TRF3 04/12/2020 - Pág. 991 - Publicações Judiciais I - Interior SP e MS - Tribunal Regional Federal 3ª Região
alegações de vício do consentimento e fraude, bem como na atribuição de consequências a eventual reconhecimento da insubsistência da avença: nulidade do procedimento extrajudicial de consolidação da propriedade do imóvel
dado em garantia, devolução dos valores pagos indevidamente, registro definitivo da propriedade do imóvel dado em garantia em favor da autora e pagamento de indenização por danos morais.A fim de conferir maior clareza ao
julgamento, passo a tratar de cada ponto em tópico separado.Do contrato n. 155552998478De acordo com o contrato de mútuo de dinheiro condicionado com obrigações e alienação fiduciária n. 155552998478 (fls. 33/42), a
autora, em 17/03/2014, tomou emprestados R$ 54.000,00, dos quais R$ 3.745,54 seriam destinados à quitação do saldo devedor do contrato de habitação n. 8.0282.6059.274-2, e o restante (R$50.254,46), seria creditado
na conta n. 0282.013.161830-6, da requerente, para sua livre utilização. Nele, o imóvel objeto da matrícula n. 93.102, do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Araraquara-SP, foi dado em garantia. Segundo planilha de
evolução teórica do contrato (fls. 43/45), a autora pagaria inicialmente uma prestação de aproximadamente R$ 1.000,00 (fls. 43).O extrato da conta poupança n. 0282.013.161830-6 (fls. 47) revela que em 18/03/2014 foi
disponibilizado um crédito de R$ 49.259,55 a título de financiamento; em 20/03/2014, autorizado um débito de R$ 26.894,00, e em 14/04/2014, outro, de R$ 796,50; por fim, depois de já ter sido debitado o valor
correspondente à primeira prestação do mútuo em 17/04/2014, foi autorizado um débito de R$ 21.387,28, que esvaziou a conta poupança da autora. Somados, os débitos autorizados entre 20/03/2014 e 23/04/2014, com
exceção da prestação do mútuo, alcançaram o montante de R$ 49.077,78, quase a totalidade do que foi disponibilizado a título de financiamento.A matrícula do imóvel em questão (fls. 48/49) registra as consequências do
contrato: cancelamento da hipoteca favorável à Caixa, relativa à compra e venda celebrada por Mauricélia com recursos da instituição financeira em 2000; e alienação fiduciária do mesmo imóvel como garantia do novo
contrato.O contrato de mútuo no bojo do qual essa hipoteca fora constituída (fls. 60/75) foi celebrado em 28/06/2000, nele comprometendo-se Mauricélia ao pagamento de 240 parcelas com valor inicial de R$ 133,44 portanto de pouca monta.Às vésperas da celebração do contrato, documento remetido pela Caixa à autora pela via postal (fls. 81) revelava que esta estava pagando em 02/2014 a 164ª parcela de um total de 240, no valor de
R$ 105,23, sendo seu saldo devedor teórico correspondente a meros R$ 3.835,83.A autora narra na Inicial que não tinha interesse em tomar emprestados mais de R$ 50.000,00; em arcar com uma parcela mensal tão alta, de
aproximadamente R$ 1.000,00; tampouco em alienar fiduciariamente seu imóvel, quando pagava parcela de pouca monta (aproximadamente R$ 100,00) pelo mútuo anterior, sendo-lhe fácil quitá-lo e assim cancelar a hipoteca
correspondente, na medida em que o saldo devedor não passava de R$ 4.000,00; no entanto, sob pressão de funcionários da Caixa, que a advertiram de que as dívidas contraídas por seu então marido poderiam lhe causar
consequências adversas graves, foi levada a assinar esse novo contrato de mútuo, em tudo desfavorável aos seus interesses. Prova de que o contrato se destinou ao pagamento dessas dívidas de terceiro seriam os débitos
efetuados em sua conta poupança entre 20/03/2014 e 23/04/2014, os quais não corresponderiam à utilização livre, de sua parte, do montante disponibilizado, mas sim à apropriação, pela própria Caixa, do que entendia ser-lhe
devido. Instruem a Inicial dois holerites da autora (fls. 21), técnica em enfermagem, relativos a julho e agosto de 2016, ambos com salário bruto de aproximadamente R$ 2.500,00. Igualmente segundo a Inicial, tanto a autora
quanto o seu então esposo, à época do segundo mútuo, percebiam renda aproximada de R$ 1.000,00 cada (fls. 06), o que tornava proibitivo pagar uma prestação mensal com esse valor, e estranho que a instituição financeira
aprovasse um mútuo tão alto para pessoas com renda tão baixa. A Caixa, em contestação, não impugnou especificamente essas alegações fáticas.Em audiência (fls. 194/195), a autora fez coro à narrativa da Inicial, reforçando a
pressão que sofreu do gerente da Caixa para assinar o contrato e quitar as dívidas do marido, sob pena de ele ser preso.O ex-marido da autora, Valcir, prestou depoimento (fls. 194 e 196) cuja importância recomenda sua
transcrição completa (em termos aproximados o mais possível da expressão oral própria do ato):Juíza:- O senhor fez um empréstimo com a Caixa? R- Eu sou um funcionário público da prefeitura e eu tinha um crédito consignado
com uma financeira chamada Alfa. Depois de um tempo, a Caixa passou a oferecer aos funcionários da prefeitura a compra deste consignado e, como na época eu precisava de dinheiro, eu fui à Caixa e fiz essa portabilidade de
consignado. No entanto, esta portabilidade é feita entre a Caixa e a financeira e eu apenas deveria levar o valor que estava devendo para a financeira à Caixa e ela repassaria para a financeira. Fico então devendo para a Caixa, e
não mais para a Alfa.Um tempo depois, eu comecei a receber umas ligações da Caixa, perguntando se eu não teria interesse em fazer investimentos e, de início, achei uma proposta estranha, já que nunca tive dinheiro para este
tipo de coisa. Foram cerca de três ligações até que decidi ir na Caixa, conversei com o gerente e disse que não tinha dinheiro para realizar investimentos e ele me disse que eu tinha R$23.000,00 na minha conta bancária.
Atordoado, eu informei que não recebia esse valor pelo meu trabalho na prefeitura, informando que meu salário era de x reais. Ele então me disse que o dinheiro era meu e apenas eu poderia movimentá-lo e, caso o deixasse na
conta corrente, correria taxas sobre esse valor. Me informou também que eu precisava ter apenas mais dois mil reais para investir. Fiquei cismado e decidi ir para casa.Passado um tempo, decidi sacar uma parte desse dinheiro,
um valor razoavelmente baixo. Fui utilizando este valor que estava na minha conta e não recebi mais nenhuma ligação da Caixa. Assim que acabou o dinheiro a Caixa me ligou, pedindo para que eu fosse até a agência para
conversarmos sobre um problema na minha conta. Eu concordei e fui para lá, que aliás foi onde conheci o senhor Mário, gerente do banco. Mario me disse que, após ser feito um balanço geral, percebeu-se uma diferença de
valor, pois havia sido feito o procedimento da portabilidade erroneamente, indo em duplicidade um valor para a financeira e outro para minha conta corrente. Perguntei de que forma eu poderia resolver aquela situação e ele disse
que aquela situação era passível de processo federal e poderia envolver a polícia, já que utilizei um valor que não me pertencia. Perguntei se eu não poderia usar meu fundo de garantia ou cobrir aquele valor trabalhando em mais
um emprego, ele, no entanto, disse que não. Mario indagou se eu tinha algum bem e eu afirmei que não tinha nenhum bem em meu nome, tenho apenas um carro financiado e falei que a única outra coisa que tinha além do carro era
a casa em que morava com minha esposa, que não está em meu nome, mas no dela.Por fim, Mario pediu que eu levasse minha esposa na agência para conversar e resolver esse problema, enfatizando que, se não resolvêssemos,
isso geraria um processo para mim e seria preso. Fui embora bastante assustado com a ideia. Juíza:- Qual foi a impressão que o senhor teve nessa conversa com o gerente do banco? Deu a sua casa em garantia ao sair de lá? RNão, eu não assinei nenhum documento. A impressão que tive foi de que estava sendo pressionado, porque ele não me deu a opção de pagar com meus próprios meios disponíveis, dando apenas a opção da casa de minha
esposa como garantia ou de ser processado e preso. Advogada da Autora:- Gostaria que ele relatasse como foram as outras duas vezes em que ele foi a agência com Mauricelia para resolver a situação no banco. R- Eu falei para
minha esposa que ela precisaria ir lá comigo, ela me indagou o porquê e expliquei por cima o ocorrido. Ao chegarmos lá, estava na sala Mário e mais dois funcionários, acho que uma se chamava Ariadne e o outro Wesley, creio
eu. Foi explicado para minha esposa o que antes havia sido exposto para mim, inclusive o fato de eu poder ir preso pelo ocorrido. Quando ele mostrou os valores das parcelas a serem pagas, eu e minha mulher logo afirmamos
que seria impossível arcar com aquele valor, afinal pagávamos pouco mais de 100 reais do financiamento da casa e agora o valor subiu para 990 reais, o que era praticamente quanto a gente ganhava.Ao ouvir o que falamos sobre
o valor, Mario foi um pouco mais severo e disse que não havia outra forma de resolver. Me recordo que minha esposa perguntou se não poderia usar o fundo de garantia dela e ele disse que não. Foi quando ele disse para irmos
embora para pensar a respeito que ele os aguardaria no dia seguinte com a decisão. Ao voltarmos, ele aparentava estar mais bravo que no dia anterior, visto que ele já não explicava mais para a gente a situação ou nos orientava,
apenas impunha o contrato para ser assinado. Juíza:-E então vocês assinaram? R-Não, quem assinou foi apenas Mauricelia. Advogado da Caixa:- Eu gostaria de saber, quando Valcir fez esta portabilidade, qual foi o valor
recebido além desses vinte e três mil reais (crédito em duplicidade). R- Na verdade eu só recebi os vinte e três mil e mais uns duzentos e poucos reais, nada além disso. Na portabilidade, quem paga a dívida é a Caixa, ou seja, ela
pagou para a Alfa o valor de vinte e três mil e ao renovar fiquei com um saldo de três mil e pouco. Advogado da Caixa:- Quanto tempo levou para você utilizar esse valor que estava na sua conta (vinte e três mil reais)? R- Foram
cerca de uns cinco ou seis meses. Advogado da Caixa:-Na época, qual era a renda do senhor? E em que você usou esse valor depositado? R- Eu recebia mil, duzentos e pouco. Usei esse dinheiro mais para sustento próprio, não
foi um dinheiro que apliquei na casa, foi mais para minha família(Advogado da Caixa pede permissão para olhar valores contidos no processo)Juíza:-Só para complementar, a Mauricelia sabia desses vinte e três mil que estavam
sendo gastos? R- Não, eu contei para ela só depois. Juíza:-O senhor gostaria de complementar alguma coisa? R- Não excelência.Juíza:-Ela assinou sobre colocar a casa como garantia? R- Na verdade, não conseguimos
compreender muito bem o documento na íntegra, não eram muito explicativos e não foi explicado para nós as cláusulas daquele contrato, apenas cobrada a assinatura de minha ex esposa. A única coisa que tínhamos
conhecimento era o valor das prestações, mas como ele mesmo disse que o valor das prestações era decrescente e que não devíamos nos preocupar, acabamos assinando. Juíza:-Então vocês não concordaram entre si sobre
assinar este contrato? R-Com certeza não. Advogado da Caixa:-Pelo que analisei, o contrato era no valor de cinquenta mil, uma parte para pagar a dívida original do contrato habitacional que estava em torno de rês mil reais e
desse valor restante, você ficou com alguma parte depois dele ter sido renovado? R-Não.Outro depoimento relevante, cuja transcrição merece ser feita na íntegra (sempre de forma aproximada à expressão oral), é o de Araini
(fls. 160 e 163), que à época da disponibilização indevida de crédito a Valcir, trabalhava na Caixa:Advogado da Caixa:-Conte-nos o que você soube na época dos contratos, afinal você trabalhava na unidade na época em que
ocorreram os fatos, certo? R- Sim. O que sei sobre o caso é que que, na época, houve uma liberação em duplicidade de um crédito para Valcir (marido de Mauricelia) ao invés de ser liberado um valor único. Valcir acabou por
utilizar o valor, então questionamos se havia alguma forma dele reaver esse valor que ele utilizou indevidamente. Valcir disse que não tinha condições para tal, sendo proposto, portanto, um crédito imóvel próprio como
garantia.Advogado da Caixa:-Se um cliente chega na Caixa e diz que foi creditado com um valor mais alto do que deveria, qual o procedimento comum a ser adotado? R- Investigar para descobrir de onde surgiu este valor que
fora creditado a mais.Advogado da Caixa:-E você se recorda de o Sr. Valcir ter ido na unidade para fazer esta solicitação de investigação?R- Não me recordo. Talvez ele tenha falado com outro empregado da agência, mas eu
acredito quer não, visto que eu estava tratando do caso na época. Advogada da autora:- Você estava presente no dia que a autora assinou novo contrato?R- Eu não estava presente no dia da assinatura, apenas quando Valcir
havia sido chamado para que lhe fosse explicado o que havia ocorrido. Advogada da autora:- Você tem conhecimento de que o novo contrato havia sido feito somente no nome de Mauricelia? R- Eu sei que a negociação feita foi
para os dois, mas não sei se o imóvel estava apenas no nome dela ou no nome de ambos. Advogada da autora:- Durante as negociações então você chegou a ter contato com Mauricelia? R- Sei que ela foi com ele nas
negociações, mas eu tive contato mais com ele do que com ela durante esse período. Advogada da autora:- Você não sabe então se ela estava ou não de acordo com esse contrato ou se ela estava ciente de todos os riscos que
acarretaria para ela? Ela foi orientada corretamente? R- A finalização do contrato foi feita pelo gerente-geral da época, Mario Antônio. Acredito que ele mesmo tenha colhido a assinatura da autora. Advogada da autora:- Você
participa deste tipo de contrato conversando com o cliente, avaliando renda? R- Neste contrato específico de utilização do imóvel não, mas participo do contrato do consignado liberado. Eu cuido das pendências contábeis, que
foi quando percebemos que houve essa liberação de crédito em duplicidade. Advogada da autora:- Você sabe se houve algum procedimento interno com relação ao Valcir para a devolução deste valor? R- Seria aberto caso não
tivesse feito o pagamento, mas como foi tomada a decisão de ser feito o contrato não foi necessário. Advogada da autora:-Qual funcionário teria cometido esse erro da duplicidade de valores? Foi apurado isto? R- Foi um erro
do sistema, por isso não houve apuração. Juíza:-É comum a Caixa fazer esse procedimento de colocar o imóvel do cliente como garantia do cumprimento da obrigação? Não deveria haver sempre a comprovação da anuência da
pessoa que disponibilizará o imóvel? R- Sim, mas me recordo que na época foi explicado como funcionaria, em quantas parcelas seriam divididas e etc. Não sei de fato como foi no momento da assinatura do contrato, mas
acredito que ela tenha anuído. Quando ocorre em casal, é comum que os dois sejam chamados. O referido gerente-geral, Mário Antônio, em depoimento prestado neste processo (fls. 207), pouco elucidou a respeito do caso,
afirmando sempre não se recordar dele; trouxe, contudo, a seguinte informação:Advogada da autora:- Como é analisada, neste tipo de contrato, a questão da prestação? Vocês levam em conta a renda ou outro fator? R- A
Caixa aceita tanto a renda formal, que é aquela comprovada, como também a renda informal (extratos bancários, extratos de cartão de crédito e até mesmo declaração do próprio tomador. Nos dias de hoje, não pode
ultrapassar a 30%.Decisão de fls. 192 inverteu o ônus da prova no que se refere à comprovação de que os débitos de que trata o referido item 3 [de fls. 158/159] foram autorizados, devendo, portanto, a Caixa arcar com a
comprovação de sua autorização, da destinação interna que tiveram e da existência de disponibilização equívoca de crédito em favor do esposo da requerente, a qual teria justificado o mútuo ora em debate. Não fazendo a Caixa
essas comprovações, suportará as consequências da ausência dessas provas para a solução do caso. A Caixa não carreou esses documentos aos autos.Na primeira audiência realizada neste processo, o então preposto da Caixa
foi ouvido (fls. 160/161), e deste depoimento transcrevo os seguintes trechos, que reputo relevantes:Advogada da autora:- E este débito autorizado?R- Ocorre tanto por parte do cliente, como por parte gerencial (nunca outro
funcionário da agência o pode fazer). Normalmente é escrito a que se refere este débito autorizado, devendo haver um documento que afirme isto. Advogada da autora:- Agora eu gostaria de saber sobre as autorizações, se você
sabe se isso partiu da cliente ou do gerente-geral? R- Para saber te informar, precisaria do instrumento redigido para saber do que se trata, mas pelo o que tive de conhecimento sobre a situação, seria realmente para fazer aqueles
acertos pendentes. Advogada da autora:- No caso, a meritíssima até intimou a Caixa para trazerem o documento, tendo uma petição protocolada que não chegou a tempo. Enfim, quanto ao erro na conta do esposo dela, se ela
não tivesse assinado este contrato e assumido esta responsabilidade, qual seria a consequência disto? O que faria o banco nesta situação? R- Caso o cliente não tivesse anuído ao contrato, o banco instauraria um processo
administrativo de apuração de responsabilidade para ver se houve um erro tecnológico, se houve falha de empregado, tudo para chegar a esta diferença de valores, o que não foi necessário visto que o contrato de mútuo fora
assinado.Através de processo administrativo, entraríamos em contato com o cliente para tentar fazer uma negociação e, se não funcionasse, ficaria um contrato em aberto, negativando seu nome no SERASA, SPC (dívida
aberta até sua resolução).Ante o exposto, avaliando livre e racionalmente o acervo probatório coligido, julgo que restou comprovado o seguinte: que Mauricélia, particularmente, não tinha interesse em contrair um empréstimo de
mais de R$ 50.000,00, entregando seu imóvel em garantia quando a hipoteca deste poderia ser facilmente liberada com menos de R$ 4.000,00; que Mauricélia e o marido não apresentavam renda suficiente para contrair um
empréstimo de mais de R$ 50.000,00, com prestações mensais de aproximadamente R$ 1.000,00, sendo contrário à praxe conhecida da instituição financeira liberar tamanho crédito a tomadores com tão parcas chances de
adimplir suas obrigações; que o argumento de que as prestações mensais eram decrescentes não justifica a concessão incomum do empréstimo, pois, por exemplo, entre a 1ª e a 16ª prestações (fls. 91/92) - o que representa um
significativo intervalo de tempo -, o valor pago, na prática, aumentou, de R$ 1.003,60 para R$ 1.084,70; que houve erro da Caixa ao disponibilizar mais de R$ 20.000,00 ao marido de Mauricélia, erro este que levou os
empregados da instituição a tentarem resolver a situação sem que ela se transformasse num procedimento administrativo que lhes pudesse prejudicar; que, por conta dessa tentativa de resolver o problema o quanto antes e sem
maiores prejuízos, Mauricélia foi pressionada a assinar o contrato que lhe era tão desvantajoso, temerosa das consequências adversas que poderiam sobrevir ao marido; que os valores disponibilizados, para além daquele
destinado à quitação do mútuo anterior, não foram livremente utilizados por Mauricélia, mas apropriados pela Caixa para cobrir o prejuízo advindo da utilização indevida do crédito disponibilizado ao marido da autora; que a
Caixa agiu de má-fé ao não vincular explicitamente a destinação do produto do mútuo, no contrato, ao pagamento dos prejuízos causados pelo marido de Mauricélia, evitando assim explicitar e formalizar o equívoco interno da
agência ao disponibilizar esse crédito, e, portanto, as consequências disciplinares ou correcionais que poderiam daí advir.Conquanto a versão de que Mauricélia teria assinado o contrato sob pressão porque seu marido poderia
ser preso pareça a princípio inverossímil - já que hoje em dia é público e notório que mesmo pessoas mais simples sabem que ninguém vai preso por dívidas -, julgo que a particularidade da situação do marido possa realmente ter
tornado crível essa ameaça. Explico: o marido de Mauricélia não apenas devia à Caixa: ele se apropriara de valores que lhe foram disponibilizados indevidamente e os gastara; não seria difícil construir a partir dessa premissa uma
argumentação de que sua conduta tangenciava o furto ou a apropriação indébita, tipos penais, e com isso incutir em Mauricélia o fundado receio de que seu marido fosse preso ou enfrentasse problemas na esfera criminal.As
conclusões acima, como já dito, decorrem, em linhas gerais, da convergência entre os depoimentos de Mauricélia, do seu marido e de Araini, em acréscimo a esclarecimentos pontuais e técnicos fornecidos pelo gerente Mário
Antônio e pelo preposto que depôs na primeira audiência (acima transcritos); das informações relativas à renda da autora e do seu marido contidas nos autos, não impugnadas pela Caixa; da praxe conhecida dos bancos e
inclusive referida em audiência pelos empregados da Caixa, consistente no não comprometimento da renda dos mutuários em patamar superior a 30%; da evidente desvantagem para Mauricélia em colocar em risco seu imóvel,
que era de tão fácil quitação, para contrair um empréstimo que dificilmente conseguiria pagar; e do fato - importantíssimo - de que a Caixa não atendeu à decisão de fls. 192, que inverteu o ônus da prova no que se refere à
comprovação de que os débitos de que trata o referido item 3 foram autorizados [item 3 de fls. 158/159 - os débitos que se seguiram à disponibilização da quantia mutuada e estão registrados no extrato da conta poupança da
autora - fls. 47], consignando que a Caixa arcaria assim com a comprovação de sua autorização, da destinação interna que tiveram e da existência de disponibilização equívoca de crédito em favor do esposo da requerente, a qual
teria justificado o mútuo ora em debate, sob pena de suportar as consequências da ausência dessas provas para a solução do caso. A meu ver, a ausência dessas provas corrobora a percepção de que Mauricélia foi pressionada a
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 04/12/2020 991/2063