TJSP 12/05/2020 - Pág. 17 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: terça-feira, 12 de maio de 2020
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano XIII - Edição 3041
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Processo 1500393-21.2020.8.26.0236 - Auto de Prisão em Flagrante - Tráfico de Drogas e Condutas Afins - LEONARDO
AILTON FURLANETO DE ARAUJO FARIAS - Vistos. “Está-se a analisar a legalidade da prisão e o estado de liberdade da
pessoa de LEONARDO AILTON FURLANETO DE ARAUJO FARIAS, que foi flagrada, segundo comunicação da autoridade
policial, praticando o delito de tráfico. Diz o boletim de ocorrência: “Comparecem nesta repartição os Policiais Militares Sd
Coutinho e Sd Jonas relatando que nesta data, durante patrulhamento pela Rua Sebastião Flavio Pinheiro avistaram a pessoa
de Leonardo, o qual é conhecido nos meios policiais pela prática de ato infracional (tráfico de drogas), adentrando com uma
bicicleta de cor branca em um terreno localizado na mesma rua, logo acima do numeral 748, local este usado para esconder
drogas. Informam que ao atingirem a altura do referido terreno, observaram Leonardo abaixado, de costas para a rua,
desenterrando e pegando um objeto, quando Leonardo se virou e deparando-se com os policiais, abandonou o objeto, tentou
subir em sua bicicleta e se evadir do local, sendo de imediato detido. Realizada busca pessoal nada de ilícito foi encontrado em
seu poder. Em seguida, ao verificarem o que ele havia abandonado, constaram os policiais tratar-se de um pequeno pacote
contento porções de maconha e no mesmo local onde Leonardo pegou essas porções foram encontradas mais porções da
mesma droga, totalizando 28 (vinte e oito) porções, mais 12 (doze) porções de crack, que estavam no mesmo lugar. Leonardo
foi questionado e negou ser o proprietário das referidas drogas. Informam os policiais que na residência de numeral de 745,
existe câmeras de segurança, inclusive com uma destas apontada para o referido terreno, foi tentado contato com o proprietário
da residência, porém não havia ninguém no referido imóvel. Diante dos fatos foi dado voz de prisão em flagrante delito à pessoa
de Leonardo, pelo crime de tráfico e, conduzido à esta Unidade Polícia, bem como as drogas e a bicicleta que usa para cometer
os atos ilícitos. Após cientificar-se dos fatos, a autoridade policial determinou que os investigador João e o agente Ferraz se
dirigissem até ao local dos fatos, ou seja, o terreno e ali eles puderam constatar que em alguns pontos do terreno haveria
pontos com “sinais de terra mexida” e um trilho marcado como local de passagem pelo terreno, o que poderia indicar indícios de
que o terreno seria usado para ocultar drogas. Os policiais civis também tentaram manter contato com o morador do imóvel
onde há câmeras que suspostamente gravaram Leonardo presente no terreno, mas não havia ninguém no imóvel. Diante do
exposto, considerando a versão dada pelos policiais militares e o relato dos policiais civis que constataram indícios de que o
terreno é utilizado para ocultação de drogas; considerando a inda a quantia de drogas apreendidas e a forma como se encontram
distribuídas, embaladas e fracionadas, ou seja, prontas para a comercialização; considerando, finalmente, ocorrências
anteriores, quando menor de idade, que envolveram Leonardo com o tráfico de drogas, entendeu esta autoridade policial que
Leonardo Ailton Furlaneto de Araujo Farias se encontra em estado flagrancial e por tal razão, ratificou a voz de prisão em
flagrante delito, determinando a apreensão das substâncias encontradas pelos policiais militares e, após elaboração de auto de
constatação provisória, o encaminhamento das substâncias à Polícia Técnico-Científica de Araraquara para o laudo definitivo.
Quanto a bicicleta, a autoridade policial determinou a entrega dela a algum parente de Leonardo.” 1. Verifico que o flagrante foi
realizado nos termos do art. 302 do Código de Processo Penal. Há recibo de nota de culpa entregue à pessoa presa com
identificação do condutor e motivo da prisão (§2º do art. 306 do Código de Processo Penal e inciso LXIV do art. 5º da
Constituição), sendo que o responsável pelo interrogatório e pela tomada das declarações das testemunhas também foi indicado.
Há informações sobre existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual
responsável pelos cuidados dos filhos. O prazo de 24h para encaminhamento do auto de prisão em flagrante foi obedecido,
sendo que não será realizada audiência de custódia em virtude das restrições impostas pela pandemia do coronavirus. Verifico
também que a pessoa presa está assistida por advogado, sendo que sua família já está ciente do ocorrido (inciso LXIII do art. 5º
da Constituição). Não houve violação ilícita de domicílio e não houve qualquer reclamação por parte da pessoa presa a respeito
de violência policial. Foi realizado exame médico (fls. 39/40), o qual não constatou nenhuma lesão. Sobre eventual
desclassificação para o delito previsto no art. 28 da Lei 11.343/06 que poderia, em cognição sumária, inquinar de ilegalidade o
flagrante conforme §2º do art. 48 da mesma lei, considero, em atenção aos critérios do §2º do citado art. 28, a quantidade e
variedade de drogas (cerca de 55g de maconha divididos em 28 porções e cerca de 5g de crack divididos em 12 porções), o
local da apreensão (conhecido como ponto de tráfico) e a situação em que o autuado foi encontrado (agachado e desenterrando
as drogas), o que indica, ao menos em cognição sumária, que a finalidade não era o consumo pessoal, mas sim a venda a
terceiros. Desta forma, estando a fase administrativa de acordo com o direito, não é o caso de relaxamento da prisão. 2. Ao
julgar o estado de liberdade da pessoa presa vejo que não está presente nenhuma das hipóteses de excludente de ilicitude, as
quais, forçosamente, ensejariam a liberdade provisória (parágrafo único do art. 310 do Código de Processo Penal). Há, por
outro lado, prova da existência do crime e indícios de autoria (depoimento dos policiais e laudo de constatação preliminar). 2.1
Como dispõe o item 3 do art. 9º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, internalizado pelo Decreto presidencial
592/92, a prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral; ela só é admitida em
nosso ordenamento, de forma excepcional, por necessidade da investigação ou do processo e, nos casos expressamente
previstos, para evitar a prática de infrações penais (inciso I do art. 282 do Código de Processo Penal). No caso em tela, embora
se trate de crime cuja pena máxima supera 4 anos, estando presente, portanto, uma das hipóteses do art. 313 do CPP, não se
justifica a prisão preventiva no caso em tela, conforme passo a explicar. Não se ignora que o tráfico é crime grave,
constitucionalmente equiparado a hediondo, mas é certo também que a jurisprudência dos tribunais superiores é pacífica no
sentido de que a gravidade abstrata do delito não é apta a fundamentar, por si só, a determinação de prisão preventiva. Tanto
assim que o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a vedação de liberdade provisória no crime de tráfico de drogas.
Na hipótese dos autos, não há, ao menos até o momento, risco concreto de que o custodiado, em liberdade, interfira na produção
da prova, nem na aplicação da lei penal. Quanto à garantia da ordem pública, o fato de o autuado já ter sido condenado 2 vezes
por ato infracional equiparado ao crime de tráfico de drogas (uma em 2018 com aplicação de Liberdade Assistida e outra em
2019 com aplicação de internação), a princípio, em uma situação de normalidade, poderia apontar para a necessidade da prisão
a fim de evitar a reiteração delitiva, conforme bem destacado pelo Ministério Público em sua manifestação, o que já foi feito por
este magistrado em diversas outras ocasiões com amparo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Deve-se lembrar,
todavia, que o mundo passa pela pandemia do novo coronavírus, que vem impondo a adoção de medidas drásticas de prevenção
em todas as áreas. No que concerne ao Sistema Penal e Carcerário, o Conselho Nacional de Justiça editou a Recomendação
62 em 17 de março de 2020 (https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/03/62-Recomenda%C3%A7%C3%A3o.pdf),
orientando os magistrados a só decretarem novas prisões preventivas em casos de grande excepcionalidade, principalmente
quando praticados delitos com violência ou grave ameaça, o que não é o caso dos autos. Vejamos: Art. 4o Recomendar aos
magistrados com competência para a fase de conhecimento criminal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em
observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem as seguintes medidas: III a máxima excepcionalidade de
novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias. Art. 8o Recomendar aos Tribunais e aos
magistrados, em caráter excepcional e exclusivamente durante o período de restrição sanitária, como forma de reduzir os riscos
epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerar a pandemia de Covid-19 como
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º