TJSP 20/08/2020 - Pág. 2015 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quinta-feira, 20 de agosto de 2020
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano XIII - Edição 3110
2015
agosto de 2010 e prazo de tolerância de 180 dias, porém, o imóvel foi entregue somente em 03 de agosto de 2011, com várias
pendências, acarretando-lhes prejuízos, haja vista que tiveram de arcar concomitantemente com os custos da locação de outro
imóvel até a efetiva entrega do bem e com o pagamento das despesas condominiais exigidas pela ré antes do término da
edificação e entrega das chaves. Diante dos fatos, requerem a procedência da ação, para declaração de nulidade da cláusula
contratual relativa ao período de carência de 180 dias para entrega do imóvel, bem como para que a ré seja condenada ao
pagamento do valor de R$ 17.563,00, a título de multa moratória pelo atraso na entrega do imóvel; R$ 3.529,00 referente ao
valor desembolsado para pagamento da Taxa Sati e corretagem; R$ 6.876,78 e R$ 9.028,80, respectivamente, a título de dano
emergente e lucros cessantes; além do pagamento de dano moral, na quantia correspondente a 20 salários mínimos, tudo
acrescido dos consectários legais devidos (fls.01/32). A inicial foi instruída com documentos (fls.33/92). Foi indeferido o pedido
de assistência judiciária gratuita (fls.93). Devidamente citada (fls.103), a ré apresentou contestação (fls.112/161), arguindo,
preliminarmente, prescrição em relação à pretensão de restituição dos valores pagos a titulo de comissão de corretagem e taxa
SATI, além de ilegitimidade passiva para responder pela comissão de corretagem. No mérito, sustentou, em suma, que o prazo
para conclusão da obra estava previsto em contrato, inclusive o de eventual atraso, e que a unidade estava apta para posse
desde a emissão do habite-se (21.01.2011) e a demora na entrega se deu exclusivamente pela não localização dos autores.
Postulou, assim, a improcedência dos pedidos e juntou documentos (fls.162/187). Réplica às fls.194/221. Facultada a produção
de provas (fls.224), as partes pugnaram pelo julgamento no estado (fls.226/228). Pela decisão de fls.229, foi determinada a
suspensão do feito até julgamento final dos REsp. n.º 1635428 e 1614721. Às fls.231/234, a ré requereu o prosseguimento do
feito. É o relatório. Fundamento e D E C I D O. 1. Conheço diretamente do pedido, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código
de Processo Civil, pois a matéria controvertida é essencialmente de direito e a prova constante dos autos suficiente ao julgamento
do mérito, bem como porque as partes não manifestaram interesse em dilação probatória. 2. A preliminar de ilegitimidade
passiva tangencia o mérito e, analisada sob tal ótica, não prospera. Não só porque a hipótese dos autos suscita aplicação da
regra de solidariedade prevista no artigo 7º, parágrafo único e no artigo 25, §1º, do Código de Defesa do Consumidor, mas
também e, principalmente, porque o Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento em sede de recurso repetitivo (REsp
nº 1.551.956/SP, 2ª Seção, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 24/08/2016), de que é parte legítima “a incorporadora, na
condição de promitente-vendedora, para responder a demanda em que é pleiteada pelo promitente-comprador a restituição dos
valores pagos a título de comissão de corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, alegando-se prática abusiva na
transferência desses encargos ao consumidor.” 3. Por outro lado, reconheço a prescrição da pretensão à restituição dos valores
pagos a titulo de comissão de corretagem e taxa SATI, pois, no mesmo REsp nº 1.551.956/SP, decidiu-se que o prazo
prescricional para restituição da comissão de corretagem e da chamada “taxa SATI” é de três anos, conforme artigo 206, §3º
inciso IV do Código Civil. Assim, considerando que, in casu, transcorreu mais de três anos entre o pagamento da comissão de
corretagem e da taxa SATI e o ajuizamento da demanda, o direito do autor em reaver tais valores foi tragado pela prescrição
trienal, nos termos do art. 206, § 3º, IV, CC. 4. Superadas as preliminares, passo ao exame do mérito. O pedido é parcialmente
procedente. Trata-se de ação de conhecimento em que os autores pretendem o ressarcimento dos prejuízos causados pelo
atraso na entrega da unidade imobiliária n.º 164, torre B1, Edifício Califórnia, do Condomínio Innova I, localizado nesta cidade
de Osasco/SP. Pois bem. Incontroverso nos autos o atraso na entrega da unidade imobiliária em questão, divergindo as partes
tão somente em relação ao cabimento dos pedidos indenizatórios. 5. De acordo com o contrato firmado entre as partes o prazo
para o término das obras do empreendimento Condomínio Innova I, cuja unidade imobiliária foi adquirida pelos autores, era
01.08.2010, com tolerância de 180 dias (Cláusula 7.1- Fevereiro/2011 - fls. 52/54), inserção perfeitamente possível, pois não
vedada em lei e amparada pela Súmula nº 164 do E. Tribunal de Justiça de São Paulo (“é válido o prazo de tolerância não
superior a cento e oitenta dias, para entrega de imóvel em construção, estabelecido no compromisso de venda e compra, desde
que previsto em cláusula contratual expressa, clara e inteligível”). 6. A despeito do prazo contratual, o imóvel foi entregue aos
autores apenas em agosto de 2011, o que não foi objeto de impugnação especifica pela ré, que alegou que a unidade imobiliária
estava apta para posse desde a emissão do habite-se em 21.01.2011. Contudo, inaceitável a tese da ré para considerar que,
desde a expedição do “habite-se”, a unidade já estava apta para a imissão. Isto porque, o “habite-se” apenas atesta que o
imóvel foi construído seguindo-se as exigências da legislação local, estabelecidas pela Prefeitura, para a aprovação de projetos,
o que não significa, por si só, a imissão do compromissário comprador na posse direta do bem (Súmula nº 160 do E. Tribunal de
Justiça de São Paulo: “A expedição do habite-se, quando não coincidir com a imediata disponibilização física do imóvel ao
promitente comprador, não afasta a mora contratual atribuída à vendedora”). 7. Portanto, configurado atraso injustificado na
entrega do imóvel pela ré, deve esta ressarcir os autores pela privação injusta do uso do bem, não se podendo admitir que o
“incremento do setor imobiliário” atue como excludente, mas verdadeiro fortuito interno, previsível. Além disso, o prazo contratual
de 180 dias adicionais para entrega da obra já leva em consideração as vicissitudes da construção civil, não se admitindo maior
extensão temporal, pois configuraria desequilíbrio injustificado na relação entre as partes, autorizador de potencial enriquecimento
sem causa da construtora/incorporadora. 8. Por conseguinte, passo à análise dos pedidos indenizatórios. Quanto aos danos
emergentes, em decorrência da mora da ré, restou comprovado que os autores permaneceram residindo em imóvel locado, no
período de setembro de 2010 até fevereiro de 2011, com gasto de R$ 6.876,78 (seis mil, oitocentos e setenta e seis reais e
setenta e oito centavos) (vide fls. 65/71), assim fica a ré condenada ao pagamento do referido montante. 9. Por outro lado,
incabível a cumulação dos pedidos de multa com lucros cessantes, pois consiste em verdadeiro bis in idem, já que ambos têm
por fundamento o inadimplemento da mesma cláusula contratual, além da possibilidade de configurar enriquecimento sem
causa. Cumpre ressaltar que o E. Superior Tribunal de Justiça em 22/05/2019, ao julgar o REsp 1.635.428/SC (TEMA 970)
vedou a cumulação da cláusula penal com os lucros cessantes, fixando a seguinte tese: “A cláusula penal moratória tem a
finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo,
afasta-se sua cumulação com lucros cessantes.” (STJ, 2ª SEÇÃO, REsp nº 1.498.484/DF e REsp nº 1.635.428/SC, Rel. Ministro
LUÍS FELIPE SALOMÃO, j. 22.5.2019. 10. Ainda sobre o tema, a 2ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o
Recurso Especial Repetitivo nº 1.614.721-DF (2016/0187952-6), Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Tema 971/STJ), fixou a
seguinte tese para os efeitos do art. 1.040 do CPC/2015: “No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/
incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada
para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigação heterogêneas (obrigações de fazer e de dar)
serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial”. 11. No caso em apreço, conforme cláusula 5.1 e ss do contrato
entabulado entre autores e ré, em caso de inadimplência dos adquirentes, incidiria sobre o valor principal das parcelas em
atraso, mora de 1% (um por cento) ao mês e multa moratória de 2 % (dois por cento) sobre o valor de cada parcela, incidente
sobre o valor do principal, corrigido monetariamente. Contudo, incabível a inversão da cláusula penal como pretendem os
autores, já que as obrigações têm natureza distintas (obrigação entregar e de dar). O Recurso Repetitivo supra enfrentou essa
questão, razão por que transcreve-se trechos do voto do Relator: “... penso que a inversão, para determinar a incidência do
mesmo percentual sobre o preço total do imóvel, incidindo a cada mês de atraso, não constitui, em verdade, simples “inversão
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