TST 23/10/2020 - Pág. 265 - Judiciário - Tribunal Superior do Trabalho
3086/2020
Data da Disponibilização: Sexta-feira, 23 de Outubro de 2020
Tribunal Superior do Trabalho
responsável (ubi emolumentum, ibi ônus)".
A teoria da responsabilidade civil objetiva, adotada no parágrafo
único do artigo 927 do Código Civil, fundada no risco da atividade,
prescinde da existência de culpa ou dolo do agente, bastando a
comprovação do nexo de causalidade entre a conduta e o dano.
Frise-se não se tratar de mera inversão do ônus da prova,
consagrada pela teoria da culpa presumida, adotada, por exemplo,
no artigo 936 do Código Civil, de seguinte teor:
Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este
causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.
Importante destacar, ainda, que a teoria objetiva não se confunde
com a teoria do risco integral, para a qual a culpa exclusiva da
vítima, o caso fortuito e a força maior não influenciam no dever de
indenizar.
José Cretella Júnior, ao discorrer sobre a teoria do risco integral,
ressalta que esta "é a modalidade extremada do risco
administrativo, abandonada, na prática, por conduzir ao abuso e à
iniquidade social. Por essa fórmula radical, a Administração ficaria
obrigada a indenizar todo e qualquer dano suportado por terceiros,
ainda que resultante de culpa ou dolo da vítima" (in Comentários à
Constituição Brasileira de 1988, 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1992, pág. 2.330).
A professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, examinando a
responsabilidade civil objetiva do Estado, consagrada no § 6º do
artigo 37 da Constituição da República, ensina que "são apontadas
como causas excludentes da responsabilidade a força maior e a
culpa exclusiva da vítima" (in Direito Administrativo, 20ª ed., São
Paulo: Atlas, 2007, pág. 602).
O próprio Supremo Tribunal Federal sufragou o entendimento de
que a responsabilidade civil do Poder Público, fundada na teoria
objetiva, é afastada quando comprovada a existência de caso
fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima. Nesse sentido,
atente-se para o seguinte precedente:
INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO PODER
PÚBLICO - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO PRESSUPOSTOS PRIMÁRIOS DE DETERMINAÇÃO DESSA
RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO CAUSADO A ALUNO POR
OUTRO ALUNO IGUALMENTE MATRICULADO NA REDE
PÚBLICA DE ENSINO - PERDA DO GLOBO OCULAR DIREITO FATO OCORRIDO NO RECINTO DE ESCOLA PÚBLICA
MUNICIPAL - CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL
OBJETIVA DO MUNICÍPIO - INDENIZAÇÃO PATRIMONIAL
DEVIDA - RE NÃO CONHECIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL
OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL. - A teoria do risco administrativo, consagrada
em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a
Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à
responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que
os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por
omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio
constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público,
faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo
Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial
sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes
estatais ou de demonstração de falta do serviço público. - Os
elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da
responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a
alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus
damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do
agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva,
imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição
funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva,
Código para aferir autenticidade deste caderno: 158265
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independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional
(RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da
responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 RTJ 99/1155 - RTJ 1 31/417). - O princípio da responsabilidade
objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o
abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria
responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais
configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a
força maior - ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à
própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50). RESPONSABILIDADE
CIVIL DO PODER PÚBLICO POR DANOS CAUSADOS A ALUNOS
NO RECINTO DE ESTABELECIMENTO OFICIAL DE ENSINO. - O
Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos
estabelecimentos da rede oficial de ensino, assume o grave
compromisso de velar pela preservação de sua integridade física,
devendo empregar todos os meios necessários ao integral
desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em
responsabilidade civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno. A obrigação governamental de preservar a intangibilidade física dos
alunos, enquanto estes se encontrarem no recinto do
estabelecimento escolar, constitui encargo indissociável do dever
que incumbe ao Estado de dispensar proteção efetiva a todos os
estudantes que se acharem sob a guarda imediata do Poder Público
nos estabelecimentos oficiais de ensino. Descumprida essa
obrigação, e vulnerada a integridade corporal do aluno, emerge a
responsabilidade civil do Poder Público pelos danos causados a
quem, no momento do fato lesivo, se achava sob a guarda,
vigilância e proteção das autoridades e dos funcionários escolares,
ressalvadas as situações que descaracterizam o nexo de
causalidade material entre o evento danoso e a atividade estatal
imputável aos agentes públicos. (STF-RE-109615/RJ, 1ª Turma,
Relator Ministro Celso de Melo, publicado no DJU de 2/8/1996).
Conquanto consagrada expressamente a adoção da teoria da
responsabilidade civil objetiva nas atividades de risco apenas em
2002, a legislação trabalhista brasileira, na vanguarda da tutela dos
direitos humanos no Brasil, já previa, desde 1943, a
responsabilidade civil objetiva do empregador pela reparação dos
danos materiais e morais sofridos pelos empregados, decorrentes
da execução do contrato de emprego.
Com efeito, a assunção dos riscos da atividade econômica, prevista
no artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho, compreende
não apenas os riscos financeiros da atividade empresarial, mas todo
o risco que essa atividade econômica representa para a sociedade
e, principalmente, para seus empregados. Interpretação diversa
violaria o princípio da função social da empresa (artigo 170, III, da
Constituição da República).
Ao assumir os riscos inerentes à atividade econômica, o
empregador assume o ônus de responder, de forma objetiva, por
todos os danos causados por sua atividade empresarial. Não seria
lógico entender que, embora assumindo os riscos da atividade, o
empregador respondesse de forma subjetiva pelos danos causados
a seus empregados. A se acolher tal entendimento, estar-se-ia
desvirtuando a regra do artigo 2º da Consolidação das Leis do
Trabalho, criando-se uma reserva quanto à responsabilidade da
empresa, pois, embora assumindo os riscos da atividade, incumbiria
ao trabalhador ofendido a prova de que o dano foi causado por
culpa ou dolo do empregador.
A jurisprudência desta Corte superior, após certa controvérsia,
sufragou a aplicação da teoria da responsabilidade civil objetiva
apenas nas hipóteses em que a atividade empresarial é
considerada de risco. Destaquem-se, nesse sentido, os seguintes
precedentes: