TJSP 27/08/2021 - Pág. 1289 - Caderno 3 - Judicial - 1ª Instância - Capital - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: sexta-feira, 27 de agosto de 2021
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano XIV - Edição 3350
1289
crédito (fls.74/183). No curso das operações de cessão de crédito, pelas quais o FGC provia liquidez ao BCS por meio do FACB,
o Banco Central decretou regime de administração especial temporária (RAET) no BCS, nomeando o próprio FGC como
administrador do BCS. Durante o RAET, novos aportes de recursos foram feitos no BCS pelo FGC, via F ACB, que tornou-se
cessionário. O F ACB pretende que seus créditos sejam classificados na classe de titulares de direito à restituição, pois os
direitos creditórios saíram da esfera patrimonial do BCS. O administrador judicial da massa falida do BCS sustenta, que o
crédito do F ACB é subordinado pois seu principal cotista é o FGC, administrador do BCS à época do RAET. No caso dos autos,
contudo, não deve incidir a norma do art. 83, VIII, “ d”, da Lei 11.101/2005. Como bem observou Manoel Justino, em lição citada
a fls. 217, a norma acima mencionada busca evitar a fraude que um administrador pode ser tentado a praticar, criando valores
em seu benefício, exatamente por ter poderes de gestão. No caso dos autos, a situação é distinta, pois o FGC aportou recursos
para evitar a insolvência do Banco Cruzeiro do Sul, antes do RAET, e depois executou os negócios celebrados, de modo que
não se identifica a suposta fraude nem se pode aplicar a norma do art. 83, VIII, que busca evitá-la. De acordo com a prova dos
autos, o F ACB foi constituído antes do RAET para prover liquidez ao BCS, o que evitou a decretação de sua liquidação
extrajudicial naquele momento, mantendo-se a confiança do mercado no BCS e em instituições financeiras do mesmo porte.
Com o RAET, mantida o BCS em pleno funcionamento, e havendo um negócio jurídico válido entre F ACB e BCS, o FGC tinha
poderes de gestão e estava autorizado a dar continuidade ao cumprimento das obrigações contratuais, de modo a permitir o
saneamento da crise econômico-financeira do BCS. Como bem destacou o Ministério Público em seu parecer, seria difícil que
outro agente econômico aportasse os valores que o BCS obteve junto ao F ACB quando todo o mercado sabia das suas
fragilidades econômico-financeiras, de modo que eram plenamente justificáveis as cessões realizadas durante o RAET, para
manter o BCS em funcionamento, cumprindo suas obrigações perante terceiros, o que afasta a incidência do art. 83, VIII, “b”, da
LRF. Claro que essa conclusão não impede os falidos de pretender a responsabilização do FGC por supostamente terem levado
o BCS à quebra, mas esta matéria é objeto de ação própria e não impede a imediata reclassificação do crédito do F ACB. Pelo
exposto, julgo procedente a impugnação para que os créditos da F ACB sejam considerados por restituição. A decisão acima
transcrita foi mantida pelo E. TJSP no julgamento do Agravo de Instrumento nº 2081895-56.2017.8.26.0000, em V. Acórdão
assim ementado: Agravo de instrumento. Recurso interposto contra a r. decisão que alterou a classificação do crédito do FACB
de subordinado para sujeito à restituição. Decisão fundada em duas premissas: 1) o FGC proveu liquidez ao BCS através do
FACB, antes e durante o RAET, e, em troca, recebeu, por cessão, direitos creditórios; 2) não incide o art. 83, inciso VIII, alínea
‘b’, da Lei nº. 11.101/05, pois os aportes realizados pelo FGC, via FACB, não indicam fraude, mas mero cumprimento de
obrigação contratual, com vistas à salvaguarda do BCS. Preliminar de violação do contraditório por ausência de manifestação
sobre documento novo (parecer jurídico). Rejeição. Convergência jurisprudencial no sentido de que pareceres jurídicos
constituem reforço argumentativo e não caracterizam documento novo, prescindindo da oitiva da parte contrária (art. 437 do
CPC/15). Parecer juntado aos autos que, segundo o Juízo de origem, não influiu na convicção judicial, visto que relativo a
questão amplamente debatida nos autos. Preliminar de cerceamento de defesa por ausência de dilação probatória. Rejeição.
Instrução pretendida pelos agravantes para demonstrar fatos incontroversos. Desnecessidade (art. 374, inciso III, do CPC/15).
As circunstâncias que envolviam o aporte de recursos pelo FGC no BCS foram descritas de modo similar pelas partes e pelo
administrador judicial. Valoração sobre a licitude da operação de liquidez que é objeto de análise em outros autos. Classificação
de crédito falimentar que veicula matéria eminentemente de direito, passível de imediata apreciação. Mérito. Análise das
finalidades institucionais do FGC (art. 2º do estatuto). Distinção entre as funções de: 1) paybox clássico (iniciada após a
liquidação extrajudicial, em setembro/2012, com o pagamento aos depositantes/investidores garantia ordinária à época limitada
a R$ 70.000,00, exceto para DPGEs, cujo limite era de 20 milhões); 2) paybox plus (aportes de recursos, pelo FGC, através do
Fundo GAMA desde 2009 e do Fundo FACB desde 2011 que avançaram sobre o período do RAET de 04/06/2012 a 14/09/2012
- sob a fiscalização do Bacen). Tese recursal de fraude, por parte do FGC, não conhecida. Inadequação da via estreita do
agravo de instrumento. Questão já judicializada (proc. nº. 1117505-64.2015.8.26.0100), em cuja via poderá haver profunda
discussão, à luz do amplo contraditório, inclusive com eventual instrução probatória, sem prejuízo de outras demandas futuras,
até de iniciativa do Ministério Público, para apuração do proceder do FGC. Ressalva quanto ao entendimento adiantado pelo
Juízo de origem na r. decisão recorrida (segunda premissa, sobre a atuação do FGC no RAET), que deve ser tido como parte da
fundamentação adotada em suas razões de decidir. Inexistência de ratificação deste E. TJSP quanto ao ponto. Controvérsia
restrita à classificação do crédito do FACB fundo do qual o FGC é o único cotista sênior - na falência do BCS. Eventual dano
porventura apurado em ação própria que poderá ser objeto de oportuno ressarcimento à massa falida pelo FGC (instituição
solvente). Irrelevância sobre a ordem de pagamento no concurso universal. Possibilidade de futuro rateio extra entre credores.
Inteligência do art. 83, inciso VIII, alínea ‘b’, da Lei nº. 11.101/05. Não se sustenta a interpretação de que, tendo o FGC assumido
a administração do BCS durante o RAET, seu crédito (em nome do FACB) deveria ser subordinado. Análise mais acurada revela
que a administração que acarreta subordinação do crédito não é exatamente aquela exercida pelo FGC. A administração do
FGC difere daquela antes conduzida pelos sócios controladores e seus administradores. Ainda que durante o RAET haja regular
funcionamento do Banco, a atuação do FGC mais se assemelha a do interventor, inobstante a suspensão da rotina bancária
neste último caso. Administrador especial temporário que dispõe de poderes de gestão ordinária, atribuídos pelo Bacen, mas
que não exerce, efetivamente, a administração ordinária, própria dos sócios controladores e seus administradores, sobre os
quais incide a finalidade preventiva do referido dispositivo, subordinando eventuais créditos. Ausência de submissão, poder de
destituição ou relação de confiança entre o FGC e os antigos sócios controladores do BCS. Objetivos administrativos diversos.
Atuação do FGC voltada à recuperação/salvaguarda da instituição financeira em crise, na tentativa de devolvê-la saneada ao
mercado. FGC sujeito ao controle do Bacen, a quem caberia autorizar, em determinadas situações, a prática de atos que
implicassem disposição/oneração patrimonial. Diferença entre a natureza de cada espécie de administração que impossibilita a
aplicação indistinta do mencionado dispositivo, idealizado apenas para situação de normalidade, ausente no caso vertente.
Fosse óbvia, por hipótese, a automática subordinação do crédito do administrador especial temporário, não seria o maior credor
do falido escolhido pelo Bacen para tal mister, tampouco haveria imediata aceitação do encargo, ainda que por indicação
superior, em prejuízo próprio e consciente do FGC. Ausência, ademais, de violação ao estatuto do FGC. Nomeação para atender
a um interesse público específico que traduz exercício de um “múnus público”, e não de uma “função pública propriamente dita”.
Inteligência dos arts. 85 e ss. da Lei nº. 11.101/05. Aportes do FGC, via FACB, que eram garantidos pela cessão de direitos
creditórios oriundos da carteira de créditos consignados do BCS. Valores cedidos que são de propriedade do FACB. Sujeita-se
à restituição o que estava em poder do BCS na data da quebra e que ainda não havia sido repassado ao FACB (R$
323.300.531,38, segundo o administrador judicial). Correta a reclassificação do crédito do FACB de subordinado para sujeito à
restituição. Agravo de instrumento parcialmente conhecido e, na extensão conhecida, desprovido, com ressalva. (TJSP; Agravo
de Instrumento 2081895-56.2017.8.26.0000; Relator Carlos Dias Motta) Como visto, e embora pendente o julgamento do AREsp
nº 1.624.391/SP sem efeito suspensivo, este juízo e o E. TJSP já decidiram a relação havida entre a Massa Falida, o F ACB em
decorrência dos contratos de cessão de direitos creditórios, ressalvando a autonomia de eventual pleito indenizatório em face
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º