TJSP 04/08/2022 - Pág. 1510 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quinta-feira, 4 de agosto de 2022
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano XV - Edição 3562
1510
prestação de serviço em 30/07/2020, junto à primeira ré, a qual se obrigou a entregar os móveis e instala-los. Afirma que foi
pactuado como data de entrega o dia 09/10/2020 e o pagamento total foi ajustado no valor de R$ 34.800,00; contudo, a requerida
não cumpriu a sua obrigação. Sustenta que, por outro lado, efetuou o pagamento do montante de R$ 23.910,00, sendo as
parcelas pagas mediante financiamento celebrado com a financeira corré; que fez reclamação no Procon, contudo, não obteve
resultado. Pede, em liminar, o cumprimento da obrigação pela ré no prazo máximo de 30 dias, com autorização para depósito
das parcelas vincendas em Juízo. Pleiteia a procedência da ação para que seja declarada a rescisão dos dois contratos, em
caso de descumprimento da obrigação de fazer, e para que sejam condenadas, as rés, à devolução do montante pago. Além
disso, pede a condenação da primeira ré a indenizá-la por lucros cessantes, equivalentes ao valor de locação do imóvel,
enquanto esteve desocupado, e danos morais, estes no valor de R$ 10.000,00, arcando, também, com multa de 60% prevista no
contrato. Com a inicial, vieram os documentos (fls. 27/184). A decisão de fls. 199/200 deferiu parcialmente a tutela provisória de
urgência, determinando o cumprimento da obrigação de fazer assumida contratualmente pela primeira ré, no prazo de 30 dias,
sob pena de multa diária de R$ 500,00. A ré Aymoré opôs embargos de declaração (fls. 210/212), que foram acolhidos para
esclarecer que a tutela de urgência refere-se apenas à primeira ré (fl. 219). Apresentou também contestação (fls. 222/233). Em
preliminar, afirma que há ilegitimidade passiva, uma vez que não fez parte do contrato entre a primeira ré e a autora; que não
houve tentativa de solução extrajudicial. No mérito, alega que houve, apenas, a contratação de financiamento junto a ela pela
requerente, o qual deve ser cumprido. Sustenta que a responsabilidade pelo contrato de compra e venda e prestação de serviços
de móveis planejados é apenas da ré Casa Forte e que a contestante não praticou nenhum ilícito. Impugnou os danos materiais
e morais. Pede a improcedência da ação e juntou documentos (fls. 234/253). Em fls. 272/273, a autora pediu a aplicação da
multa diária, posto que transcorridos os 30 dias sem cumprimento da obrigação pela primeira ré. Uma vez que a citação e
intimação dela restou infrutífera, a decisão de fl. 285 deferiu a tutela de urgência requerida em fls. 279/284, determinando a
suspensão das parcelas vincendas do contrato celebrado com a segunda ré e obstando-a de efetuar cobranças relativas a ele.
Houve réplica (fls. 291/305). A segunda ré juntou comprovante de cumprimento da tutela de urgência (fls. 313/316). Porém, a
autora informou que as cobranças não cessaram (fls. 324/331). A ré Casa Forte Empreendimentos foi citada em fl. 348, mas
deixou transcorrer “in albis” o prazo para apresentar contestação (cf. Certidão de fl. 349). A autora requereu a decretação da
revelia (fl. 353). É O RELATÓRIO. DECIDO. A matéria é exclusivamente de direito, pois os fatos estão demonstrados
documentalmente. Por isto, impõe-se o julgamento antecipado da lide, a teor do artigo 355, I, do Código de Processo Civil.
Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva suscitada em fls. 226/227, confunde-se com o mérito. A ação prospera em relação
à ré Ferrucci Construção Civil Ltda ME (Móveis Casa Forte), contudo, é improcedente quanto à ré Aymoré Crédito, Financiamento
e Investimento S/A. O pleito inicial repousa no cumprimento da obrigação de fazer assumida pela primeira ré no contrato
celebrado com a autora, cujo objeto era a confecção e instalação de móveis planejados (fls. 32/36). O prazo para entrega dos
móveis foi ajustado para a data de 13/10/2020 (fl. 37). Entretanto, a requerida não cumpriu o pactuado até os dias de hoje.
Assim, para essa hipótese, a autora requereu a rescisão contratual e a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos,
sendo, a primeira ré, condenada ao ressarcimento do valor apurado, da multa contratual de 60%, de lucros cessantes e de
indenização por danos morais de R$ 10.000,00. Quanto à segunda corré, informa, a autora, que celebrou com ela um
financiamento para pagar o valor devido à primeira, como se vê dos boletos de fls. 116/140 e de fl. 251. Assim, também pede a
rescisão dessa avença e a condenação solidária dela até o limite dos valores recebidos. Nota-se que o referido contrato de
compra e venda de móveis planejados e prestação de serviços (fls. 32/36) foi celebrado em julho de 2020, figurando Maria
Cristina Maruschi, ora autora, como contratante. Ainda, como contratada, consta a primeira ré. Quanto à requerida Aymoré, esta
não tem vínculo com a avença em questão e, assim, não responde pelas obrigações contraídas pela correquerida Casa Forte.
Ora, não existe negócio jurídico de direito material que tenha vinculado a segunda corré a cumprir as obrigações assumidas
pela Casa Forte. O que ocorreu foi a celebração de dois contratos diferentes, sendo um deles o referido contrato de compra e
venda de móveis planejados e em relação ao qual a primeira ré está inadimplente (fls. 32/36). Quanto ao outro (fl. 251), consiste
em financiamento feito pela autora junto à correquerida Aymoré, a qual efetuou o pagamento da instalação e venda dos móveis
planejados à Casa Forte. Portanto, a requerente tornou-se devedora da instituição financeira, a qual arcou com a dívida que ela
contraiu junto à primeira correquerida. A Aymoré, pois, cumpriu com a obrigação assumida contratualmente, sendo-lhe devidos
os pagamentos dos boletos pela autora. O fato de ter ocorrido desacerto comercial entre a requerente e a Casa Forte não pode
prejudicar a instituição financeira Aymoré e, em virtude da inexistência de contrato que vincule esta à obrigação assumida pela
Casa Forte, referente à confecção, entrega e instalação dos móveis planejados, evidente não pode ser condenada a restituir os
valores pleiteados na inicial, pois a sua obrigação foi adimplida. Sendo assim, improcede a ação em face de Aymoré Crédito,
Financiamento e Investimento, já que ela disponibilizou numerário à autora e faz jus ao recebimento da importância ajustada
contratualmente. Dessa forma, é caso de revogar a tutela de urgência concedida em fl. 285. Quanto à correquerida Casa Forte,
por outro lado, nota-se que, no pedido de venda (fl. 37), consta o prazo da entrega em 13/10/2020. O mesmo se vê da cláusula
1.2 do contrato, que especifica o período de 50 dias úteis, contatos da data da assinatura, para tanto (fl. 32). Apesar disso, como
se vê da reclamação feita junto ao Procon de fls. 158/166, datada de março de 2021, a requerida ainda não havia cumprido a
obrigação de entrega, além da autora ter enfrentado dificuldades para resolver a situação na seara administrativa (fls. 57/115).
Perfeitamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela, nos termos do que dispõem os artigos 2º e 3º de
referido diploma legal: “Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja
intervindo nas relações de consumo. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou
estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção,
transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. Conforme se vê
dos autos, a requerida assumiu a posição de fornecedora de produtos e de prestadora de serviços junto à autora (fls. 40/41).
Por meio do contrato celebrado entre as partes (fls. 32/36) e do pedido de venda (fls. 37/39), a ré deveria efetuar a medição, a
confecção e a instalação dos móveis planejados até 13/10/2020. O Código de Defesa do Consumidor prevê a inversão do ônus
da prova à parte que possui maiores condições de comprovar suas alegações em face à outra, que é considerada hipossuficiente
na relação de consumo entre elas existente: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de
seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil
a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências. O presente caso trata, efetivamente,
de relação de consumo (arts. 2º e 3º do CDC), o que enseja a inversão do “ônus probandi” como utensílio apto a autorizar o
equilíbrio entre as partes. Portanto, incumbiria à ré trazer aos autos prova cabal e inconteste, a fim de refutar as teses constantes
da peça exordial, comprovando que cumpriu o pactuado. Mas, assim não agiu, deixando de ofertar contestação. Portanto,
presume-se que os móveis planejados não foram mesmo entregues à autora, tampouco instalados, e que a ré descumpriu sua
obrigação contratual. Assim, é devida a rescisão da avença pleiteada pela autora com a restituição, pela primeira ré, dos valores
pagos (fls. 141/149), tanto a título de entrada (R$ 15.000,00), quanto de todas as 20 parcelas do financiamento. Observo que,
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º