TST 21/10/2020 - Pág. 319 - Judiciário - Tribunal Superior do Trabalho
3084/2020
Data da Disponibilização: Quarta-feira, 21 de Outubro de 2020
Tribunal Superior do Trabalho
atente-se para o seguinte precedente:
INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO PODER
PÚBLICO - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO PRESSUPOSTOS PRIMÁRIOS DE DETERMINAÇÃO DESSA
RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO CAUSADO A ALUNO POR
OUTRO ALUNO IGUALMENTE MATRICULADO NA REDE
PÚBLICA DE ENSINO - PERDA DO GLOBO OCULAR DIREITO FATO OCORRIDO NO RECINTO DE ESCOLA PÚBLICA
MUNICIPAL - CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL
OBJETIVA DO MUNICÍPIO - INDENIZAÇÃO PATRIMONIAL
DEVIDA - RE NÃO CONHECIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL
OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL. - A teoria do risco administrativo, consagrada
em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a
Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à
responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que
os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por
omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio
constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público,
faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo
Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial
sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes
estatais ou de demonstração de falta do serviço público. - Os
elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da
responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a
alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus
damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do
agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva,
imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição
funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva,
independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional
(RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da
responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 RTJ 99/1155 - RTJ 1 31/417). - O princípio da responsabilidade
objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o
abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria
responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais
configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a
força maior - ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à
própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50). RESPONSABILIDADE
CIVIL DO PODER PÚBLICO POR DANOS CAUSADOS A ALUNOS
NO RECINTO DE ESTABELECIMENTO OFICIAL DE ENSINO. - O
Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos
estabelecimentos da rede oficial de ensino, assume o grave
compromisso de velar pela preservação de sua integridade física,
devendo empregar todos os meios necessários ao integral
desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em
responsabilidade civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno. A obrigação governamental de preservar a intangibilidade física dos
alunos, enquanto estes se encontrarem no recinto do
estabelecimento escolar, constitui encargo indissociável do dever
que incumbe ao Estado de dispensar proteção efetiva a todos os
estudantes que se acharem sob a guarda imediata do Poder Público
nos estabelecimentos oficiais de ensino. Descumprida essa
obrigação, e vulnerada a integridade corporal do aluno, emerge a
responsabilidade civil do Poder Público pelos danos causados a
quem, no momento do fato lesivo, se achava sob a guarda,
vigilância e proteção das autoridades e dos funcionários escolares,
ressalvadas as situações que descaracterizam o nexo de
causalidade material entre o evento danoso e a atividade estatal
imputável aos agentes públicos. (STF-RE-109615/RJ, 1ª Turma,
Relator Ministro Celso de Melo, publicado no DJU de 2/8/1996).
Código para aferir autenticidade deste caderno: 158084
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Conquanto consagrada expressamente a adoção da teoria da
responsabilidade civil objetiva nas atividades de risco apenas em
2002, a legislação trabalhista brasileira, na vanguarda da tutela dos
direitos humanos no Brasil, já previa, desde 1943, a
responsabilidade civil objetiva do empregador pela reparação dos
danos materiais e morais sofridos pelos empregados, decorrentes
da execução do contrato de emprego.
Com efeito, a assunção dos riscos da atividade econômica, prevista
no artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho, compreende
não apenas os riscos financeiros da atividade empresarial, mas todo
o risco que essa atividade econômica representa para a sociedade
e, principalmente, para seus empregados. Interpretação diversa
violaria o princípio da função social da empresa (artigo 170, III, da
Constituição da República).
Ao assumir os riscos inerentes à atividade econômica, o
empregador assume o ônus de responder, de forma objetiva, por
todos os danos causados por sua atividade empresarial. Não seria
lógico entender que, embora assumindo os riscos da atividade, o
empregador respondesse de forma subjetiva pelos danos causados
a seus empregados. A se acolher tal entendimento, estar-se-ia
desvirtuando a regra do artigo 2º da Consolidação das Leis do
Trabalho, criando-se uma reserva quanto à responsabilidade da
empresa, pois, embora assumindo os riscos da atividade, incumbiria
ao trabalhador ofendido a prova de que o dano foi causado por
culpa ou dolo do empregador.
A jurisprudência desta Corte superior, após certa controvérsia,
sufragou a aplicação da teoria da responsabilidade civil objetiva
apenas nas hipóteses em que a atividade empresarial é
considerada de risco. Destaquem-se, nesse sentido, os seguintes
precedentes (os grifos não são do original):
(...)
Conclui-se, assim, que o risco ordinário, ínsito ao dia a dia, dá azo à
responsabilidade subjetiva, fundada no dolo ou na culpa do
agressor. De outro lado, o risco extraordinário, decorrente de
atividade que extrapola o perigo comum, enseja a responsabilidade
objetiva do agente causador.
Com efeito, não se permite mais a persecução do lucro, objetivo da
atividade empresária (artigo 981 do Código Civil), sem o resguardo
da função social da empresa, que impõe ao empresário a
observância das normas de defesa ao meio ambiente, ao
consumidor e, principalmente, ao trabalhador - principal elemento
integrante do conceito da atividade organizada (artigo 966 do
Código Civil).
Frise-se, ainda, que o reconhecimento da responsabilidade civil
objetiva não é incompatível com o disposto no artigo 7º, XXVIII, da
Constituição da República, visto que a cabeça do mesmo dispositivo
assegura a observância de outros direitos que visem à melhoria da
condição social dos trabalhadores. Tal dispositivo apenas consagra
o mínimo de direitos que devem ser assegurados ao trabalhador.
Ressaltou o Exmo. Ministro Joaquim Barbosa, ao proferir seu voto
no julgamento da ADI 639, que "o art. 7º da Constituição não exaure
a proteção dos direitos sociais". Segundo o professor Alexandre de
Moraes, "no art. 7º, o legislador constituinte definiu alguns direitos
constitucionais dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social" (in Direito
Constitucional, 12ª ed., São Paulo: Atlas, 2002, pág. 204).
Nesse contexto, é inevitável o reconhecimento de que a atividade
de condutor de veículo rodoviário (motorista de caminhão), em face
de sua natureza, configura atividade de risco, porquanto expõe o
trabalhador à probabilidade da ocorrência de sinistros durante as
viagens - como no caso dos autos, em que o empregado foi vítima
de acidente de trânsito. Conquanto o acidente não tenha contado