fazer qualquer juízo de valor a este respeito, portanto, por uma
questão de humanidade, afigura-se bastante justa a pretensão do requerente, que certamente contribuirá para uma vida mais
digna e saudável. Aqui, é importante destacar que não há nos autos qualquer documento médico colocando em dúvida a
credibilidade da prescrição, sendo certo que a nota técnica de fls. 89/94, por não tratar do caso do autor especificamente, não é
suficiente para tanto. Ante o exposto e considerando o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL
para o fim de tornar definitiva a decisão liminar e impor ao Município de Batatais e o Estado de São Paulo o dever de disponibilizar
ao(à) requerente o(s) medicamento(s) solicitado(s), sob pena de multa diária de R$ 300,00, limitada a R$ 6.000,00, sem prejuízo
de eventual responsabilização pessoal dos Chefes dos Poderes Executivos. Registro que o medicamento pleiteado na inicial já
foi entregue à autora conforme documentos de fls. 117/118. Por consequência, JULGO EXTINTO O FEITO, com fundamento no
art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil. Não há razão para condenação de qualquer das partes ao pagamento de custas
e despesas processuais e honorários advocatícios. Publique. Registre. Intime. Batatais, 14 de abril de 2015. - ADV: RICARDO
ALEXANDRE TAQUETE (OAB 169898/SP), RAFAEL COELHO DO NASCIMENTO (OAB 269077/SP), MARINA ELISA COSTA
DE ARAUJO (OAB 300895/SP), MÁRCIA HELENA MARQUES CORRÊA (OAB 337829/SP)
Processo 1003592-34.2014.8.26.0070 - Procedimento do Juizado Especial Cível - Obrigação de Fazer / Não Fazer - José
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