TJSP 23/07/2020 - Pág. 1134 - Caderno 3 - Judicial - 1ª Instância - Capital - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quinta-feira, 23 de julho de 2020
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano XIII - Edição 3090
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de créditos mantidos com a Falida oriundos de investimentos, em que o investidor realizava aportes financeiros e, em
contrapartida, recebia a remuneração de juros acima dos juros legais de mercado. Tal operação que originou o crédito utilizado
para a aquisição da presente unidade. Ademais, conforme manifestação da Administradora Judicial, foi localizada no sistema
informacional da Falida planilha de investimentos em nome de referido interessado, assim como comprovantes de pagamentos
(fls. 108/109), o que demonstra que a Construtora Atlântica realizou diversos pagamentos em seu favor ao longo dos anos. No
mais, também foram encontrados diversos outros contratos em nome do requerente (fls. 211/227). Por fim, o interessado não
apresenta qualquer comprovante de pagamento, ou esclarece a origem das unidades originárias utilizadas como meio de
pagamento da unidade objeto deste incidente. Cumpra salientar, ainda, que o instrumento contratual de fls. 87/90, o qual tinha
por objeto as unidades nº 102, 207 e 410 do empreendimento José Antônio Coelho, foi celebrado dentro do termo legal, fixado
em 09/03/2015. Sendo assim, além do instrumento contratual ser ineficaz perante a Massa Falida, deve ser interpretado como
forma de pagamento de dívida vencida e exigível por forma diversa daquela prevista em contrato. Nos termos do art. 129, II, da
LREF, “[s]ão ineficazes em relação à massa falida, tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômicofinanceira do devedor, seja ou não intenção deste fraudar credores: [...] II o pagamento de dívidas vencidas e exigíveis realizado
dentro do termo legal, por qualquer forma que não seja a prevista pelo contrato”. O termo “pagamento” deve ser interpretado em
sentido amplo, abarcando outras formas de extinção de obrigações, tais como a dação em pagamento e a cessão de crédito.
Neste sentido, ensina Ricardo Tepedino que “[n]ão há dúvida de que a forma mais comum de verificar a hipótese do inciso em
exame é a dação em pagamento, cujo traço característico consistena na substituição da prestação acordada, com o
consentimento do credor. Mas há outros meios que merecem atenção. É o caso do pagamento através da cessão de crédito”.
(Comentário ao art. 129. In: ABRÃO, Carlos Henrique, TOLEDO, Paulo F. C. Salles de. Comentários à Lei de Recuperação de
Empresas e Falência. 6. ed., São Paulo: Saraiva, 2018, p. 489). Desse modo, tendo em vista as informações financeiras
encontradas pela Administradora Judicial, a ausência de comprovantes de pagamentos e/ou esclarecimentos quanto aos
créditos utilizados como meio de pagamento da unidade ora debatida, assim como a celebração do contrato dentro do termo
legal, não há que se falar em crédito privilegiado ou de direito de adjudicação da unidade em questão. LUCIANA GOLDBERG. A
interessada, em 16/02/2015, celebrou o “Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda” (fls. 73/76), tendo por
objeto a unidade nº 207 do empreendimento José Antônio Coelho, pelo valor de R$364.632,00, no qual a Construtora Atlântica
dá a mais total, geral, irrevogável e irretratável quitação, sem, todavia, especificar a forma de pagamento. Conforme manifestação
da Administradora Judicial, foram localizados outros contratos em nome da requerente, em que também não mencionam a
forma de pagamento das unidades, senda dadas por quitadas no ato da assinatura do instrumento, bem como com cláusulas de
recompra (fls. 228/235). No mais, foi encontrado no sistema informacional da Falida, instrumento contratual por meio do qual a
interessada adquire o direito à fração ideal de um terreno, correspondente a 1/72 do empreendimento Fidalga (fls. 236/239). Em
mencionado instrumento, a interessada investe o valor de R$209.000,00, sob a promessa de rentabilidade mínima de 2,5% ao
mês sobre o valor investido. Nesse contexto, foi encontrada planilha de investimentos, bem como comprovantes de pagamentos
em nome da requerente (fls. 110/113), além de um “relatório de prestação de contas”, elaborado pela Falida para que fosse
apresentado ao investidor informações como: número de unidades vendidas e qual o lucro obtido em razão das vendas efetuadas
(fls. 240/275). No mais, para a caracterização de real adquirente, mostra-se necessário demonstrar que a unidade fora adquirida,
bem como que o pagamento foi efetivamente realizado. Muito embora o contrato não tenha sido celebrado dentro do termo
legal, não houve qualquer comprovante de efetivo pagamento. Cumpra salientar que a requerente em questão, mesmo em sede
de produção de prova, deixou de apresentar qualquer comprovante (fl. 276). Ademais, analisando os documentos juntados pela
Administradora Judicial, não há qualquer menção da entrada de aporte efetuado em 16/02/2015, no valor de R$364.632,00 (fl.
113). Diante dos documentos juntados pela Administradora Judicial (planilha de investimentos, comprovantes de pagamentos
efetuados pela Atlântica em favor da interessada), assim como da ausência da efetiva demonstração da quitação, forçoso
reconhecer que a requerente em questão não é proprietária da unidade. Demonstrado, portanto, que o negócio jurídico simulava
compra e venda, quando, na realidade, caracterizava-se como forma de investimento pelo interessado e como meio de ter
garantia do pagamento de juros acima do permitido. ARTHUR KAUFMAN. O interessado, em 08/09/2014, celebrou o “Instrumento
Particular de Compromisso de Cessão de Direitos com Permuta” (fls. 7/10), objetivando a unidade nº 207 do empreendimento
José Antônio Coelho, pelo valor de R$320.000,00, pagos por meio de dação em pagamento da unidade 15 do empreendimento
Brigadeiro Luís Antônio. Por sua vez, em 18/04/2011, fora celebrado o “Instrumento Particular de Compromisso de Venda e
Compra”, tendo por objeto a unidade nº 15 do empreendimento Brigadeiro Luís Antônio (fls. 153/156), pelo valor de R$320.000,00,
pagos da seguinte maneira: (i) R$140.000,00 pagos no ato; (ii) R$180.000,00 pagos em 30 parcelas no valor de R$6.000,00,
vencendo-se a primeira em 28/01/2011. Desse modo, a aquisição da unidade nº 207 do empreendimento José Antônio Coelho
ocorreu a partir da seguinte dinâmica contratual: Aquisição da unidade nº 15 do empreendimento Brigadeiro Luís Antônio, pelo
valor de R$320.000,00. Ocorrida em 18/04/2011. Aquisição da unidade nº 207 do empreendimento José Antônio Coelho, pelo
valor de R$320.000,00, pago por meio de dação da unidade nº 15 do empreendimento Brigadeiro Luís Antônio. Ocorrida em
08/09/2014. Logo, a fim de se averiguar se o interessado faz jus a condição de adquirente, mostra-se necessário a análise da
efetiva quitação da unidade nº 15 do empreendimento Brigadeiro Luís Antônio o qual foi utilizado como meio de pagamento da
unidade ora debatida bem como da data de ocorrência da aquisição do imóvel. A celebração do contrato de fls. 7/10 ocorreu
antes do termo legal fixado, qual seja 09/03/2015. Há, ainda, prova de pagamento dos valores (fls. 19/28). Ainda que nem todo
o montante tenha sido demonstrado em relação à unidade utilizada como meio de pagamento, adquirida em 2011, os pagamentos
apresentados são substanciais. Em que pese os demais contratos localizados pela Administradora Judicial (fls. 149/168), e em
especial a planilha de investimentos, conjuntamente com os comprovantes de pagamentos (fls. 103/107), assim como o “relatório
de prestação de contas” (fls. 173/210), o credor esclarece que os valores se referem ao celebrado em relação ao empreendimento
Cayowaá (fls. 169/172). Sendo assim, em relação à unidade em questão, o interessado provou adequadamente sua pretensão,
não havendo razão para não se entender que a unidade que fora utilizada como pagamento não fora integralmente satisfeita,
como se alega. Isto posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos. Faço-o para manter a classificação dos
créditos de FREDERICO LUIZ DULEY e LUCIANA GOLDBERG, como quirografários, no valor incluído na lista pela Administradora
Judicial, nos termos do art. 83, VI da Lei 11.101/2005. Por sua vez, quanto ao interessado ARTHUR KAUFMAN, reconheço-o
como adquirentes da unidade em epígrafe, de forma que há direito de adjudicação sobre o bem, com a alteração da relação de
credores. Em razão da sucumbência condeno FREDERICO LUIZ DULLEY e LUCIANA GOLDBERG ao pagamento das custas e
despesas processuais e de honorários da Massa Falida e de ARTHUR KAUFMAN, os quais fixo no valor de R$3.000,00, para
cada. No mais, considerando o crime falimentar do art. 175 da Lei 11.101/2005, transitada em julgado, abra-se vista ao MP para
a promoção de eventual denúncia crime, caso presentes os requisitos legais. P.R.I. - ADV: MARCIA REGINA BULL (OAB 51798/
SP), PAULA ALEMBIK ROSENTHAL (OAB 163074/SP), GESIBEL DOS SANTOS RODRIGUES (OAB 252856/SP), GUILHERMINA
MARIA FERREIRA DIAS (OAB 271235/SP), JORGE TIENI BERNARDO (OAB 121042/SP), FLAVIO DUARTE BARBOSA (OAB
138654/SP), ANA PAULA MARTINS PENACHIO TAVEIRA (OAB 129696/SP), ROBERSON BATISTA DA SILVA (OAB 154345/
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