TJSP 11/06/2015 - Pág. 2020 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quinta-feira, 11 de junho de 2015
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano VIII - Edição 1902
2020
Que depois de realizadas as medições foi constatada a normalidade dos cilindros, pistões e anéis. Finalmente, alegou a não
ocorrência de danos materiais ou morais e reafirmou que o trator permaneceu na concessionária por apenas dez dias (fls. 3241). Houve réplica (fls. 70-72). A audiência de conciliação foi infrutífera, a preliminar defensiva foi rejeitada, o processo saneado
e foi deferida a realização de perícia de engenharia mecânica a ser custeado pelo autor (fl. 78-A). Com a vinda da proposta de
honorários periciais (fl. 85) o autor informou não ter condições de suportar o pagamento, restando inviabilizada a realização da
prova da parte autora (fl. 91). A requerida propôs recolher o trator para efetuar todos os reparos que fossem necessários, seja
em sua oficina ou em qualquer outra concessionária Massey Ferguson da Região e apresentou contraproposta ao valor dos
honorários periciais propostos (fls. 94-97). As propostas não foram aceitas pela parte autora (fls. 99-100). Foi facultada às
partes a apresentação de laudos técnicos particulares (fl. 101). A requerida apresentou relatórios de visita periciais (fls. 107-111
e 128-135). A parte autora se manifestou sobre os laudos apresentados (fls. 143-144). Em instrução oral foram inquiridas uma
testemunha da parte autora e uma testemunha da parte ré (mídia de fl. 154). A ré informou a perda da concessão junto ao
fabricante da marca Massey Ferguson e requereu a justiça gratuita (fls. 158-159), o que foi impugnado pela parte autora (fls.
169-170). As partes se manifestaram em alegações finais (fls. 171-173 e 174-180). É o relatório. Decido. Fundamentação. Em
que pese que a atual situação financeira da empresa requerida esteja conturbada, havendo apontamentos de títulos protestados,
ações executivas e dívidas bancárias (fls. 182-186), tais elementos não se mostram suficientes a abalar o vultoso capital social
que empresa possui (R$ 3.118.000,00, fl. 46). Assim, indefiro a justiça gratuita requerida pelo pólo passivo. No mérito a ação é
parcialmente procedente. Ficou devidamente comprovado que existiram vários vícios no trator adquirido pelo autor, o que enseja
a responsabilidade da ré (sem prejuízo do exercício do direito de regresso contra a fabricante). A existência de múltiplos defeitos
como no caso concreto (defeito no freio, defeito na tomada de força, defeito no motor, defeito na transmissão, falha hidráulica) é
totalmente anormal (tratando-se de maquinário novo) e claramente obstou o funcionamento pleno e adequado do trator. Tal
conclusão além de lógica chega a ser incontroversa, diante de todos os elementos trazidos aos autos e corroborados pela prova
testemunhal. Ademais, quem compra um trator novo espera que ele esteja em perfeitas condições de uso, durabilidade e
resistência, máxime por tratar-se de máquina destinada a trabalhos agrícolas. Restou demonstrado que o trator logo de início
apresentou problema de travamento do freio, fato alegado pelo autor, mencionado pela testemunha Fernando Aparecido Ribeiro
e confirmado pela testemunha Edison Correia da Veiga (testemunha da ré) que declarou que foi efetuada a troca do cilindro
mestre. Também ficou demonstrado que houve problema no sistema hidráulico, necessitando de regulagem da mola mestra do
hidráulico conforme declarado pela testemunha Fernando Aparecido Ribeiro, e corroborado pela ordem de serviço de fl. 55. O
defeito na tração do trator também restou devidamente comprovado, seja pela prova oral, seja pelo documento de fl. 56, que
descreve a troca da engrenagem da caixa de tração. Por fim e o mais sério dos defeitos foi a constatação de defeito no motor do
trator, consistente no consumo anormal de óleo de motor e a emissão excessiva de fumaça pelo escapamento. E restou
devidamente demonstrado que o defeito existiu. Muito embora a concessionária/ré tenha alegado em sua contestação (fl. 36 e
37) que o autor não autorizou o mecânico a efetuar o diagnóstico recomendado pela fábrica e que uma vez recolhido o trator, foi
feita a medição homologada pelo fabricante, sendo constatado que cilindros, pistões e anéis estavam em perfeitas condições,
tais alegações não encontram respaldo na prova produzida nos autos. A própria testemunha arrolada pela ré (Edison Correia da
Veiga) contradisse tal declaração (de perfeitas condições) ao declarar que diante da reclamação do autor de que o trator estava
baixando óleo de motor, foi efetuada a troca dos anéis. É inverossímil que os anéis fossem trocados se não houvesse defeito. E
mais, referida testemunha que é mecânico da concessionária há mais de 23 anos, declarou que não é normal um trator
apresentar tais defeitos logo de início, fato corroborado pela testemunha Fernando Aparecido Ribeiro, que é agricultor e tendo
experiência no uso de maquinário parecido, bem como tendo utilizado o trator defeituoso em sua propriedade rural, constatou
que essa máquina especificamente apresentava uma gama de defeitos que não eram vistos em outras máquinas da mesma
marca e modelo. Mesmo o laudo técnico produzido pela parte ré, apesar de concluir pela inexistência de consumo excessivo de
óleo do motor (embora após a troca dos anéis), corroborou que ocorreram vários defeitos (especialmente na caixa de
transmissão). A ré também tentou imputar ao autor a culpa exclusiva por não terem sido efetuados os reparos necessários no
trator, aduzindo em alegações finais (fl. 177 in fine) que o autor poderia ter levado o trator para ser reparado, de forma gratuita,
a qualquer agência Massey Ferguson localizada no Brasil. Tal alegação não prospera. É sabido que Palestina dista cerca de 54
quilômetros de distância da cidade de São José do Rio Preto (SP) onde se localiza a concessionária ré. As demais concessionárias
autorizadas da marca Massey Fergurson estão ainda mais distantes de Palestina. O trator, como máquina agrícola, não pode
trafegar em rodovias e o autor, como pequeno agricultor que é, provavelmente não deva possuir um caminhão adequado ao
transporte de tratores. Afinal, não se está falando de um veículo de passeio que pode ser levado pessoalmente a qualquer
concessionária, e em se tratando de vícios ocultos do produto, cabe à revendedora/ré o ônus de remover o bem com segurança
e consertá-lo (eis que é sua a responsabilidade civil correlata). Ficou claro também que após vários atendimentos frustrados
prestados de maneira ineficiente pela concessionária o autor passou a desacreditar que a empresa fosse capaz de resolver o
seu problema, preferindo procurar o Judiciário para colocar fim a sua completa insatisfação, seja com a máquina adquirida ou
com o tratamento recebido da empresa ré. E a ineficiência na pronta solução de todos os defeitos gerou sua responsabilidade
civil. Primeiro, verifica-se na expedição da Nota Fiscal de venda que houve erro na descrição do modelo vendido. O modelo
comprado pelo autor é um trator MF 4275/4 (Trator traçado, 4x4, com 75 cavalos de potência) conforme constou na cédula de
crédito bancário (fl. 15) e no depoimento das testemunhas, enquanto que na nota constou o modelo MF 4283/4 (trator traçado,
4x4, com 83 cavalos de potência). Segundo, verifica-se na expedição das ordens de serviços que em nenhuma delas há a
assinatura do autor autorizando ou recebendo os serviços (fls. 55, 56 e 58), bem como as datas de entrega da máquina foram
colocadas de maneira precária e no rodapé das ordens de serviços. Terceiro, o próprio fato de a concessionária haver sido
descredenciada pela fabricante do trator, sendo excluída do seu quadro de revendedoras autorizadas, vedando a prestação de
assistência técnica nos tratores produzidos pela Massey Ferguson/AGCO ou de utilizarem a sua marca ou logomarca (fl. 157).
Assim, reputo que existiram vários defeitos de fabricação no trator adquirido pelo autor e que a ré, atuando como revenda e
assistência técnica (até então autorizada da marca), não logrou êxito em realizar efetivamente os reparos que o trator
necessitava, devendo ser responsabilizada civilmente pelos danos suportados pelo autor. Em se tratando de vício redibitório,
havendo irrecusável incapacidade da ré em sanar os defeitos apontados, e já tendo o autor manifestado o desinteresse no
reparo da máquina atual, necessário se faz que as partes retornem ao “status quo ante”, com a rescisão do contrato e a
correspondente devolução do montante pago com as respectivas correções. Ocorrem danos morais. Como já assinalado, quem
compra um trator novo espera que ele esteja em perfeitas condições de uso, e em se tratando de máquina agrícola que ele
tenha um mínimo de resistência e durabilidade, bem como que sejam supridos com presteza e rapidez os eventuais defeitos
ocultos, máxime quando se trata de um bem de alto custo e que foi adquirido com sacrifício pelo agricultor (como na situação
deste processo, em que a compra precisou ser financiada pelo autor). No caso, porém, as solicitações administrativas feitas
pelo autor não foram atendidas adequadamente, na medida em que a máquina não foi consertada a contento e, pior, tentou-se
equivocadamente inquinar a série de defeitos a não realização de revisões periódicas, quando a totalidade dos defeitos iniciouPublicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º